Lei Seca

Motorista que não aceita bafômetro tem de ser punido

Autor

  • Ravênia Márcia de Oliveira Leite

    Ravênia Márcia de Oliveira Leite é delegada de Polícia Civil em Minas Gerais bacharel em Direito e Administração pela Universidade Federal de Uberlândia pós-graduada em Direito Público pela Universidade Potiguar e em Direito Penal pela Universidade Gama Filho.

1 de novembro de 2008, 23h00

O advento da Lei 11.705/2008, alcunhada pelo público em geral como “Lei Seca”, alterou o artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro nos seguintes termos: “conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a seis decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência.”

O artigo 277, caput, do Código de Trânsito Brasileiro, admite testes de alcoolemia, exames clínicos, perícia ou outro exame que, por meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados pelo Contran possam aferir o estado de embriaguez.

A nova redação do parágrafo 3º, do artigo 277, da legislação de trânsito, ratifica o caput do mesmo ao prever que “serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no artigo 165 deste Código ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo”, ou seja, admite os meios de prova acima referidos para comprovação da embriaguez, no âmbito do Código de Trânsito Brasileiro, o qual deve ser interpretado sistematicamente.

A previsão do artigo 165, do Código de Trânsito Brasileiro, no que tange à suspensão do direito de dirigir por 12 meses, retenção do veículo até a apresentação de condutor habilitado e recolhimento do documento de habilitação, impõe além do processo penal citado, também o processo administrativo para imposição da medida administrativa, respeitados os princípios do contraditório e da ampla defesa, sendo que, exercidos tais direitos, ao término, a Autoridade de Trânsito Estadual poderá impor a penalidade de suspensão do direito de dirigir. Ressalte-se que o condutor reincidente na penalidade poderá ter o direito de dirigir cassado, logicamente, mediante processo administrativo.

O Decreto Federal 6.488, de 19 de junho de 2008 prevê que, para os fins criminais de que trata o artigo 306 da Lei 9.503 de 1997, a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia é a seguinte:

I – Exame de sangue: concentração igual ou superior a seis decigramas de álcool por litro de sangue; ou,

II – Teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro): concentração de álcool igual ou superior a três décimos de miligrama por litro de ar expelido dos pulmões;

O crime previsto no artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, não mais exige que tal conduta exponha a dano potencial a incolumidade de outrem, condição esta que era prevista na redação original desse tipo penal, razão pela qual a mera direção de veículo automotor, constatada a ingestão de álcool ou qualquer outra substâcnia psicoativa que determine dependência, caracteriza o delito.

O Código de Trânsito Brasileiro admite a aplicação subsidiária do Código de Processo Penal, sendo assim, devemos recorrer ao mesmo na ausência do etilômetro, exame de sangue e exame clínica, aos quais, o cidadão tem direito constitucional de não submeter-se, já que, ninguém está obrigado a constituir prova em seu detrimento.

Assim, subsidiariamente, verifica-se a necessária aplicação do artigo 165 do Código de Processo Penal o qual estabelece a obrigatoriedade do exame de corpo de delito nas infrações que deixam vestígios.

Além disso, o artigo 167 do Código de Processo Penal prevê que “não sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhal poderá suprir-lhe a falta”, ou seja, a recusa do condutor em submeter-se aos testes de alcoolemia, exame de sangue ou exame clínico não podem ser utilizada para beneficiar sua própria torpeza, da mesma forma, que a ausência na comarca de etilômetro não pode afugentar a aplicação da lei penal, isso porque, cabe ao Estado reunir o arcabouço probatório necessário para provar a existência da prática criminosa.

Conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “Havendo outros elementos probatórios, de regra, lícitos, legítimos e adequados para demonstrar a verdade judicialmente válida dos fatos, não há razão para desconsiderá-los sob o pretexto de que o artigo 158 do CPP admite, para fins de comprovação da conduta delitiva, apenas e tão-somente, o respectivo exame pericial (STJ, 5.ª Turma, RHC 13.215/SC, relator ministro Felix Fischer, DJU de 26 de maio de 2003, p. 368.)

O festejado Damásio de Jesus nos ensina que: “ainda que o condutor exerça o direito à não-auto-incriminação, é possível, diante dos indícios configuradores de crime de trânsito (artigo 306 do CTB), encaminhá-lo à autoridade de polícia judiciária a qual, de imediato, expedirá a requisição para o exame clínico. Em razão da pesquisa do médico oficial, será possível aferir se o condutor dirigia, de forma anormal, sob o efeito de álcool ou substância análoga, o que se mostrará suficiente para a configuração do artigo 306 do CTB, haja vista ser desnecessário estabelecer, para efeitos penais, a dosagem de concentração do álcool no organismo do condutor.

Como ensina a doutrina, basta a prova da ingestão dessas substâncias e a influência por elas exercidas na forma de condução do veículo automotor em via pública. Constatando-se o comportamento anormal à direção — ziguezagues, velocidade incompatível com a segurança etc. — já será possível a imposição de sanções penais (artigo 306). Ressalto que, no exame clínico, serão observados: hálito, motricidade (marcha, escrita, elocução), psiquismo e funções vitais, entre outras pesquisas médicas, cuja realização, em vários casos, independerá da colaboração do condutor do veículo automotor.” (Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5338)

O crime em testilha, por ser apenado com detenção, perfaz ao autor direito à fiança, nos termos da lei, arbitrada pelo próprio delegado de polícia, e não havendo qualquer óbice em contrário, deverá o cidadão ser colocado imediatamente em liberdade, já que, a lei faculta-lhe o direito de responder ao processo crime em liberdade, ausentes, ressalte-se, quaisquer impedimentos legais.

Além dos elementos jurídicos citados, a sociedade, como um todo, salvo melhor e mais acurado juízo, já observa os benefícios da implantação da legislação citada, já que, sabe-se que houve uma notável diminuição das lesões graves, gravíssimas e morte ocasionadas no trânsito em razão do uso indevido de substâncias psicoativas ou álcool na direção de veículo automotor.

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  • Ravênia Márcia de Oliveira Leite é delegada de Polícia Civil em Minas Gerais, bacharel em Administração pela Universidade Federal de Uberlândia, pós-graduada em Direito Público pela Universidade Potiguar e pós-graduanda em Direito Penal pela Universidade Gama Filho.

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