Pregão presencial

Presença do licitante não é obrigatório no pregão presencial

Autor

  • Jonas Lima

    sócio de Palomares Advogados pós-graduado em Direito Público pelo IDP. Especialista em licitações e contratos administrativos é autor do livro A defesa da empresa na licitação – Processos administrativos e judiciais.

28 de março de 2008, 15h35

Persiste com bastante força a polêmica sobre a legalidade ou a ilegalidade de exigência da presença física do licitante ou seu representante na sessão do pregão presencial. Os pareceres das consultorias jurídicas, as posições adotadas pelos pregoeiros e a doutrina oscilam para os dois lados.

O assunto ainda precisa ser pacificado, o que somente ocorrerá quando o intérprete autêntico e maior da legislação federal, ou seja, o Superior Tribunal de Justiça, que tem função de uniformizar a jurisprudência do país, repita-se, sobre temas de legislação federal, responder à questão em face da Lei 10.520/02 e de outras normas aplicáveis, como as regras gerais da Lei 8.666/93, que se aplicam subsidiariamente à modalidade licitatória do pregão. Além disso, o Supremo Tribunal Federal também precisará se pronunciar sobre essa exigência em face do disposto na parte final do inciso XXI do artigo 37 da Constituição Federal, da qual ele é o guardião. Enquanto isso não ocorre, o debate prossegue.

Os defensores da tese de que se pode exigir a presença física do licitante no pregão presencial sustentam, basicamente, o seguinte:

— pela natureza do pregão e pelo próprio nome de presencial, deve ser feita a exigência;

— o credenciamento somente é possível de licitante presente fisicamente no pregão;

— não existe respaldo legal para receber proposta por via postal;

— não existe respaldo jurídico para receber a proposta com antecedência, no órgão, mas sem que, posteriormente, o representante da licitante compareça à sessão do pregão; e

— se os licitantes começassem a deixar de comparecer nos pregões não haveria mais etapa de lances, prejudicando a competitividade no certame.

Não obstante o respeito por tais argumentos, tem-se que como consideravelmente sólida a argumentação em sentido contrário à exigência:

— primeiramente, a parte final do inciso XXI do artigo 37 da Constituição Federal estabelece que exigências nos editais de licitação devem ser limitadas àquelas “indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações”, ou seja, à segurança da futura contratação, e nisso a presença física na sessão do pregão não terá interferência, mas sim o que consta da proposta e da documentação enviadas (há visível impertinência da exigência para fins de contrato);

— o Tribunal de Contas da União há vários anos vem decidindo que “no caso de pregão, o licitante interessado em participar da fase de lances verbais, além de entregar os envelopes com a documentação e as propostas por escrito, deve credenciar seu representante legal com poderes para oferecer novos preços” e que, “caso não tenha interesse em participar da fase de lances verbais, pode remeter os envelopes ao órgão ou entidade licitadora da melhor forma que encontrar.” (Licitações e contratos: orientações básicas / Tribunal de Contas da União. – 3. ed, rev. atual. e ampl. Brasília: TCU, Secretaria de Controle Interno, 2006);

— o Tribunal de Contas da União adotou a interpretação acima após examinar a Lei 10.520/02, que instituiu o pregão para “União, estados, Distrito Federal e municípios”, com caráter de norma geral, lembrando-se que, nos termos do artigo 22, inciso XXVII, da Constituição Federal, compete privativamente à União legislar sobre “normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, estados, Distrito Federal e municípios”;

— ainda no cenário acima, se para o pregão, criado por uma norma geral, que foi a Lei 10.520/02, assim sobreveio a interpretação do Tribunal de Contas da União, nenhum órgão ou entidade pode mais exigir presença física de licitante em pregão presencial, porque a Súmula 222 daquela corte de contas estabelece que suas “decisões relativas à aplicação de normas gerais de licitação, sobre as quais cabe privativamente à União legislar, devem ser acatadas pelos administradores dos Poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios”;

— passando à análise da Lei 8.666/93, que dispõe “normas gerais de licitação”, aplicáveis inclusive ao pregão (conforme o artigo 9º da Lei 10.520/02), a finalidade legal da licitação, no artigo 3º daquela lei, é “selecionar a proposta mais vantajosa para a administração”, sendo que, pode ocorrer que, por desclassificação de outras propostas, por inabilitação de outros licitantes, por ausência de lances, ou por ser efetivamente mais baixa em valores (e dentro do preço de mercado), seja aquela proposta enviada pelos Correios exatamente a “mais vantajosa” para a administração (nesse caso, não haverá discricionariedade do pregoeiro para deixar de aceitar a melhor proposta apenas porque o licitante não está presente);

— no contexto do item anterior, sob pena de quebra do princípio da legalidade, não há outra alternativa que respeite a finalidade legal da licitação, além do que, por exemplo, se fosse uma licitação privada (aquela realizada dentro da iniciativa privada) jamais uma empresa que busca qualidade e economicidade, deixaria de aceitar uma proposta de outra empresa apenas porque ela foi a única a chegar por via postal (você faria isso se estivesse comprando algo para você mesmo e perderia a chance de, ao menos, comparar aquela proposta?);

— voltando às normas gerais da Lei 8.666/93, o artigo 3º, parágrafo 1º, inciso I, daquela lei, estabelece que “é vedado aos agentes públicos: I — admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato”, sendo que esses diversos comandos barram completamente a exigência em questão, seja por discriminação geográfica, seja por aumento da despesa para o licitante se deslocar a determinada cidade, seja por restringir ou frustrar o caráter competitivo do certame desperdicando propostas técnica e economicamente aceitáveis, seja porque a circunstância é impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato;

— o nome pregão presencial significa sim que ele é feito com a presença de pessoas, mas isso não dá respaldo para que o administrador crie ou adote uma conduta que não está sequer prevista em lei, qual seja, uma nova e verdadeira hipótese de desclassificação de proposta ou de inabilitação (pregoeiro somente desclassifica proposta ou inabilita licitante dentro dos permissivos expressos legais; ele possui um modus operandi ou um rito a ser seguido, não podendo inovar e criar uma cláusula restritiva além dos limites da lei);

— os licitantes realmente interessados, ou seja, a grande maioria, não vão deixar de comparecer nos pregões e não haverá redução da competitividade nos certames, mas, ao contrário, os licitantes sempre estarão dispostos a brigar ativamente na disputa para tomar a conta do outro concorrente, porque ganhar mercado hoje em dia é essencial para as empresas se tornarem cada vez mais competitivas em outras licitações seguintes;

— até mesmo em um pregão que exija amostra o licitante pode entregar antecipadamente a sua máquina, equipamento ou outro bem, que adere e faz parte integrante de sua proposta, mas, se preferir, pode não comparecer à ocasião marcada especificamente para os testes, sem que isso cause qualquer obstáculo, porque o licitante simplesmente estará abrindo mão do direito de fiscalizar esses testes e as amostras dos seus concorrentes, não podendo alegar que deixou de ser avisado; e

— no caso ausência do licitante na sessão, por outro lado, depreende-se apenas e tão somente que ele estará, unicamente, abrindo mão do direito de formular lances verbais (artigo 4º, inciso VIII, da Lei 10.520/02), do direito de recorrer imediatamente ao final da sessão (artigo 4º, inciso XVIII, da Lei 10.520/02) e, eventualmente, do direito de desempatar a licitação, se for microempresa, empresa de pequeno porte ou cooperativa (artigos 44 e 45 da Lei Complementar 123/06).

Ante o exposto, o parecer sobre esse tema é pela impossibilidade da exigência de presença física do licitante no pregão presencial.

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    sócio de Palomares Advogados, pós-graduado em Direito Público pelo IDP. Especialista em licitações e contratos administrativos, é autor do livro A defesa da empresa na licitação – Processos administrativos e judiciais.

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