Limite da ciência

Leia voto de Gilmar Mendes sobre pesquisas com células-tronco

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31 de maio de 2008, 18h32

A realização de pesquisas com células-tronco embrionárias deveria ser condicionada à aprovação prévia de um órgão de Ética e Pesquisa, vinculado ao Ministério da Saúde. O entendimento é do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, que votou pela constitucionalidade do artigo 5º, da Lei 11.105/05, que trata do assunto, mas com ressalvas.

Na quinta-feira (29/5), o Supremo concluiu o julgamento da ADI 3.510, que questionava as pesquisas com células tronco embrionárias. Todos os ministros votaram a favor das pesquisas. Mas a decisão não foi considerada unânime, porque cinco dos 11 ministros, entre eles o presidente do STF, impuseram algumas restrições.

Apesar de reconhecer que a lei foi “cuidadosa” ao regulamentar as pesquisas, ao fazer uma comparação com as legislações de outros países, o ministro a considerou incompleta. Em seu voto, o ministro Gilmar Mendes faz paralelos entre os dispositivos que regulamentam as pesquisas na Lei de Biossegurança com as legislações de outros países, como Alemanha, França, México e Austrália.

“Uma análise comparativa do artigo 5º da Lei 11.105/2005 com a legislação de outros países sobre o mesmo assunto pode demonstrar que, de fato, não se trata apenas de uma impressão inicial; a lei brasileira é deficiente no tratamento normativo das pesquisas com células tronco”, escreve.

O ministro explica que, na Alemanha, a lei que trata do assunto é bastante restritiva. No país, há limitações quanto às células-tronco embrionárias passíveis de importação, à utilização em pesquisas, à submissão destas à aprovação prévia por uma comissão de ética, além de exigência de um relatório periódico com os resultados das pesquisas.

Na Austrália, como no Brasil, só é permitida a utilização de células-tronco embrionárias inviáveis. Mas lá a inviabilidade do embrião é expressamente determinada de acordo com a capacidade que tem de ser implantado no útero. Também há um órgão responsável pela concessão de autorizações prévias para as pesquisas. A legislação australiana prevê, ainda, um número específico de embriões a serem utilizados para alcançar os objetivos da pesquisa.

Já a França, a partir do Decreto 2006-121, de 6 de fevereiro de 2006, modificou o Código de Saúde Pública, e passou a permitir as pesquisas. Mas elas só são permitidas pela agência de biomedicina por um período máximo de 5 anos. Além disso, a legislação francesa só permite a pesquisa em casos “em que os progressos terapêuticos almejados não puderem ser alcançados por um método alternativo de eficácia comparável no meio científico”.

Gilmar Mendes explica que, na Espanha, o tema é muito explorado na Lei 14, de 3 de julho de 2007. A legislação espanhola permite qualquer técnica de obtenção de células-tronco embrionárias humanas com fins terapêuticos ou de pesquisa. Mas determina: é proibido a constituição de pré-embriões e embriões humanos para serem usados em pesquisas. Além disso, as pesquisas dependem da impossibilidade de se conseguir alcançar os objetivos por outros métodos.

Cláusula de subsidiariedade

Ao analisar as legislações desses países, o ministro chama atenção para a cláusula de subsidiariedade. Ou seja, a pesquisa com células tronco embrionárias só devem ser realizadas se não houver outros métodos para se alcançar determinado objetivo.

Para o ministro, a lei brasileira deveria estabelecer expressamente um dispositivo nessa direção. Gilmar Mendes observou que já existem pesquisas que possibilitam a obtenção de células-tronco totipotentes através de células do tecido epitelial e do cordão umbilical. “O desenvolvimento desses meios alternativos pode tornar desnecessária a utilização de embriões humanos”, constatou.

Efeito aditivo

Segundo Gilmar Mendes, a lei é insuficiente. Mas declará-la inconstitucional poderia causar mais prejuízos do que benefícios. “A declaração de sua inconstitucionalidade, com a conseqüente pronúncia de sua nulidade total, por outro lado, pode causar um indesejado vácuo normativo mais danoso à ordem jurídica e social do que a manutenção de sua vigência”, afirmou.

Para o ministro, ao analisar determinado dispositivo legal, o Tribunal acaba alterando, ainda que minimamente, o sentido original da lei. “Por isso, muitas vezes a interpretação conforme levada a efeito pelo Tribunal pode transformar-se numa decisão modificativa dos sentidos originais do texto”, explica.

O ministro defende que, em alguns casos, essa interpretação, que modifica ou corrige o dispositivo, é mais adequada do que simplesmente declarar a inconstitucionalidade da lei. Gilmar Mendes cita, em seu voto, algumas decisões recentes do Supremo que tiveram um “perfil aditivo”.

Para o ministro Gilmar Mendes, não caberia ao Supremo a infrutífera tarefa de se analisar quando a vida começa. Ele lembrou que essa questão já tem suscitado discussões há séculos sem que pudesse chegar a conclusão precisa. O ponto principal, portanto, era saber se as pesquisas estão bem regulamentadas pela Lei 11.105, de 24 de março de 2005.


Leia o voto

VOTO

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES:

Senhores Ministros. Cabe a mim, na qualidade de Presidente desta Corte, a difícil tarefa de votar por último, num julgamento que ficou marcado, desde seu início, pelas profundas reflexões de todos que intervieram no debate. Os pronunciamentos dos senhores advogados, do Ministério Público, dos amici curiae e dos diversos cientistas e expertos, assim como os votos magistrais de Vossas Excelências, fizeram desta Corte um foro de argumentação e de reflexão com eco na coletividade e nas instituições democráticas.

Assim, o que posso dizer é que este Tribunal encerra mais um julgamento que certamente representará um marco em nossa jurisprudência constitucional.

Chamado a se pronunciar sobre um tema tão delicado, o da constitucionalidade das pesquisas científicas com células-tronco embrionárias, um assunto que é ético, jurídico e moralmente conflituoso em qualquer sociedade construída culturalmente com lastro nos valores fundamentais da vida e da dignidade humana, o Supremo Tribunal Federal profere uma decisão que demonstra seu austero compromisso com a defesa dos direitos fundamentais no Estado Democrático de Direito.

O julgamento desta ADI n° 3.510, dedicadamente conduzido pelo Ministro Carlos Britto, constitui uma eloqüente demonstração de que a Jurisdição Constitucional não pode tergiversar diante de assuntos polêmicos envolvidos pelo debate entre religião e ciência.

É em momentos como este que podemos perceber, despidos de qualquer dúvida relevante, que a aparente onipotência ou o caráter contra-majoritário do Tribunal Constitucional em face do legislador democrático não pode configurar subterfúgio para restringir as competências da Jurisdição na resolução de questões socialmente relevantes e axiologicamente carregadas de valores fundamentalmente contrapostos.

Delimitar o âmbito de proteção do direito fundamental à vida e à dignidade humana e decidir questões relacionadas ao aborto, à eutanásia e à utilização de embriões humanos para fins de pesquisa e terapia são, de fato, tarefas que transcendem os limites do jurídico e envolvem argumentos de moral, política e religião que vêm sendo debatidos há séculos sem que se chegue a um consenso mínimo sobre uma resposta supostamente correta para todos.

Apesar dessa constatação, dentro de sua competência de dar a última palavra sobre quais direitos a Constituição protege, as Cortes Constitucionais, quando chamadas a decidir sobre tais controvérsias, têm exercido suas funções com exemplar desenvoltura, sem que isso tenha causado qualquer ruptura do ponto de vista institucional e democrático. Importantes questões nas sociedades contemporâneas têm sido decididas não pelos representantes do povo reunidos no parlamento, mas pelos Tribunais Constitucionais. Cito, a título exemplificativo, a famosa decisão da Suprema Corte norte-americana no caso Roe vs. Wade, assim como as decisões do Tribunal Constitucional alemão nos casos sobre o aborto (BVerfGE 39, 1, 1975; BverfGE 88, 203, 1993).

Muito se comentou a respeito do equívoco de um modelo que permite que juízes, influenciados por suas próprias convicções morais e religiosas, dêem a última palavra a respeito de grandes questões filosóficas, como a de quando começa a vida.

Lembro, em contra-argumento, as palavras de Ronald Dworkin que, na realidade norte-americana, ressaltou o fato de que “os Estados Unidos são uma sociedade mais justa do que teriam sido se seus direitos constitucionais tivessem sido confiados à consciência de instituições majoritárias”1.

Em nossa realidade, o Supremo Tribunal Federal vem decidindo questões importantes, como a recente afirmação do valor da fidelidade partidária (MS n° 26.602, 26.603 e 26.604), sem que se possa cogitar de que tais questões teriam sido melhor decididas por instituições majoritárias, e que assim teriam maior legitimidade democrática.

Certamente, a alternativa da atitude passiva de self restraint – ou, em certos casos, de greater restraint, utilizando a expressão de García de Enterría2 – teriam sido mais prejudiciais ou menos benéficas para a nossa democracia.

O Supremo Tribunal Federal demonstra, com este julgamento, que pode, sim, ser uma Casa do povo, tal qual o parlamento. Um lugar onde os diversos anseios sociais e o pluralismo político, ético e religioso encontram guarida nos debates procedimental e argumentativamente organizados em normas previamente estabelecidas. As audiências públicas, nas quais são ouvidos os expertos sobre a matéria em debate, a intervenção dos amici curiae, com suas contribuições jurídica e socialmente relevantes, assim como a intervenção do Ministério Público, como representante de toda a sociedade perante o Tribunal, e das advocacias pública e privada, na defesa de seus interesses, fazem desta Corte também um espaço democrático. Um espaço aberto à reflexão e à argumentação jurídica e moral, com ampla repercussão na coletividade e nas instituições democráticas.


Ressalto, neste ponto, que, tal como nos ensina Robert Alexy, “o parlamento representa o cidadão politicamente, o tribunal constitucional argumentativamente”. Cito, nesse sentido, a íntegra do raciocínio do filósofo e constitucionalista alemão:

“O princípio fundamental: “Todo poder estatal origina-se do povo” exige compreender não só o parlamento, mas também o tribunal constitucional como representação do povo. A representação ocorre, decerto, de modo diferente. O parlamento representa o cidadão politicamente, o tribunal argumentativamente. Com isso, deve ser dito que a representação do povo pelo tribunal constitucional tem um caráter mais idealístico do que aquela pelo parlamento. A vida cotidiana do funcionamento parlamentar oculta o perigo de que maiorias se imponham desconsideradamente, emoções determinem o acontecimento, dinheiro e relações de poder dominem e simplesmente sejam cometidas faltas graves. Um tribunal constitucional que se dirige contra tal não se dirige contra o povo senão, em nome do povo, contra seus representantes políticos. Ele não só faz valer negativamente que o processo político, segundo critérios jurídico-humanos e jurídico-fundamentais, fracassou, mas também exige positivamente que os cidadãos aprovem os argumentos do tribunal se eles aceitarem um discurso jurídico-constitucional racional. A representação argumentativa dá certo quando o tribunal constitucional é aceito como instância de reflexão do processo político. Isso é o caso, quando os argumentos do tribunal encontram eco na coletividade e nas instituições políticas, conduzem a reflexões e discussões que resultam em convencimentos examinados. Se um processo de reflexão entre coletividade, legislador e tribunal constitucional se estabiliza duradouramente, pode ser falado de uma institucionalização que deu certo dos direitos do homem no estado constitucional democrático. Direitos fundamentais e democracia estão reconciliados.”3

O debate democrático produzido no Congresso Nacional por ocasião da votação e aprovação da Lei n° 11.105/2005, especificamente de seu artigo 5º, não se encerrou naquela casa parlamentar. Renovado por provocação do Ministério Público, o debate sobre a utilização de células-tronco para fins de pesquisa científica reproduziu-se nesta Corte com intensidade ainda maior, com a nota distintiva da racionalidade argumentativa e procedimental própria de uma Jurisdição Constitucional.

Não há como negar, portanto, a legitimidade democrática da decisão que aqui tomamos hoje.

Feitas essas breves considerações preliminares, passo à estruturação da análise que faço da controvérsia constitucional, após muito refletir sobre o assunto.

O voto que profiro parte de uma constatação básica: temos uma questão específica posta em julgamento, a constitucionalidade da utilização de células-tronco embrionárias para fins de pesquisa científica, e para decidi-la não precisamos adentrar em temáticas relacionadas aos marcos inicial e final da vida humana para fins de proteção jurídica. São questões transcendentais que pairam no imaginário humano desde tempos imemoriais e que nunca foram resolvidas sequer com relativo consenso. Ciência, religião e filosofia construíram sua própria história em torno de conceitos e concepções sobre o que é a vida, quando ela começa e como deve ser ela protegida. Com todo o desenvolvimento do pensamento e do conhecimento humano, não é possível vislumbrar qualquer resposta racionalmente aceitável de forma universal, seja pela ciência ou pela religião, seja pela filosofia ou pelo imaginário popular.

Se podemos tirar alguma lição das múltiplas teorias e concepções e de todo o infindável debate que se produziu sobre temas como o aborto, a eutanásia e as pesquisas com embriões humanos, é que não existem respostas moralmente corretas e universalmente aceitáveis sobre tais questões.

Independentemente da concepção que se tenha sobre o termo inicial da vida, não se pode perder de vista – e isso parece ser indubitável diante de qualquer posicionamento que se adote sobre o tema – que, em qualquer hipótese, há um elemento vital digno de proteção jurídica.

Muitas vezes passa despercebido nos debates que não é preciso reconhecer em algo um sujeito de direitos para dotar-lhe de proteção jurídica indisponível.

Nesse sentido, são elucidativas as lições de Jürgen Habermas:

“Nessa controvérsia, fracassa toda tentativa de alcançar uma descrição ideologicamente neutra e, portanto, sem prejulgamento, do status moral da vida humana prematura, que seja aceitável para todos os cidadãos de uma sociedade secular. Um lado descreve o embrião no estágio prematuro de desenvolvimento como um amontoado de células e o confronta com a pessoa do recém-nascido, a quem primeiramente compete a dignidade humana no sentido estritamente moral. O outro lado considera a fertilização do óvulo humano como o início relevante de um processo de desenvolvimento já individualizado e controlado por si próprio. Segundo essa concepção, todo exemplar biologicamente determinável da espécie deve ser considerado como uma pessoa potencial e como um portador de direitos fundamentais. Ambos os lados parecem não se dar conta de que algo pode ser considerado como indisponível, ainda que não receba o status de um sujeito de direitos, que nos termos da constituição, é portador de direitos fundamentais inalienáveis. Indisponível não é apenas aquilo que a dignidade humana tem. Nossa disponibilidade pode ser privada de alguma coisa por bons motivos morais, sem por isso ser intangível no sentido dos direitos fundamentais em vigor de forma irrestrita e absoluta (que são direitos constitutivos da dignidade humana, conforme o artigo 1º da Constituição).”4


Mesmo entre aqueles que consideram que antes do nascimento com vida não há especificamente um sujeito de direitos fundamentais, não é possível negar que na fase pré-natal há um elemento vital digno de proteção.

Assim, a questão não está em saber quando, como e de que forma a vida humana tem início ou fim, mas como o Estado deve atuar na proteção desse organismo pré-natal diante das novas tecnologias, cujos resultados o próprio homem não pode prever.

Trago à tona as lições de Hans Jonas para afirmar que o Estado deve atuar segundo o princípio responsabilidade5.

As novas tecnologias ensejaram uma mudança radical na capacidade do homem de transformar seu próprio mundo e, nessa perspectiva, por em risco sua própria existência. E o homem tornou-se objeto da própria técnica. Como assevera Hans Jonas, “o homo faber aplica sua arte sobre si mesmo e se habilita a refabricar inventivamente o inventor e confeccionador de todo o resto”6.

O homo faber ergue-se diante do homo sapiens. A manipulação genética, um sonho ambicioso do homo faber de controlar sua própria evolução, demonstra a necessidade de uma nova ética do agir humano, uma ética de responsabilidade. “O princípio responsabilidade – ensina Hans Jonas – contrapõe a tarefa mais modesta que obriga ao temor e ao respeito: conservar incólume para o homem, na persistente dubiedade de sua liberdade que nenhuma mudança das circunstâncias poderá suprimir, seu mundo e sua essência contra os abusos de seu poder”7.

Independentemente dos conceitos e concepções religiosas e científicas a respeito do início da vida, é indubitável que existe consenso a respeito da necessidade de que os avanços tecnológicos e científicos, que tenham o próprio homem como objeto, sejam regulados pelo Estado com base no princípio responsabilidade.

Não se trata de criar obstáculos aos avanços da medicina e da biotecnologia, cujos benefícios para a humanidade são patentes. Os depoimentos de renomados cientistas na audiência pública realizada nesta ADI n° 3.510 nos apresentam um futuro promissor em tema de pesquisas com células tronco originadas do embrião humano.

A história nos ensinou que é toda a humanidade que sai perdendo diante de tentativas, sempre frustradas, de barrar o progresso científico e tecnológico. Nas felizes palavras de Hans Jonas: “O que vale a pena reter no caso da ciência e da técnica, em especial depois da sua simbiose, é que se há uma história de êxito, essa é a história de ambas; um êxito contínuo, condicionado por uma lógica interna, e portanto prometendo seguir assim no futuro. Não creio que se possa dizer o mesmo de nenhum outro esforço humano que se alongue pelo tempo”8.

À utopia do progresso científico, não obstante, deve-se contrapor o princípio responsabilidade, não como obstáculo ou retrocesso, mas como exigência de uma nova ética para o agir humano, uma ética de responsabilidade proporcional à amplitude do poder do homem e de sua técnica. Essa ética de responsabilidade implica, assim, uma espécie de humildade, não no sentido de pequenez, mas em decorrência da excessiva grandeza do poder do homem. Como bem assevera Hans Jonas, “em vista do potencial quase escatológico dos nossos processos técnicos, o próprio desconhecimento das conseqüências últimas é motivo para uma contenção responsável”9.

Ao princípio esperança (Prinzip Hoffnung, de Ernst Bloch10), portanto, contrapõe-se o princípio responsabilidade (Prinzip Verantwortung, de Hans Jonas11).

Como tenho afirmado em outras ocasiões, com base nas lições do Professor Peter Häberle, a Constituição de 1988, ao incorporar tanto o “princípio-responsabilidade” (Hans Jonas) como o “princípio-esperança” (Ernst Bloch), permite que nossa evolução constitucional ocorra entre a ratio e a emotio12.

O certo é que o ser humano, diante das novas tecnologias, deve atuar de acordo com uma ética de responsabilidade.

Portanto, a questão está em saber se a Lei n° 11.105, de 24 de março de 2005, regula as pesquisas científicas com células tronco embrionárias com a prudência exigida por um tema ética e juridicamente complexo, que envolve diretamente a própria identidade humana.

A questão, assim, envolve uma análise segundo parâmetros de proporcionalidade.

A Lei n° 11.105, de 24 de março de 2005, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam Organismos Geneticamente Modificados – OGM e seus derivados.

Em seu artigo preambular, a própria lei estabelece as diretrizes que constituem o lastro de suas normas: o estímulo e o avanço científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente.

Em todo o corpo da lei, o art. 5º é destinado à regulamentação da utilização, para fins de pesquisa, de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro. Assim dispõe o referido artigo, o qual constitui, em sua integralidade, o objeto da presente ação direta de inconstitucionalidade:

“Art. 5o É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento, atendidas as seguintes condições:

I – sejam embriões inviáveis; ou

II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos, contados a partir da data de congelamento.

§ 1o Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores.

§ 2o Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem pesquisa ou terapia com células-tronco embrionárias humanas deverão submeter seus projetos à apreciação e aprovação dos respectivos comitês de ética em pesquisa.

§ 3o É vedada a comercialização do material biológico a que se refere este artigo e sua prática implica o crime tipificado no art. 15 da Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de 1997.”

É possível perceber que a lei, inegavelmente, foi cuidadosa na regulamentação de alguns pontos, ao exigir que as pesquisas sejam realizadas apenas com embriões humanos ditos “inviáveis”, sempre mediante o consentimento dos genitores e com aprovação prévia dos projetos por comitês de ética, ficando proibida a comercialização do material biológico utilizado.

O que causa perplexidade, por outro lado, é perceber que, no Brasil, a regulamentação de um tema tão sério, que envolve profundas e infindáveis discussões sobre aspectos éticos nas pesquisas científicas, seja realizada por um, e apenas um artigo.

A vaguidade da lei deixou a cargo do Poder Executivo a regulamentação do tema, que o fez por meio dos arts. 63 a 67 do Decreto n° 5.591, de 22 de novembro de 2005. O referido decreto ainda contém remissões normativas a atos administrativos específicos de órgãos como o Ministério da Saúde e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

A primeira impressão, não há dúvida, é de que a lei é deficiente na regulamentação do tema e, por isso, pode violar o princípio da proporcionalidade não como proibição de excesso (Übermassverbot), mas como proibição de proteção deficiente (Untermassverbot).

Como é sabido, os direitos fundamentais se caracterizam não apenas por seu aspecto subjetivo, mas também por uma feição objetiva que os tornam verdadeiros mandatos normativos direcionados ao Estado.

A dimensão objetiva dos direitos fundamentais legitima a idéia de que o Estado se obriga não apenas a observar os direitos de qualquer indivíduo em face das investidas do Poder Público (direito fundamental enquanto direito de proteção ou de defesa – Abwehrrecht), mas também a garantir os direitos fundamentais contra agressão propiciada por terceiros (Schutzpflicht des Staats)13.

A forma como esse dever será satisfeito constitui, muitas vezes, tarefa dos órgãos estatais, que dispõem de alguma liberdade de conformação14. Não raras vezes, a ordem constitucional identifica o dever de proteção e define a forma de sua realização.

A jurisprudência da Corte Constitucional alemã acabou por consolidar entendimento no sentido de que do significado objetivo dos direitos fundamentais resulta o dever do Estado não apenas de se abster de intervir no âmbito de proteção desses direitos, mas também de proteger tais direitos contra a agressão ensejada por atos de terceiros15.

Essa interpretação da Corte Constitucional empresta sem dúvida uma nova dimensão aos direitos fundamentais, fazendo com que o Estado evolua da posição de “adversário” para uma função de guardião desses direitos16.

É fácil ver que a idéia de um dever genérico de proteção fundado nos direitos fundamentais relativiza sobremaneira a separação entre a ordem constitucional e a ordem legal, permitindo que se reconheça uma irradiação dos efeitos desses direitos sobre toda a ordem jurídica17.

Assim, ainda que não se reconheça, em todos os casos, uma pretensão subjetiva contra o Estado, tem-se, inequivocamente, a identificação de um dever deste de tomar todas as providências necessárias para a realização ou concretização dos direitos fundamentais18.

Os direitos fundamentais não podem ser considerados apenas como proibições de intervenção (Eingriffsverbote), expressando também um postulado de proteção (Schutzgebote). Utilizando-se da expressão de Canaris, pode-se dizer que os direitos fundamentais expressam não apenas uma proibição do excesso (Übermassverbote), mas também podem ser traduzidos como proibições de proteção insuficiente ou imperativos de tutela (Untermassverbote)19.

Nos termos da doutrina e com base na jurisprudência da Corte Constitucional alemã, pode-se estabelecer a seguinte classificação do dever de proteção20:

a) dever de proibição (Verbotspflicht), consistente no dever de se proibir uma determinada conduta;

b) dever de segurança (Sicherheitspflicht), que impõe ao Estado o dever de proteger o indivíduo contra ataques de terceiros mediante a adoção de medidas diversas;

c) dever de evitar riscos (Risikopflicht), que autoriza o Estado a atuar com o objetivo de evitar riscos para o cidadão em geral mediante a adoção de medidas de proteção ou de prevenção especialmente em relação ao desenvolvimento técnico ou tecnológico.

Discutiu-se intensamente se haveria um direito subjetivo à observância do dever de proteção ou, em outros termos, se haveria um direito fundamental à proteção. A Corte Constitucional acabou por reconhecer esse direito, enfatizando que a não-observância de um dever de proteção corresponde a uma lesão do direito fundamental previsto no art. 2, II, da Lei Fundamental21.

Assim, na dogmática alemã é conhecida a diferenciação entre o princípio da proporcionalidade como proibição de excesso (Ubermassverbot) e como proibição de proteção deficiente (Untermassverbot). No primeiro caso, o princípio da proporcionalidade funciona como parâmetro de aferição da constitucionalidade das intervenções nos direitos fundamentais como proibições de intervenção. No segundo, a consideração dos direitos fundamentais como imperativos de tutela (Canaris) imprime ao princípio da proporcionalidade uma estrutura diferenciada22. O ato não será adequado quando não proteja o direito fundamental de maneira ótima; não será necessário na hipótese de existirem medidas alternativas que favoreçam ainda mais a realização do direito fundamental; e violará o subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito se o grau de satisfação do fim legislativo é inferior ao grau em que não se realiza o direito fundamental de proteção23.

Na jurisprudência do Tribunal Constitucional alemão, a utilização do princípio da proporcionalidade como proibição de proteção deficiente pode ser encontrada na segunda decisão sobre o aborto (BverfGE 88, 203, 1993). O Bundesverfassungsgericht assim se pronunciou:

“O Estado, para cumprir com seu dever de proteção, deve empregar medidas suficientes de caráter normativo e material, que levem a alcançar – atendendo à contraposição de bens jurídicos – a uma proteção adequada, e como tal, efetiva (proibição de insuficiência).

(…)

É tarefa do legislador determinar, detalhadamente, o tipo e a extensão da proteção. A Constituição fixa a proteção como meta, não detalhando, porém, sua configuração. No entanto, o legislador deve observar a proibição de insuficiência (…). Considerando-se bens jurídicos contrapostos, necessária se faz uma proteção adequada. Decisivo é que a proteção seja eficiente como tal. As medidas tomadas pelo legislador devem ser suficientes para uma proteção adequada e eficiente e, além disso, basear-se em cuidadosas averiguações de fatos e avaliações racionalmente sustentáveis.(…)”

Uma análise comparativa do art. 5º da Lei n° 11.105/2005 com a legislação de outros países sobre o mesmo assunto pode demonstrar que, de fato, não se trata apenas de uma impressão inicial; a lei brasileira é deficiente no tratamento normativo das pesquisas com células tronco e, portanto, não está em consonância com o princípio da proporcionalidade como proibição de proteção insuficiente (Untermassverbot).

ALEMANHA

Na Alemanha, editou-se lei específica, a denominada Stammzellgesetz (StZG), sobre a importação e a utilização das células-tronco embrionárias em pesquisas científicas.

A regulação da atividade científica com células-tronco é restritiva e inclui (1) limitações importantes quanto às células-tronco embrionárias passíveis de importação e utilização em pesquisa (§4º); (2) restrições às pesquisas que podem utilizar células-tronco embrionárias (§5º); (iii) a necessidade de aprovação prévia de cada pesquisa (§6º); (iv) a instituição de agência competente (§ 7º) e comissão de ética de especialistas (§ 8º) para apreciar e conceder as autorizações prévias; (3) infrações penais (§ 13) e administrativas (§ 14) pertinentes; e (4) a exigência de relatório periódico com os resultados das experiências envolvendo células-tronco tanto embrionárias quanto adultas (§ 15).

Destaque-se que a legislação alemã permite apenas as pesquisas com linhas de células-tronco consolidadas do exterior. Portanto, é expressamente proibida a produção de linhas de células-tronco na própria Alemanha, tornando-se imprescindível a importação de embriões para fins de pesquisa.

A lei permite a importação apenas de embriões formados antes de 1º de janeiro de 2002, desde que na conformidade da legislação do país exportador. Esse marco temporal foi recentemente alterado pelo Bundestag (em 11.4.2008), fixando-se novo marco em 1º de maio de 2007.

Além disso, somente podem ser utilizados embriões em pesquisa (1) fecundados in vitro (2) com o objetivo de assistir a gravidez; e (3) descartados por razões não fundadas em características inerentes aos embriões.

Mais importante, a lei alemã exige que as pesquisas com células tronco embrionárias sejam motivadas por elevados objetivos (hochrangigen Forschungszielen) ou sejam destinadas ao desenvolvimento de procedimentos terapêuticos, de diagnóstico ou de prevenção aplicados a seres humanos, com cláusula de subsidiariedade. Isto é, só podem ser realizadas pesquisas quando todas as hipóteses foram exaustivamente testadas com células de animais ou em experiências com animais; e somente podem ser realizadas com células-tronco embrionárias (§ 5, Abs. 2 StZG):

“Trabalhos de pesquisas com células-tronco embrionárias somente podem ser realizadas se cientificamente demonstrado que

(…)

2. Segundo o estado da Ciência e da Técnica:

a) as hipóteses previstas no projeto de pesquisa foram testadas tanto quanto possível com modelos in vitro com células de animais ou em experimentos com animais e

b) o conhecimento científico a ser obtido pelo projeto de pesquisa em apreço não tenha expectativa de ser alcançado utilizando outras células, além das células-tronco embrionárias. (Forschungsarbeiten an embryonalen Stammzellen dürfen nur durchgeführt werden, wenn wissenschaftlich begründet darlegt ist, dass

2. nach dem anerkannten Stand von Wissenschaft und Technik

a) die im Forschungsvorhaben vorgesehen Fragestellungen so weit wie möglich bereits in In-vitro-Modellen mit tierischen Zellen oder in Tierversuchung vorgeklärt worden sind und

b) der mit dem Forschungsvorhaben angestrebte wissenschaftliche Erkenntnisgewinn sich voraussichtlich nur mit embryonalen Stammzellen erreichen lässt.“

Ressalte-se que a legislação alemã institui não só um órgão administrativo competente (Zuständige Behörde), ligado ao Ministério da Saúde, para conceder as licenças prévias, como cria Comissão de Ética Central para Pesquisa com células-tronco (Zentrale Ethik-kommission für Stammzellenforschung), formada por expertos em medicina, biologia, ética e teologia.

Em suma, a legislação alemã é extremamente restritiva da atividade científica que tenha por objeto embriões humanos. Os constantes debates entre cientistas, religiosos e entes da sociedade civil, a respeito da necessidade de relativização dos rigores da lei, ainda não levaram a qualquer solução legislativa mais significativa no sentido da mudança das regras estabelecidas.

Apesar das reivindicações de cientistas quanto a mudanças na legislação sobre as pesquisas com células-tronco, há consenso sobre a necessidade de se regular rigidamente essas pesquisas, afastando-se qualquer possibilidade de abusos e transgressões cujas conseqüências não é possível prever.

AUSTRÁLIA

Na Austrália, a questão é regulada pelo Research Involving Human Embryos Act 2002, alterado pelo Prohibition of Human Cloning for Reproduction and the Regulation of Human Embryo Research Amendment Act 2006.

Segundo a regulação australiana, permite-se apenas a utilização de células-tronco embrionárias inviáveis (not suitable). Define-se expressamente que a viabilidade do embrião seja determinada com base na sua aptidão biológica para implantação [biological fitness for implantation – Section 10 (2) “d” i]

Nesse caso, institui-se também órgão que emite licenças prévias para as pesquisas envolvendo células-tronco embrionárias (Embryo Research Licensing Committee of the National Health and Medical Research Council).

Outrossim, dispõe-se especificamente sobre as formas válidas de obtenção de consentimento dos responsáveis pelos embriões do quais serão derivadas as células-tronco [Section 21 (3) “a”].

Além disso, há preocupação específica com as pesquisas que podem danificar ou destruir embriões, nas quais somente podem ser utilizados embriões criados até 5.4.2002 [Sections 21 (3) “b” e 24 (3)].

Por outro lado, a lei australiana determina que a licença seja limitada a um número específico de embriões que serão utilizados para alcançar os objetivos da pesquisa [Section 21 (4) “a”], além de prever, assim com na legislação alemã, cláusula de subsidiariedade, nos seguintes termos:

“(4) Na decisão sobre a emissão de licença, o Órgão de Licença NHMRC precisa considerar o seguinte:

(…)

(b) a possibilidade de significativo avanço no conhecimento ou melhoria nas tecnologias para tratamento propostos no requerimento como resultado no uso do excesso de embriões para reprodução assistida, outros embriões ou óvulos humanos, que não poderiam razoavelmente ser alcançados por outros meios.” [In deciding whether to issue the licence, the NHMRC Licensing Committee must have regard to the following:

(…)

(b) the likelihood of significant advance in knowledge or improvement in technologies for treatment as a result of the use of excess ART embryos, other embryos or human eggs proposed in the application, which could not reasonably be achieved by other means].

Como se vê, também a legislação autraliana estabelece uma cláusula de subsidiariedade como condição para a permissão de pesquisas com células-tronco. Em outros termos, a utilização de células-tronco apenas é permitida para fins de pesquisa se, e somente se, não existirem ou não sejam suficientes ou adequados outros meios científicos para o alcance dos objetivos da pesquisa.

Essa cláusula de subsidiariedade atende ao postulado da proporcionalidade e da precaução na utilização de novas tecnologias cujo conhecimento humano ainda não é exaustivo. Trata-se, enfim, de um corolário do princípio da responsabilidade.

FRANÇA

Na França, a Agence de la Biomédicine passou a expedir autorizações para pesquisas com células embrionárias humanas (recherches sur l’embryon et les cellules souches embryonnaires humaines) desde 2007, com base no Decreto n° 2006-121, de 6 de fevereiro de 2006, que modificou o Código de Saúde Pública (Décret n. 2006-121 du 6 février 2006 relatif à la recherche sur l’embryon et sur les cellules embryonnaires et modifiant le code de la santé publique).

Naquele país, portanto, as pesquisas com células embrionárias humanas são permitidas, tendo em vista razões de progresso terapêutico (pour des progrès thérapeutiques majeurs), porém são objeto de ampla e rigorosa regulamentação.

Em primeiro lugar, as pesquisas com células embrionárias são permitidas apenas com vistas ao tratamento de doenças particularmente graves ou incuráveis, e apenas são autorizadas, pela agência de biomedicina, por um período máximo de 5 anos (Art. R. 2151-1. Sont notamment susceptibles de permettre des progrès thérapeutiques majeurs, au sens de l’article L. 2151-5, les recherches sur l’embryon et les cellules embryonnaires poursuivant une visée thérapeutique pour le traitement de maladies particulièrement graves ou incurables, ainsi que le traitement des affections de l’embryon ou du foetus. Art. R. 2151-2. – Le directeur général de l’agence de la biomédecine peut autoriser un protocole de recherche sur l’embryon ou sur les cellules embryonnaires, après avis du conseil d’orientation, pour une durée déterminée qui ne peut excéder cinq ans).

Ademais, as pesquisas somente são autorizadas após o consentimento prévio do casal genitor ou de membro sobrevivente do casal. [Art. R 2151-19 – Le directeur général de l´agence de la biomedecine autorise la conservation de cellules souches embryonnaires, après avis du conseil d´orientation, pour une durée déterminée, qui ne peut exceder cinq ans (…)]

A Lei de Bioética, de 6 de agosto de 2004, já autorizava as referidas pesquisas, mas em caráter subsidiário. Ou seja, também a lei francesa dispõe de uma cláusula de subsidiariedade, segundo a qual serão permitidas as pesquisas com células embrionárias tão-somente nos casos em que os progressos terapêuticos almejados não puderem ser alcançados por um método alternativo de eficácia comparável no meio científico. [Art. L. 2151-5. – (…)Par dérogation au premier alinéa, et pour une période limitée à cinq ans à compter de la publication du décret en Conseil d’Etat prévu à l’article L. 2151-8, les recherches peuvent être autorisées sur l’embryon et les cellules embryonnaires lorsqu’elles sont susceptibles de permettre des progrès thérapeutiques majeurs et à la condition de ne pouvoir être poursuivies par une méthode alternative d’efficacité comparable, en l’état des connaissances scientifiques.]

ESPANHA

A Lei n. 14, de 3 de julho de 2007, que regula a pesquisa biomédica, já em seu preâmbulo ressalta que os “avanços científicos e os procedimentos e ferramentas utilizados para alcançá-los geram importantes incertezas éticas e jurídicas, que devem ser convenientemente reguladas, com o equilíbrio e a prudência que exige um tema tão complexo que afeta de maneira tão direta a identidade do ser humano.”

A referida lei, que veio complementar as previsões da Lei n.14, de 26 de maio de 2006, sobre técnicas de reprodução humana assistida, é bastante abrangente e está estruturada em 90 artigos, quinze capítulos, oito títulos, ademais das disposições adicionais, transitórias, derrogatórias e finais.

Já em seu título I, estabelece um catálogo de princípios e garantias para a proteção dos direitos da pessoa humana e dos bens jurídicos implicados na investigação biomédica, recorrendo a uma relação precisa para estabelecer os limites do princípio da liberdade de pesquisa na defesa da dignidade e da identidade do ser humano.

Assim, em conformidade com a concepção de proteção da vida humana já assentada na jurisprudência espanhola (Sentenças 53/1985, 212/1996 e 116/1999), a lei proíbe expressamente a constituição de pré-embriões e embriões humanos exclusivamente com a finalidade de experimentação, mas permite a utilização de qualquer técnica de obtenção de células-tronco embrionárias humanas com fins terapêuticos ou de pesquisa, que não comporte a criação de um pré-embrião ou embrião exclusivamente com esse fim.

Estabelece o art. 28 da referida Lei que os embriões humanos que tenham perdido sua capacidade de desenvolvimento biológico, bem como os embriões ou fetos humanos mortos, poderão ser doados para fins de pesquisa biomédica ou outros fins diagnósticos, terapêuticos, farmacológicos, clínicos ou cirúrgicos.

A promoção da pesquisa biomédica atenderá a critérios de qualidade, eficácia e igualdade de oportunidades, e qualquer pesquisa deverá ser cientificamente justificada, além de cumprir critérios de qualidade científica (art. 10).

A realização de pesquisa sobre uma pessoa requererá seu consentimento expresso, e por escrito, ou de seu representante legal, e prévia informação sobre as conseqüências e riscos que poderão acarretar a sua saúde (Art.58).

Ademais, a pesquisa em seres humanos somente poderá realizar-se quando inexistente alternativa de eficácia comparável (cláusula de subsidiariedade), e não deverá implicar para o ser humano riscos e moléstias desproporcionais aos potenciais benefícios que poderão ser obtidos. (Artículo 14. Principios generales.1. La investigación en seres humanos sólo podrá llevarse a cabo en ausencia de una alternativa de eficácia comparable. 2. La investigación no deberá implicar para el ser humano riesgos y molestias desproporcionados en relación con los beneficios potenciales que se puedan obtener.)

MÉXICO

A Lei Geral de Saúde do México, de 7 de fevereiro de 1984 (última alteração publicada em 18.12.2007) prevê, em seu artigo 100, que a pesquisa em seres humanos deverá adaptar-se a princípios científicos e éticos a justificar a pesquisa, especialmente no que se refere à sua possível contribuição para a solução de problemas de saúde e do desenvolvimento de novos campos da ciência médica.

Também se requer, para a realização de pesquisa, o consentimento expresso, e por escrito, do sujeito fonte, além de prévia informação sobre as conseqüências e riscos que poderão advir à sua saúde.

E o México igualmente adota, a exemplo dos demais países referidos acima (Alemanha, Austrália, França e Espanha), cláusula de subsidiariedade, ao deixar expresso que tais pesquisas somente poderão efetuar-se quando o conhecimento que se pretende produzir não possa ser obtido por outro método idôneo. (Art. 100, II – II. Podrá realizarse sólo cuando el conocimiento que se pretenda producir no pueda obtenerse por otro método idoneo.)

a interpretação do art. 5º da Lei n° 11.105/2005 com efeitos aditivos

Como se pode constatar, a legislação de outros países é extremamente rigorosa e, portanto, responsável na regulamentação do tema das pesquisas científicas com embriões humanos.

Efetuada a comparação, é impossível negar a deficiência da lei brasileira na regulamentação desse tema.

É importante ressaltar que a legislação brasileira sequer prevê qualquer norma para regular as atividades desenvolvidas pelas clínicas de fertilização in vitro. Daí a origem dos bancos de embriões congelados sem qualquer destinação específica.

Inserido, no curso do processo legislativo, numa lei que trata de tema distinto, o dos Organismos Geneticamente Modificados-OGM, denominados “transgênicos”, o art. 5º da Lei n° 11.105/2005 visa preencher essa lacuna, destinando à pesquisa e à terapia os embriões humanos congelados há mais de três anos, na data da publicação da lei.

Assim, é possível perceber, em primeiro lugar, que, enquanto no direito comparado a regulamentação do tema é realizada por leis específicas, destinadas a regular, em sua inteireza, esse assunto tão complexo, no Brasil inseriu-se um único artigo numa lei destinada a tratar de tema distinto. Um artigo que deixa de abordar aspectos essenciais ao tratamento responsável do tema.

Ressalto a estrutura da lei espanhola, com 90 artigos, quinze capítulos, oito títulos, ademais das disposições adicionais, transitórias, derrogatórias e finais. Em seu preâmbulo, a lei espanhola é enfática ao afirmar que os “avanços científicos e os procedimentos e ferramentas utilizados para alcançá-los geram importantes incertezas éticas e jurídicas, que devem ser convenientemente reguladas, com o equilíbrio e a prudência que exige um tema tão complexo que afeta de maneira tão direta a identidade do ser humano.”

A lei brasileira, numa lacuna contundente, estabelece apenas que as instituições de pesquisa e serviços de saúde, que realizem pesquisa ou terapia com células-tronco embrionárias humanas, deverão submeter seus projetos à apreciação e aprovação dos respectivos comitês de ética em pesquisa.

Deixa a lei, nesse aspecto, de instituir um imprescindível Comitê Central de Ética, devidamente regulamentado. A legislação germânica, por exemplo, institui não só um órgão administrativo competente (Zuständige Behörde), ligado ao Ministério da Saúde, para conceder as licenças prévias, como cria Comissão de Ética Central para Pesquisa com células-tronco (Zentrale Ethik-kommission für Stammzellenforschung), formada por expertos em medicina, biologia, ética e teologia.

Além disso, é importante observar que a legislação no direito comparado, sem exceção, estabelece, de forma expressa, uma cláusula de subsidiariedade, no sentido de permitir as pesquisas com embriões humanos apenas nas hipóteses em que outros meios científicos não se demonstrarem adequados para os mesmos fins.

A lei brasileira deveria conter dispositivo explícito nesse sentido, como forma de um tratamento responsável sobre o tema. Os avanços da biotecnologia já indicam a possibilidade de que células-tronco totipotentes sejam originadas de células do tecido epitelial e do cordão umbilical. As pesquisas com células-tronco adultas têm demonstrado grandes avanços. O desenvolvimento desses meios alternativos pode tornar desnecessária a utilização de embriões humanos e, portanto, afastar, pelo menos em parte, o debate sobre as questões éticas e morais que envolvem tais pesquisas.

Assim, a existência de outros métodos científicos igualmente adequados e menos gravosos torna a utilização de embriões humanos em pesquisas uma alternativa científica contrária ao princípio da proporcionalidade.

O art. 5º da Lei n° 11.105/2005 é, portanto, deficiente, em diversos aspectos, na regulamentação do tema das pesquisas com células-tronco.

A declaração de sua inconstitucionalidade, com a conseqüente pronúncia de sua nulidade total, por outro lado, pode causar um indesejado vácuo normativo mais danoso à ordem jurídica e social do que a manutenção de sua vigência.

Não seria o caso de declaração total de inconstitucionalidade, ademais, pois é possível preservar o texto do dispositivo, desde que seja interpretado em conformidade com a Constituição, ainda que isso implique numa típica sentença de perfil aditivo.

Nesse sentido, a técnica da interpretação conforme a Constituição pode oferecer uma alternativa viável.

Há muito se vale o Supremo Tribunal Federal da interpretação conforme à Constituição24. Consoante a prática vigente, limita-se o Tribunal a declarar a legitimidade do ato questionado desde que interpretado em conformidade com a Constituição25. O resultado da interpretação, normalmente, é incorporado, de forma resumida, na parte dispositiva da decisão26.

Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, porém, a interpretação conforme à Constituição conhece limites. Eles resultam tanto da expressão literal da lei quanto da chamada vontade do legislador. A interpretação conforme à Constituição é, por isso, apenas admissível se não configurar violência contra a expressão literal do texto e não alterar o significado do texto normativo, com mudança radical da própria concepção original do legislador27.

Assim, a prática demonstra que o Tribunal não confere maior significado à chamada intenção do legislador, ou evita investigá-la, se a interpretação conforme à Constituição se mostra possível dentro dos limites da expressão literal do texto28.

Muitas vezes, porém, esses limites não se apresentam claros e são difíceis de definir. Como todo tipo de linguagem, os textos normativos normalmente padecem de certa indeterminação semântica, sendo passíveis de múltiplas interpretações. Assim, é possível entender, como o faz Rui Medeiros, que “a problemática dos limites da interpretação conforme à Constituição está indissociavelmente ligada ao tema dos limites da interpretação em geral”29.

A eliminação ou fixação, pelo Tribunal, de determinados sentidos normativos do texto, quase sempre tem o condão de alterar, ainda que minimamente, o sentido normativo original determinado pelo legislador. Por isso, muitas vezes a interpretação conforme levada a efeito pelo Tribunal pode transformar-se numa decisão modificativa dos sentidos originais do texto.

A experiência das Cortes Constitucionais européias – destacando-se, nesse sentido, a Corte Costituzionale italiana30 – bem demonstra que, em certos casos, o recurso às decisões interpretativas com efeitos modificativos ou corretivos da norma constitui a única solução viável para que a Corte Constitucional enfrente a inconstitucionalidade existente no caso concreto, sem ter que recorrer a subterfúgios indesejáveis e soluções simplistas como a declaração de inconstitucionalidade total ou, no caso de esta trazer conseqüências drásticas para a segurança jurídica e o interesse social, a opção pelo mero não-conhecimento da ação.

Sobre o tema, é digno de nota o estudo de Joaquín Brage Camazano31, do qual cito a seguir alguns trechos:

“La raíz esencialmente pragmática de estas modalidades atípicas de sentencias de la constitucionalidad hace suponer que su uso es prácticamente inevitable, con una u otra denominación y con unas u otras particularidades, por cualquier órgano de la constitucionalidad consolidado que goce de una amplia jurisdicción, en especial si no seguimos condicionados inercialmente por la majestuosa, pero hoy ampliamente superada, concepción de Kelsen del TC como una suerte de ‘legislador negativo’. Si alguna vez los tribunales constitucionales fueron legisladores negativos, sea como sea, hoy es obvio que ya no lo son; y justamente el rico ‘arsenal’ sentenciador de que disponen para fiscalizar la constitucionalidad de la Ley, más allá del planteamiento demasiado simple ‘constitucionalidad/ inconstitucionalidad’, es un elemento más, y de importancia, que viene a poner de relieve hasta qué punto es así. Y es que, como Fernández Segado destaca, ‘la praxis de los tribunales constitucionales no ha hecho sino avanzar en esta dirección’ de la superación de la idea de los mismos como legisladores negativos, ‘certificando [así] la quiebra del modelo kelseniano del legislador negativo.”

Certas modalidades atípicas de decisão no controle de constitucionalidade decorrem, portanto, de uma necessidade prática comum a qualquer jurisdição constitucional.

Assim, o recurso a técnicas inovadoras de controle da constitucionalidade das leis e dos atos normativos em geral tem sido cada vez mais comum na realidade do direito comparado, na qual os tribunais não estão mais afeitos às soluções ortodoxas da declaração de nulidade total ou de mera decisão de improcedência da ação com a conseqüente declaração de constitucionalidade.

Além das muito conhecidas técnicas de interpretação conforme à Constituição, declaração de nulidade parcial sem redução de texto, ou da declaração de inconstitucionalidade sem a pronúncia da nulidade, aferição da “lei ainda constitucional” e do apelo ao legislador, são também muito utilizadas as técnicas de limitação ou restrição de efeitos da decisão, o que possibilita a declaração de inconstitucionalidade com efeitos pro futuro a partir da decisão ou de outro momento que venha a ser determinado pelo tribunal.

Nesse contexto, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem evoluído significativamente nos últimos anos, sobretudo a partir do advento da Lei n° 9.868/99, cujo art. 27 abre ao Tribunal uma nova via para a mitigação de efeitos da decisão de inconstitucionalidade. A prática tem demonstrado que essas novas técnicas de decisão têm guarida também no âmbito do controle difuso de constitucionalidade32.

Uma breve análise retrospectiva da prática dos Tribunais Constitucionais e de nosso Supremo Tribunal Federal bem demonstra que a ampla utilização dessas decisões, comumente denominadas “atípicas”, as converteram em modalidades “típicas” de decisão no controle de constitucionalidade, de forma que o debate atual não deve mais estar centrado na admissibilidade de tais decisões, mas nos limites que elas devem respeitar.

O Supremo Tribunal Federal, quase sempre imbuído do dogma kelseniano do legislador negativo, costuma adotar uma posição de self-restraint ao se deparar com situações em que a interpretação conforme possa descambar para uma decisão interpretativa corretiva da lei33.

Ao se analisar detidamente a jurisprudência do Tribunal, no entanto, é possível verificar que, em muitos casos, a Corte não se atenta para os limites, sempre imprecisos, entre a interpretação conforme delimitada negativamente pelos sentidos literais do texto e a decisão interpretativa modificativa desses sentidos originais postos pelo legislador34.

No recente julgamento conjunto das ADIn 1.105 e 1.127, ambas de relatoria do Min. Marco Aurélio, o Tribunal, ao conferir interpretação conforme a Constituição a vários dispositivos do Estatuto da Advocacia (Lei n° 8.906/94), acabou adicionando-lhes novo conteúdo normativo, convolando a decisão em verdadeira interpretação corretiva da lei35.

Em outros vários casos mais antigos36, também é possível verificar que o Tribunal, a pretexto de dar interpretação conforme a Constituição a determinados dispositivos, acabou proferindo o que a doutrina constitucional, amparada na prática da Corte Constitucional italiana, tem denominado de decisões manipulativas de efeitos aditivos37.

Tais sentenças de perfil aditivo foram proferidas por esta Corte nos recentes julgamentos dos MS n°s 26.602, Rel. Min Eros Grau, 26.603, Rel. Min. Celso de Mello e 26.604, Rel. Min. Cármen Lúcia, em que afirmamos o valor da fidelidade partidária; assim como no também recente julgamento a respeito do direito fundamental de greve dos servidores públicos (MI n° 708, de minha relatoria; MI n°s 607 e 712, Rel. Min. Eros Grau). Outra não foi a fórmula encontrada pelo Tribunal para solver a questão da inconstitucionalidade da denominada cláusula de barreira instituída pelo art. 13 da Lei n° 9.096, no julgamento das ADI n°s 1.351 e 1.354, Rel. Min. Marco Aurélio.

Sobre a evolução da Jurisdição Constitucional brasileira em tema de decisões manipulativas, o constitucionalista português Blanco de Morais fez a seguinte análise:

“(…) o fato é que a Justiça Constitucional brasileira deu, onze anos volvidos sobre a aprovação da Constituição de 1988, um importante passo no plano da suavização do regime típico da nulidade com efeitos absolutos, através do alargamento dos efeitos manipulativos das decisões de inconstitucionalidade.

Sensivelmente, desde 2004 parecem também ter começado a emergir com maior pragnância decisões jurisdicionais com efeitos aditivos.

Tal parece ter sido o caso de uma acção directa de inconstitucionalidade, a ADIn 3105, a qual se afigura como uma sentença demolitória com efeitos aditivos. Esta eliminou, com fundamento na violação do princípio da igualdade, uma norma restritiva que, de acordo com o entendimento do Relator, reduziria arbitrariamente para algumas pessoas pertencentes à classe dos servidores públicos, o alcance de um regime de imunidade tributária que a todos aproveitaria. Dessa eliminação resultou automaticamente a aplicação, aos referidos trabalhadores inactivos, de um regime de imunidade contributiva que abrangia as demais categorias de servidores públicos.”

Em futuro próximo, o Tribunal voltará a se deparar com o problema no julgamento da ADPF n° 54, Rel. Min. Marco Aurélio, que discute a constitucionalidade da criminalização dos abortos de fetos anencéfalos. Caso o Tribunal decida pela procedência da ação, dando interpretação conforme aos arts. 124 a 128 do Código Penal, invariavelmente proferirá uma típica decisão manipulativa com eficácia aditiva.

Ao rejeitar a questão de ordem levantada pelo Procurador-Geral da República, o Tribunal admitiu a possibilidade de, ao julgar o mérito da ADPF n° 54, atuar como verdadeiro legislador positivo, acrescentando mais uma excludente de punibilidade – no caso do feto padecer de anencefalia – ao crime de aborto.

Portanto, é possível antever que o Supremo Tribunal Federal acabe por se livrar do vetusto dogma do legislador negativo e se alie à mais progressiva linha jurisprudencial das decisões interpretativas com eficácia aditiva, já adotadas pelas principais Cortes Constitucionais européias. A assunção de uma atuação criativa pelo Tribunal poderá ser determinante para a solução de antigos problemas relacionados à inconstitucionalidade por omissão, que muitas vezes causa entraves para a efetivação de direitos e garantias fundamentais assegurados pelo texto constitucional.

O presente caso oferece uma oportunidade para que o Tribunal avance nesse sentido. O vazio jurídico a ser produzido por uma decisão simples de declaração de inconstitucionalidade/nulidade dos dispositivos normativos impugnados torna necessária uma solução diferenciada, uma decisão que exerça uma “função reparadora” ou, como esclarece Blanco de Morais, “de restauração corretiva da ordem jurídica afetada pela decisão de inconstitucionalidade”38 .

Seguindo a linha de raciocínio até aqui delineada, deve-se conferir ao art. 5º uma interpretação em conformidade com o princípio responsabilidade, tendo como parâmetro de aferição o princípio da proporcionalidade como proibição de proteção deficiente (Untermassverbot).

Conforme analisado, a lei viola o princípio da proporcionalidade como proibição de proteção insuficiente (Untermassverbot) ao deixar de instituir um órgão central para análise, aprovação e autorização das pesquisas e terapia com células-tronco originadas do embrião humano.

O art. 5º da Lei n° 11.105/2005 deve ser interpretado no sentido de que a permissão da pesquisa e terapia com células-tronco embrionárias, obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro, deve ser condicionada à prévia aprovação e autorização por Comitê (Órgão) Central de Ética e Pesquisa, vinculado ao Ministério da Saúde.

Entendo, portanto, que essa interpretação com conteúdo aditivo pode atender ao princípio da proporcionalidade e, dessa forma, ao princípio responsabilidade.

Assim, julgo improcedente a ação, para declarar a constitucionalidade do art. 5º, seus incisos e parágrafos, da Lei n° 11.105/2005, desde que seja interpretado no sentido de que a permissão da pesquisa e terapia com células-tronco embrionárias, obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro, deve ser condicionada à prévia autorização e aprovação por Comitê (Órgão) Central de Ética e Pesquisa, vinculado ao Ministério da Saúde.

Notas de rodapé

1 – DWORKIN, Ronald. O império do direito. São Paulo: Martins Fontes; 1999, p. 426.

2 – GARCÍA DE ENTERRÍA, Eduardo. Justicia Constitucional: la doctrina prospectiva en la declaración de ineficacia de las leyes inconstitucionales. In: Revista de Direito Público n° 92; out./dez. de 1989, p. 14.

3 – ALEXY, Robert. Direitos fundamentais no Estado constitucional democrático. Para a relação entre direitos do homem, direitos fundamentais, democracia e jurisdição constitucional. Trad. Luís Afonso Heck. In: Revista Direito Administrativo, Rio de Janeiro, 217: 55-66, jul./set. 1999.

4 – HABERMAS, Jürgen. O futuro na natureza humana. São Paulo: Martins Fontes; 2004, p. 44.

5 – JONAS, Hans. O princípio responsabilidade. Ensaio de uma ética para a civilização tecnológica. Trad. Marijane Lisboa, Luis Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto; 2006.

6 – JONAS, Hans. O princípio responsabilidade. Ensaio de uma ética para a civilização tecnológica. Trad. Marijane Lisboa, Luis Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto; 2006, p. 57.

7 – JONAS, Hans. O princípio responsabilidade. Ensaio de uma ética para a civilização tecnológica. Trad. Marijane Lisboa, Luis Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto; 2006, p. 23.

8 – JONAS, Hans. O princípio responsabilidade. Ensaio de uma ética para a civilização tecnológica. Trad. Marijane Lisboa, Luis Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto; 2006, p. 271-272.

9 – JONAS, Hans. O princípio responsabilidade. Ensaio de uma ética para a civilização tecnológica. Trad. Marijane Lisboa, Luis Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto; 2006, p. 63-64.

10 – BLOCH, Ernst. O princípio esperança. Trad. Nélio Schneider. Rio de Janeiro: Contraponto; 2005.

11 – JONAS, Hans. O princípio responsabilidade. Ensaio de uma ética para a civilização tecnológica. Trad. Marijane Lisboa, Luis Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto; 2006.

12 – HÄBERLE, Peter. El Estado Constitucional. Trad. Héctor Fix-Fierro. México D.F: Universidad Autónoma de México; 2001, p. 7.

13 – HESSE, Konrad. Grundzüge des Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deutschland. 16. ed. Heidelberg, 1988, p. 155-156.

14 – HESSE, Konrad. Grundzüge des Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deutschland , cit. p. 156.

15 – Cf., a propósito, BverfGE, 39, 1 e s.; 46, 160 (164); 49, 89 (140 e s.); 53, 50 (57 e s.); 56, 54 (78); 66; 39 (61); 77 170 (229 s.); 77, 381 (402 e s.); ver, também, DIETLEIN, Johannes. Die Lehre von den grundrechtlichen Schutzpflichten. Berlin, 1991, p. 18.

16 – Cf., a propósito, DIETELEIN, Johannes. Die Lehre von den grundrechtlichen Schutzpflichten, cit. p. 17 e s.

17 – von MÜNCH, Ingo. Grundgesetz-Kommentar, Kommentar zu Vorbemerkung Art 1-19, Nº 22.

18 – von MÜNCH, Ingo. Grundgesetz-Kommentar, cit.

19 – CANARIS, Claus-Wilhelm. Grundrechtswirkungen und Verhältnismässigkeitsprinzip in der richterlichen Anwendung und Fortbildung des Privatsrechts. JuS, 1989, p. 161 (163).

20 – RICHTER, Ingo; SCHUPPERT, Gunnar Folke. Casebook Verfassungsrecht. 3. ed. München, 1996, p. 35-36.

21 – Cf. BverfGE 77, 170 (214); ver também RICHTER, Ingo; SCHUPPERT, Gunnar Folke. Casebook Verfassungsrecht, p. 36-37.

22 – “Uma transposição, sem modificações, do estrito princípio da proporcionalidade, como foi desenvolvido no contexto da proibição de excesso, para a concretização da proibição de insuficiência, não é, pois, aceitável, ainda que, evidentemente, também aqui considerações de proporcionalidade desempenhem um papel, tal como em todas as soluções de ponderação”. CANARIS, Claus-Wilhelm. Direitos Fundamentais e Direito Privado. Coimbra: Almedina; 2003.

23 – Cf. BERNAL PULIDO, Carlos. El principio de proporcionalidad y los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales; 2003, p. 798 e segs.

24 – Rp. 948, Rel. Min. Moreira Alves, RTJ, 82:55-6; Rp. 1.100, RTJ, 115:993 e s.

25 – Cf., a propósito, Rp. 1.454, Rel. Min. Octavio Gallotti, RTJ, 125:997.

26 – Cf., a propósito, Rp. 1.389, Rel. Min. Oscar Corrêa, RTJ, 126:514; Rp. 1.454, Rel. Min. Octavio Gallotti, RTJ, 125:997; Rp. 1.399, Rel. Min. Aldir Passarinho, DJ, 9 set. 1988.

27 – ADIn 2405-RS, Rel. Min. Carlos Britto, DJ 17.02.2006; ADIn 1344-ES, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 19.04.2006; RP 1417-DF, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 15.04.1988; ADIn 3046-SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 28.05.2004.

28 – Rp. 1.454, Rel. Min. Octavio Gallotti, RTJ, 125:997; Rp. 1.389, Rel. Min. Oscar Corrêa, RTJ, 126:514; Rp. 1.399, Rel. Min. Aldir Passarinho, DJ, 9 set. 1988.

29 – MEDEIROS, Rui. A decisão de inconstitucionalidade. Os autores, o conteúdo e os efeitos da decisão de inconstitucionalidade da lei. Lisboa: Universidade Católica Editora, 1999, p. 301.

30 – Cf. MARTÍN DE LA VEGA, Augusto. La sentencia constitucional en Italia. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales; 2003.

31 – CAMAZANO, Joaquín Brage. Interpretación constitucional, declaraciones de inconstitucionalidad y arsenal sentenciador (un sucinto inventario de algunas sentencias “atípicas”). en Eduardo Ferrer Macgregor (ed.), La interpretación constitucional, Porrúa, México, 2005, en prensa.

32 – RE 197.917/SP, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 7.5.2004.

33 – ADIn 2405-RS, Rel. Min. Carlos Britto, DJ 17.02.2006; ADIn 1344 -ES, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 19.04.1996; RP 1417 -DF, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 15.04.1988.

34 – ADI 3324, ADI 3046, ADI 2652, ADI 1946, ADI 2209, ADI 2596, ADI 2332, ADI 2084, ADI 1797, ADI 2087, ADI 1668, ADI 1344, ADI 2405, ADI 1105, ADI 1127.

35 – ADIn 1105-DF e ADIn 1127 -DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ o acórdão Min. Ricardo Lewandowski.

36 – ADI 3324, ADI 3046, ADI 2652, ADI 1946, ADI 2209, ADI 2596, ADI 2332, ADI 2084, ADI 1797, ADI 2087, ADI 1668, ADI 1344, ADI 2405, ADI 1105, ADI 1127.

37 – Sobre a difusa terminologia utilizada, vide: MORAIS, Carlos Blanco de. Justiça Constitucional. Tomo II. O contencioso constitucional português entre o modelo misto e a tentação do sistema de reenvio. Coimbra: Coimbra Editora; 2005, p. 238 e ss. MARTÍN DE LA VEGA, Augusto. La sentencia constitucional en Italia. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales; 2003. DÍAZ REVORIO, Francisco Javier. Las sentencias interpretativas del Tribunal Constitucional. Valladolid: Lex Nova; 2001. LÓPEZ BOFILL , Héctor. Decisiones interpretativas en el control de constitucionalidad de la ley. Valencia: Tirant lo Blanch; 2004.

38 – Segundo Blanco de Morais, “às clássicas funções de valoração (declaração do valor negativo do acto inconstitucional), pacificação (força de caso julgado da decisão de inconstitucionalidade) e ordenação (força erga omnes da decisão de inconstitucionalidade) juntar-se-ia, também, a função de reparação, ou de restauração corretiva da ordem jurídica afectada pela decisão de inconstitucionalidade”. MORAIS, Carlos Blanco de. Justiça Constitucional. Tomo II. O contencioso constitucional português entre o modelo misto e a tentação do sistema de reenvio. Coimbra: Coimbra Editora; 2005, p. 262-263.

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