Espera faminta

Lentidão da Justiça deixa pensionistas em situação dramática

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30 de maio de 2008, 13h30

Questão que vem afligindo o credor de alimentos é aquela referente ao processo de execução de pensão alimentícia. Tal processo, que deve ser célere e eficaz para satisfazer as necessidades vitais da pessoa, em geral mulheres e crianças que carecem de outros recursos para sobreviver, arrasta-se durante meses e meses e, em alguns casos, por mais de ano, para ser resolvido. Isto ocorre em razão da morosidade da Justiça.

Essa morosidade tem gerado efeitos negativos, em prejuízo do credor da pensão e da própria Justiça, porquanto acaba premiando o devedor. Com efeito, a tolerância para com o devedor converte-se em enorme injustiça para com o credor de alimentos, que fica aguardando por meses a solução do caso, isto é, o pagamento da dívida, sem ter meios para sobreviver durante esse longo período.

Da injustiça experimentada pelas pessoas que passam pelo dramático processo da execução (em geral mulheres e crianças), nasce um sentimento íntimo de revolta e de descrédito no Judiciário, que se revelou ineficiente em sua nobilíssima tarefa de dar a cada um o que é seu, em tempo razoável.

Em contrapartida, causa ao devedor a sensação confortável de impunidade, pois ele somente vem satisfazer a obrigação após longo tempo, o que constitui inescondível incentivo para prática do não pagamento de pensão. Note-se, outrossim, que o não pagamento de pensão alimentícia sem justo motivo configura crime de abandono material e representa caso típico de violência contra a família, tão perverso como a agressão física.

Com razão, pois, o eminente ministro Carlos Mario da Silva Veloso, ao declarar que da morosidade da Justiça “tiram proveito os ricos, em condições de sustentar um processo através de todas as instâncias até chegar à prescrição das causas, e por elas pagam os pobres, desistindo de causas que fariam valer seus direitos” (O Estado — 3/5/99). Os advogados que militam em direito de família vêem com assustadora freqüência o credor abrir mão de parcela significativa do crédito para poder recebê-lo imediatamente, o que representa enorme injustiça.

É preciso ficar muito claro que deixar de pagar pensão alimentícia, de forma voluntária e inescusável (artigo 5º, LXVII, da Constituição Federal), é fato extremamente grave, e que, na grande parte dos casos onde se cobra alimentos em atraso, o devedor não os paga apenas porque não quer ou porque deseja punir o credor — geralmente a ex-esposa ou ex-companheira — por mágoas do passado ou porque adota o inadimplemento como estratégia de guerra, consistente em “cercar o inimigo”, cortar-lhe os suprimentos, para que esse, fragilizado, abra mão de direitos em favor do mais forte, economicamente.

A situação dos alimentandos que deixam de receber pensão é dramática. Quando isso acontece, são obrigados a contratar advogado, pagar os respectivos honorários — se tiverem recursos para isso — arcar com o pagamento de despesas processuais e somente recebem aquilo a que têm direito muitos meses após o ajuizamento da execução. Isto sem contar que essas pessoas já passaram pelo processo de conhecimento, onde a obrigação alimentar foi fixada.

O processo de execução agride não só o credor, como também atravanca a Justiça e desgasta igualmente o advogado porque como a solução do caso é alongada, a parte não compreende a demora. Ela sabe que deixar de pagar pensão sujeita o infrator à prisão civil, mas como a Justiça é lenta e o processo arrasta-se, o credor não compreende como pode o devedor inadimplente não cumprir sua obrigação, sem justo motivo, e nada acontecer, ou melhor, demorar muito para acontecer. Por isso, muitos advogados têm evitado patrocinar este tipo de causa, pois a impressão que fica ao cliente é de que eles são incompetentes ou negligentes, quando na verdade, sabe-se que não têm culpa alguma por esse lastimável estado de coisas.

É preciso, assim, pôr termo a esse quadro, que, de um lado, prejudica as pessoas necessitadas e, de outro, deslustra a imagem da Justiça.

Poder-se-ia procurar resolver o problema da morosidade da Justiça, dotando-a dos recursos humanos e materiais de que necessita e que dificultam o fornecimento da prestação jurisdicional rápida e eficaz. Tal solução, entretanto, não pode de imediato cogitar-se por motivos óbvios, até porque parece faltar vontade política ao Estado para resolver o problema.

A solução que se apresenta, a meu ver, para atenuar o sofrimento do credor é, de um lado, estabelecer-se preferência na tramitação dos processos de execução tanto nos casos do artigo 732 como nos casos do artigo 733 do Código de Processo Civil, a exemplo do que ocorre com o Mandado de Segurança, com o Habeas Corpus e, ultimamente, nas demandas em que uma das partes é idoso. A urgência de que se reveste o crédito alimentar e a relevância social do tema são suficientes para justificar tal medida.

O segundo caminho que vislumbro é o endurecimento no “jogo” com os devedores. A execução de alimentos, dado o caráter urgente e inadiável da prestação, deve ter em vista a pronta satisfação do débito alimentar e a regularidade dos pagamentos, e jamais a comodidade ou conveniência do devedor. Por isso, impõe-se maior rigor na apreciação da justificativa do devedor e a decretação de sua prisão com energia e presteza, respeitando-se, evidentemente, os seus direitos processuais. E, nas hipóteses da execução sob o rito do artigo 732 do CPC, as medidas constantes da lei deverão ser impostas ao devedor de maneira efetiva.

Por derradeiro, oportuno registrar que a experiência revela que, na quase totalidade dos casos onde é decretada a prisão civil do devedor, este cumpre sua obrigação e os recursos, curiosamente, aparecem e a prisão é revogada.

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