Olhos do CNJ

Além de produtividade, é preciso exigir qualidade dos juízes

Autor

  • Luiz Salvador

    é presidente da ALAL diretor do Departamento de Saúde do Trabalhador da JUTRA assessor jurídico de entidades de trabalhadores membro integrante do corpo técnico do Diap do corpo de jurados do Tribunal Internacional de Liberdade Sindical (México) da Comissão Nacional de Relações internacionais do Conselho Federal da OAB e da comissão de juristas responsável pela elaboração de propostas de aprimoramento e modernização da legislação trabalhista instituídas pelas Portarias-MJ 840 1.787 2.522/08 e 3105/09.

26 de maio de 2008, 19h40

Com base em um sistema informatizado, o conselho já consegue identificar os juízes que mais trabalham e também os que preferem deixar os processos acumulando sobre as mesas. E a Corregedoria do CNJ avisou: juízes que trabalham pouco serão investigados. A idéia em princípio é boa, porque somente advogado tem prazo neste país. Mas essa realidade não é geral, porque na Justiça do Trabalho os juízes trabalham muito e muito.

E a situação agora se agravou com a vinda de mais e mais processos para a Justiça do Trabalho, como decorrência da aprovação da EC 45 que ampliou significativamente a competência da Justiça do Trabalho para decidir e julgar toda relação de trabalho e não mais apenas as relações de vínculo empregatício, ou seja, dos conhecidos processos demandados pelo trabalhador contra seu empregador.

Louvamos a iniciativa do CNJ na busca do ideário em favor dos direitos da cidadania, mas sem violentar, por outro lado, a situação real vivenciada pelos magistrados, principalmente os do trabalho. É preciso atenção à realidade mais global da problemática. Não basta exigir-se apenas o critério de produtividade, ou seja, apenas o número de decisões proferidas pelo juiz em um mês.

Há que se considerar a realidade, a estrutura da vara, a quantidade de processos que existem para serem julgados, o grau de complexidade das decisões, mormente as relativas a acidentes do trabalho e adoecimentos ocupacionais, demandas reprimidas que agora recebem incentivo pelo sistema de gratuidade do processo laboral para o seu ajuizamento, contando agora os trabalhadores doentes e lesionados com uma gama maior de profissionais do direito, incluídos até mesmo por advogados que antes não militavam na Justiça obreira (civilistas, criminalistas, administrativistas.).

E as causas dessas demandas reprimidas podem ser examinadas e até atribuídas à prática das repudiadas subnotificações acidentárias e aos vícios apontados à não concessão dos benefícios previdenciários de lei, conforme expostos no artigo de nossa autoria, intitulado: “Conivência repudiada”. Vício existente no sistema Sabi não permite perito do INSS conceder auxílio-acidente pelo NTEP. O sistema Sabi (Sistema Administrativo de Benefícios por Incapacidade) está viciado e não permite ao perito do INSS conceder o benefício auxílio-doença acidentário (B-91) pelo NTEP — Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (método para caracterização de doenças relacionadas ao trabalho) ainda que o perito reconheça o direito do segurado a tal benefício.

Certo que o trabalho aumentou. Mas o Poder Executivo, até agora não deu atenção à parte complementar, faltante: o da dotação de recursos econômicos e financeiros suficientes e necessários para a ampliação e modernização das estruturas administrativas internas do Poder Judiciário, com novos mobiliários, servidores, juízes assistentes, permitindo-se ao magistrado do trabalho a entrega da prestação estatal de mérito.

Diante da exigência de mera produtividade, sem preocupação com o julgamento do mérito, assegurando efetividade à legislação protetora laboral em favor da dignidade do trabalhador, muitos juízes, para dar conta da produtividade que lhes esta sendo cobrada, acabam por adotar soluções contra os direitos da cidadania, ou seja, extinguem processos sem julgamento de mérito, aplicam prescrição de ofício, atribuem o ônus da prova ao trabalhador hipossuficiente, o que acaba a premiar o mau empregador que inadimpliu suas obrigações do contrato, beneficiando-se da própria torpeza.

Todos somos sabedores de que o volume de trabalho aumentou exageradamente na Justiça do Trabalho, mas a estrutura física, funcional, continua a mesma. Os juízes defendem em seus julgados ser dever do empregador assegurar meio ambiente laboral equilibrado, não permitindo que seus trabalhadores se acidentem e ou adoeçam. Todavia, vivem na contramão, sem que o mesmo direito também lhes seja assegurado.

Muitos juízes estão adoecendo em serviço pelo acúmulo exagerado de processos distribuídos a cada vara, sendo obrigados a dar cobro do aumento desses serviços, não contando com número adequado de funcionários e nem mesmo de um auxiliar que lhe digite as sentenças, o que tem provocado o estresse ocupacional e mesmo a doença que passou a ser conhecida como Ler-Dort. Assim, os juízes do trabalho que tem a missão de julgar as ações decorrentes de acidentes do trabalho, na contramão da história, sentem-se desprotegidos pelo Estado, já que expostos também a sérios riscos ocupacionais de desenvolvimento de doenças do trabalho.

Como decorrência dessa realidade já não desconhecida, conclamamos a sociedade e em especial as pessoas e entidades compromissadas com os avanços e contra o retrocesso social a nos juntarmos para unidos promovermos um movimento nacional concentrado e solidário no sentido de sensibilizar nossas autoridades e em especial o Poder Executivo para que se assegure ao Poder Judiciário Trabalhista o suficiente e necessário aporte econômico e financeiro, assegurando-se à Justiça do Trabalho dos meios e recursos para a adequação de sua estrutura administrativa e funcional, com novos espaços, mobiliários, pessoal, visando possibilitar a entrega da prestação jurisdicional em seu mérito.

Em assim fazendo, o equilíbrio restará restabelecido, permitindo-se que o magistrado cumpra seu dever legal na entrega da prestação jurisdicional estatal, de assegurar efetividade aos direitos fundamentais e laborais tutelados ao cidadão trabalhador e não a mera entrega formal de uma prestação jurisdicional precária, onde se exige do magistrado apenas produtividade e não qualidade da prestação laboral, descumprindo-se os primados do trabalho assegurados pela Carta Cidadã, em benefício da própria torpeza do mau empregador que na vigência contratual não adimpli suas obrigações do contrato, em prejuízo do trabalhador que já despendeu suas energias consumidas e que não podem ser repostas.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!