Código Civil

Indenização por ofensa deve obedecer critérios rígidos

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26 de junho de 2008, 0h01

Quando o gozo de uma prerrogativa constitucional está em risco, a análise legal pode ser ampliada. Prova disso é a decisão do Superior Tribunal de Justiça que garantiu ao nascituro o direito à indenização pelo dano moral resultante da morte do genitor. André Rodrigues, morto em um acidente de trabalho, deixou, na época do fato, filhos e uma viúva grávida. Pela ausência paterna e conjugal, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul condenou o empregador pelos danos extrapatrimoniais sofridos pela família, inclusive à criança em gestação, além da pensão alimentícia.

Quanto à escassez de proventos para o sustento do nascituro e o necessário suprimento pecuniário da lacuna deixada pelo pai, não há o que discutir. O Código Civil é claro ao afirmar que, “A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”. Inegável é o direito da criança à pensão alimentícia. Portanto, desde a concepção, o feto adquire a garantia ao sustento pós-nascimento, não podendo ser-lhe negado esse direito em razão da morte do genitor.

Todavia, existe séria polêmica no que diz respeito ao reconhecimento da lesão moral daquele que não é dotado de personalidade civil. Para Flávio Tartuce, “Os direitos da personalidade podem ser conceituados como sendo aqueles direitos inerentes à pessoa e à sua dignidade. Surgem cinco ícones principais: vida/integridade física, honra, imagem, nome e intimidade. Essas cinco expressões-chave demonstram muito bem a concepção desses direitos”1. Ao vincular a honra à personalidade, o autor desconsidera, com fulcro na lei vigente, a possibilidade de indenização por danos morais àquele não nascido.

Entretanto, os direitos da personalidade advêm de um bem maior, protegido pela Carta Magna em seu art. 1º, inc. III. A dignidade da pessoa humana, inerente à pessoa e à personalidade, como disse Tartuce, é a base da decisão que indenizou o nascituro. “Maior do que a agonia de perder um pai é a angústia de jamais ter podido conhecê-lo, de nunca ter recebido dele um gesto de carinho, enfim, de ser privado de qualquer lembrança ou contato, por mais remoto que seja, com aquele que lhe proporcionou a vida”, afirmou a relatora da ação, ministra Nancy Andrighi.

No caso em questão, é laudável a decisão, pois preservou uma prerrogativa superior, nessa hipótese específica, aos ditames infraconstitucionais. Entrementes, é imperioso que a flexibilização e a consideração das ofensas indenizáveis sejam criteriosas. A lesão à dignidade da pessoa humana merece a compensação, ainda que pecuniária, somente quanto indubitavelmente existente. Contudo, para que não haja a desvalorização do direito de pedir, e da própria prerrogativa constitucional, o que poderia causar uma avalanche indenizatória, cabe ao Judiciário a cautela ao apreciar casos análogos.

Nota de rodapé:

1. TARTUCE, Flávio. Os direitos da personalidade no novo Código Civil . Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 878, 28 nov. 2005. Disponível em: . Acesso em: 21 jun. 2008.

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