Greve pública

Projeto de deputados sobre greve é mais favorável ao servidor

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17 de junho de 2008, 18h33

A organização sindical se estrutura em três pilares: o direito de sindicalização, de negociação e de greve. No serviço público, apenas o pilar do direito de sindicalização é exercido plenamente no país. Os direitos de negociação e greve ainda estão em debate no governo e no Congresso.

A regulamentação do direito de greve voltou à agenda de debate, especialmente após a decisão do Supremo Tribunal Federal que mandou aplicar, por analogia, a Lei de Greve do setor privado, e após a aprovação de projeto de lei na Comissão de Trabalho da Câmara sobre a matéria. As entidades de servidores públicos, entretanto, reivindicam que a regulamentação do direito de negociação venha antes da regulamentação do direito de greve.

O lógico, realmente, é que o direito à negociação venha antes do direito de greve, até porque este existe para forçar aquele. Entretanto, a iniciativa governamental de propor a ratificação da Convenção 151 da OIT não será suficiente para assegurar o direito à negociação. Há a necessidade de alteração do artigo 37 da Constituição para prever expressamente a negociação, cujos termos poderiam ser regulamentados por lei ordinária.

A aprovação do substitutivo do PL 4.497/01, diante da conjuntura e do conteúdo da proposição, abre uma nova oportunidade para o exame da matéria. O substitutivo, apesar de não ser o ideal, é melhor que a lei do setor privado e avança em relação às propostas governamentais, tanto do governo FHC quanto do governo Lula.

O texto do relator, deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP), graças às importantes contribuições do deputado Tarcisio Zimmermann (PT-RS), avançou em vários aspectos em relação às propostas governamentais e às versões anteriores:

1) A transferência da lei para o estatuto das formalidades e quórum para convocação de greve;

2) A supressão da lista de atividades essenciais e inadiáveis, nas quais era proibido o direito de greve;

3) A previsão de negociação dos dias paralisados;

4) A fixação de um prazo de 30 dias para o governo responder à pauta de reivindicação das entidades;

5) A definição do prazo máximo de 90 dias pra envio ao Congresso dos textos pactuados;

6) A garantia de consignação (desconto) em folha de contribuições em favor das entidades em greve, inclusive para formação de fundo;

7) A proibição de demissão ou exoneração de servidor em greve, bem como a vedação de contratar pessoal ou serviço terceirizado para substituir grevista, exceto nos casos de descumprimento das atividades essenciais e inadiáveis;

8) A possibilidade de reclamar judicialmente o descumprimento de acordo firmado em decorrência de negociação coletiva.

É verdade que o substitutivo ainda precisa ser aperfeiçoado, mas dificilmente a proposta em debate no governo seria mais favorável ao exercício do direito do que o texto em exame na Câmara dos Deputados. Entre os pontos que necessitam correção e aperfeiçoamento, porque limitam e inibem o direito de greve, cabe mencionar:

1) A exigência de sigilo sobre informações que forem repassadas pela Administração sob essa condição;

2) A obrigatoriedade de manutenção de pelo menos 35% dos servidores nas atividades que coloquem em risco a segurança do Estado, a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população, fato que elimina o direito de greve nos casos de turnos e revezamentos;

3) A prerrogativa atribuída ao dirigente máximo do órgão ou entidade da Administração Pública de definir, sem necessidade de acordo com as entidades sindicais, os serviços e unidades administrativas nas quais deverá ser observado o percentual (35%) mínimo de servidores em atividade;

4) A possibilidade de multa de R$ 30 mil por dia contra o sindicato que mantiver greve considerada abusiva pela Justiça;

5) O dispositivo que considera abuso do direito de greve:

a) utilizar método que visem constranger ou obstar o acesso dos servidores que não aderirem à greve ou seu ambiente de trabalho ou a circulação pública,

b) a paralisação ocorrida antes dos 30 dias dados à administração para responder à pauta de reivindicação ou no prazo de 45 dias após a apresentação de proposta conciliatória, ou

c) não cumprir as formalidades estatutárias para deflagração do movimento, bem como não comunicar com 72 duas horas de antecedência da deflagração do movimento.

Os pilares da organização sindical no serviço público foram debatidos durante a Constituinte de 1987/88, e, naquela oportunidade, o atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na condição de deputado constituinte, foi o autor e principal defensor do parágrafo 2º do artigo 8º da Constituição, segundo o qual “os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da lei”.

Alertado pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) sobre a abrangência do dispositivo, que poderia resultar em cadeia para as lideranças e multa para sindicalistas e entidades, o então constituinte manteve a defesa da punição por entender que os trabalhadores (e servidores) devem responder por eventuais abusos cometidos.

A julgar pelo conteúdo das proposições em debate nas diversas instâncias — Judiciário, Executivo e Legislativo — e também pela visão do presidente da República a respeito do direito de greve, parece não restar dúvidas de que o substitutivo em exame na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, cujo relator é o deputado Geraldo Magela (PT-DF), após pequenos aperfeiçoamentos, será mais favorável ao servidor que as demais propostas.

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