Promete causar polêmica a decisão do juiz auxiliar da propaganda da 1ª Zona Eleitoral de São Paulo, Francisco Carlos Shintate, que multou a pré-candidata à prefeitura paulistana Marta Suplicy (PT) em pouco mais de R$ 42 mil pelas entrevistas concedidas à imprensa. A Folha da Manhã, que edita o jornal Folha de S. Paulo, e a Editora Abril, que publica a revista Veja, também foram multadas em R$ 21 mil cada uma. O juiz afirma que as entrevistas caracterizaram propaganda antecipada.
Em entrevista ao site Consultor Jurídico, o advogado do jornal Folha de S. Paulo, Luis Francisco Carvalho Filho, classificou a decisão de absurda e disse que vai recorrer ao Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo. Para ele, “não é papel da Justiça Eleitoral estabelecer regime de exceção e censura”. E disse, ainda: “O jornal tem o dever de informar os seus leitores”.
O advogado Alexandre Fidalgo, do escritório Lourival J. Santos Advogados, que representa a revista Veja, disse que também vai recorrer. Fidalgo usará os argumentos do interesse da sociedade, da liberdade de imprensa e do objetivo meramente informativo da entrevista que a revista fez com a candidata na Veja São Paulo. “O destino da informação é a sociedade. Ela tem que ser informada sobre o que pensam os candidatos”, diz ele.
O advogado especialista em Direito Eleitoral, Ricardo Penteado, considera que a candidata, o jornal Folha de S. Paulo e a revista Veja não deveriam ser multados: “Uma entrevista não tem propósito eleitoral. Propaganda se faz com esse propósito. Não cabe à Justiça Eleitoral julgar a conseqüência reflexa de uma entrevista ou de que forma ela vai influenciar ou não o voto dos eleitores”.
Ele ponderou que os veículos de comunicação não tratam igualmente os candidatos e que têm direito, inclusive, de revelar a simpatia pelo candidato A ou B. Penteado, que assessora juridicamente o atual prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), candidato à reeleição, ressalta que a ofensiva contra as entrevistas não partiu de adversários políticos, e sim do Ministério Público Eleitoral. Por fim, ele disse acreditar que o TRE paulista terá uma grande oportunidade de restabelecer a liberdade de imprensa após os recursos.
Além de Marta Suplicy, a Folha de S.Paulo já entrevistou o prefeito Gilberto Kassab, Geraldo Alckmin (PSDB) e Soninha (PPS), todos igualmente candidatos a prefeito de São Paulo.
Recentemente, o jornalista Carlos Brickman registrou em sua coluna que o Ministério Público e a Justiça Eleitoral estão entendendo como propaganda eleitoral antecipada o noticiário sobre as eleições municipais deste ano. Segundo o jornalista, sete veículos de comunicação já foram punidos ou impedidos de publicar matérias: Gazeta Regional, Gazeta de Pirajuí e Tribuna da Águas, SP; Agosto, de Ribeirão Bonito, SP; Periódico O Povo, de Ituporanga, SC; Grupo Estado, SP; Sistema Correio, João Pessoa, PB; e o blog do jornalista Pedro Dória, que teve de tirar do ar sua declaração de apoio ao candidato Fernando Gabeira, no Rio.
Os fundamentos
Segundo o juiz, a propaganda eleitoral antecipada fica caracterizada, em uma entrevista à imprensa, a partir de referências como qualidades pessoais, para influenciar os eleitores e angariar votos, mesmo que não haja menção direta ao cargo que se pretenda disputar. Para ele, entrevista concedida antes do período permitido para propaganda eleitoral ultrapassa o mero interesse jornalístico.
De acordo com o juiz, apesar do inquestionável interesse público, as entrevistas caracterizam "típica propaganda direta, explícita e extemporânea, dirigida a todos os eleitores". Conforme a Lei nº 9.504/97, que estabelece normas para as eleições em todo o país, a propaganda eleitoral somente é permitida a partir de 6 de julho do ano da eleição.
Shintate considerou que a publicação de entrevista em mídia escrita viola a igualdade entre os pré-candidatos. Motivo: permite que um deles exponha, antes dos demais e fora do período permitido, sua pretensão de concorrer ao cargo e sua plataforma de governo. O candidato, nessas ocasiões, enaltece suas qualidades e feitos passados, além de criticar as ações do atual governo e imputar qualidades desfavoráveis aos adversários, de acordo com ele.
“Embora a liberdade de imprensa esteja elevada à categoria de princípio constitucional, não se pode esquecer que, além desta garantia, por igual vigora outro princípio, da mesma hierarquia, que garante a igualdade dos candidatos no pleito, apresentando-se como limite da liberdade de imprensa quando a mesma usa espaço de entrevista para a realização de propaganda no período pré-eleitoral", afirmou.
Para o juiz, nas entrevistas concedidas, Marta Suplicy indicou sua intenção de se candidatar à prefeita de São Paulo, aproveitou para valorizar suas qualidades e também para atacar adversários políticos. As reportagens foram publicadas em 4 de junho na Folha de S. Paulo e na edição de 4 a 11 de junho da revista Veja São Paulo.
Clique aqui para ler a decisão do juiz no caso da entrevista para a Veja São Paulo.
Comentários de leitores
14 comentários
Bira (Industrial)
E os adesivos de duplo sentido proposital em SBC-SP? Acorda TRE!
Comentarista (Outros)
No mundo todo (civilizado de verdade ou, como preferem alguns, de "primeiro mundo") os candidatos são entrevistados (fora dos horários eleitorais, é claro) e - pasmem! - só falam de um único assunto, ou seja, POLÍTICA (o que é natural, pois se eles são políticos não haveriam de ser entrevistados para darem "receitas de bolos", por exemplo). E isso não "diminui" a democracia desses países realmente desenvolvidos e civilizados. Já aqui, na nossa republiqueta das bananas atolada em corrupção, desigualdade social e altíssimos índices de criminalidade, alguns "gênios" querem provar que o correto é o contrário... Hehehe.
Sérgio Niemeyer (Advogado Sócio de Escritório - Civil)
A sentença está corretíssima. Não se pode permitir que o direito de livre imprensa e expressão do pensamento pretextando informar o público (eleitor, é claro) seja exercido para embuçar verdadeira propaganda eleitoral antecipada. Tal prática, sobre ser imoral, porque adrede manipulada para burlar a lei, causa manifesto desequilíbrio do jogo eleitoral. E é exatamente isso que visa a coibir a lei. O equilíbrio eleitoral entre os candidatos, no sentido de que devem ser outorgados com as mesmas condições de divulgação de seus nomes, plataformas políticas, programas de governo, críticas ao governo vigente e aos demais candidatos. Essas regras não podem ser simplesmente ladeadas por meio de subterfúgios capazes de conferir à burla a aparência de exercício de um direito. Ao fazer isso colocam-se em confronto dois direitos. Essa colidência constitui situação típica de conflito que deve ser dirimido pelo Poder competente, o Judiciário. Ora, se há regras que regem o jogo eleitoral, não podem tais regras ser violadas sub-repticiamente, dissimulando a violação em exercício de outro direito. Na solução do conflito um desses direitos haverá de ceder o passo ao outro. A resposta contida na sentença é de que o direito de imprensa ou de informar não prevalece às regras que regem o jogo eleitoral. Isso significa que, como todo direito, em cuja noção é inerente a idéia de limite, o de imprensa não é absoluto, como pretendem os que o exercem diretamente; além disso, não há coartação do direito de informar, como reclamam os que contestam a sentença, mas apenas a determinação de que o exercício desse direito subordina-se às regras do jogo eleitoral, que estabelecem o termo inicial para a divulgação e informação do público eleitor sobre todos os candidatos.
Comentários encerrados em 25/06/2008.
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