Destempero verbal

Xingar patrão que não pagou verbas trabalhista não causa dano

Autor

9 de junho de 2008, 11h05

Empregado demitido que fica sem receber verbas trabalhistas e, por isso, tem um momento de destempero verbal não precisa pagar indenizações por danos morais para o empregador. O entendimento é do juiz Grijalbo Fernandes Coutinho, da 19ª Vara do Trabalho do Distrito Federal. O juiz livrou uma coordenadora de um escritório de advocacia do DF de indenizar a chefe por dano moral por tê-la chamado de “baixinha ridícula” e ter ameaçado processa-la judicialmente. Na mesma sentença, o juiz condenou a responsável pelo escritório a pagar as verbas rescisórias à empregada.

De acordo com o processo, a autora da ação foi contratada em agosto de 2007 como coordenadora do escritório de advocacia. Sua carteira de trabalho foi anotada só em outubro e a demissão ocorreu em novembro. Ela foi dispensada sem justa causa e não recebeu as verbas rescisórias. A chefe alegou que não pagou os direitos trabalhistas porque a coordenadora não cumpriu o aviso prévio e a teria abandonado no momento mais difícil, já que passava por uma gravidez de risco.

Segundo a versão da patroa, ao ser informada do rompimento do contrato de trabalho numa denominada “franqueza típica dos operadores do Direito e sem que restasse oportunidade para melhor formalizá-la”, a coordenadora afirmou que não tinha interesse em continuar trabalhando, assegurando que “aquele seria seu último dia de trabalho”.

Já a coordenadora disse que não se recusou a cumprir o aviso prévio e insistiu em receber as verbas rescisórias. Como a chefa se recusava a pagar, ela fazia ligações, exigindo seus direitos. Em um dos telefonemas, deixou recado afirmando: “avisa essa mulher baixinha, ridícula, por dentro e por fora e mal amada, que vou levar ela pro pau, que ela vai se surpreender com os valores que eu vou pedir”.

Para a dona do escritório, a “ameaça”, feita com esses dizeres, é suficiente para isentá-la do pagamento das verbas rescisórias e ainda receber indenização por danos morais. O juiz Grijalbo Fernandes Coutinho entendeu o contrário. “Militante na área do direito, a reclamada bem deveria saber de suas obrigações trabalhistas na qualidade de empregadora, não necessitando sequer da alegada ‘franqueza típica dos operadores do direito’, expressão essa utilizada em sua defesa, espécie de gesto muito mais relacionado ao caráter e à personalidade de cada indivíduo, daí resultando em atributos positivos e negativos, não necessariamente adquiridos nos bancos dos cursos jurídicos que proliferam nas esquinas das capitais brasileiras, portanto, longe de se constituírem em monopólio de uma ou outra categoria profissional.”

Para ele, “avaliações preconceituosas e subjetivas devem ser sempre repelidas, eis que o tom descrito mais se assemelha à reação juvenil destemperada. Por outro lado, o destempero verbal externado por intermédio de contato telefônico nem de longe configura dano moral”.

Coutinho esclareceu que o destempero foi justificado porque a coordenadora foi demitida, sem justa causa, e não recebeu as verbas rescisórias. “Passados quase 30 dias, é natural que desejasse usufruir dos direitos rescisórios a que fez jus em decorrência da prestação de serviços, mantendo ou tentando manter contato com a sua antiga empregadora para cobrar a dívida trabalhista. Tudo isso é absolutamente legítimo”, afirmou.

“Longe de avalizar agressões verbais, estou convencido de que o eventual destempero da reclamante, via contato telefônico, foi uma reação justificada contra a agressão de maior intensidade, contra os seus direitos sociais, direitos humanos por excelência, a serem protegidos tanto quanto os direitos individuais de primeira geração. Não vejo, assim, o dano moral praticado pela empregada contra a empregadora, senão o descontentamento da obreira pela falta do recebimento de suas verbas rescisórias, embora possa ter utilizado expressões rudes”, concluiu. As partes podem recorrer da decisão.

Leia a sentença

ATA DE AUDIÊNCIA

PROCESSO: 0336-2008-019-10-00-8

Aos trinta dias do mês de maio do ano de 2008, perante a 19ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA-DF, sob a direção do Juiz do Trabalho Titular GRIJALBO FERNANDES COUTINHO, realizou-se a audiência relativa ao processo identificado em epígrafe.

A audiência teve início às 17h55, momento em que foram apregoadas as partes.

Presentes os que assinam esta ata.

SENTENÇA

IRELATÓRIO

Dispensado o Relatório, na forma do Artigo 852-I, da CLT.

IIFUNDAMENTOS

CONTRATO DE TRABALHO. DURAÇÃO. REMUNERAÇÃO PACTUADA. RESCISÃO. JUSTA CAUSA. ÔNUS DA PROVA. VERBAS RESCISÓRIAS

A reclamante alega que foi admitida em 16 de agosto de 2007 para exercer a função de Coordenadora Geral do Escritório de Advocacia, tendo sido dispensada, sem justa causa, no dia 19 de novembro de 2007, embora a sua CTPS somente tenha sido anotada no dia 1º de outubro de 2007.

 

Assevera a autora que laborava das 09:00 às 18:00 horas, com 01(uma) hora de intervalo, de segunda a sexta-feira, nas dependências do escritório, como também comparecia aos tribunais para acompanhamento dos processos em curso.

 

Diz a empregada que o seu salário mensal era de R$ 2.717, 00(dois mil, setecentos e dezessete reais), acrescido do auxílio combustível(R$67, 50), remuneração que foi reduzida pela empregadora a partir do segundo mês de vigência do pacto laboral para R$ 2.500,00(dois mil e quinhentos reais), conforme depósitos efetuados em sua conta bancária.

Por último, afirma a obreira que dispensada de forma imotivada, não recebeu as verbas rescisórias.

Defendendo-se, a reclamada aduz que a reclamante foi admitida em 20 de agosto de 2007 para coordenar toda a equipe de estagiários e de trabalhadores terceirizados, tendo a obreira abandonado o emprego após receber aviso prévio, o qual deveria ser cumprido.

A empregadora tece considerações sobre o insatisfatório desempenho profissional da reclamante, cujas faltas injustificadas ao trabalho causaram diversos transtornos aos serviços do escritório de advocacia.

Assegura a reclamada que era fundamental o cumprimento do aviso prévio, considerando a gravidez de risco a que estava submetida naquele momento, de modo que não havia nenhum outro empregado apto a substituir a reclamante de forma imediata.

Segundo versão da ré, ao ser informada do rompimento do contrato, numa denominada “franqueza típica dos operadores do Direito e sem que restasse oportunidade para melhor formalizá-la”(fls. 31), a reclamante teria afirmado que não tinha interesse em continuar trabalhando, assegurando que “aquele seria seu último dia de trabalho”(fls. 31).

Em resumo, sustenta a reclamada a tese de que a parte contrária abandonou o emprego em 19 de novembro de 2007, logo após receber aviso prévio, não sendo, assim, credora das verbas rescisórias inerentes à modalidade de rescisão imotivada da relação jurídica em exame(CLT, artigo 482, i).

Quanto ao valor do salário, declara a reclamada que o registro lançado na CTPS corresponde à realidade fática(R$2.500,00 por mês).

É evidente que ao agitar fato impeditivo à percepção das verbas rescisórias, à reclamada cabe provar a justa causa alegada, nos termos dos artigos 769 e 818, da CLT, e 333, II, do CPC.

Para além de tal aspecto, consigno que o comportamento, como veiculado na contestação, não integra o cotidiano das ações dos empregados, excepcional e extraordinário que está a demandar prova robusta por parte de quem o alega, ainda mais em época de alarmante desemprego estrutural.

Avalio a prova produzida nos autos.

Não existe um documento sequer revelador do abandono de emprego por parte da reclamante.

Em depoimento pessoal, a autora ratificou os termos da peça de ingresso(fls. 74/75), sem que fosse possível alcançar a sua confissão.

A reclamada, ao contrário, confessa que o ato seguido à recusa ao cumprimento do aviso prévio, pela reclamante, importou no registro, na CTPS, do término do contrato de trabalho, numa fração de minutos entre uma medida e outra, tudo no dia 22 de novembro de 2007.

Os termos da defesa ratificados no depoimento pessoal da ré são reveladores da absoluta falta de sintonia com a figura jurídica invocada para rescindir o contrato de trabalho.


É que o abandono de emprego caracteriza-se pelo o ânimo do trabalhador em romper o pacto laboral, por iniciativa própria, sem comunicar essa intenção ao empregador.

De um lado, portanto, o ânimo obreiro em não mais dar seqüência à prestação laboral, do outro, a surpresa causada ao patrão.

Em tal perspectiva, a doutrina trabalhista, respaldada por fração expressiva da jurisprudência, tem reconhecido a possibilidade do abandono de emprego a partir da ausência do trabalhador por período igual ou superior a 30(trinta) dias, sem qualquer justificativa ou comunicação prévia do desaparecimento.

Sendo mais direto, diria que o abandono de empregador é medida radical adotada pelo empregado, capaz de surpreender a outra parte da relação, estando o obreiro num verdadeiro estado de desparecimento imotivado do local de trabalho.

Logo, é necessário ânimo de abandonar o emprego, desaparecimento injustificado do local central da prestação de serviços e total surpresa do empregador com o gesto do empregado.

Ora, quando a reclamada declara que a autora, ao ser comunicada da rescisão do contrato de trabalho e da necessidade de cumprimento do aviso prévio, manifesta imediata reação contrária à permanência no escritório de advocacia, a tese do abandono de emprego ventilada na defesa sucumbe diante da flagrante confissão patronal exteriorizada em dois momentos tão significativos do debate travado nos autos.

 

Não houve ânimo, por parte da reclamante, em romper o contrato de trabalho, muito menos de modo a surpreender a empregadora.

 

É impossível cogitar a presença da figura jurídica do abandono de emprego quando o término do contrato de trabalho resta consignado na CTPS exatamente no último dia da efetiva prestação de serviços, sem que a trabalhadora permanecesse afastada de suas funções durante um dia sequer, quadro esse verificado nos autos.

Na hipótese mais generosa com a empregadora, devo registrar que a forma de extinção do contrato, no plano fático descrito pela defesa, resulta em pedido de demissão, pela empregada, cujo ônus respectivo também é da ré(CLT, artigo 818).

Mesmo assim, é difícil falar em pedido de demissão quando a reclamada, de maneira absolutamente escancarada, tomou a iniciativa na extinção do pacto laboral.

No máximo, então, seria o caso de não pagar à empregada o aviso prévio, pela suposta recusa obreira em trabalhar naquele interregno.

A reclamada afirma que estava insatisfeita com o desempenho profissional da reclamante, o que a levou rescindir o contrato de trabalho.

A eventual recusa, por parte da empregada, em cumprir o aviso prévio, jamais altera o curso ou inverte o pólo do interesse primeiro em extinguir a relação de emprego.

Ademais, não há, nos autos, o mais remoto indício no sentido de que a reclamada tenha, de fato, manifestado intenção em conceder aviso prévio, muito menos da recusa em cumprí-lo.

Valendo-me do fato de ter colhido a prova de forma direta, assim como do preceito do artigo 852-D, da CLT, assinalo não ter para mim restado qualquer dúvida a respeito do episódio. A reclamada rescindiu o contrato, não concedeu qualquer aviso prévio e, lamentavelmente, deixou de pagar as verbas rescisórias.

Militante na área do direito, a reclamada bem deveria saber de suas obrigações trabalhistas na qualidade de empregadora, não necessitando sequer da alegada “franqueza tipica dos operadores do direito”, expressão essa utilizada em sua defesa, espécie de gesto, na minha modesta compreensão acerca dos segredos da alma humana, muito mais relacionado ao caráter e à personalidade de cada indivíduo, daí resultando em atributos positivos e negativos não necessariamente adquiridos nos bancos dos cursos jurídicos que proliferam nas esquinas das capitais brasileiras, portanto, longe de se constituírem em monopólio de uma ou outra categoria profissional.

A sinceridade e a franqueza são marcas contundentes dos homens simples e humildes do campo porque as regras por eles seguidas fogem do mundo da aparência da vida urbana moderna, assim como essas louváveis qualidades permeiam as manifestações das crianças até o momento em que começam a valer os códigos de conduta repressora naturalmente aprovados pela sociedade, a ponto de tornar o oprimido de hoje no opressor de amanhã.

Será que os operadores do direito são mais francos e realistas do que sociólogos, físicos, engenheiros, cientistas políticos e filósofos? Entendo que não, sem querer cogitar qual seria o profissional mais franco quando qualquer análise em tal seara parte de dedução amparada em mero sentido empírico, destituído, assim, do rigor científico e, conseqüentemente, da verdade.

O operador do direito, em tese, domina o arcabouço jurídico, tipo de conhecimento fundamental numa sociedade marcada pela desigualdade social e pela conflituosidade de suas relações, mas os físicos e os filósofos, por exemplo, conhecem o mundo, na correta acepção deste termo, um verdadeiro mundo que originou a espécie humana, assim como as concretas ameaças de sua deterioração crescente e extinção, tudo em decorrência de fenômenos naturais e humanos.

Sob este foco, o nosso mundo jurídico, dos operadores do direito, incluindo os juízes, é bem mais reduzido, ao ser comparado com o raio de investigação levado a efeito por outros sujeitos tão francos em suas atitudes quanto os advogados, sendo os físicos mais realistas, sem nenhuma dúvida, ao conduzirem análises mediante utilização de instrumentos dotados de maior grau de cientificidade.

Passo a analisar os demais aspectos da controvérsia.

Foi registrado na CTPS o contrato de trabalho vigente no lapso temporal compreendido entre 1º de outubro a 22 de novembro de 2007.

A defesa patronal reconhece que a CTPS não foi anotada na data correta, ao apontar o dia 20 de agosto de 2007 como o termo inicial da prestação de serviços.

Ao prestar depoimento pessoal, a reclamante manteve a data apontada na peça de ingresso (16 de agosto de 2007).

Admissão em 16 ou 20 agosto de 2007, é um dos pontos controvertidos.

A reclamada, em depoimento pessoal, não soube precisar a data da admissão obreira, tendo afirmado que o fato ocorreu em agosto de 2007, cuja relação perdurou durante três meses.

 

O nosso sistema processual não estabelece qualquer hierarquia entre as diversas modalidades de provas admitidas em juízo. Tem sido recorrente, no entanto, a valorização da confissão feita pela parte, muito provavelmente pelo reconhecimento da violação do direito por quem mais detém autoridade e isenção para emitir pronunciamento nesse sentido.

 

O depoimento pessoal tem como objetivo único extrair da parte a sua confissão, em relação aos fatos controvertidos alegados pelo outro litigante. É por essa razão, que no processo civil/trabalhista, não há sentido na formulação de perguntas, durante o ato instrutório, pelo causídico ao seu cliente. Nenhuma frase ou vírgula posta na ata será aproveitada de modo favorável a quem prestou depoimento pessoal na qualidade de parte. Apesar de tudo isso, não podemos encarar a tomada do depoimento pessoal como uma armadilha para se alcançar a confissão a qualquer custo. É evidente que a capacidade e a liberdade do inquiridor, em tais circunstâncias, estão bem delimitadas na Constituição e na Lei, jamais se permitindo a prática de abusos, comportamento que não integra o cotidiano dos magistrados brasileiros.

Não detendo a reclamada conhecimento sobre um dos fatos controvertidos, aplica-se à confissão ficta à referida empregadora, capaz de elevar à verdade processual a data de ingresso apontada na petição inicial, conclusão reforçada em razão de o registro na CTPS ter sido feito bem depois do início da prestação laboral, conforme reconhecido pela defesa.

As partes afirmaram que o contrato foi rompido em 22 de novembro de 2007 (depoimentos, fls. 73/75), conforme consta na CTPS.

Quanto ao salário mensal, tenho que a reclamante não conseguiu desconfigurar o valor anotado na CTPS (R$2.500,00). No primeiro mês (fls. 13), efetivamente, a quantia liquida depositada pela reclamada importou em R$ 2, 601, 44(fls. 13).

Os depoimentos pessoais (fls. 73/75) revelaram que além da remuneração, a reclamada efetuava o depósito, na mesma ocasião, de valores referentes a ressarcimento de despesas feitas pela reclamante(refeições e combustível), o que justifica o recolhimento mais elevado naquela oportunidade.


Na esteira do raciocínio antes desenvolvido, declaro que a reclamante foi admitida em 16 de agosto de 2007, na função de Coordenadora Geral, mediante salário mensal de R$2.500,00(dois mil e quinhentos reais), tendo sido dispensada, injustamente, no dia 22 de novembro de 2007, com ausência de quitação das verbas rescisórias.

Com base no salário mensal de R$2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), é a reclamante credora de parcelas referentes ao aviso prévio indenizado (30 dias) e respectiva integração do período ao seu tempo de serviço, para todo os fins, 13º salário fracionado de 2007 (5/12), férias proporcionais (4/12), acrescidas do abono de 1/3, FGTS de todo o contrato, acrescido da multa de 40%, multa rescisória do artigo 477, §8º, da CLT e saldo de salário do mês de novembro de 2007 (06 dias).

Em vez de considerar o mês do calendário oficial para pagamento do salário mensal, a reclamada observava a data da contratação(16 de agosto de 2007) para esse fim, segundo se extrai dos depósitos efetuados na conta do reclamante(fls. 13), pela ausência de fracionamento já no primeiro depósito. Não havendo prova do pagamento do saldo salarial do período de 16 a 22 de novembro de 2007, é devida a respectiva satisfação(06 dias de saldo de salário), como deferido no parágrafo anterior.

A reclamada lançará na CTPS obreira a data correta do início do contrato de trabalho (16.08.2007), retificando registro em sentido contrário feito no documento, no prazo de 48 horas, pena de assim proceder a Secretaria da Vara.

ALGUNS ESCLARECIMENTOS SOBRE A APLICAÇÃO DA MULTA DO ARTIGO 477, §8º, DA CLT

O reclamante pretende receber duas multas(pedidos j e i, da petição inicial), enquanto a reclamada invoca a tese da controvérsia sobre o caráter da rescisão para afastar a multa rescisória.

Em primeiro lugar, devo esclarecer que não existem duas multas previstas no artigo 477, da CLT, havendo tão-somente a retratada no §8º, do referido dispositivo, a qual foi deferida anteriormente.

A reclamante formula dois pleitos, como se um tivesse apoio no caput do artigo, o outro, ainda, respaldo no §8º. Deferida apenas uma multa equivalente ao valor do salário antes reconhecido. A segunda resta indeferida.

Sustenta a reclamada que a controvérsia acerca da natureza do vínculo de emprego afasta a aplicação da multa rescisória do artigo 477, §8º, da CLT.

Não tem razão a reclamada.

Ainda que fosse o caso de pedido de demissão ou mesmo de justa causa, haveria pagamento a ser feito a título de verba rescisória, como é o caso do saldo de salário, sendo certo que a reclamada foi uma empregadora que deixou de cumprir obrigações trabalhistas básicas, ao registrar o contrato na CTPS depois de seu início, ao não recolher o FGTS, além das contribuições previdenciárias, e ao não efetuar qualquer ato ligado à rescisão contratual.

 

Em síntese, passados mais de seis meses da extinção do contrato, não honrou a reclamada ainda com as obrigações trabalhistas por ela própria reconhecidas. Numa ousadia, busca o afastamento da aplicação da multa rescisória sob o frágil argumento de que o debate sobre a natureza da rescisão contratual inviabiliza a aplicação da penalidade, sem desprezar que tamanha fragilidade também esteve presente na tese da justa causa.

 

Não aplicar a multa rescisória, com todo respeito, é conferir prêmio à empregadora deliberadamente descumpridora da legislação trabalhista.

Ademais, a não incidência da multa em questão, data vênia do entendimento contrário, para casos envolvendo discussão sobre a natureza do término da referida relação, consagra beneplácito oferecido a quem está burlando o ordenamento jurídico-trabalhista em sua maior intensidade.

Devo reiterar que ao contrário do que ocorre em relação à multa do artigo 467, da CLT, não existe nenhuma ressalva capaz de afastar a multa rescisória do §8º, da artigo 477, da CLT, pelo fato de ter ocorrido alguma controvérsia sobre o término do vínculo de emprego.

DIFERENÇAS SALARIAIS

Indefiro o pedido de diferenças salariais dos meses de setembro, outubro e novembro de 2007, diante do reconhecimento da remuneração lançada na CTPS( R$ 2.500,00).

AUXÍLIO COMBUSTÍVEL

Confessou a reclamante, em depoimento pessoal, que não havia regularidade no fornecimento do auxílio-combustível, cujo pagamento se dava pela modalidade de ressarcimento da despesa efetuada e comprovada( fls.74/75).

Rejeito o pleito de auxílio combustível.

INDENIZAÇÃO DO ARTIGO 467, DA CLT

A controvérsia que se estabeleceu sobre as verbas deferidas afasta a aplicação da norma do artigo 467, da CLT. Indefiro.

JUSTIÇA GRATUITA

Afirmando não poder demandar sem prejuízo do sustento próprio e de sua família, a reclamante pleiteou, na inicial, os benefícios da justiça gratuita (fls. 05).

Entendo que a presunção de hipossuficiência do empregado milita em seu favor, especialmente quando preenchidos os requisitos legais para concessão da gratuidade judiciária, cabendo ao empregador/reclamado destituir a aparente regularidade, o que não ocorreu, embora tenha impugnado a declaração.

Defiro, pois, a gratuidade judiciária postulada pela autora, nos termos da DECLARAÇÃO DE POBREZA JURÍDICA firmada a fls. 05, na forma das Orientações Jurisprudenciais 304 e 331, ambas da SBDI-1, do c. TST.

OFÍCIOS AOS ÓRGÃOS FISCALIZADORES

A secretaria deverá encaminhar ofícios aos órgãos fiscalizadores (INSS, DRT-DF e CEF), em face das irregularidades constatadas.

CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS E FISCAIS

Reconhecido o vínculo de emprego, desde 16 de agosto de 2007, pela via judicial, impõe-se o recolhimento da contribuição previdenciária sobre a remuneração mensal auferida durante o contrato de trabalho, sem prejuízo, ainda, de sua incidência sobre outras parcelas salariais que devem ser pagas a partir da rescisão contratual, nos exatos termos do artigo 276, §7º, do Decreto 3.048/99.

A interpretação restritiva feita não encontra amparo no texto constitucional, sendo certo que o artigo 114, inciso VIII, da Constituição Federal, estabelece a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar “a execução, de ofício, das contribuições previstas no artigo 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir”. Tal redação compõe o ordenamento primeiro desde a promulgação da Emenda nº 20, de 15 de dezembro de 1998, representando a alteração, efetivamente, uma significativa mudança de eixo.

Quaisquer contribuições previdenciárias devidas sobre salários, diferenças salariais e sobre outras parcelas reconhecidas pela Justiça do Trabalho, estão sob a sua alçada. E assim o é porque o texto da Carta Política não faz a restrição anunciada pelo posicionamento recentemente externado pelo Tribunal Superior do Trabalho.

Aliás, não seria sequer razoável deslocar a referida competência para o órgão que cabe reconhecer a parcela principal e, logo depois, restringi-la na parte mais expressiva.

Entendo que tal fracionamento, definitivamente, estaria a produzir algo inusitado em termos de competência e a militar contra a unidade de convicção e de jurisdição.

É verdade, por outro lado, que a postura inconseqüente do órgão previdenciário, do ponto de vista administrativo, ao criar embaraços diversos para a averbação do tempo de serviço reconhecido pela Justiça do Trabalho, ainda que providenciado o recolhimento previdenciário pertinente, merece o mais veemente repúdio, com a adoção de medidas, nos próprios autos, capazes de fazer prevalecer a decisão judicial ignorada pelo Instituto Nacional do Seguro Social.

 

Ainda assim, nenhuma represália, por parte dos juízes do trabalho, merece aplauso quando o desprezo ao regramento estabelecido pelo constituinte derivado é a resposta oferecida à cegueira do órgão público em destaque. O INSS, em nome do combate às simulações e fraudes contra a previdência do povo brasileiro, tem desprezado as decisões da Justiça do Trabalho as quais reconhecem a relação de emprego e determinam o recolhimento da contribuição previdenciária sobre o salário mensal.


 

Depois do histórico recente de golpes promovidos por quadrilhas organizadas contra a Previdência, não há qualquer dúvida quanto à necessidade de uma permanente vigilância, interna e externa, dos mais diversos atos praticados, nada que justifique a absoluta inversão de valores, a ponto de uma ação administrativa simplesmente ignorar decisão judicial sobre o mesmo tema.

É fundamental que o contraditório seja observado e, para evitar as simulações eventualmente perseguidas pelas partes litigantes na Justiça do Trabalho, considero que, na hipótese de qualquer debate em torno do reconhecimento da relação de emprego, se mostra bastante razoável a inclusão do órgão previdenciário na lide, a partir da fase de conhecimento, para que pudesse não apenas produzir defesa e provas, como também recorrer quando julgasse conveniente.

Outras propostas merecem análise mais aprofundada e reflexões no seio da Justiça do Trabalho, cujas intenções devem estar voltadas, por um lado, para garantir o respeito às decisões judiciais e, por outro, repelir todas e quaisquer condutas tendentes a fraudar e a lesar o erário.

Não consigo conceber como razoável, registro novamente, a interpretação restritiva de um mandamento constitucional revestido do mais alto valor social para o conjunto da população brasileira, qual seja, o que atribui à Justiça do Trabalho como segmento especializado do Poder Judiciário competência para dirimir a totalidade do conflito resultante da relação jurídica que une trabalhadores e empregadores.

Ademais, o próprio Instituto Nacional do Seguro Social tem postulado de forma sistemática que o tempo de serviço reconhecido por decisão judicial seja considerado para fins de recolhimento da contribuição previdenciária sobre o salário mensal pago ao trabalhador naquele lapso temporal. E assim agindo, parece-me ter o órgão previdenciário concluído pela regularidade da relação principal, daí derivando o seu direito ao pagamento das verbas previdenciárias.

Cuidadoso e criterioso, estou certo que a cada exame dos autos, o órgão previdenciário providencia o registro em seus arquivos da regularidade da situação, de modo a não obstar a aposentadoria e a percepção de outros benefícios pelos sofridos trabalhadores brasileiros.

Estou absolutamente convicto de que compete à Justiça do Trabalho determinar o recolhimento da contribuição previdenciária sobre a totalidade das verbas salariais deferidas e também determinar a incidência da contribuição mensal regular sobre o salário, na hipótese do reconhecimento judicial da relação de emprego, e sobre suas diferenças, quando a remuneração real não tiver sido considerada pelo empregador como base de cálculo durante o contrato de trabalho.

Na legislação inferior, o artigo 276, § 7º, do Decreto 3.048/99, estabelece o seguinte:

Se da decisão resultar o reconhecimento de vínculo empregatício, deverão ser exigidas as contribuições, tanto do empregador como do reclamante, ainda que o pagamento das remunerações a ele correspondentes não tenham sido reclamadas na ação, tomando-se por base de incidência, na ordem, o valor da remuneração paga, quando conhecida, da remuneração paga a outro empregado de categoria ou função equivalente ou semelhante, do salário normativo da categoria ou do salário mínimo mensal, permitida a compensação das contribuições patronais eventualmente recolhidas.”

Acrescento, por fim, que recentemente foi editada a Lei 11.457, de 16 de março de 2007, dando nova redação ao art. 876 da CLT, para constar que:

Serão executadas ex-officio as contribuições sociais devidas em decorrência de decisão proferida pelos Juízes e Tribunais do Trabalho, resultantes de condenação ou homologação de acordo, inclusive sobre os salários pagos durante o período contratual reconhecido.”

A Lei em comento, a meu ver, só veio reforçar o entendimento ora esposado, porquanto o regramento acerca do recolhimento previdenciário já estava previsto no art. 114, VIII, da CF/88, com redação dada pela EC 20/98, norma que não dependia de qualquer regulamentação.

Tendo em vista que o não recolhimento à época própria deu-se por culpa da reclamada, deverá a empregadora arcar com os recolhimentos previdenciários – inclusive o percentual normalmente a cargo do empregado -, nos termos do art. 33 da Lei n° 8.212/91.

 

A Reclamada deverá efetuar o recolhimento da contribuição previdenciária devida durante a vigência do contrato de trabalho (recolhimento integral de 16 de agosto de 2007 a 22 de novembro de 2007), com base no salário mensal de R$2.500,00(dois mil e quinhentos reais), limitado, porém, ao teto da previdência, para esse fim. E por ter dado causa ao atraso, responderá a empregadora pela totalidade da parcela, inclusive à cota-parte que originariamente competia à empregada.

 

Também haveria incidência sobre a outra parcela salarial ora deferida, qual seja, 13º salário fracionado de 2007, sempre com a observância do teto da Previdência Social.

Se não o fizer mediante comprovação nos autos, o recolhimento será feito por meio de execução.

JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. IMPOSTO DE RENDA. ISENÇÃO. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS

Devida a atualização monetária da verba (Súmula 381, do c. TST), contando-se os juros de mora(1% ao mês) a partir da data do ajuizamento da reclamatória.

Para que não restem duvidas quanto à inteireza da prestação jurisdicional, é de se observar que a Lei n° 8.177/91 constitui, atualmente, o diploma legal específico para as diretrizes a serem observadas quanto aos débitos trabalhistas e, via de conseqüência, pelo princípio da especialidade, prevalece sobre os demais.

No que se refere ao imposto de renda, tem-se como fato gerador do tributo o denominado “regime de caixa”, segundo o qual a incidência do imposto de renda ocorre no momento da disponibilização do crédito, independentemente da época em que este era devido ao reclamante.

A respeito do tema, a jurisprudência está consolidada por meio da Súmula nº368 do colendo Tribunal Superior do Trabalho:

368bbDESCONTOS PREVIDENCIÁRIOS E FISCAIS. COMPETÊNCIA. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO. FORMA DE CÁLCULOb. (bconversão das Orientações Jurisprudenciais nos 32, 141 e 228 da SDI-1)Alterada pela Res. 1382005, DJ 23.11.2005

I- A Justiça do Trabalho é competente para determinar o recolhimento das contribuições fiscais. A competência da Justiça do Trabalho, quanto à execução das contribuições previdenciárias, limita-se às sentenças condenatórias em pecúnia que proferir e aos valores, objeto de acordo homologado, que integrem o salário-de-contribuição. (ex-OJ nº 141Inserida em 27.11.1998)

II- É do empregador a responsabilidade pelo recolhimento das contribuições previdenciárias e fiscais, resultante de crédito do empregado oriundo de condenação judicial, devendo incidir, em relação aos descontos fiscais, sobre o valor total da condenação, referente às parcelas tributáveis, calculado ao final, nos termos da Lei nº 8.5411992, art. 46 e Provimento da CGJT nº 032005. (ex-OJ nº 32Inserida em 14.03.1994 e OJ nº 228Inserida em 20.06.2001)

Em se tratando de descontos previdenciários, o critério de apuração encontra-se disciplinado no art. 276, §4º, do Decreto n º 3.04899 que regulamentou a Lei nº8.21291 e determina que a contribuição do empregado, no caso de ações trabalhistas, seja calculada mês a mês, aplicando-se as alíquotas previstas no art. 198, observado o limite máximo do salário-de-contribuição.” (ex-OJ nº 32 – Inserida em 14.03.1994 e OJ 228 – Inserida em 20.06.2001) & parte sublinhada em negrito para destaque, que não consta do original.


O entendimento jurisprudencial transcrito descreve o procedimento técnico-contábil para a apuração do recolhimento previdenciário relativo à cota-parte do empregado, segundo o chamado “regime de competência”, que se diferencia do “regime de caixa” – utilizável quanto aos débitos fiscais -, pois, neste último caso, o valor devido é apurado com relação ao momento de disponibilização do crédito, independentemente da época em que o mesmo era devido, ao passo que, para o cálculo do INSS, por meio do regime de competência, há de se obedecer ao limite especificado como teto máximo para o salário-de-contribuição, em atenção ao momento em que a verba salarial era devida ao credor, independentemente de o pagamento só vir a ser realizado meses ou anos depois.

NÃO INCIDÊNCIA DE IMPOSTO DE RENDA SOBRE JUROS DE MORA

Os juros de mora representam a compensação paga pelo devedor em virtude do atraso no adimplemento da prestação devida, não se incluindo, assim, no conceito legal de renda, insculpido na definição fornecida pelo art. 43 do Código Tributário Nacional, in verbis:

Art. 43 O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:

 

Ide renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;

 

IIde proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior. […]

Entendo que não cabe imposto de renda sobre os juros de mora, seja porque o Empregado não deu causa ao atraso, sendo ele o único devedor da parcela fiscal, dado o fato de vir a auferir renda somente por força de decisão judicial, seja também pela natureza jurídica da verba em questão.

Os juros de mora, ainda que incidentes sobre parcelas tributáveis, têm absoluta autonomia em relação a tais verbas, com natureza nitidamente indenizatória pelo atraso no cumprimento da obrigação pela fonte pagadora, não se constituindo, assim, em nova renda, nem mesmo em acréscimo de renda.

Com efeito, como os juros de mora não constituem produto de capital e/ou trabalho, nem representam acréscimo patrimonial, pois, ao contrário, implicam compensação pelo decréscimo no patrimônio do credor em decorrência do decurso de tempo entre a data em que deveria ter sido solvida a obrigação e a época em que efetivamente vier a ser quitado o débito, não pode ser considerada parcela sujeita à incidência do imposto.

No mesmo sentido, aliás, é a jurisprudência do STJ, exemplificada pelos arestos a seguir transcritos:

/i>IMPOSTO DE RENDA. RETENÇÃO. INDENIZAÇÃO. DESAPROPRIAÇÃO. JUROS COMPENSATÓRIOS E MORATÓRIOS. SÚMULA N. 39 DO TFR . A indenização decorrente de desapropriação não é ganho de capital, nem acréscimo dele. A propriedade é transferida ao Poder Público pelo valor determinado pela Justiça a título de indenização. Não ocorre venda nem lucro, e sim reposição do valor do bem atingido. Este é o bom entendimento da Súmula nº. 39 do TFR prestigiado por esta alta corte de justiça (RESPS nºs. 47.449-3-SP e 54.155-7-SP). Os juros compensatórios e moratórios integram a indenização. Recurso improvido. (Acórdão 1ª Turma nº 9700303624, RESP. Processo nº 130194/SP. Relator Min. Garcia Vieira. Publicado no DJ de 24.11.97, p. 61131).

bEMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO INEXISTENTE. DESAPROPRIAÇÃO. IMPOSTO DE RENDA. JUROS NÃO TRIBUTÁVEIS. JURISPRUDÊNCIA PACIFICA. REJEIÇÃO DOS EMBARGOSb. Assentando que os juros, por integrarem a indenização, não constituem renda, não estando sujeitos a tributação, decidiu a turma consoante pacifica jurisprudência e se ateve ao que foi discutido no recurso especial. Sem omissão a ser suprida, rejeitam-se embargos de declaração. (Acórdão 2ª Turma nº 9600572445, EDRESP. Proc. nº 107277/SP. Rel. Min. Hélio Mosimann. Publicado DJ 12.05.97, p. 18783).

Em recente julgado do TRF da 4ª região, restou consignado que não incide imposto de renda sobre juros de mora, cujo acórdão é transcrito:

bTRIBUTÁRIObIMPOSTO DE RENDAb> – <b>INCIDÊNCIA SOBRE JUROS DE MORA PAGOS EM VIRTUDE DE CONDENAÇÃO JUDICIAL IMPOSTO POR SENTENÇA PROFERIDA EM RECLAMATÓRIA TRABALHISTA<!–b> – INADMISSIBILIDADE.

1O art. 16 da Lei nº 4.506/64 deve ser interpretado à luz do art. 43 da Lei nº 5.172//66, que lhe é posterior e instituiu o Código Tributário Nacional. De acordo com este último dispositivo, as indenizações que não acarretam acréscimo patrimonial não configuram fato gerador do imposto de renda.

2Os juros moratórios são, por natureza, verba indenizatória dos prejuízos causados ao credor pelo pagamento extemporâneo de seu crédito. Inteligência do art. 404 do Código Civil (Lei 10.406, de 10/01/2002).

3No caso de mora no pagamento de verba trabalhista, que tem notória natureza alimentar, impondo ao credor a privação de bens essenciais de vida, e/ou o endividamento para cumprir seus próprios compromissos, a indenização, através dos juros moratórios, corresponde aos danos emergentes, ou seja, àquilo que o credor perdeu em virtude da mora do devedor. Não há nessa verba qualquer conotação de riqueza nova, a autorizar sua tributação pelo imposto de renda. Indenização não é renda.

4O Código Civil de 2002 não contém norma que diga expressamente que o acessório segue a sorte do principal, como havia no Código de 1916. Essa regra continua vigente por uma questão de lógica. Não se aplica, entretanto, em toda a sua amplitude, quando a natureza do principal é distinta da do acessório.

RELATÓRIO

Celio Rodolfo Muller ajuizou ação ordinária contra a União, visando a restituição dos valores descontados a título de imposto de renda incidente sobre os juros moratórios pagos em virtude de condenação judicial imposta por sentença proferida em reclamatória trabalhista. Alega que os juros moratórios têm natureza indenizatória e não constituem riqueza nova, o que afasta a incidência do art. 43 do CTN, I e II, do CTN. Alega, ainda, que é ilegal o § 3º do art. 43 do Decreto nº 3000/99, que classifica os juros como rendimento de trabalho assalariado.

 

A União contestou a ação. Aduziu que o art. 43, § 3º, do Decreto nº 300099, ao determinar a incidência do imposto de renda sobre os juros moratórios, apenas regulamentou o disposto no art. 16, parágrafo único, da Lei nº 4.50664. Aduziu, ainda, que o juro representa rendimento do capital e que oelemento do juro’ é a remuneração, ‘base da tributação do Imposto de Renda’

 

Sobreveio sentença que julgou procedente o pedido paradeclarar a inexigibilidade do imposto de renda sobre juros de mora’ e condenar a Uniãoa restituir ao autor os valores recolhidos a título de imposto de renda incidente sobre a parcela recebida em ação trabalhista, relativa a juros de mora decorrente do pagamento de horas extras e reflexos em atrasofl. 48', tudo corrigido monetariamente pela taxa SELIC. Condenou a União ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação.

Apelou a União, aduzindo que, a teor do art. 92 do Código Civil de 2002, os juros são bens acessórios em relação ao valor principal pago na reclamatória trabalhista, de modo que, seas diferenças recebidas têm natureza salarial, então, por óbvio, os juros de mora a elas relativos têm natureza salarial, e, sendo assim configuram acréscimo patrimonial sujeito à tributação por parte do imposto de renda’.


Com contra-razões, vieram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

VOTO

1De início, cumpre examinar o parágrafo único do art. 16 da Lei nº 4.506, de novembro de 1964, invocado pela União, em sua contestação, como fundamento de validade do § 3º do art. 43 do Decreto nº 3000/99. Dispõe esse dispositivo:

Parágrafo único. Serão também classificados como rendimentos de trabalho assalariado os juros de mora e quaisquer outras indenizações pelo atraso no pagamento das remunerações previstas neste artigo.

O texto legal em exame trata os juros decorrentes de atraso no pagamento das remunerações em geral como indenização. Classifica-os, entretanto, como rendimento de trabalho assalariado.

O art. 16 da Lei nº 4.506/64 deve ser interpretado à luz do art. 43 da Lei nº 5.172//66, que lhe é posterior e instituiu o Código Tributário Nacional. De acordo com este último dispositivo, as indenizações que não acarretam acréscimo patrimonial não configuram fato gerador do imposto de renda. Tudo depende da natureza do bem jurídico a que se refere a indenização. Se o pagamento em dinheiro apenas reconstitui a perda patrimonial ocorrida em virtude da lesão, não há aumento no patrimônio material. Nesse sentido: REsp 786769/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 03.04.2006, p. 276.

2Os juros moratórios são, por natureza, verba indenizatória dos prejuízos causados ao credor pelo pagamento extemporâneo de seu crédito, e como tal conceituados no art. 404 do vigente Código Civil (Lei 10.406, de 10/01/2002):

Art. 404. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.

Parágrafo único. Provado que os juros da mora não cobrem o prejuízo, e não havendo pena convencional, pode o juiz conceder ao credor indenização suplementar.

Outro não era o tratamento dado à matéria pelo art. 1.061 do Código Civil de 1916:

Art. 1.061. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, consistem nos juros da mora e custas, sem prejuízo da pena convencional.

A única inovação trazida pelo Código Civil de 2.002 foi a possibilidade de o juiz conceder indenização suplementar caso os juros de mora não cubram o prejuízo do credoro que vem, mais uma vez, ressaltar o caráter indenizatório desses juros.

Cuida-se, aqui, de mora no pagamento de verba trabalhista, que tem notória natureza alimentar, impondo ao credor a privação de bens essenciais de vida, e/ou o endividamento para cumprir seus próprios compromissos. A indenização, através dos juros moratórios, corresponde aos danos emergentes, ou seja, àquilo que o credor perdeu em virtude da mora do devedor. Não há nessa verba, portanto, qualquer conotação de riqueza nova, a autorizar sua tributação pelo imposto de renda. Indenização não é renda.

3O Código Civil de 2002 não contém norma que diga expressamente que o acessório segue a sorte do principal, como havia no Código de 1916. Essa regra continua vigente por uma questão de lógica. Não se aplica, entretanto, em toda a sua amplitude quando a natureza do principal é distinta da do acessório, como no caso dos autos.

 

Em face do exposto, nego provimento à apelação e à remessa oficial.

 

É o voto.” (Apelação Cível 2006.72.00.012059-2/SC, Relator Desembargador Federal ANTÔNIO ALBINO RAMOS DE OLIVEIRA)

Não haverá cobrança de imposto de renda sobre os juros de mora a serem apurados em regular processo de liquidação.

COMPENSAÇÃO

Não cabe qualquer compensação de valores, eis que a reclamada deixou de pagar as verbas deferidas, em seus correspondentes períodos de exigibilidade.

Rejeito.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Ressalvando entendimento pessoal em sentido contrário, curvo-me, diante da jurisprudência consolidada, para indeferir o pedido de pagamento de honorários advocatícios.

A jurisprudência consolidada, no âmbito da Justiça do Trabalho, é firme no sentido de que os honorários advocatícios são cabíveis na hipótese de haver assistência prestada pelo sindicato obreiro e não poder o empregado demandar sem prejuízo de seu sustento, de modo que a ausência de um dos requisitos, como é o caso dos autos, onde a reclamante não tem a assistência jurídica do seu sindicato de classe, afasta a possibilidade de deferimento de honorários advocatícios.

Reitero: não concordo com o referido posicionamento, inclusive porque o empregado, a partir de tal interpretação, precisa repartir fração de seu crédito trabalhista para remunerar o advogado que contratou para defendê-lo em juízo, mas curvo-me ao entendimento pacificado no âmbito do TRT 10 e do TST, com todas as ressalvas possíveis.

Pleito que rejeito, em observância ao teor da jurisprudência consolidada na Justiça do Trabalho.

DA RECONVENÇÃO APRESENTADA PELA EMPREGADORA. CABIMENTO NO PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO. DANO MORAL. INDENIZAÇÃO

A reclamada apresenta reconvenção(fls. 54/59) com o propósito de obter a condenação da ex-empregada ao pagamento de indenização por dano moral, no valor de R$15.000,00(quinze mil reais).

Depois de reiterar a versão da defesa relacionada ao abandono de emprego, pela reconvinda, inclusive a denominada “<b>franqueza típica dos operadores do direito<!–b>”(fls. 55), afirma a reconvinte que a ex-empregada teria realizado ligação telefônica para o seu escritório, deixando recado, por intermédio dafuncionária Edione”, com o seguinte teor:”PARA XXXXXXX, ESSA MULHER BAIXINHA, RIDÍCULA, POR DENTRO E POR FORA E MAL AMADA QUE VOU LEVAR ELA PRO PAU, QUE ELA VAI SE SURPREENDER COM OS VALORES QUE EU VOU PEDIR”(fls. 57).

Diante da precariedade do seu estado de saúde no momento em que recebeu o grosseiro recado, a empregadora-reconvinte sentiu-se abalada emocionalmente e humilhada, motivo pelo qual pretende alcançar a condenação da empregada-reconvinda, a título de indenização por dano moral, na forma do artigo 5º, Inciso V, da Constituição Federal.

Impugnando a pretensão patronal, a reconvinda argüi preliminar de carência de ação por ser inadmissível pedido reconvencional nos feitos submetidos ao rito sumaríssimo. No mérito, a obreira rechaça o contexto fático descrito pela empregadora.

Não vejo qualquer obstáculo ao lançamento de reconvenção nos autos de processo submetido ao rito sumaríssimo, até porque a medida resolve, por intermédio de ato único, todas as questões vinculadas ao pacto e, nesse sentido, vai ao encontro do propósito do legislador ordinário ao criar mecanismo mais célere para a solução das demandas trabalhistas.

Assinalo que não se trata sequer de tema concernente às condições da ação, as quais estão presentes.

Rejeito a preliminar deduzida na contestação da empregada-reconvinda.

As partes, em seus depoimentos pessoais, ratificaram as versões de suas respectivas peças processuais(fls. 73/75), sem que fosse possível alcançar a confissão.

Ouvida na qualidade de testemunha, a estagiária Edione Ferreira da Silva, vinculada ao cumprimento da jornada de 08 (oito) horas diárias, de segunda a sexta-feira, afirma que por intermédio de contato telefônico, a reclamante disse-lhe o seguinte :”<b>fala para essa baixinha ridícula, por dentro e por fora, e mal amada, que vou entrar na justiça e vou desgraçar a vida dela<!–b>”(fls. 75/76).

Para a configuração do direito à reparação civil alguns requisitos se mostram imprescindíveis demonstrar: o evento danoso, a ação ou omissão do autor do fato ou responsável, o nexo de causalidade entre os dois itens anteriores e, claro, o dano propriamente dito.

Para Sílvio Rodrigues, citado por José Affonso Dallegrave Neto, danos morais são todos aqueles que não têm repercussão de caráter patrimonial ou, no dizer de Paulo Netto Lobo, “os danos morais violam os direitos de personalidade” (in, Responsabilidade Civil, LTR, São Paulo, 2005, página 141). Mas é certo que para a caracterização do dano moral, na concepção da teoria da responsabilidade civil abraçada pelo novo Código Civil (artigo 927, parágrafo único), além da culpa do empregador, há necessidade da presença do dano e também do nexo de causalidade (in, obra citada).

 

A Constituição Federal assegura, no capítulo dos direitos e deveres individuais e coletivos, a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, cujo desrespeito a tais garantias atrai a indenização pelo dano material ou moral (CF, artigo 5º, inciso X).

 

Diz Walmir Oliveira Costa que “Só há responsabilidade do ofensor se houver dano a reparar, tendo o empregado que provar a presença dos elementos essenciais da responsabilidade civil extra-contratual, ou seja: a)o dano suportado;b)a culpa do empregador ; e c)o nexo causal entre o evento danoso e o ato culposo”( in, “Dano Moral nas Relações Laborais”, Editora Juruá, 1999, Curitiba-PR, Página 49).

A ofensa moral, em síntese, segundo manifestação da reconvinte, restaria configurada por expressões dotadas de preconceito(“baixinha ridícula”), de avaliação subjetiva sobre o seu relacionamento(“mal amada”) e das ameaças feitas(“levar pro pau”, “entrar na justiça”).

Se verdadeiro o contexto narrado pela testemunha, é forçoso concluir que, no mínimo, faltou serenidade e equilíbrio emocional à empregada para tratar de questão importante da sua vida profissional. Avaliações preconceituosas e subjetivas devem ser sempre repelidas, eis que o tom descrito em depoimento testemunhal muito mais se assemelha à reação juvenil destemperada .

Por outro lado, o destempero verbal externado por intermédio de contato telefônico, eventualmente proferido pelo ator da relação jurídica localizado em posição de dependência hierárquica, nem de longe, configura dano moral.

No caso dos autos, não pode ser esquecido o fato de que a empregada foi dispensada, sem justa causa, com ausência de quitação das verbas rescisórias. Passados quase trinta dias, é natural que desejasse usufruir dos direitos rescisórios a que fez jus em decorrência da prestação de serviços, mantendo ou tentando manter contato com a sua antiga empregadora para cobrar a dívida trabalhista. Tudo isso é absolutamente legítimo.

Não é ameaça, muito menos chantagem, declarar a empregada que irá ajuizar ação trabalhista para receber as suas verbas. Ao contrário, bem sabem as partes, militantes na área do direito, que se trata de uma garantia constitucional. Os valores, elevados ou não, passarão pelo crivo do julgador.

Ao não cumprir as obrigações trabalhistas para com a empregada, a reconvinte causou-lhe um dano material, que pode ter evoluído ou não para dano moral.

A empregada, evidentemente, a partir de tal ato patronal, pode exercer o seu sagrado direito de ação ou de resistência natural ao comportamento que está a lhe trazer angústia, desconforto e sacrifício.

O direito de resistência, fundamental nas relações de trabalho caracterizadas pela opressão, alcançou, por exemplo, o reconhecimento da legitimidade das greves operárias, das diversas operações conduzidas por sindicatos obreiros e de outros atos avaliados precipitadamente como sujeitos às sanções penais por parte do Estado.

A resistência é um direito natural do ser humano explorado e oprimido, não sendo o Estado capaz de captar, muitas vezes, essa garantia porque deixa de distinguir o legal do justo.

E nessa seara, deve-se questionar qual o ato mais ofensivo à dignidade da pessoa humana(CF. Artigo 1º inciso III). O que viola os direitos trabalhistas da empregada ou o concernente à dureza de expressões verbais manifestadas contra a empregadora, em decorrência do primeiro evento, por meio de contato telefônico?

Longe de avalizar agressões verbais, estou convencido de que o eventual destempero da reclamante, via contato telefônico mantido com a estagiária do escritório de advocacia, foi uma reação justificada contra a agressão de maior intensidade, contra os seus direitos sociais, direitos humanos por excelência, a serem protegidos tanto quanto os direitos individuais de primeira geração.

Não vejo, assim, o dano moral praticado pela empregada contra a empregadora, senão o descontentamento da obreira pela falta do recebimento de suas verbas rescisórias, embora possa ter utilizado expressões rudes.

Pela ausência de dano moral, indefiro o pedido de indenização formulado na reconvenção contra a empregada.

De idêntico modo, afasto a possibilidade de caracterização da litigância de má-fé, pela empregada.

IIICONCLUSÃO

Diante do exposto, julgo procedentes, em parte, os pedidos para condenar a reclamada, XXXXXXXXXX, a pagar à reclamante, XXXXXXXXXXXXXX, no prazo legal, aviso prévio indenizado (30 dias) e respectiva integração do período ao seu tempo de serviço, para todo os fins, 13º salário fracionado de 2007 (5/12), férias proporcionais (4/12), acrescidas do abono de 1/3, FGTS de todo o contrato, acrescido da multa de 40%, multa rescisória do artigo 477, §8º, da CLT, e saldo de salário do mês de novembro de 2007 (06 dias), sempre tomando base de cálculo o salário mensal de R$2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), tudo nos termos da fundamentação precedente, que integra o presente dispositivo como se parte dele fosse.

A reclamada lançará na CTPS obreira a data correta do início do contrato de trabalho (16.08.2007), retificando registro em sentido contrário feito no documento, no prazo de 48 horas, pena de assim proceder a Secretaria da Vara.

Defiro a gratuidade judiciária postulada pela autora, nos termos da DECLARAÇÃO DE POBREZA JURÍDICA firmada a fls. 05, na forma das Orientações Jurisprudenciais 304 e 331, ambas da SBDI-1, do c. TST.

Providencie a Secretaria a expedição dos ofícios aos órgãos fiscalizadores (INSS, DRT-DF e CEF), logo após o trânsito em julgado da decisão.

Juros e atualização monetária, na forma legal, sendo os primeiros à razão de 1%(um por cento) ao mês, a partir do ajuizamento da presente reclamatória, e a atualização monetária a partir do 5º(quinto)dia útil do mês seguinte ao vencido.

A liquidação será por cálculos.

Recolhimentos previdenciários, na forma do Provimento 01/96, da CGJT, sob pena de execução de ofício (artigo 114, §3º, da CF), incidentes sobre as parcelas indicadas na fundamentação, quais sejam, salários de todo o contrato (SOBRE O SALÁRIO DE R$2.500,00 POR MÊS) e 13º salário fracionado de 2007, desde que o teto mensal não tenha sido ultrapassado, considerando, inclusive, os eventuais recolhimentos mensais já realizados durante a vigência do contrato de trabalho. Incidirão contribuições previdenciárias sobre as parcelas indicadas no tópico próprio, respeitando-se, sempre, o teto de contribuição mensal, considerando para esse fim o que já fora recolhido, mês a mês. O empregado não pode efetuar o pagamento de contribuição previdenciária sobre parcela que será desprezada, no seu valor, para fins de aposentadoria.

Não haverá incidência de imposto de renda sobre juros de mora.

Recolhimentos fiscais, nos termos do Provimento n°03/2005 da CGJT.

Custas pela reclamada, no importe de R$200,00 (duzentos reais), calculadas sobre R$ 10.000,00(dez mil reais), valor arbitrado à condenação e para esse fim aproveitado.

AS PARTES ESTÃO CIENTES.

GRIJALBO FERNANDES COUTINHO

Juiz Titular da 19ª Vara do Trabalho/BSB-DF

*Texto alterado às 17h40 do dia 23 de fevereiro de 2016 para supressão de nomes.

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