Os planos de saúde não podem estabelecer limites de cobertura de carência nas internações de emergência. Ao criarem essa regra, há o risco de o contrato ser nulo de pleno direito por violar os princípios da equidade e da boa-fé e colocar o consumidor em desvantagem exagerada. Quando o que se está em jogo é a vida e a saúde do cliente, a empresa é obrigada a cobrir o tratamento.
O entendimento é do Tribunal de Justiça de São Paulo, que condenou uma empresa de seguro saúde a arcar com os custos da internação do segurado que sofreu insuficiência coronária aguda. A mesma decisão proibiu o hospital de cobrar o valor depositado como caução, protestar o cheque ou incluir o nome do paciente no cadastro de inadimplentes. Cabe recurso.
O contrato de plano de saúde foi assinado em abril de 2005. Menos de um mês depois, o cliente sofreu de mal súbito e precisou ser atendido às pressas em um dos melhores hospitais da rede privada de São Paulo. A internação durou seis dias. Para prestar o atendimento, o hospital exigiu pagamento antecipado de R$ 18 mil. A família entregou um cheque caução. Depois, foi apresentada mais uma fatura no valor de R$ 52 mil.
Procurada pela família para pagar o tratamento, a seguradora se negou a cobrir as despesas. Alegou que a cobertura do contrato abrangia apenas as primeiras 12 horas da internação. A empresa sustentou que estava amparada em resolução do Conselho Nacional de Saúde, no Código de Defesa do Consumidor e na lei que estabelece as regras para os planos de saúde privados. Sem acordo, o caso foi parar na Justiça.
Em primeira instância, a ação foi julgada procedente para condenar a seguradora a cobrir os custos da internação. A empresa não ficou satisfeita e apelou ao TJ paulista com o argumento de que a decisão se afastou dos fatos, das provas e da lei. Segundo a empresa, a sentença não poderia ser aplicada porque impunha a ela, seguradora, que assumisse a cobertura de um acordo que não estava obrigada.
O TJ paulista entendeu que o quadro tratava de internação de emergência e que, nesses casos, a empresa está obrigada a arcar com as despesas por implicar em risco imediato de vida para o paciente. Os julgadores sustentaram que a regra de carência só pode ser admitida quando o fato trata de internação normal. Para a turma julgadora, no caso de urgência, quando está em jogo a vida e a saúde, o apego à formalidade da carência é conduta abusiva porque ataca direito e impõe obrigações e coloca o paciente em inequívoca desvantagem.
O relator do julgamento, desembargador Vicentini Barroso, apontou que a lei dos planos privados de saúde determina que nos atendimentos de urgência o prazo de carência deve ser de 24 horas. Para o relator, o contrato em debate está em desacordo com a norma ao estabelecer limite de 12 horas e só permitir a cobertura ambulatorial, deixando de fora o atendimento hospitalar.
“Em casos de urgência e emergência não cogita cumprimento de período de carência. Do mesmo modo, a cobertura por um período de apenas 12 horas de atendimento representa cláusula abusiva”, afirmou o relator. Para Vicentini Barroso, a preservação da saúde é a finalidade do contrato.
A turma julgadora seguiu o entendimento do relator. Ele considerou que a exclusão de tratamento, em casos graves, é iníqua e configura afronta ao direito do consumidor.