Populismo e despreparo

É o Estado quem deve servir a sociedade, não o contrário

Autor

  • Ives Gandra da Silva Martins

    é professor emérito das universidades Mackenzie Unip Unifieo UniFMU do Ciee/O Estado de S. Paulo das Escolas de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme) Superior de Guerra (ESG) e da Magistratura do Tribunal Regional Federal da 1ª Região professor honorário das Universidades Austral (Argentina) San Martin de Porres (Peru) e Vasili Goldis (Romênia) doutor honoris causa das Universidades de Craiova (Romênia) e das PUCs PR e RS catedrático da Universidade do Minho (Portugal) presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio-SP ex-presidente da Academia Paulista de Letras (APL) e do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp).

29 de janeiro de 2008, 18h10

Artigo originalmente publicado no jornal Folha de S. Paulo no dia 28 de janeiro

Colhe o mundo, atualmente, uma notável safra de pseudo-líderes, populistas e despreparados, que conduzem nações mais ou menos desenvolvidas, exclusivamente baseados no poder de comunicação com o povo, principalmente com aquela parcela menos favorecida.

Partem do princípio de que, para os políticos, “as promessas que fazem só comprometem os que as recebem” — como dizia Roberto Campos, que muitos sequer conheceram. Foi, de resto, o que ocorreu, quando o presidente Lula, a fim de ver aprovada a DRU no Senado, prometeu à oposição e ao povo, que não iria lançar pacotes tributários, nem aumentar tributos, e descumpriu o prometido, alguns dias depois.

Na mesma linha, o histriônico presidente venezuelano — capaz de criar desnecessárias resistências por ser incapaz de controlar seus repentes e ofensas, transforma o narcotráfico colombiano e sua indústria de sequestros em “idealística” guerrilha. Começa, entretanto, em sua democracia de um homem só, a sentir as resistências de um povo cansado de ver que o governo tem dinheiro em excesso, por força de sua monoeconomia (petróleo), mas, curiosamente, no país, tudo falta e a inflação explode.

O certo é que a “democracia” de um presidente despreparado, que pretende ser perpétuo, periclita na Venezuela.

O mesmo se pode dizer de Morales, que pretende, também, se perpetuar no poder e que começa, em face de sua enciclopédica e truculenta ignorância, a dividir a nação. Lá também a democracia corre risco.

É de se lembrar que todos os três presidentes são amigos de um ditador que, segundo os dados internacionais, fuzilou, sem julgamento, — os homicídios perpetrados nos famosos “paredons” — muito mais pessoas que Pinochet e que, no entanto, nenhum juiz espanhol ou italiano pretende levar aos tribunais internacionais.

Nada obstante devessem os dois, de há muito, terem sido condenados pelas mortes que causaram, pelos tribunais de seu tempo — pois, pelo Tribunal da História, já estão julgados, no mesmo nível de Hitler, Mussolini e Stálin — a única diferença entre esses assassinos (Fidel e Pinochet), é que o Chile progrediu mais do que Cuba.

A Ásia não fica distante das Américas, sob esse aspecto. O presidente do Paquistão tem na força do exército sua sustentação contra a vontade popular, sendo notória a sua omissão na proteção devida à sua concorrente, Benazir Butto, lamentavelmente assassinada em plena campanha para desbancá-lo do poder.

O continente todo passa por momentos de conturbação. O oriente próximo continua um barril de pólvora, em que a democracia é um sonho distante.

Da África, nem há o que se falar, sendo os recentes episódios do Quênia uma triste reincidência das pretéritas lutas tribais, de cruel violência.

A Europa se isola dos problemas extracontinentais e os Estados Unidos, depois da desastrada presidência de George Bush, responsável pela morte de 151 mil civis no Iraque, corre o risco de votar num outro populista despreparado para conduzir seus destinos, em momento em que sua economia dá sinais de decadência.

Neste mundo atormentado por falsas lideranças e fantástica mediocridade política, creio que valeria a pena retomar-se a idéia — que propus em meu livro O Estado de Direito e o Direito de Estado, em 1977 — de uma “escola de governo” em nível de primeiro grau, para os cargos municipais, segundo grau, para os cargos estaduais e universitário, para cargos federais, na qual se preparariam líderes para dirigir a nação. Arthur Lahl, embaixador da Índia na ONU, chegou inclusive a pensar numa “Universidade Mundial”, em 1970, para preparação de líderes internacionais. Tanto na minha proposta como na de Lahl, os governos financiariam tais escolas (Brasil e ONU), sem ônus para os que se sentissem vocacionados e fossem aprovados em exame vestibular.

De alguma forma, é o que a Escola de Comando e Estado Maior do Exército, nos cursos do CPEAex, faz com os coronéis em vias de ser indicados ao generalato, que passam, um ano inteiro, estudando, na Praia Vermelha, os grandes problemas nacionais e mundiais, antes de sua eventual promoção.

Creio que é o momento de a sociedade exigir a melhor preparação de seus líderes, objetivando fazer o Estado servir a sociedade e não a sociedade, aos governos.

Autores

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    é advogado tributarista, professor emérito das Universidades Mackenzie e UniFMU e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, é presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, do Centro de Extensão Universitária e da Academia Paulista de Letras.

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