Fiscal da lei

Diretrizes básicas das principais formas de atuação do MPT

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22 de janeiro de 2008, 15h49

O artigo 127, caput, da Constituição da República, dispõe ser o Ministério Público instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

Inicialmente, destaque-se que a essencialidade a que se reporta o comando constitucional acima referido deve ser analisada sobre duplo enfoque: limitativo e ampliativo.

Sob o aspecto restritivo, cabe registrar que a atuação do Ministério Público não se faz presente em todos os processos judiciais, mas tão-somente naqueles em que o interesse público primário encontra-se subjacente à lide.

Por “interesse público primário” entende-se aquele de cunho eminentemente social, seja pela natureza da lide ou pela qualidade da parte, concernente a valores relevantes à sociedade como um todo, e não o pontual e momentâneo do administrador público, denominado de “interesse público secundário”.

Sob o prisma ampliativo, saliente-se que a atuação do parquet não se restringe à intervenção em processos judiciais, destacando-se duas outras importantes formas de exercício de suas funções institucionais: a promoção de interesses e as atividades de órgão agente, sem falarmos nos procedimentos de mediação e arbitragem.

A promoção de interesses traduz-se em relevante mister institucional, destacando-se por seus caracteres interdisciplinar, preventivo e pedagógico. Como exemplos, podem ser citados a realização de seminários, fóruns, entrevistas, palestras e debates e a distribuição de cartilhas e cartazes informativos, que visem à divulgação, prevenção e combate a lesões a bens jurídicos que justifiquem a atuação do Ministério Público, notadamente os relacionados a violações de direitos fundamentais, indisponíveis por sua essência.

Outra característica é a participação conjunta de outros órgãos ou organismos públicos e privados, tais como o Ministério do Trabalho e Emprego, o Ministério Público Estadual e Federal, os Conselhos Tutelares, os Sindicatos, ONGs, entre outros.

A atividade de órgão agente está diretamente relacionada à tutela dos direitos metaindividuais, quais sejam, os difusos, coletivos e individuais homogêneos, conceituados na norma prevista nos incisos I a III do parágrafo único do artigo 81 da Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor).

Conforme disposição contida no artigo 129, inciso III, do texto constitucional, é função institucional do Ministério Público a promoção do inquérito civil e da ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

Na verdade, diga-se que o inquérito civil e a ação civil pública não são propriamente ditos funções institucionais, mas efetivos instrumentos de atuação do parquet, para que este possa exercer, de fato, sua atribuição nuclear: a tutela do interesse público.

Quanto ao Ministério Público do Trabalho, o artigo 83, inciso III, da Lei Complementar 75/93 (Lei Orgânica do Ministério Público da União), lhe atribui a promoção da ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho, para defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos.

No entanto, a atuação como órgão agente não se limita à esfera judicial, podendo, inclusive, jamais atingir esta fase, restringindo-se somente a uma atuação de natureza extrajudicial.

A notícia de lesão ou ameaça de lesão a direitos metaindividuais desencadeia a instauração de procedimento investigatório, para apuração da veracidade dos fatos denunciados, com vistas à atuação do Ministério Público do Trabalho.

O inquérito civil não é o único, mas é o principal instrumento investigatório do parquet, instituído pela Lei 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), com reconhecida inspiração no inquérito policial. Encontra-se, ainda, como visto, consagrado no artigo 129, inciso III, da Constituição Federal.

Antes do advento da Lei 7.347/85 (LACP), inexistia instrumento investigativo prévio e formalmente previsto em lei, que visasse à apuração da autoria e materialidade de lesão ou ameaça de lesão a direitos transindividuais.

Os artigos 8º e 9º da LACP instituíram o inquérito civil como procedimento de investigação de caráter administrativo, presidido por membro do Ministério Público, que se destina à coleta de elementos de convicção com vistas à identificação ou não de hipótese autorizadora da propositura de ação civil pública.

Não obstante a inspiração advinda do inquérito policial, o inquérito civil é presidido diretamente por membro do Ministério Público, estando sujeito a controle de arquivamento pela própria instituição ministerial.


Trata-se, pois, o inquérito civil de procedimento administrativo de natureza inquisitorial, presidido por membro do Ministério Público, que se destina à coleta de elementos de convicção, visando à apuração da autoria e da materialidade de lesão ou ameaça de lesão a direitos metaindividuais, com vistas à propositura de ação civil pública.

É instrumento de investigação exclusivo do Ministério Público (artigo 8º, parágrafo 1º, da LACP), não obstante a legitimidade concorrente e disjuntiva para ajuizamento da ação civil pública (artigo 5º da LACP).

Com fundamento no artigo 8º, incisos I a IX, da Lei Complementar 75/93, o membro do Ministério Público da União, no exercício de suas atribuições, poderá, nos procedimentos de sua competência:

“I — notificar testemunhas e requisitar sua condução coercitiva, no caso de ausência injustificada;

II — requisitar informações, exames, perícias e documentos de autoridades da administração pública direta ou indireta;

III — requisitar da administração pública serviços temporários de seus servidores e meios materiais necessários para a realização de atividades específicas;

IV — requisitar informações e documentos a entidades privadas;

V — realizar inspeções e diligências investigatórias;

VI — ter livre acesso a qualquer local público ou privado, respeitadas as normas constitucionais pertinentes à inviolabilidade do domicílio;

VII — expedir notificações e intimações necessárias aos procedimentos e inquéritos que instaurar;

VIII — ter acesso incondicional a qualquer banco de dados de caráter público ou relativo a serviço de relevância pública;

IX — requisitar o auxílio de força policial/”.

Após a fase instrutória do inquérito civil, se o membro do Ministério Público do Trabalho, depois de esgotadas todas as diligências, convencer-se acerca da inexistência de fundamento para a propositura de ação civil pública ou coletiva, promoverá o seu arquivamento (artigo 9º, caput, da LACP).

O arquivamento do inquérito civil ou das peças informativas se sujeita à homologação do Conselho Superior do Ministério Público do Trabalho. Na hipótese, os autos deverão ser encaminhados ao referido órgão colegiado no prazo de três dias, sob pena de se incorrer em falta grave (artigo 9º, parágrafo 1º, da LACP).

Condiciona-se ao controle de arquivamento não somente o inquérito civil, mas também qualquer outro procedimento investigatório preliminar e/ou peças de informação (ex: procedimentos preparatórios).

Até a apreciação da promoção de arquivamento em sessão do Conselho Superior do Ministério Público do Trabalho, qualquer interessado poderá apresentar razões escritas ou documentos, que serão juntados aos respectivos autos (artigo 9º, parágrafo 2º, da LACP).

Em não sendo homologada a promoção de arquivamento pelo Conselho Superior do Ministério Público do Trabalho, será designado outro órgão ministerial para o ajuizamento da ação civil pública (artigo 9º, parágrafo 4º, da LACP), ou prosseguimento das diligências investigatórias.

O membro do Ministério Público que for designado para propor a ação civil pública, ou prosseguir nas diligências investigatórias, não agirá por atribuições próprias, mas por delegação do colegiado, não podendo, desta forma, invocar a independência funcional para se furtar ao ajuizamento da referida ação ou ao prosseguimento da investigação.

Registre-se, por oportuno, que a Resolução 23/07 do Conselho Nacional do Ministério Público veio disciplinar a instauração e todo o trâmite do inquérito civil no âmbito dos Ministérios Públicos, regulamentando, inclusive, o instrumento investigatório do procedimento preparatório.

Frise-se, por oportuno, que a instauração do inquérito civil ou de qualquer outro procedimento investigatório não constitui pressuposto indispensável para que o Ministério Público compareça em juízo.

Neste sentido, a disposição contida no artigo 1°, parágrafo único, da Resolução 23/07 do CNMP, quando dispõe: “O inquérito civil não é condição de procedibilidade para o ajuizamento das ações a cargo do Ministério Público, nem para a realização das demais medidas de sua atribuição própria”.

Se o membro do Ministério Público do Trabalho, ao final do inquérito civil, concluir pela materialidade e autoria da lesão denunciada, poderá propor ao inquirido a celebração de Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta, nos exatos termos do parágrafo 6° do artigo 5° da Lei 7.345/85 (LACP), que dispõe in verbis: “Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial”.


Conforme o artigo 14 da Resolução 23/07 do CNMP, o Ministério Público poderá firmar compromisso de ajustamento de conduta, nos casos previstos em lei, com o responsável pela ameaça ou lesão aos interesses ou direitos mencionados no artigo 1º da referida Resolução, visando à reparação do dano, à adequação da conduta às exigências legais ou normativas e, ainda, à compensação e/ou à indenização pelos danos que não possam ser recuperados.

O Termo de Compromisso, a ser firmado perante qualquer dos órgãos públicos legitimados ao ajuizamento da ação civil pública, consiste em manifestação unilateral e espontânea de vontade do compromitente em adequar sua conduta aos preceitos legais e/ou constitucionais. Trata-se, como visto, de título executivo extrajudicial, nos moldes dos artigos 5°, parágrafo 6°, da LACP e 876, caput, da CLT.

A firmatura de Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta perante o Ministério Público do Trabalho acarreta o arquivamento do inquérito civil, sendo desnecessária a remessa dos autos ao Conselho Superior (Precedente 16 do CSMPT), dando início a um procedimento de acompanhamento do cumprimento do referido instrumento.

O descumprimento das obrigações consignadas no Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta importa o ajuizamento de ação de execução de título executivo extrajudicial, tendo por objeto não somente a multa cominatória fixada no referido instrumento, mas também, e principalmente, as próprias obrigações ali constantes.

A multa cominatória não possui a natureza jurídica de cláusula penal, mas de meio de coerção (astreintes), não sofrendo, desta forma, qualquer limitação correspondente ao valor da obrigação principal.

Se o inquirido não concordar com a celebração de Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta, o membro do Ministério Público promoverá o arquivamento do inquérito civil, para ajuizamento da ação civil pública ou coletiva.

Traçadas as diretrizes básicas da atuação do Ministério Público do Trabalho na promoção de interesses e na qualidade de órgão agente, passemos à exposição da natureza e das hipóteses da intervenção custos legis.

Atuação Custos Legis do Ministério Público do Trabalho

Na prática judiciária é comum referir às atividades do Ministério Público como órgão interveniente através da expressão “atuação custos legis”, ou seja, na condição de fiscal da lei.

No entanto, com a devida vênia, entendemos que o Ministério Público, em qualquer de suas formas de atuação, jamais se despe de sua função constitucionalmente assegurada de fiscal da lei. Isso porque, conforme já exposto, ao órgão ministerial cabe a defesa da ordem jurídica.

Assim sendo, ainda que esteja exercendo atribuições inerentes à promoção de interesses ou às atividades de órgão agente, o parquet se imbui do importante papel de fiscal da lei, não se admitindo que esta conotação se restrinja às hipóteses de intervenção judicial.

Com espeque no artigo 83, inciso II, da Lei Complementar 75/93, constitui atribuição do Ministério Público do Trabalho manifestar-se em qualquer fase do processo trabalhista, acolhendo solicitação do juiz ou por sua iniciativa, quando entender existente interesse público que justifique a sua intervenção.

O interesse público a que se reporta o dispositivo legal acima destacado é o interesse público primário, ou seja, aquele inerente à própria sociedade, não se confundindo com o interesse público secundário, ínsito ao administrador público, de índole pontual e momentânea.

E este interesse público primário a ser tutelado pelo Ministério Público do Trabalho, atraindo a sua intervenção judicial como fiscal da lei, pode decorrer da natureza da lide ou da qualidade da parte.

Quando o processo veicula demanda de índole coletiva, cuja pretensão vise à tutela de uma macro-lesão, com repercussão social; ou ainda, que vislumbre violação de direitos individuais indisponíveis (como: assédio moral, assédio sexual, revista íntima, trabalho escravo, entre outros), de caráter fundamental, o interesse público primário justificador da intervenção ministerial encontra fundamento na natureza da lide.

Por outro lado, este interesse público primário pode se verificar a partir de pessoa que mereça uma proteção especial do Estado. É o caso de processos caracterizados pela existência de interesses de menores e outros incapazes, índios, pessoas com deficiência física, idosos, etc..

Frise-se, ainda, que se o Ministério Público do Trabalho não for parte em ações de natureza coletiva, como a ação civil pública e a ação civil coletiva, este deve atuar obrigatoriamente como custos legis, nos exatos termos dos artigos 5°, parágrafo 1°, da Lei 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública) e 92 da Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor).


O artigo 75 da Lei 10.741/03, que dispõe sobre o Estatuto do Idoso, também preceitua que nos processos e procedimentos em que não for parte, atuará obrigatoriamente o Ministério Público na defesa dos direitos e interesses de que cuida a referida lei, hipóteses em que terá vista dos autos depois das partes, podendo juntar documentos, requerer diligências e produção de outras provas, usando os recursos cabíveis.

Por sua vez, o artigo 77 deste mesmo Estatuto estabelece que a falta de intervenção do Ministério Público acarreta a nulidade do feito, que será declarada de ofício pelo juiz ou a requerimento de qualquer interessado.

Com relação às pessoas portadoras de deficiência, o artigo 5° da Lei 7.853/89 dispõe que o Ministério Público intervirá obrigatoriamente nas ações públicas, coletivas ou individuais, em que se discutam interesses relacionados à deficiência das pessoas.

Já, no tocante à reclamação trabalhista ajuizada por menor de 18 (dezoito) anos de idade, não se pode jamais confundir a atuação do Ministério Público do Trabalho como curador, com vistas à integração de sua capacidade processual, quando da ausência de responsáveis legais, prevista no artigo 793 da CLT, com a atuação ministerial /custos legis/ em todo o processo que versar sobre interesses de incapazes, incluindo os menores.

Conforme preceitua o artigo 127, caput, da Constituição da República, o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

Ao disciplinar o exercício das atribuições do Ministério Público do Trabalho junto aos órgãos da Justiça do Trabalho, o artigo 83 da Lei Complementar 75/93 (Lei Orgânica do Ministério Público da União), em seus incisos II e V, dispõe in verbis:

“Art. 83. Compete ao Ministério Público do Trabalho o exercício das seguintes atribuições junto aos órgãos da Justiça do Trabalho:

……………………………………………………………………………..

II – manifestar-se em qualquer fase do processo trabalhista, acolhendo solicitação do juiz ou por sua iniciativa, quando entender existente interesse público que justifique a intervenção;

……………………………………………………………………………..

V – propor as ações necessárias à defesa dos direitos e interesses dos menores, incapazes e índios, decorrentes da relação de trabalho”;

O artigo 112 do mesmo diploma legal também dispõe:

“Art. 112. Os Procuradores do Trabalho serão designados para funcionar junto aos Tribunais Regionais do Trabalho e, na forma das leis processuais, nos litígios trabalhistas que envolvam, especialmente, interesses de menores e incapazes”.

O Código de Processo Civil, por sua vez, no artigo 82, inciso I, atribui ao Ministério Público a legitimidade para intervir nas causas em que há interesses de incapazes.

Entre as prerrogativas institucionais do parquet, quando da atuação na condição de fiscal da lei, o artigo 83, incisos I e II, do referido diploma processual civil acrescenta in litteris:

“Art. 83. Intervindo como fiscal da lei, o Ministério Público:

I – terá vista dos autos depois das partes, sendo intimado de todos os atos do processo;

II – poderá juntar documentos e certidões, produzir prova em audiência e requerer medidas ou diligências necessárias ao descobrimento da verdade”.

Como se ainda não bastasse, a Lei 8.069/90, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, estabelece, em seu artigo 202:

“Artigo 202. Nos processos e procedimentos em que não for parte, atuará obrigatoriamente o Ministério Público na defesa dos direitos e interesses de que cuida esta Lei, hipótese em que terá vista dos autos depois das partes, podendo juntar documentos e requerer diligências, usando os recursos cabíveis”.

Mais adiante, o artigo 204 do referido Estatuto preceitua que a falta de intervenção do Ministério Público acarreta a nulidade do feito, que será declarada de ofício pelo juiz ou a requerimento de qualquer interessado.

O artigo 246 do Código de Processo Civil também alerta que é nulo o processo, quando o Ministério Público não for intimado a acompanhar o feito em que deva intervir.

Assim sendo, a existência de representante legal dos menores, assistido por advogado regularmente constituído nos autos, não constitui óbice para que o Órgão Ministerial intervenha no processo, como fiscal da lei, na tutela dos interesses dos menores.

Cumpre ressaltar mais uma vez que o artigo 793 da CLT vem disciplinar a representação do menor de 18 anos para fins de ajuizamento de reclamação trabalhista, não afastando, portanto, a legitimidade do Ministério Público do Trabalho para atuar no feito na condição de fiscal da lei (custos legis).


Outra importante hipótese na qual o interesse público primário decorreria da qualidade da parte é a prevista no artigo 83, inciso XIII, da Lei Complementar 75/93, atribuindo ao Ministério Público do Trabalho a intervenção obrigatória em todos os feitos nos segundo e terceiro graus de jurisdição da Justiça do Trabalho, quando a parte for pessoa jurídica de Direito Público, Estado estrangeiro ou organismo internacional.

Registre-se que a obrigatoriedade da intervenção, neste caso, se restringe aos segundo e terceiro graus de jurisdição. No entanto, nada impede que a atuação do Ministério Público se faça presente a partir do primeiro grau de jurisdição, desde que a natureza da lide justifique a sua intervenção.

Quando a lei dispõe ser obrigatória a intervenção do Parquet, entendemos que o interesse público se presume existente, o que implicaria a emissão de parecer circunstanciado pelo respectivo membro ao qual tenha sido distribuído o feito.

Todavia, não é este o entendimento esposado na Orientação n° 04 da Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público do Trabalho, ao dispor que: “É possível interpretar sistematicamente o artigo 83, XIII, da LC 75/93, considerados os princípios da unidade e da independência funcional, visando atingir a máxima qualidade do parecer, no sentido de que a intervenção obrigatória diz respeito à remessa dos processos judiciais em que forem parte pessoa jurídica de direito público, Estado estrangeiro ou organismo internacional para a distribuição e exame da existência do interesse público que, uma vez verificado ensejará parecer obrigatório”.

Deste modo, de acordo com a orientação supramencionada, a intervenção obrigatória implica a necessária remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, ficando dentro da esfera da discricionariedade e da independência funcional do membro a verificação da existência ou não de interesse público que justifique a emissão de parecer circunstanciado.

As ações de competência originária dos tribunais trabalhistas também ensejam a intervenção custos legis do Ministério Público, como nos casos de mandado de segurança, ação rescisória, ação anulatória de cláusula de instrumento coletivo e dissídio coletivo.

De acordo com o artigo 83, inciso VII, da Lei Complementar 75/93, ao Ministério Público do Trabalho, cabe funcionar nas sessões dos Tribunais Trabalhistas (atuação interveniente), manifestando-se verbalmente sobre a matéria em debate, sempre que entender necessário, sendo-lhe assegurado o direito de vista dos processos em julgamento, podendo solicitar as requisições e diligências que julgar convenientes.

Na esfera coletiva, o inciso IX deste mesmo artigo assegura ao parquet “promover ou participar da instrução e conciliação em dissídios decorrentes da paralisação de serviços de qualquer natureza, oficiando obrigatoriamente nos processos, manifestando sua concordância ou discordância, em eventuais acordos firmados antes da homologação, resguardado o direito de recorrer em caso de violação à lei e à Constituição Federal”.

A ampliação da competência da Justiça do Trabalho promovida pela Emenda Constitucional 45/04 acarretou, por conseqüência, um acréscimo dos casos de intervenção custos legis do Ministério Público do Trabalho, notadamente em razão da natureza das respectivas lides.

Usualmente, está sendo uma realidade dos membros que atuam nos Núcleos de Atividade Interveniente da Procuradoria Regional do Trabalho da 1ª Região a intervenção em processos que tenham sido instaurados em razão de:

a) ações que envolvam exercício do direito de greve (CF/88, art. 114, II);

b) ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores (CF/88, art. 114, III);

c) mandados de segurança, Habeas Corpus e Habeas Data, quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição (CF/88, art. 114, IV);

d) ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho (CF/88, art. 114, VI);

e) ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho (CF/88, art. 114, VII);

A título ilustrativo, colacionamos abaixo a relação de hipóteses específicas de intervenção do Ministério Público do Trabalho, determinantes da remessa dos autos, para exame e manifestação, como “fiscal da lei”, em segundo grau de jurisdição, que vem sendo adotada pelos membros que atuam no respectivo núcleo da Procuradoria Regional do Trabalho da 1ª Região:

“RELAÇÃO DE HIPÓTESES ESPECÍFICAS DE INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO, DETERMINANTES DA REMESSA DOS AUTOS PARA EXAME E MANIFESTAÇÃO, COMO “FISCAL DA LEI” (permissivo legal: inciso II do artigo 83 da Lei Complementar n° 75/93, sem embargo do disposto no inciso XII do mesmo artigo, bem assim no inciso III do artigo 85 do Regimento Interno do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região)


1. Processos dos quais sejam partes pessoas jurídicas de Direito Público (inclusive fundações públicas e autarquias, mesmo as profissionalizantes, exceto a Ordem dos Advogados do Brasil (ADI 1.717-6-6-DF, em 7/11/02), Estados estrangeiros (inclusive Consulados) e organismos internacionais (Lei Complementar 75/93, artigo 83, inciso XIII);

2. Processos dos quais seja parte o Instituto Nacional do Seguro Social, ainda que na fase de execução (dispensada a remessa apenas daqueles em que a autarquia ou a própria União pretenda, como terceira interessada, preservar a incidência de contribuições previdenciárias sobre créditos judicialmente constituídos);

3. Processos que envolvam interesses de incapazes.

4. Processos em que se discuta a ocorrência de discriminação ou qualquer prática atentatória à dignidade da pessoa humana do trabalhador, quando o dano tiver projeção coletiva, assim entendido aquele que decorre de postura adotada pelo empregador em relação à generalidade dos empregados ou à parcela considerável destes (como, por exemplo, revistas íntimas);

5. Processos em que se discuta a ocorrência de discriminação ou de qualquer prática atentatória à dignidade de idosos, crianças, adolescentes ou pessoas com deficiência, quando a tais condições diretamente relacionadas (Lei 9.029/95; artigos 26 a 28, 75, 77 e 90 da Lei 10.741/03; artigo 5º da Lei 7.853/89; Lei 8.069/90; Lei 10.224/01; Lei 10.803/03);

6. Ações civis públicas ou ações civis coletivas, e respectivas ações cautelares, propostas por entidades sindicais (dispensada a remessa das ajuizadas pelo próprio Ministério Público do Trabalho, por força da interpretação, a contrário sensu, do parágrafo 1° do artigo 5° da Lei 7.347/85);

7. Processos em que sindicatos, federações ou confederações sindicais estejam promovendo, na condição de substitutos processuais, a defesa de direitos e/ou interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos, inclusive os relativos a ações de cumprimento de cláusulas de sentenças normativas, convenções coletivas ou acordos coletivos (dispensada a remessa de processos em que estejam reivindicando, com fulcro nos referidos instrumentos normativos, direitos dos quais elas mesmas sejam titulares, como, por exemplo, descontos assistenciais e contribuições confederativas);

8. Processos em que o Ministério Público tenha atuado em primeiro grau de jurisdição, agindo na defesa de interesses de incapazes;

9. Processos em que o Ministério Público tenha atuado como custos legis em primeiro grau de jurisdição, emitindo parecer ou interpondo recurso;

10. Processos dos quais sejam partes empresas públicas e sociedades de economia mista, porquanto integrantes da administração pública Indireta, nos quais se discutam as seguintes matérias:

a) Admissão sem concurso público, nulidade e conseqüências — artigo 37, inciso II e parágrafo 2°, da Constituição da República;

b) Efeitos da aposentadoria sobre o contrato de trabalho;

c) Equiparação salarial, isonomia ou reenquadramento, quando do reconhecimento do pretendido direito puder resultar alteração de cargo (ascensão funcional), em detrimento da exigência constitucional do concurso público, que o Supremo Tribunal Federal considera extensível a provimentos derivados [dispensada a remessa dos processos em que são postuladas meras promoções (sem alteração de cargo), independentemente de qual seja a fonte formal do suposto direito];

d) Pedido de reintegração ao emprego, seja qual for a causa de pedir;

e) Anistia, seja qual for a causa de pedir;

f) Teto salarial, em decorrência de normas constitucionais;

11. Processos dos quais seja parte a Infraero, além das hipóteses referidas no item 10, quando a União Federal já estiver intervindo como terceira interessada (art. 10 da Lei 5862, de 12/12/72, e art. 7º da Lei 9.469/97, c/c inciso XIII do art. 83 da LC 75/93);

12. Processos dos quais seja parte a Emgeprom, além das hipóteses referidas no item 10, quando a União Federal já estiver intervindo como terceira interessada (art. 12 da Lei 7.000/82 e art. 7º da Lei 9.469/97, c/c inciso XIII do artigo 83 da LC 75/93);

13. Processos dos quais seja parte a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) ou qualquer outra empresa pública, além das hipóteses referidas no item 10, sempre que for discutida em defesa, recurso ou contra-razões sua equiparação à Fazenda Pública (art. 12 do Decreto-Lei 509/69 e Precedente STF-Plenário, RE 220906/DF, de 16/11/2000);

14. Processos relativos a ações que envolvam o exercício do direito de greve, na forma do inciso II do artigo 114 da Constituição da República/88;

15. Processos relativos a ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores e entre sindicatos e empregadores, na forma do inciso III do artigo 114 da Constituição da República;

16. Outros processos em que o desembargador relator entenda deva solicitar o exame do Ministério Público para aferição do interesse público determinante, ou não, da intervenção”.

Por fim, quanto à legitimidade para interposição de recurso na esfera trabalhista, o artigo 83, inciso VI, da Lei Complementar 75/93 assegura ao Ministério Público do Trabalho legitimidade para recorrer das decisões da Justiça do Trabalho, quando entender necessário, tanto nos processos em que for parte, como naqueles em que oficiar como fiscal da lei, bem como pedir revisão dos enunciados da Súmula de Jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho.

Desta forma, na hipótese de a decisão (sentença ou acórdão) ter sido prolatada em desconformidade com a tese esposada pelo parquet em sua manifestação circunstanciada, a lei lhe assegurada legitimidade para recorrer, a fim de prossiga no mister de defensor da ordem jurídica e tutor do interesse público.

Conclusão

Esta sucinta e objetiva explanação procurou traçar as diretrizes básicas das principais formas de atuação do Ministério Público do Trabalho.

Não se buscou — o que seria até mesmo um tanto pretensioso — esgotar o estudo de todas as atribuições do parquet na esfera trabalhista, mas percorrer as atividades mais relevantes a serem exercidas junto aos órgãos da Justiça do Trabalho.

Após estas rápidas considerações, a conclusão a que se pode chegar é a de que sempre que estiver exercendo seu múnus< de guardião da ordem jurídica — seja na promoção de interesses, seja nas atividades de órgão agente ou interveniente —, o Ministério Público jamais se despirá da atribuição constitucional de fiscal da lei (CF/88, art. 127). Por sua vez, no tocante especificamente à atuação custos legis, é a tutela do interesse público primário que norteará a intervenção do órgão ministerial, cuja existência poderá advir da natureza da lide ou da qualidade da parte. Saliente-se, por oportuno, que este mesmo interesse público primário também restará tutelado nas atividades de promoção de interesses e de órgão agente, posto que o verdadeiro foco de toda atribuição ministerial é a tutela de bens jurídicos que concretizem valores caros à sociedade como um todo. Daí é que se pode afirmar, sem medo de errar, que Ministério Público forte é sinônimo de sociedade vigilante.

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