Compra de acordo

Abadia propõe entregar dinheiro em troca de extradição rápida

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16 de janeiro de 2008, 10h23

Alguém acusado de homicídios em outro país pode usufruir dos benefícios de um criminoso financeiro no Brasil? É essa a questão que o juiz Fausto Martin de Sanctis, da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, terá de definir nesta quarta-feira (16/1), no processo em que o megatraficante colombiano Juan Carlos Ramírez Abadia, oferece US$ 35 milhões (R$ 61 milhões) em troca de benefícios, como ser extradito para os Estados Unidos com brevidade, ou anulação da pena, ou transferência da sua mulher para outro presídio, entre diversas outras possibilidades.

O traficante quer ser extraditado para os EUA o mais rápido possível porque acha que pode até ser libertado com as informações e o dinheiro que tem para entregar as autoridades americanas. A proposta, de oferecer dinheiro em troca de benefícios, pode parecer moralmente reprovável, mas especialistas em crimes financeiros defendem que é possível a aplicação de penas financeiras.

Abadía é acusado, no Brasil, de lavagem de dinheiro e nesse tipo de crime não é raro a Justiça aceitar acordos com réus — a delação premiada. De acordo com reportagem do jornalista Mario César Carvalho, da Folha de S. Paulo, a negociação está prevista na lei de lavagem de dinheiro, de 1998. O artigo 5º diz que o juiz pode reduzir ou deixar de aplicar a pena se o acusado “colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais e de sua autoria ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime”.

A lei também estabelece multas. O doleiro Helio Laniado, por exemplo, fez acordo pelo qual aceitou entregar informações sobre os empresários para os quais fazia remessas ilegais e concordou em pagar cerca de R$ 3 milhões.

Ainda segundo a reportagem da Folha, é a primeira vez, porém, que um acusado apresenta uma proposta de reparação financeira — a regra é o juiz estabelecer a multa. Outra questão é que Abadía não é um mero criminoso financeiro. Apontado pelo DEA (a agência antidrogas dos EUA) como um dos maiores traficantes do mundo, dono de uma fortuna estimada pelos americanos em mais de US$ 1 bilhão, ele é acusado de ter ordenado a morte de 300 pessoas na Colômbia e 15 nos EUA.

No Brasil, porém, não há provas de que Abadía tenha traficado nem ordenado mortes. É essa questão que o juiz federal Fausto Martin de Sanctis terá de decidir: alguém acusado de homicídios em outro país pode usufruir dos benefícios de um criminoso financeiro no Brasil?

Abadía apresentou formalmente a proposta ao superintendente da Polícia Federal em São Paulo, Jaber Saad. A negociação é mantida em sigilo pela PF, pelo Ministério Público Federal e pela Justiça.

Desde que Abadía foi preso, em agosto, os policiais dizem ter certeza de que ele tinha mais dinheiro no Brasil do que havia declarado ter trazido da Colômbia — US$ 9 milhões. A comemoração por ter prendido um dos maiores traficantes do mundo foi seguida por um constrangimento: a PF não conseguiu localizar um centavo além dos cerca de R$ 4 milhões que Abadía apontou que estavam escondidos em Campinas.

Na semana foram levados a leilão partes do patrimônio imobiliário construído pelo traficante no país. Foram arrematados uma casa em Aldeia da Serra, na grande São Paulo, outra casa em Angrados Reis (RJ), três terrenos e uma fazenda em Guaíba(RS), e uma casa em Jurerê (SC) e um lote em Pouso Alegre (MG). No total foram arrecadados R$ 4,3 milhões.

A PF usou até um equipamento de raio X para radiografar as paredes da casa em que ele vivia. A busca nas paredes não é capricho. Abadía enterrou US$ 80 milhões em buracos na Colômbia.

O traficante colombiano está detido no Presídio de Segurança Máxima de Campo Grande (MS). Segundo reportagem da Agência Estado, Abadía foi levado para a sede da Superintendência da Polícia Federal de São Paulo, na Lapa, na zona oeste da cidade, na noite desta terça-feira (15/1). Abadía passou a noite na sede da PF. A decisão de extraditá-lo cabe ao Supremo Tribunal Federal, em Brasília. Abadía acredita que quanto mais rápido pisar em solo norte-americano, mais fácil será negociar uma redução de pena através da entrega de mais dinheiro.

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