Direito imobiliário

Contratos built to suit sob pontos de vista antagônicos

Autor

  • Marcio Adriani Tavares Pereira

    é advogado mestre em Direito Constitucional Econômico especialista em Direito Empresarial administrador com especializações em Direito Imobiliário Material e Processual Imobiliário Empresarial tributarista conferencista mediador quântico juiz arbitral e colunista em jornais e revistas.

7 de janeiro de 2008, 13h28

O contrato built to suit vem confirmar que o Direito é dinâmico, questionável e polêmico no tocante as obrigações e as características acentuadas quanto às causas e os efeitos das relações jurídicas entre as partes envolvidas.

Uma das insaciáveis forças vitais da humanidade consiste na manifestação de vontades. Ora, como estabelecer, constituir, criar, extinguir, modificar qualquer direito sem conflitar ou ao menos esbarrar nas garantias e interesses estabelecidos pelo próprio homem.

Cumpre ressaltar que a operação built to suit consiste no contrato de “locação” ou equivalente de longo prazo, em média 15 anos, para atender a construção nos moldes estruturados de acordo com as unidades operacionais de quem contratou. Elucidando ainda mais podemos afirmar que qualquer empresa ao invés de investir o seu capital comprando um imóvel ou investindo na construção, faz a opção pela encomenda da construção a termo, isto é, construção sob medida ou de acordo com suas necessidades.

Como é cediço com o passar do tempo e o devido cumprimento do contrato, pode acontecer que as circunstâncias fáticas se modifiquem de tal forma que acarrete onerosidade excessiva para uma das partes. Surgindo, nessa ocasião, a aplicabilidade da cláusula rebus sic stantibus eis que do seu significado decorre que as coisas permaneçam como no momento em que foi pactuado o negócio jurídico.

Imperioso mencionar que além dos requisitos preenchidos, a fonte primordial da aplicação da cláusula rebus sic stantibus e, por conseguinte, o reconhecimento da onerosidade excessiva decorre, praticamente dos princípios constitucionais da solidariedade e da dignidade da pessoa humana.

Por outro lado, não podemos olvidar dos juristas que apontam quatro principais requisitos necessários à aplicação da teoria da imprevisão: 1) o diferimento ou a sucessividade na execução do contrato; 2) alteração nas condições circunstanciais objetivas em relação ao momento da celebração do contrato; 3) excessivas onerosidade para uma parte contratante e vantagem para outra; 4) imprevisibilidade daquela alteração circunstancial. No entanto, acrescentamos a estes mais três pressupostos: 5) a imprevisão da alteração circunstancial; 6) o nexo causal entre a alteração circunstancial objetiva, a real onerosidade e a vantagem excessiva; 7) a inimputabilidade às partes pela mudança circunstancial.

Diante desta apresentação temos dois temas correlatos: pacta sunt servanda e rebus sic stantibus. Cumpre apontar a correlação, vez que a mesma ocorre em virtude das trilhas antagônicas, por levarem ao mesmo destino, que consiste na garantia de um fim juridicamente protegido ou, pelo menos, almejado.

O primeiro para preservar a autonomia da vontade, a liberdade de contratar e a segurança jurídica de que os instrumentos previstos no nosso ordenamento são confiáveis. O segundo para proteger o bem comum, o equilíbrio contratual, a igualdade entre as partes e a certeza de que o interesse particular não predominará sobre o social.

O princípio da força obrigatória (pacta…) é uma regra, cuja exceção tem merecido cada vez mais a atenção do jurista pátrio. Versa sobre a vinculação das partes ao contrato, como se norma legal fosse, tangenciando a imutabilidade.

Enquanto que a teoria da imprevisão (rebus…) constitui uma exceção, da qual a regra está a merecer mais observação do legislador. Contempla a possibilidade de que um pacto seja alterado, a despeito da obrigatoriedade, sempre que as circunstâncias que envolveram a sua formação não forem às mesmas no momento da execução, imprevisível e inimputavelmente, de modo a prejudicar uma parte em benefício da outra.

O respeitável leitor perceberá que a revisão contratual no contrato built to suit acaba tomando boa parte deste estudo, e versa sobre uma revisão diferenciada, vez ser um contrato diferenciado, alertando aos operadores do direito a linha tênue que separa o contrato de locação com o contrato built to suit, isto é, neste último temos um imóvel por encomenda, a construção é sob medida ou, por encomenda ou, a termo, versa sobre um contrato intuito personae em razão daquela pessoa diante a expectativa justa do desenvolvimento do imóvel para aquela empresa ,ou seja, um imóvel infungível.

Desta forma, o contrato built to suit na nossa singela visão consiste em um mix de locação de coisa, em que se faz a cessão temporária do uso e gozo de uma coisa contra o recebimento de um aluguel com a junção da respectiva empreitada sob encomenda, em que alguém se obriga a produzir uma determinada obra seja no terreno com ou sem construção, igualmente contra retribuição em dinheiro, com a finalidade do cumprimento das partes envolvidas de todas as cláusulas livremente pactuadas.

Pois bem, o tema invocado trata sobre dois institutos com forças antagônicas que possuem como escopo um destino, cada qual com o seu prisma, sendo que ao nosso ver fundamental é a interposição de um ponto de equilíbrio para a garantia e proteção de um fim almejado.

Percebe-se que ambos os princípios giram em torno do cumprimento do contrato; da necessidade de cumpri-lo incondicionalmente ou de, condicionalmente, alterá-lo.

Justamente por isso é que não é possível falar de pacta sunt servanda ou de rebus sic stantibus sem mencionar a revisão dos contratos. No entanto, quando nos depararmos diante do contrato built to suit a revisão deverá levar em conta o tipo do contrato, ou seja, trata-se de um contrato atípico, diante o investimento realizado pelo proprietário do imóvel na construção a termo ou sob medida, com a finalidade de atender as necessidades de quem pagará pelo espaço utilizado sem ter que despender de investimentos no imobilizado, ao revés aproveita todo esse volume de recursos financeiros para investir no seu próprio negócio alavancando melhores resultados para a empresa.

Assim sendo, neste tipo de contrato atípico a força obrigatória prevalece com certa sutileza perante a teoria da imprevisão, pois quando esta última for aplicada deverá levar em conta todos os fatores e a complexidade do negócio, levando-se em consideração a equação econômica que é o investimento condicionado ao retorno financeiro, decorrente no recebimento dos valores da remuneração por determinado prazo mínimo.

Entretanto, em muitos casos a equação econômica será o ponto de equilíbrio enquanto que a garantia e proteção do fim almejado será a multa estabelecida em comum acordo com os interesses das partes. Ora, como quebrar a essência de um pacto pré-acordado ignorando um contrato atípico não previsto em lei até o presente momento, bem como alguns elementos essenciais retro mencionados simplesmente aplicando a lei de locação a um contrato que não versa sobre uma simples locação?

Destarte, quando da aplicação da teoria da imprevisão versus a força obrigatória no contrato built to suit não esqueceremos dos principais requisitos necessários à aplicação da teoria em voga, incluindo para aplicação de uma definição equilibrada e justa os três pressupostos acrescidos, ou seja, 1) a imprevisão da alteração circunstancial; 2) o nexo causal entre a alteração circunstancial objetiva, a real onerosidade e a vantagem excessiva; 3) a inimputabilidade às partes pela mudança circunstancial.

Não menor é a importância da invocação perante os magistrados de que este contrato é atípico, lembrando-os da linha tênue que separa o mesmo da locação e, como corolário o tratamento diferenciado, vez que não temos legislação específica para o mesmo, porém respeitar-se-á a equação econômica intrínseca a esse instituto no qual a mesma é realizada com base nos investimentos a serem feitos e as partes celebram o contrato diante a transparência da relação comercial e o princípio da boa fé, não podendo invocar simplesmente uma revisão sem deixar comprovadamente todos os pressupostos da teoria da imprevisão supramencionados.

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