Carnaval no Rio

Juiz algemado só se identificou na delegacia, afirmam policiais

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19 de fevereiro de 2008, 21h26

Os três policiais que prenderam e algemaram o juiz federal Roberto Dantes Schuman de Paula, no dia 4 de fevereiro, no Rio de Janeiro, afirmaram, nesta terça-feira (19/2), que ele só se identificou como juiz na porta da delegacia. E não logo que foi abordado, como alegou o magistrado.

Christiano Carvalho Veiga Mouta, Marcelo Costa de Jesus e Bernadilson Ferreira de Castro, policiais da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core), foram ouvidos em audiência pelo juiz Marcello Granado, titular da 7ª Vara Federal Criminal do Rio. Os três policiais são processados por desacato e abuso de autoridade.

De acordo com os policiais, Schuman foi algemado porque estava “muito alterado” e os xingou. Questionados sobre o fato de não terem pedido a identificação de Schuman, mesmo quando estavam de posse de sua carteira, os policiais afirmaram que a orientação é para não abrir a carteira daqueles que abordam.

Mouta afirmou que a versão contada pelo juiz pode ser contestada por testemunhas e pelo GPS da viatura. Segundo o policial, o aparelho mostraria que o juiz não foi perseguido. “Ao final do processo, os senhores vão ter vergonha de ter esse juiz nos quadros da magistratura”, disse Mouta.

A próxima audiência está marcada para o dia 4 de março. O Ministério Público Federal solicitou ainda o registro do GPS da viatura para saber das paradas e informações sobre os processos administrativos instaurados na Corregedoria de Polícia.

A prisão de Schuman deflagrou uma mobilização classista que envolveu diversas entidades, como Associação dos Juízes Federais e OAB do Rio. Em ato de desagravo, no dia 13 de janeiro, as entidades classificaram a prisão como arbitrariedade policial. Para a Ajufe, o incidente não atinge apenas a pessoa do juiz, mas o sistema jurídico como um todo. Até o corregedor nacional de Justiça, ministro Cesar Asfor Rocha, criticou a prisão.

Na audiência, os policias contaram que Schuman estava no meio da rua, falando ao celular e com uma lata de cerveja na mão. O motorista da viatura, Marcelo Costa de Jesus, gritou: “sai da rua, vai acabar morrendo”. O juiz teria revidado, então, com xingamentos. Os policiais, então, desceram da viatura. Segundo eles, o juiz estava alterado e, por isso, foi dada voz de prisão. A única manifestação de Schumann teria sido a de que eles iriam se dar mal com a prisão.

Os policiais apontaram irregularidades no depoimento do juiz. De acordo com eles, o Termo de Depoimento de Schuman, feito na delegacia, fora digitado pelo próprio juiz, instruído de sua mãe, também juíza, e sem o acompanhamento de qualquer autoridade policial.

O juiz do caso, Marcello Granado, pediu que eles usassem os termos da conversa, mesmo que chulos. O juiz chegou a comentar que estranha o relato dos policiais sobre a abordagem de Schuman, que mais parecia abordagem da Polícia sueca. Para o juiz, o papel da Polícia não é dar “esporo”, mas de prender na forma da lei.

Os policiais tinham sido afastados de suas funções externas e tiveram suas armas retidas. O advogado deles, Rodrigo Roca, pediu a Granado que os policiais pudessem ter suas armas e carteiras funcionais de volta. O pedido foi aceito pelo juiz, que revogou em parte sua decisão anterior para determinar a devolução das armas, carteiras e distintivos por entender ser necessário para a segurança pessoal dos próprios policiais acusados. Os policiais continuarão a exercer funções administrativas.

O advogado afirmou que existe uma clara pressão da magistratura, que se sentiu ofendida. Ele questiona em um pedido de Habeas Corpus, no Tribunal Regional Federal da 2ª Região, a competência da Justiça Federal para o caso. A liminar foi negada. Roca estranhou ainda a agilidade do processo, que em menos de um mês depois da apresentação da denúncia pelo Ministério Público Federal, já está na fase de interrogatório. As promotoras que atuam no processo não quiseram se manifestar sobre o caso.

Durante o carnaval, Schuman foi levado até a 5ª Delegacia do Rio, onde foi ouvido e liberado em seguida. O juiz diz que os policiais agiram com abuso de poder. Já os agentes, por outro lado, o acusam de desacato. Segundo o representante da Ajufe na 2ª Região (Rio e Espírito Santo), Fernando Mattos, dois processos já foram abertos para apurar a prisão, um administrativo na Corregedoria-Geral Unificada e outro criminal, na Justiça Federal.

[Texto alterado para correção de informação às 0h15, de 20/2/2008]

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