Obstáculo necessário

Exame da Ordem é fundamental para exercício da advocacia

Autor

  • Manoel Leonilson Bezerra Rocha

    é advogado criminalista em Goiânia (GO) presidente do Instituto Bezerra Rocha de Estudos Criminais (IbreCrim) professor de Direito Penal e doutorando em Direito Penal pela Universidade de Burgos Espanha.

17 de fevereiro de 2008, 0h01

Um tema que vem ganhando acirrados debates é o da exigência do Exame de Ordem para o exercício da advocacia. Recentemente, a questão ganhou destaque em razão de uma decisão emanada de uma juíza federal no Rio de Janeiro que garantiu, em sede de liminar, a alguns bacharéis em Direito que pudessem exercer a advocacia independentemente da exigência feita pela Ordem dos Advogados do Brasil.

Se, por um lado há os que defendem o Exame de Ordem com veemência, por acreditarem que, apesar das falhas, é uma maneira de diminuir os males de uma infestação em larga escala de maus profissionais de formação duvidosa nos quadros da advocacia, por outro, há aqueles que sustentam que a exigência do Exame é uma ficção.

O argumento destes últimos tem ganhado força a partir da operação deflagrada pela Polícia Federal, denominada “passando a limpo” em Goiás e outros Estados que investigava um suposto esquema de venda de carteiras de advogado, sendo que aqui em Goiânia culminou com a vexatória e deprimente prisão de alguns membros da atual diretoria, por alegado envolvimento no esquema fraudulento.

De fato, este triste episódio feriu pungentemente a todos os que viam na Ordem dos Advogados do Brasil um dos últimos baluartes da ética e de lutas gloriosas como paradigmas para uma sociedade democrática e de salutar vigilância e fortalecimento das instituições públicas. Entretanto, como diz o adágio, não se deve sacrificar o paciente para se extrair o tumor.

Bem por isso, a Ordem dos Advogados do Brasil não deve ser aniquilada em razão da enfermidade que lhe causaram alguns inescrupulosos administradores que traíram a sociedade e a confiança dos milhares que os elegeram para bem representá-los. Se a administração vai mal, não é da instituição a culpa, não devendo esta ser sacrificada, mas, sim, passada a limpo.

Aos que se posicionam contra o Exame de Ordem com o pífio argumento de que o mesmo é falho e não é apto a avaliar o conhecimento dos bacharéis em Direito, pois, estes já foram devidamente preparados ao longo de cinco anos na faculdade, então, pergunta-se, por que temem tanto uma simples avaliação que os aprovaria ao exercício da advocacia? Geralmente, a maioria que critica o Exame de Ordem, só o faz após ser neste reprovado ou não ter sido feliz em alguma tentativa de ser aprovado em concurso público.

Alguns alegam que a exigência do Exame de Ordem é mera “reserva de mercado” e que tal exigência não ocorre em outros cursos. Ora, isso é uma inverdade mal intencionada ou absoluta falta de inteligência. O Médico estudou Medicina. O Engenheiro estudou Engenharia. O Administrador estudou Administração. O Psicólogo estudou Psicologia. Acaso o estudante de Direito estudou “advocacia”? Existe nas faculdades “curso de advocacia”? Por óbvio que não. O estudante de Direito, ao concluir o seu curso, torna-se, tão-somente, um Bacharel em Direito.

A partir daí ele vai iniciar uma nova etapa rumo à sua área de atuação dentre as tantas que se lhe são oferecidas, devendo, para tanto, ser submetido às exigências para a pretendida investidura. Se se pretende seguir carreira na Magistratura, no Ministério Público, Delegado de Polícia, etc., então terá de ser aprovado em concurso público. Se, por sua vez, optar pela militância na advocacia, fazer parte do quadro de advogados, na Ordem dos Advogados do Brasil, então terá que ser aprovado no Exame de Ordem. É simples!

A magistrada que concedeu a liminar assegurando aos recém-formados exercerem a advocacia sem o prévio Exame de Ordem, sob a alegação de que este certame não é apto a mensurar o conhecimento de ninguém e que os alunos já são presumidamente preparados, pois estudaram Direito durante cinco anos, deveria estender tal medida também ao Judiciário, ao Ministério Público, Procuradoria, Polícias.

Bastava utilizar-se dos mesmos argumentos e determinar que, caso se apresentasse um bacharel em Direito requerendo uma vaga de juiz, de promotor de justiça ou de delegado de polícia, deveria ser imediatamente nomeado, sem a exigência de concurso público pois os mesmos já estão devidamente preparados para tais funções, considerando que já passaram cinco anos estudando Direito nas centenas de faculdades que se inauguram quase que todos os dias no nosso país. Aliás, existem muitas comarcas nos diversos Estados da Federação sem juiz, sem promotor de justiça, sem delegado de policia. Entretanto, certamente advogados já existem muitos.

Essa sanha de extinguir o Exame de Ordem, por mais que venha travestida de um discurso aparentemente ingênuo, em verdade oculta em si um nefasto propósito de alcance e conseqüências imensuráveis. Serve aos interesses pequenos dos donos de cursos de Direito, verdadeiros comerciantes de diplomas que não sabem o que fazer com a enxurrada de “formados” que despejam semestralmente no mercado pessoas despreparadas, verdadeiras caricaturas de bacharéis, sem nenhum compromisso com o saber jurídico e sem consciência da sublime importância e responsabilidade do que é ser operador do Direito.

Serve à larga legião de alunos maus preparados que, inaptos para o exercício profissional em outras áreas (muitos dos que pretendem ingressar na OAB o fazem por saber que não têm preparo suficiente para enfrentar a grande concorrência no serviço público) migram em fileiras para a Ordem dos Advogados como se esta tão importante instituição devesse se transformar, de repente, em um refúgio de estultos e aventureiros incompetentes. Não deve ser transformada em asilo de frustrados.

O discurso contra o Exame de Ordem também interessa aos saudosistas do regime antidemocrático, os viúvos da ditadura, que desejam ver a advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil enfraquecidas e inoperantes, sem força e desacreditadas. Esse afã é embalado por muitos integrantes do Judiciário, do Ministério Público e, principalmente, por muitos integrantes das forças policiais (civil e militar), que sonham com o poder absoluto a fim de que os seus desmandos e megalomanias não sejam contestados, fiscalizados e denunciados por uma instituição ou uma classe, como a advocacia, de forma independente e austera.

Que se arruínem as instituições públicas, tornando-as desacreditadas. Que declarem a falência ética da classe política. Que os mercenários sofistas banalizem o ensino jurídico com a complacência de políticos inescrupulosos. Todavia, resguardemos contra todas essas bestialidades a Ordem dos Advogados do Brasil. Pois, somente ela, revestida do espírito aguerrido e de intocável credibilidade, será capaz de reerguer e restaurar, das ruínas, as instituições que sucumbiram, para o fortalecimento da sociedade e de cada cidadão, com a preservação dos ideais de justiça e dos valores fundamentais em um estado democrático de direito.

A história tem sido testemunha (aliás, a OAB se confunde com a própria história do Brasil) da importância e da imprescindibilidade da Ordem dos Advogados do Brasil para a nossa sociedade, legado do seu glorioso histórico de lutas e conquistas.

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    é advogado criminalista em Goiânia (GO), presidente do Instituto Bezerra Rocha de Estudos Criminais (IbreCrim), professor de Direito Penal e doutorando em Direito Penal pela Universidade de Burgos, Espanha.

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