Veredicto supremo

Legalidade da greve de advogados públicos será julgada pelo STF

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12 de fevereiro de 2008, 9h45

Caberá ao Supremo Tribunal Federal decidir sobre as penalidades que os advogados públicos poderão sofrer por causa da greve da categoria, iniciada em 17 de janeiro. A decisão foi tomada pelo ministro Raphael de Barros Monteiro Filho, presidente do Superior Tribunal de Justiça. O ministro considerou que há fundamento constitucional na ação principal porque o que está em jogo é o direito de greve dos servidores públicos.

A União entrou no STJ para tentar reverter uma liminar obtida pela Associação Nacional dos Membros das Carreiras da Advocacia Geral da União (Anajur). A entidade conseguiu, junto ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, uma liminar que impede a União de adotar qualquer medida disciplinar, de retaliação ou represália, contra os associados que aderiram ao movimento grevista. A proibição incluiu o corte de ponto com efeitos pecuniários, suspensão ou desconto de vencimentos e inscrições em fichas funcionais, sem o devido processo legal.

Uma outra ação coletiva foi ajuizada na 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Rio Grande do Sul, que declinou da competência e remeteu os autos ao Juízo da 16ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal. No Distrito Federal, a greve foi considerada ilegal. Na região sul do país, a greve foi considerada legal pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Contra essa decisão, a Advocacia-Geral da União recorreu ao Superior Tribunal de Justiça. Com a decisão do ministro presidente do STJ, a legalidade da greve será decidida pelo Supremo Tribunal Federal.

Como já publicou a revista Consultor Jurídico, caberia ao Superior Tribunal de Justiça julgar a greve dos advogados da União. Foi assim que definiu o Supremo Tribunal Federal quando decidiu pelo mesmo tratamento entre trabalhadores privados e públicos em caso de greve. No julgamento, os ministros também decidiram qual esfera da Justiça é competente para julgar a legalidade da greve.

Segundo a decisão do STF, se a greve do funcionalismo for local, a competência é da segunda instância. Quando a greve acontece em mais de um estado, é o Superior Tribunal de Justiça quem resolve o dissídio. Neste caso, o STJ afirmou que o que está em discussão são direitos constitucionais e, por isso, é o STF que terá de colocar um ponto final no imbróglio.

SLS 823

SUSPENSÃO DE LIMINAR E DE SENTENÇA Nº 823 – RS (2008/0027956-4)

REQUERENTE: UNIÃO

REQUERIDO: DESEMBARGADOR FEDERAL RELATOR DO AGRAVO DE INSTRUMENTO NR 200804000021609 DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4A REGIÃO

INTERES.: ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MEMBROS DAS CARREIRAS DA ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO – ANAJUR E OUTROS

ADVOGADO: ROGÉRIO VIOLA COELHO E OUTRO(S)

DECISÃO

Vistos, etc.

1. “Associação Nacional dos Membros das Careiras da Advocacia Geral da União – ANAJUR” e Outros ajuizaram ação ordinária coletiva, com pedido de antecipação de tutela, contra a União Federal, objetivando a determinação de que a União, “por seus agentes, abstenha-se da adoção de qualquer medida disciplinar e (ou) sancionatória ou de retaliação ou de represália contra os associados dos Autores que aderiram ao movimento de paralisação em curso desde 17.01.2008 (inclusive corte de ponto com efeitos pecuniários, suspensão ou descontos de vencimentos, inscrições em assentamentos funcionais etc.), sem a observância dos pressupostos materiais, a prévia caracterização da suposta ilegalidade do movimento grevista e o respeito à prévia cominação de sanção em lei, ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa”.

Alegaram os autores que a deflagração do movimento paredista ocorreu em virtude de descumprimento, por parte do Governo Federal, do compromisso firmado como a categoria no sentido de promover a recomposição salarial dos integrantes da carreira da Advocacia Pública Federal. Afirmaram também que não obstante as reiteradas comunicações de alerta acerca da possibilidade de paralisação dos trabalhos por parte da categoria, o Governo permaneceu inerte e alheio aos seus apelos. Asseveraram ainda que o ingresso no movimento grevista ocorreu conforme o regramento legal vigente, pois em perfeita harmonia com a recente decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, ao tratar da matéria em sede de mandado de injunção.

Aduziram mais que a greve dos advogados públicos, decidida em deliberações coletivas da categoria, é um instrumento legítimo e adequado, que visa a assegurar direitos e garantidas fundamentais, ainda que a Constituição Federal, em seu art. 37, VII, estabeleça a necessidade de regulamentação para o seu exercício. Por fim, defenderam que, em havendo qualquer pretensão de sancionamento, devem ser, previamente, observados os princípios constitucionais do devido processo legal, contraditório e ampla defesa, previstos também na legislação infraconstitucional (Lei n. 9.784/99, art. 3º, III; e Lei n. 8.112/90, art. 143 e seguintes).

A MMª Juíza da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Rio Grande do Sul declinou da competência, determinando a remessa dos autos ao Juízo da 16ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, dada a existência de conexão. Interposto agravo de instrumento, o em. Desembargador Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no eventual impedimento do Relator, reconheceu a competência do Juízo a quo e deferiu a antecipação da tutela, nos termos em que requerida na ação coletiva.

Daí este pedido de suspensão formulado pela União, com fulcro no art. 4º da Lei n. 4.348/64 e art. 4º da Lei n. 8.437/92, sob alegação de incompetência do Juízo Federal do Rio Grande do Sul, uma vez que as associações representativas dos interesses da categoria em questão têm sede nesta Capital, bem como pela ocorrência de conexão com a ação cominatória de obrigação de fazer e não fazer cumulada com ação condenatória por ela proposta, em tramitação no Juízo da 16ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, com idêntica causa de pedir, a saber, deflagração do movimento grevista da categoria dos Procuradores Federais, Procuradores Federais da Previdência Social, Advogados da União, Procuradores da Fazenda, Defensores Públicos e Procuradores do Banco Central.

Por outro lado, sustenta a ocorrência de grave lesão à ordem e à economia públicas, por ofensa à ordem administrativa em geral e, especificamente, à ordem jurídica, e ainda pela possibilidade de perda de prazos judiciais, acarretando irreversível prejuízo à Fazenda Pública. Defende a legalidade do desconto dos dias não trabalhados pelos servidores grevistas, sendo dispensável o processo administrativo para tal fim. Aduz também que a decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal relativamente à aplicação da Lei n. 7.783/89 para os servidores públicos é delimitada aos casos concretos versados nos Mandados de Injunção 670/ES, 708/DF e 712/PA, que não se estende à greve em questão. Afirma ainda que não houve fixação de prazo para a implementação do acordo salarial firmado, em 0/11/2007, com as entidades de classe, devendo ser analisado um prazo razoável para a sua efetivação.

2. De acordo com os arts. 4º da Lei nº 8.437/92 e 25 da Lei nº 8.038/90, a competência desta Presidência para a suspensão de execução de liminar nas ações movidas contra o Poder Público restringe-se àquelas causas que não tenham por fundamento matéria constitucional, hipótese em que o pedido de suspensão deve ser ajuizado perante a Corte Suprema.

Em decisão lançada na SS nº 2.918/SP (DJ de 25/5/2006), a Exma. Srª Presidente do Supremo Tribunal Federal, Minitra Ellen Gracie, ao examinar a matéria de natureza competencial, evocou o seguinte precedente da Suprema Corte: “para a determinação de competência do Tribunal, o que se tem de levar em conta, até segunda ordem, é – segundo se extrai, mutatis mutandis, do art. 25 da Lei nº 8.038/90 – o fundamento da impetração; se este é de hierarquia infraconstitucional, presume-se que, da procedência do pedido, não surgirá questão constitucional de modo a propiciar recurso extraordinário” (RCL nº 543, relator Ministro Sepúlveda Pertence, Pleno, DJ 29/9/95).

A contrario sensu, se a ação principal possui fundamento constitucional, a competência é do Supremo Tribunal Federal, ao qual eventualmente caberá apreciar o recurso extraordinário. In casu, a causa de pedir, na ação coletiva, ostenta índole constitucional, pois envolve questão relativa ao direito de greve dos servidores públicos, tendo como parâmetro recentes decisões proferidas pela Suprema Corte, a exemplo do MI 670/ES, cujo acórdão encontra-se pendente de publicação, além da aplicação dos princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa.

Havendo concorrência de matéria constitucional e infraconstitucional, o entendimento desta Corte é no sentido de que ocorre a vis atrativa da competência do em. Ministro Presidente do Supremo Tribunal Federal, sendo “irrelevante que o acórdão contenha fundamentos constitucional e infraconstitucional” (AgRg na Pet nº 1.310/AL, relator Ministro Paulo Costa Leite). No mesmo sentido, confiram-se a SS nº 1.024/SP, relator Ministro Paulo Costa Leite, e a SS nº 1.602, relator Ministro Edson Vidigal, entre outros.

3. Ante o exposto, nego seguimento ao pedido, determinando a remessa dos autos ao colendo Supremo Tribunal Federal.

Publique-se. Intimem-se.

Brasília, 11 de fevereiro de 2008.

MINISTRO BARROS MONTEIRO

Presidente

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