Atleta trabalhador

Como o Direito do Trabalho é contemplado na área esportiva

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21 de agosto de 2008, 0h00

Antes de tudo vamos acabar com o mito chamado Direito Desportivo, esclarecendo porque não foi utilizado o tão badalado termo, mas sim Direito do Trabalho aplicado à Área Esportiva.

O termo não foi utilizado porque a expressão Direito Desportivo diz respeito a matéria completamente diferente daquela em questão e daquela usualmente tratada como tal.

O Direito Desportivo é aquele previsto no Código de Justiça Desportiva ou no Código Brasileiro de Futebol, que regulam os acontecimentos exclusivamente no âmbito desportivo, tais como a suspensão automática de jogador de futebol expulso em determinada partida; a perda do mando de campo do clube que na observar a segurança da torcida, jogadores, árbitros e demais envolvidos no espetáculo; a punição a atleta que compete sob efeito de substâncias estimulantes, etc. As demais questões dizem respeito a cada uma das áreas do Direito (se é que se pode falar assim, pois não sendo uma ciência estanque, as diversas áreas se interligam) aplicada ao âmbito desportivo.

Tanto é verdade que o Direito Desportivo diz respeito “às regras do jogo” que o artigo 50 da Lei 9.615/98 limitou a competência da Justiça Desportiva ao processo e julgamento das infrações disciplinares e às competições desportivas.

Nessa linha, temos o Direito do Trabalho aplicado ao Âmbito Desportivo, quando serão analisadas, por exemplo, as relações dos atletas profissionais de futebol com os clubes aos quais prestam serviços; o Direito Tributário aplicado ao Âmbito Desportivo, no qual, por exemplo, se discutem as questões tributárias incidentes sobre os pagamentos feitos a atletas de futebol e às empresas por eles criadas para gerenciar suas imagens; Direito Penal aplicado ao Âmbito Desportivo, quando, por exemplo, se apreciará questões ligadas a lesões corporais praticadas durante disputas esportivas não decorrentes do jogo propriamente dito (lembremos o caso do jogador argentino, Desabato, que foi parar na delegacia por, supostamente, ter ofendido o jogador Grafite, com palavras racistas, somente não vindo a ser processado criminalmente porque o brasileiro optou por não dar continuidade ao caso), Direito Civil aplicado ao Âmbito Desportivo, em situações em que, por exemplo, um torcedor se sente prejudicado porque comprou o ingresso para um determinado jogo e não pode entrar no estádio, por falta de organização do clube e busca indenização por danos morais e materiais, e assim sucessivamente.

Portanto, o primeiro mito a ser desfeito no caso é a denominação de Especialistas em Direito Desportivo àqueles profissionais o Direito que atuam em nome de atletas e/ou entidades de prática desportiva. Esse profissionais são advogados especialistas em Direito Penal, do Trabalho, Tributário, Civil, etc., podendo apenas ser chamados de Especialistas em Direito Desportivo aqueles que cuidam dos interesses dessas mesmas partes (atletas e/ou entidades de prática desportiva) exclusivamente no âmbito desportivo, junto aos Tribunais mantidos pelas Confederações de prática desportiva, tais como os Tribunais de Justiça Desportiva (TJD) das Federações Estaduais de Futebol, o Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) da Confederação Brasileira de Futebol.

Desfeito esse primeiro mito, vamos analisar outras questões que vemos costumeiramente nos jornais, acerca da matéria tratada nesse artigo.

Várias vezes temos notícia de que um determinado jogador de futebol acionou seu clube na Justiça do Trabalho buscando a rescisão contratual (e assim ter liberdade para procurar qualquer outro clube para jogar) e a respectiva multa por rescisão, sob a alegação de atraso no pagamento de salário, disfarçado em direito de imagem. Pois bem, desse caso várias lições podem ser extraídas.

A primeira delas é de que, com todo respeito a posicionamentos conflitantes com o ora exposto, diferentemente do que vem sendo usualmente decidido e propalado, não é incontestável que o chamado “direito de imagem” se constitui em salário disfarçado.

A Justiça tem decidido que o “direto de imagem“ é, na verdade, salário porque os clubes celebram esses contratos com empresas de propriedade dos atletas, mas jamais se utilizam da imagem dos mesmos, o que leva o Poder Judiciário a decretar a fraude (artigo 9º da CLT), visto que o objetivo de tais contratações é apenas minimizar os encargos incidentes sobre os pagamentos (os clubes pagam valores menos a título de recolhimento previdenciário e o atleta se beneficia com alíquotas de Imposto de Renda bem inferiores àquelas incidentes sobre os salários).

Contudo, se os clubes, efetivamente explorarem a imagem do atleta, o contrato de direito de imagem será lícito, não podendo, a nosso ver, ser decretada fraude e, conseqüentemente, não se poderá afirmar que o direito de imagem seria salário disfarçado.

Por exemplo, o clube que pretende atrair novos sócios para a instituição se utiliza da imagem de seu jogador, através de “outdoor” ou propagandas de televisão, conclamando os torcedores a se associarem ao clube (aumentando, com isso a receita social da instituição); ou então o clube, que pretende aumentar a venda de camisas oficiais do time, faz propaganda com o atleta para que as vendas se aqueçam; o clube pretende vender camarotes em seu estádio e utiliza-se dos jogadores do elenco para fazer a propaganda, etc.

Feito isso, efetivamente haverá a exploração da imagem do atleta, sendo, em nosso entendimento, absolutamente lícita a celebração de contrato de exploração do direito de imagem, que não poderá ser considerado salário, com todas as implicações que este reconhecimento traz.

Outra situação a ser analisada, desse vez sob a ótica do atleta, é o pedido de reconhecimento de que o direito de imagem se constitui em salário, pois se esse reconhecimento se verificar, o próprio atleta sofrerá graves conseqüências de ordem financeira.

Ora, recebendo o direito de imagem através de contrato de natureza civil celebrado entre o clube e uma empresa da qual o atleta é titular, esses valores recebidos serão tributados como pagamentos feitos a pessoas jurídicas, com alíquotas de Imposto de Renda, por exemplo, bem menores que aquelas incidentes sobre a remuneração das pessoas físicas. Porém, se o próprio atleta afirma que esse “direito de imagem” se constitui salário, dá margem a que a Receita Federal exija dele o pagamento do Imposto de Renda de Pessoa Física, em alíquota muito superior àquela utilizada para pagamento, além de juros, correção monetária e multa por recolhimento em atraso, sendo certo que não caberá ao atleta qualquer defesa, pois ele mesmo confessou se tratar de salário ao pedir o reconhecimento judicial dessa natureza jurídica à parcela.

Com isso, muitas vezes, o benefícios financeiros que terá com a rescisão de seu contrato com o clube poderá ser infinitamente inferior ao valor que terá que recolher aos cofres públicos, por conta de impostos atrasados.

Como é sabido, a multa contratual é proporcional ao tempo que falta para o término do contrato (artigos 28, parágrafo 4º e 31, parágrafo 3º da Lei 9.615/98 – Lei Pelé), assim, se o pedido de rescisão for feito já perto do final do contrato, a multa a ser recebida não será muito alta, porém, o recolhimento dos impostos atrasados deverão ser realizados por toda a vigência do contrato e, com certeza, apresentará valor financeiro elevado, muito superior à multa a ser recebida.

Portanto, o atleta deve pensar duas vezes antes de embarcar nessa onda e ver se no final das contas o prejuízo não será superior ao lucro.

Outra questão usualmente pelos atletas para pedir a rescisão do contrato se baseia em não recolhimento de FGTS por parte do clube.

Pois bem a legislação autoriza esse pedido desde que haja “mora contumaz” nos depósitos do FGTS (artigo 31, parágrafo 2º da Lei 9.615/98).

Nessas condições, a Justiça pode entender que havendo atraso até superior a três meses, mas que não seja contumaz, porque verificado apenas uma vez, não se verifica a tipificação legal autorizadora da rescisão contratual. Esse fato se verificou perante o Tribunal Superior do Trabalho, em julgamento da ação movida por Márcio Santos contra o Santos Futebol Clube.

Em casos como este (o que não ocorreu no exemplo citado acima) pode não ser reconhecido, como já dito, a justa causa para que o atleta postule a rescisão contratual, contudo, se o mesmo deixar de comparecer ao clube, pode ser reconhecido o abandono de emprego e, conseqüentemente a justa causa para que o clube considera rescindido o contrato do atleta e cobre dele a multa devida pela rescisão contratual. Ou seja, além de “não levar” o que queria, ainda terá de pagar indenização ao clube. Outro cuidado, pois, que se deve ter antes de promover ação judicial.

Aqui estão algumas questões a serem pensadas, principalmente antes de serem tomadas medidas judiciais, pois o “feitiço pode virar contra o feiticeiro”.

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