Celeridade judicial

Edição de súmula é alternativa para melhorar o Judiciário

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19 de agosto de 2008, 18h39

Razões históricas explicam o funcionamento do nosso sistema judicial incompatível com as necessidades da população. A tradição patrimonialista do nosso desenvolvimento histórico e as injustiças sociais que nos envergonham não poderiam deixar de afetar a prestação dos serviços judiciais.

Não seria razoável esperar que, num país em que a população não recebe serviços de qualidade de saúde e educação, a Justiça estivesse ao alcance e satisfazendo a todos.

É óbvia a necessidade de ampliação da quantidade e qualidade dos serviços públicos no Brasil. Não é diferente no que diz respeito à prestação jurisdicional. Não se pode esperar que a solução do problema venha somente quando o país se tornar definitivamente justo e democrático. Enquanto isso não ocorre e não temos a Justiça dos nossos sonhos, algo há de ser feito, com as limitações que a complexidade do problema maior impõe.

Não há dúvida de que a lentidão é um dos mais graves problemas da Justiça no Brasil. Uma de suas causas é o excesso de processos que se acumulam nos tribunais superiores. Os tribunais não podem processar a enorme quantidade de ações que a eles são direcionadas. As decisões que encerram as demandas não podem sempre ser tomadas pelos tribunais superiores, numa repetição irracional de julgamentos individuais. A adoção de meios alternativos para a solução de conflitos é um dos caminhos a serem perseguidos.

A implementação de política de redução do número de processos deve levar em conta a necessidade de garantir o direito de defesa das pessoas e o atendimento do princípio segundo o qual as decisões podem sempre ser objeto de revisão superior. O sistema de recursos judiciais não existe para permitir a protelação sem fim dos processos na Justiça.

Há que considerar ainda a concentração de processos envolvendo interesses das grandes corporações privadas e do setor público. A solução definitiva passa pela implementação de políticas de desestímulo de recurso ao Judiciário e de sua utilização predatória. Enquanto os nossos tribunais estiverem congestionados, não terão tempo adequado para tratar das questões relevantes nem lhes sobrará estrutura para se tornarem acessíveis a toda a população.

É inegável que a emenda 45 e as leis processuais aprovadas após a sua promulgação em 2005 trouxeram modificações na estrutura do Judiciário. Essas alterações legislativas, aliadas às iniciativas de modernização e informatização da atividade jurisdicional, têm trazido benefícios para o Judiciário nas suas diversas estruturas.

Recentemente, observamos avanços no Supremo Tribunal Federal.

Balanço apresentado pelo presidente Gilmar Mendes demonstra a reversão de tendência histórica de crescimento anual do número de processos protocolados (20 mil em 1990, 50 mil em 2000 e 100 mil em 2007), sinalizando números mais aceitáveis em 2008: verificou-se neste primeiro semestre a redução de 39% do número de processos distribuídos entre os ministros e a queda em 10% da quantidade de ações ajuizadas diretamente no tribunal (comparação 2008/2007).

Esses resultados são creditados à implementação de medidas administrativas e de instrumentos criados pela emenda 45, como a súmula vinculante (obrigatoriedade de que determinada orientação do STF seja seguida pelos juízes das instâncias inferiores) e a repercussão geral (mecanismo que exige a comprovação de que determinada ação envolva questão relevante para que seja apreciada pelo Supremo).

Os efeitos da edição das primeiras dez súmulas e da aplicação da repercussão geral a 73 temas constitucionais já podem ser sentidos e apontam perspectivas auspiciosas.

Alguns dos efeitos preconizados com a reforma começam a ser percebidos no STF e demonstram o acerto da percepção de que a emenda 45 significou o início de um processo que precisa ser continuado.

Para isso, é necessário que todos os agentes do sistema do Judiciário, especialmente o Conselho Nacional de Justiça e as direções dos tribunais do país, enfrentem o problema com a prioridade que ele merece. O Supremo, que, historicamente, tem sido um fator de estabilidade institucional importante para o país, também nesse caso tem nos dado um belo exemplo.

Artigo originalmente publicado pelo jornal Folha de S. Paulo nesta terça-feira (19/8)

Autores

  • é advogado, subchefe para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República, e ex-secretário da Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça.

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