Direção segura

Lei Seca deve derrubar custo do seguro de carro, mas não já

Autor

17 de agosto de 2008, 0h00

O dinheiro que o motorista gasta a mais com táxi depois de beber sua cervejinha de fim de tarde poderá voltar ao seu bolso na forma de uma redução no custo do seguro de carro. Especialistas ouvidos pela revista Consultor Jurídico admitem que a queda de até 39% nas estatísticas de acidentes de trânsito, ocorrida após a entrada em vigor da Lei Seca (Lei 11.705/2008) deve provocar uma redução no custo do seguro de carro.

A boa notícia vem acompanhada de outra nem tanto: a redução dos preços dos prêmios do seguro não devem ocorrer imediatamente. Os especialistas divergem sobre o prazo que se terá de esperar, mas concordam que isso só vai acontecer depois que se consolidar a cultura de que beber e dirigir são atividades incompatíveis.

O presidente do Sindicato dos Corretores de Seguros de São Paulo (Sincor-SP), Leôncio de Arruda, explica que o preço do seguro de carro tem relação direta com as estatísticas dos sinistros. Se o número de ocorrências cai, a tendência é que o custo do seguro também caia, favorecendo o consumidor. O corretor, no entanto, prefere a cautela para falar em prazos para que isso aconteça.

“A redução poderá chegar a até 20%, com variações entre as companhias”, explica Arruda, para quem a concorrência impedira que as companhias de seguro retenham para si todo o impacto da diminuição dos acidentes. “Por outro lado, o cálculo precisa ser feito de forma cuidadosa, com aprovação dos acionistas e técnicos atuariais”, explica.

Diminuir o valor do seguro, segundo Arruda, passa por dados estatísticos mais consistentes, com indicativos de freqüência, periodicidade e região do acidente; para que se possa verificar a realidade da tendência. Hoje, os acidentes violentos de veículos têm um impacto de entre 20 e 25% no valor do prêmio do seguro.

O diretor de Automotivos da HDI Seguros, Eduardo Dal Ri, faz coro ao que afirma o presidente do Sincor-SP, e prevê que os reflexos da redução de acidentes provocados pela Lei Seca podem demorar até cinco anos.

“A curto prazo não influencia. Os cálculos de seguro levam em conta experiências recentes conjuntamente com histórico de até cinco anos. Na prática, só teremos impacto nos preços de seguro a partir de 2009, isto se for constatada a redução nos acidentes de trânsito e no número de mortes”, acredita Dal Ri, que não arrisca percentuais de redução.

O presidente do Sincor-SP se disse convencido de que a lei terá sua constitucionalidade ratificada pelo Supremo Tribunal FederaL. Arruda não atribui a redução no número de acidentes ao aumento da fiscalização. “Há quem diga que se a fiscalização diminuir os índices de acidentes poderiam voltar aos níveis anteriores à lei. Mas não acredito que isso ocorra. Na minha opinião a Lei pegou”, afirmou.

Eduardo Dal Ri espera que aconteça com a Lei Seca o mesmo que aconteceu, há alguns anos com a obrigatoriedade do uso do cinto de segurança. Pressionados pela fiscalização intensa e induzido pela maciça propaganda, os brasileiros acabaram se convencendo das vantagens do uso do equipamento.

No caso do duo álcool e direção, Dal Ri considera que as mudanças de cultura propostas são de mais difícil implementação. “A questão do álcool é mais difícil de ser controlada e implica em um conflito com outra ‘cultura’ de beber e dirigir. O uso do cinto não conflita com nada e, além disso, é passível de fiscalização visual, diferentemente do teor alcoólico”.

O engenheiro de tráfego Sergio Ejzenberg entende que cabe à sociedade e às autoridades fazerem uma marcação cerrada em torno da aplicação da Lei 11.705/2008. Ele afirma que o efeito imediato da Lei Seca no campo securitário será o fortalecimento do argumento das seguradoras que se negam a pagar indenização quando o veículo assegurado se envolve num acidente estando com o motorista embriagado.

“A embriaguez, até a Lei Seca surgir na vida e estrelar na mídia, era um estado praticamente considerado normal pela sociedade e, agora, a tendência é que isso se reverta. O maior peso negativo da embriaguez deve ajudar a sustentar as negativas de pagamento de indenização”, explica Ejzenberg.

O engenheiro de tráfego lembra que o rodízio de veículos em São Paulo, por exemplo, inicialmente implicou na redução de veículos em circulação e no aumento do consumo de transportadores profissionais (táxi, transporte coletivo, etc.). “No entanto, para fugir do rodízio, segmentos da sociedade que normalmente tinham um só veículo, passaram a ter dois ou mais, com finais de placa diferentes, para continuar circulando na cidade”.

O engenheiro Sergio Ejzenberg cita que legislações com o mesmo teor da Lei 11.705/2008 já são realidade em países do Norte e Leste europeu, onde beber e assumir o volante era uma atividade enraizada da população. “Na Ucrânia, por exemplo, uma das leis de trânsito mais respeitadas é a que proíbe o consumo de álcool pelos condutores”, sublinha.

O trânsito da Lei no STF

A Lei Seca determina penalidades para os motoristas que dirigirem depois de ingerir qualquer quantidade de álcool. Além disso, impede a venda de bebidas alcoólicas em rodovias federais e tipifica como crime dirigir um veículo sob efeito de mais de 0,6 decigramas de álcool por litro de sangue.

Em 4 de julho, a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) ingressou com uma a Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a lei sustentando que a norma prejudica a lucratividade dos estabelecimentos que vendem bebidas alcoólicas e os empregos gerados diretamente pelo setor.

Alega ainda que o texto contém conteúdo abusivo e inconstitucional, que atenta contra as garantias e as liberdades individuais, principalmente ao dizer que qualquer concentração de álcool no sangue sujeita o condutor a penalidades.

Por sua vez, o presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, determinou no dia 7 de julho que a ADI fosse julgada em definitivo pelo Plenário da Corte, sem análise do pedido de liminar.

Em 24 de julho, parecer da Advocacia-Geral da União sinalizou que a Lei 11.705/08 possui temos “plenamente adequados” e recomendou que o STF declare a sua constitucionalidade. Dentre os argumentos, indica que só nas estradas federais, os acidentes de trânsito foram reduzidos em 39%. Resta ainda o parecer da Procuradoria-Geral da República.

A votação no Plenário do STF ainda não tem data para acontecer.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!