Mundo das escutas

No Brasil, um juiz autoriza, em média, 20 grampos por ano

Autor

24 de abril de 2008, 19h00

Em 2007, foram autorizadas pela Justiça 409 mil escutas telefônicas. Como há no país cerca de 17 mil juízes na primeira e segunda instâncias e nos tribunais superiores, pode-se concluir que em média, cada magistrado deu cerca de 20 autorizações.

Os números são teóricos. Na prática, nem todos os 17 mil juízes podem autorizar grampos. Pela lei, só podem autorizar grampos os juízes criminais em casos de crimes passíveis de punição com reclusão. Ou seja, o número de grampos por juiz é bem maior. O balanço foi feito nesta quinta-feira (24/4) pelo Conselho Superior de Direito da Fecomercio, em São Paulo. A pergunta levantada pelos conselheiros é quanto disso realmente virou ação penal.

O advogado Ives Gandra da Silva Martins, presidente do conselho, acredita que nem 10%, tamanha a banalização das escutas. “Duvido que tenham surgido 40 mil processos das escutas.” Isso significa que mais de 360 mil interceptações feitas não tiveram conseqüências jurídicas. Gandra lamenta que, no Brasil, o que era exceção virou a regra e a regra virou exceção.

Pela Constituição Federal, o grampo de conversas telefônicas é exceção. Pela Lei das Escutas (Lei 9.296/96), só pode ser autorizado em último caso, quando há fortes indícios e por um prazo limitado — 60 dias. Não é o que acontece hoje. Basta observar as operações da Polícia Federal que ganham os holofotes da imprensa. Todas são baseadas em grampos telefônicos, muitas vezes expostos nas páginas dos jornais e nas telas de televisão. “O mais grave é que é invadida a privacidade de pessoas que nada têm a ver com a que está sendo investigado”, lamenta Gandra.

O advogado reconhece que os juízes autorizam o grampo em grande parte por pressão da imprensa e da sociedade. “Os juízes estão preparados quando se tratada de conhecimento jurídico. No entanto, grande parte é muito jovem. Não tem vivência.” Ele considera que, para suportar a pressão da sociedade e não mandar grampear a torto e a direito, é preciso muito personalidade. Não só. É preciso correr o risco de ser acusado de favorecer o réu e se submeter a uma possível armação para incriminá-lo.

O Conselho Superior de Direito da Fecomercio pretende preparar um texto técnico dizendo quando e como é possível autorizar uma escuta telefônica. Os conselheiros combinaram que o material pode ser divulgado para a sociedade ajudar a pressionar o Congresso Nacional para transformar em lei as regras. Para o conselho, a política dos grampos aterroriza não só as autoridades, como também o cidadão comum.

Em março, o governo federal apresentou um anteprojeto de lei com novas regras para as escutas. A idéia é limitar as gravações a até 360 dias, salvo exceções, e destruir o material dois meses depois do seu uso, para evitar vazamento das conversas e seu uso para outros fins, como chantagens comerciais.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!