Direito de pai

TRT paulista reconhece auxílio-creche para homem

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20 de abril de 2008, 0h01

O Hospital Ana Costa, de Santos (SP), terá que repor 20% do salário de um ex-funcionário a título de auxílio-creche. A decisão foi tomada pela 9ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região no dia 24 de março. Os juízes seguiram voto da relatora, Jane Granzoto Torres da Silva, no sentido de que a norma coletiva assinada entre empregadores e sindicato da categoria não faz qualquer distinção quando ao gênero do funcionário.

O acordo diz que o trabalhador, com filho de menos de seis anos, tem direito a adicional de 20% se a empresa não tem creche. Na norma da categoria está escrito: “as empresas que não possuírem creches próprias pagarão aos seus empregados um auxílio-creche equivalente a 20% (vinte por cento) do salário normativo, por mês e por filho, até seis anos de idade”. A 4ª Vara do Trabalho de Santos também havia reconhecido o direito do trabalhador.

Para a juíza, como o trabalhador preenche os dois requisitos (tem filho e a empresa não tem creche), não se pode alegar que, por ser homem, ele não está impedido de receber o direito. “Cumpre salientar que, além de o texto normativo não estabelecer o auxílio-creche somente para os empregados do sexo feminino, a argumentação da recorrente, nesse particular, contém traços discriminatórios, diante do teor do artigo 5º, I, da Constituição Federal”, anota Jane Granzoto.

Outro argumento usado pela juíza é que na sociedade contemporânea os núcleos familiares são formados por homens e mulheres em igualdade de condições sociais e profissionais. Segundo Jane, “institutos como o auxílio-creche, os afastamentos decorrentes de nascimento e adoção de filhos e tantos outros, visam acima de tudo o bem estar da criança, como beneficiário direto, independentemente de quem o perceba indiretamente — pai ou mãe”.

O hospital reclamava também de que o empregado trabalhava no período noturno. Para a juíza, isso não faz a mínima diferença já que não há na norma qualquer referência ao horário de trabalho. “Seria tratamento desigual para com aqueles trabalhadores que desenvolvem atividades em período noturno e por vezes igualmente necessitam dos cuidados de terceiros para seus filhos”, afirma Jane.

Cláusula restritiva

Em 2005, no entanto, a 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho entendeu que é válida cláusula de acordo que restringe o auxílio-creche às mães e pais solteiros que tenham a guarda dos filhos. O Tribunal Regional do Trabalho 22ª Região (Piauí) havia considerado discriminatório a exclusão do benefício para os demais homens da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos.

A ofensa ao princípio da igualdade foi rebatida pelos ministros do TST diante do reconhecimento de que a Constituição admite exceções. O ministro Ives Gandra Filho (relator) entendeu na oportunidade que não havia ofensa ao princípio da igualdade. Ele citou como exemplo a diferenciação feita pela Constituição ao prever a aposentadoria para as mulheres com menos idade e tempo de contribuição.

Leia decisão

Processo Nº 01463200644402009 (20070677900)

Recurso Ordinário

Recorrentes: Hospital Ana Costa S/A e Luiz Ricardo Alves Gusmão

Recorridos: Os Mesmos

Origem: 4ª Vara do Trabalho/Santos

Ementa: Auxílio-creche previsto em norma coletiva para todos os empregados. Devido aos trabalhadores do sexo masculino.

Estabelecer o auxílio-creche somente para os empregados do sexo feminino, contém traços discriminatórios, diante do teor do artigo 5º, I, da Constituição Federal, sobretudo na sociedade contemporânea, onde os núcleos familiares são formados por homens e mulheres, em igualdade de condições sociais e profissionais. Ademais, institutos como o auxílio-creche, os afastamentos decorrentes de nascimento e adoção de filhos e tantos outros, visam acima de tudo o bem estar da criança, como beneficiário direto, independentemente de quem o perceba indiretamente — pai ou mãe.

Inconformada com a r. decisão de fls. 172/178, complementada a fl. 187, cujo relatório adoto e que julgou procedente em parte a ação, recorre ordinariamente a reclamada às fls. 189/194, insurgindo-se contra a condenação em auxílio-creche, sustentando ser tal benefício previsto apenas para as empregadas, na condição de mães, visando compensar a dupla jornada, bem como a ausência de comprovação da necessidade, considerado o trabalho do autor em período noturno.

Também irresignado com a r. decisão de primeiro grau, recorre adesivamente o reclamante às fls. 206/210, atacando o indeferimento das pretensões relativas às multas normativas e às diferenças de FGTS. Pugna, ainda, pela concessão dos benefícios da justiça gratuita.

Contra-razões apresentadas às fls. 199/204 e 215/220.

Depósito recursal e custas processuais comprovados às fls. 195/197.

É o relatório.

VOTO

JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

Conheço dos recursos interpostos, por presentes os pressupostos de admissibilidade, exceto do tópico exposto no recurso adesivo do autor, relativo à concessão dos benefícios da justiça gratuita, por ausência de lesividade, porquanto não foi o demandante condenado ao pagamento de qualquer despesa processual.

Não conheço do documento juntado a fl. 205, eis que não caracterizadas quaisquer das hipóteses previstas na súmula 08, do C. TST.

RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA

Estabelecem as normas coletivas juntadas com a exordial, em todas as suas versões:

As empresas que não possuírem creches próprias, pagarão aos seus empregados um auxílio-creche equivalente a 20% (vinte por cento) do salário normativo, por mês e por filho, até seis anos de idade.

Vê-se, pois, que os requisitos estabelecidos pelo instrumento normativo para a concessão do benefício aos empregados são:

— ausência de creche própria pela empresa; e

— possuir o empregado filhos até seis anos de idade.

Nesse contexto, os demais requisitos citados pela recorrente em suas razões, por não fixados na norma coletiva, não podem ser considerados como impeditivos do direito do empregado.

Cumpre salientar que, além de o texto normativo não estabelecer o auxílio-creche somente para os empregados do sexo feminino, a argumentação da recorrente, nesse particular, contém traços discriminatórios, diante do teor do artigo 5º, I, da Constituição Federal, sobretudo na sociedade contemporânea, onde os núcleos familiares são formados por homens e mulheres, em igualdade de condições sociais e profissionais. Ademais, institutos como o auxílio-creche, os afastamentos decorrentes de nascimento e adoção de filhos e tantos outros, visam acima de tudo o bem estar da criança, como beneficiário direto, independentemente de quem o perceba indiretamente — pai ou mãe.

Por outro lado, também a norma coletiva não limitou a concessão do auxílio-creche aos empregados que cumprem horário diurno. Do contrário, seria tratamento desigual para com aqueles trabalhadores que desenvolvem atividades em período noturno e por vezes igualmente necessitam dos cuidados de terceiros para seus filhos.

De ser aqui lembrado: onde a norma não distingue, não cabe ao intérprete fazê-lo.

Derradeiramente, as normas coletivas juntadas aos autos não condicionam a concessão do benefício à comprovação pelo empregado, da existência de filhos, junto ao seu empregador. Ao contrário, em sendo estipulação normativa, é a empresa responsável objetivamente pelo seu fiel e integral cumprimento.

Mantenho.

RECURSO ADESIVO DO RECLAMANTE

1) Das diferenças de FGTS

A alegação do recorrente no sentido de que os documentos juntados aos autos comprovam a inexistência de depósitos do FGTS relativos aos meses de dezembro/03, janeiro/04, fevereiro/04, março/04, abril/2004, junho/04 e julho/04, é inverídica.

De fato, os extratos trazidos com a exordial apontam ausência de alguns depósitos. Mas o simples exame dos mesmos denuncia que estão incompletos, o que os invalida até mesmo como indício de prova.

Ao contrário, os documentos juntados pela ré em volume apartado (nºs 196/146) demonstram à saciedade a integralidade dos depósitos mensais, não tendo o autor indicado nos autos quaisquer diferenças ou irregularidades em seu favor.

Nada a ser reformado.

2) Das multas normativas

Efetivamente houve descumprimento de cláusulas normativas pela reclamada, no tocante à concessão do auxílio-creche, o que foi inclusive reconhecido pela MM. Vara de Origem (fl. 177). Assim, as multas previstas nos instrumentos juntados com a exordial, observadas as respectivas vigências.

Modifico.

Isto posto, conheço dos recursos interpostos, exceto do tópico exposto no recurso adesivo do autor, relativo à concessão dos benefícios da justiça gratuita e, no mérito NEGO PROVIMENTO ao apelo da ré e DOU PROVIMENTO PARCIAL ao recurso do reclamante, para acrescer à condenação as multas normativas postuladas na exordial, em razão do descumprimento das cláusulas concernentes ao auxílio-creche. No mais, mantenho a r. decisão de primeiro grau em todos os seus termos, inclusive no tocante ao valor da condenação.

JANE GRANZOTO TORRES DA SILVA

Desembargadora Relatora

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