Segurança da Justiça

Ameaça a juízes também é ameaça para a democracia

Autor

  • Fernando Mattos

    é juiz mestre em Direito Público pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro e vice-presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil na 2ª Região e juiz federal em Vitória (ES).

11 de abril de 2008, 14h09

Os crimes julgados pela Justiça Federal, especialmente a partir da segunda metade dos anos 90, passaram a ser, em sua maioria, aqueles praticados por organizações criminosas, com ramificação internacional. São crimes de corrupção sistêmica em todas as esferas do Poder Público, municipal, estadual e federal, tráfico ilícito de drogas, armas e pessoas e de lavagem de dinheiro.

Sensível a essa mudança, o Parlamento cuidou de aprimorar os instrumentos normativos destinados ao combate à criminalidade organizada. Editou-se, até mesmo, lei que confere ampla proteção não apenas às vítimas e testemunhas como igualmente aos próprios acusados, incentivando-os a colaborar nas investigações.

A Justiça Federal, igualmente, por meio do Conselho da Justiça Federal, aperfeiçoou a sua estrutura administrativa, com a especialização de varas para julgar os crimes de lavagem de dinheiro e os praticados por organizações criminosas. Fez mais: estabeleceu programação científica de qualificação dos juízes federais para a prestação desse serviço.

Em razão da sofisticação do combate à macrocriminalidade e da atuação contundente e eficiente da Justiça Federal, vários juízes federais — que estão na linha de frente deste embate entre as forças criminosas e o Estado —, vêm sendo vítimas de ameaças e atentados, já se multiplicando por todas as regiões do país os casos de colegas que têm necessidade de proteção permanente da Polícia Federal, com a vida colocada constantemente em perigo.

Apenas para citar alguns, há juízes federais sob proteção da polícia nos Estados do Rio de Janeiro, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Alagoas e Paraná, sendo que neste último o carro que transportava o magistrado foi alvejado por diversos tiros há menos de um mês.

Segurança dos juízes não é só assunto dos juízes. Pretender que os juízes sejam independentes para julgar não interessa apenas aos próprios julgadores. Interessa à democracia. Sem garantias de que pode exercer sua função sem pressões, o Judiciário não terá como cumprir suas funções indispensáveis ao próprio Estado Democrático de Direito.

Neste contexto, há urgência na aprovação do Projeto de Lei 2.057/2007, que está pronto para discussão na Comissão de Segurança da Câmara dos Deputados, tendo já recebido parecer favorável do relator, deputado Laerte Bessa (PMDB/DF). O projeto traz inovações importantíssimas, prevendo um conjunto de medidas legislativas e administrativas para a proteção dos juízes em situação de risco, como a instituição do julgamento colegiado em primeira instância, a fim de pulverizar a visibilidade do juiz que processa e condena organização criminosa, o controle de acesso de pessoas nos foros, a instalação de detectores de metais, policiamento ostensivo e a criação de órgão estratégico para elaborar e executar plano de segurança — o que inclui a definição do modo de atendimento do juiz, em regime de plantão, nos casos de urgência.

A idéia é que esse órgão estratégico crie um sistema inteligente que tenha a capacidade de identificar as situações de risco, com a conseqüente recomendação da adoção das medidas preventivas específicas para os casos, no sentido de dar a devida proteção e segurança não apenas ao juiz como igualmente aos seus familiares, preservando, assim, a sua independência funcional no exercício da atividade jurisdicional.

Se ontem a atuação da Justiça Federal foi decisiva na luta contra a ditadura política, sendo incompleta a história da redemocratização do país sem menção ao papel desenvolvido pela magistratura federal, hoje os juízes federais se apresentam como os agentes da hora no combate à ditadura das organizações criminosas, tão perniciosa ao direito de liberdade do cidadão quanto aquela.

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    é juiz, mestre em Direito Público pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro e vice-presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil na 2ª Região e juiz federal em Vitória (ES).

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