Ônus da coragem

STF manda União descontar dias parados de advogados públicos

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9 de abril de 2008, 8h21

O governo federal deve descontar os dias parados dos salários dos advogados públicos e auditores fiscais em greve por dois motivos: o primeiro é que as greves em questão são ilegais; o segundo é que não compete à primeira instância examinar paralisações em mais de um estado.

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, decidiu da mesma forma nos dois casos (auditores e advogados), na noite desta terça-feira (8/4), ao examinar recurso da União contra decisão da Justiça Federal gaúcha, que atendera pedido feito pela Unafisco (entidade sindical dos auditores) e pelas entidades dos advogados públicos. Os advogados da União estão parados desde 17 de janeiro; os auditores fiscais, desde 18 de março.

Os advogados públicos resolveram parar em retaliação por um acordo de reajuste salarial que o governo suspendeu sob alegação de que a redução de receitas com a rejeição da CPMF pelo Congresso impede a concessão do aumento.

A 4ª Vara Federal de Porto Alegre havia determinado à União que se abstivesse de adotar “qualquer medida disciplinar ou sancionatória, inclusive de proceder a desconto salarial relativo aos dias não trabalhados, além de atos de retaliação ou de represália” contra os associados da Unafisco, já que os advogados da União haviam sido beneficiados com a mesma ordem. O TRF da 4ª Região manteve a decisão. O STJ remeteu a questão para o STF, por entender que se tratava de matéria da alçada do tribunal.

A relatoria da matéria é da incumbência da presidência do STF, mas foi assumida por Gilmar Mendes que, além de ex-advogado-geral da União, foi quem formulou a tese jurídica recente de que os servidores públicos devem obedecer a Lei de Greve da iniciativa privada (Lei 7.783/89) enquanto o Congresso permanecer omisso em relação ao setor público.

Com base na lei, o ministro afirmou que “na suspensão do contrato de trabalho não há falar propriamente em prestação de serviços, nem tampouco no pagamento de salários. Como regra geral, portanto, os salários dos dias de paralisação não deverão ser pagos, salvo no caso em que a greve tenha sido provocada justamente por atraso no pagamento ou por outras situações excepcionais que justifiquem o afastamento da premissa da suspensão do contrato de trabalho”.

O ministro detectou “a ocorrência de grave lesão à ordem pública, em sua acepção administrativa, ante o fato de que a continuidade do movimento paredista em comento gerará danos à fiscalização do cumprimento das obrigações tributárias, à arrecadação de tributos e ao comércio exterior, bem como ao combate à sonegação e ao contrabando, o que certamente causará prejuízos, em última análise, à economia nacional como um todo”.

A União argumentou que a greve dos auditores fiscais da Receita Federal produz prejuízos incalculáveis para a administração tributária e para o país. Na questão da competência, o ministro reproduziu a decisão do tribunal do ano passado, quando se definiu que as greves de servidores municipais, estaduais e federais serão julgadas pela justiça local quando a greve for local; e pelo STJ quando se tratar de paralisação em mais de um estado. Os TJs cuidam das greves municipais e estaduais e os TRFs das greves de servidores federais no estado.

Leia as decisões de Gilmar Mendes

SUSPENSÃO DE TUTELA ANTECIPADA 229-8 RIO GRANDE DO SUL

RELATORA: MINISTRA PRESIDENTE

REQUERENTE(S): UNIÃO

ADVOGADO(A/S): ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

REQUERIDO(A/S): PRESIDENTE DO TRIBUNAL REGIONAL

FEDERAL DA 4ª REGIÃO (SUSPENSÃO DE EXECUÇÃO DE LIMINAR Nº 2008.04.00.009130-2)

INTERESSADO(A/S): SINDICATO NACIONAL DOS AUDITORES FISCAIS DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL – UNAFISCO SINDICAL

ADVOGADO(A/S): PRISCILLA MEDEIROS DE ARAUJO BACCILE

DECISÃO: A União, com fundamento nos arts. 297 do RISTF, 25 da Lei 8.038/90, 4º da Lei 8.437/92 e 1º da Lei 9.494/97, requer a suspensão dos efeitos da decisão proferida pelo Juízo da 4ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado do Rio Grande do Sul nos autos da Ação Ordinária 2008.71.00.006757-2, mantida em agravo de instrumento (Agravo de Instrumento 2008.04.00.009024-3/RS, fls. 50-52) e em suspensão (Suspensão de Execução de Liminar 2008.04.00.009130-2/RS, fls. 53-54).

A decisão ora impugnada deferiu, com fundamento nos julgamentos dos Mandados de Injunção 670/ES, 708/DF e 712/PA, o pedido de antecipação da tutela formulado pelo Unafisco Sindical para determinar que a União se abstenha de adotar qualquer medida disciplinar ou sancionatória, inclusive de proceder a desconto salarial relativo aos dias não trabalhados, além de atos de retaliação ou de represália, contra os seus associados que aderiram ao movimento de paralisação em curso desde 18 de março de 2008. A requerente sustenta, em síntese:


a) incompetência do Juízo Federal do Rio Grande do Sul, nos termos do art. 109, § 2º, da Constituição da República, dado que a referida entidade representativa tem sede e foro na Capital Federal;

b) o direito de greve dos servidores públicos somente poderá ser exercido, em sua plenitude, com a edição da norma legal prevista no art. 37, VII, da Constituição da República;

c) ausência de comprovação do cumprimento dos requisitos mínimos exigidos pela Lei 7.783/89 para a deflagração do movimento grevista;

d) ocorrência de grave lesão à ordem pública, considerada em termos de ordem administrativa, pois “a atividade desempenhada pelos profissionais em greve compreende a fiscalização do cumprimento das obrigações tributárias, a arrecadação de tributos e o controle aduaneiro de comércio exterior, além de outras atividades” (fl. 18). Ademais, a “atuação dos Auditores Fiscais é imprescindível para o combate à sonegação e ao contrabando” (fl. 18);

e) “a greve dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil tem o efeito de gerar prejuízos incalculáveis, que não serão mitigados com o eventual cumprimento, por parte dos grevistas, dos artigos 9º ao 11 da Lei nº 7.783, de 1989. Em outros termos, a observância do percentual mínimo de 30% estabelecido pela jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) para a prestação dos serviços essenciais não afastará as perdas e danos para a administração tributária e para o País” (fl. 18);

f) “o reflexo que será ocasionado apenas no âmbito das Delegacias de Julgamento, mesmo que respeitado o contingente mínimo de 30%: no período de um mês, verificar-se-á uma perda de 72.000 horas de trabalho no julgamento de processos fiscais” (fls. 18-19).

Inicialmente, reconheço que a controvérsia instaurada na ação principal e no agravo de instrumento referidos evidencia a existência de matéria constitucional: arts. 37, VII, e 109, § 2º, da Constituição da República. Dessa forma, cumpre ter presente que a Presidência do Supremo Tribunal Federal dispõe de competência para examinar questão cujo fundamento jurídico tem natureza constitucional, conforme firme jurisprudência desta Corte, destacando-se os seguintes julgados: Rcl 497-AgR/RS, rel. Min. Carlos Velloso, Plenário, DJ 06.4.2001; SS 2.187AgR/SC, rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 21.10.2003; e SS 2.465/SC, rel. Min. Nelson Jobim, DJ 20.10.2004. O art. 4º da Lei 8.437/92, c/c o art. 1º da Lei 9.494/97, autoriza o deferimento do pedido de suspensão da execução da tutela antecipada concedida nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas.

Conforme autoriza a jurisprudência pacificada do Supremo Tribunal Federal, quando da análise do pedido de suspensão de decisão (SS 846-AgR/DF, rel. Ministro Sepúlveda Pertence, DJ 29.5.96; SS 1.272-AgR/RJ, rel. Ministro Carlos Velloso, DJ 18.5.2001, dentre outros), permite-se o proferimento de um juízo mínimo de delibação a respeito da questão jurídica deduzida na ação principal.

Verifico que se encontra devidamente demonstrada a ocorrência de grave lesão à ordem pública, em sua acepção administrativa, ante o fato de que a continuidade do movimento paredista em comento gerará danos à fiscalização do cumprimento das obrigações tributárias, à arrecadação de tributos e ao comércio exterior, bem como ao combate à sonegação e ao contrabando, o que certamente causará prejuízos, em última análise, à economia nacional como um todo.

No presente caso, poderá haver o denominado “efeito multiplicador” (SS 1.836-AgR/RJ, rel. Min. Carlos Velloso, Plenário, unânime, DJ 11.10.2001), diante da existência de outras categorias de servidores públicos federais em situação potencialmente idêntica àquela dos associados da entidade autora, que se sentirão incentivados a deflagrar movimentos grevistas com o objetivo de reivindicar reajustes salariais. Em voto proferido no julgamento do Mandado de Injunção n° 708/DF, de minha relatoria, restou asseverado o seguinte:

“No mérito, acolho a pretensão tão-somente no sentido de que se aplique a Lei nº 7.783/1989 enquanto a omissão não for devidamente regulamentada por lei específica para os servidores públicos. Nesse particular, ressalto ainda que, em razão dos imperativos da continuidade dos serviços públicos, não estou a afastar que, de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto e mediante solicitação de órgão competente, seja facultado ao juízo competente impor a observância a regime de greve mais severo em razão de tratar-se de “serviços ou atividades essenciais”, nos termos dos já mencionados arts. 9o a 11 da Lei nº 7.783/1989.


Creio que essa complementação na parte dispositiva de meu voto é indispensável porque, na linha do raciocínio desenvolvido, não se pode deixar de cogitar dos riscos decorrentes das possibilidades de que a regulação dos serviços públicos que tenham características afins a esses “serviços ou atividades essenciais” seja menos severa que a disciplina dispensada aos serviços privados ditos “essenciais”.

Isto é, mesmo provisoriamente, há de se considerar, ao menos, idêntica conformação legislativa quanto ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade que, se não atendidas, coloquem “em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população” (Lei no 7.783/1989, parágrafo único, art. 11).

(…)

Assim, sob pena de injustificada e inadmissível negativa de prestação jurisdicional nos âmbitos federal, estadual e municipal, é necessário que, na decisão deste MI, fixemos os parâmetros institucionais e constitucionais de definição de competência, provisória e ampliativa, para a apreciação de dissídios de greve instaurados entre o Poder Público e os servidores com vínculo estatutário.

Nesse particular, assim como argumentei com relação à Lei Geral de Greve, creio ser necessário e adequado que fixemos balizas procedimentais mínimas para a apreciação e julgamento dessas demandas coletivas. A esse respeito, no plano procedimental, vislumbro que é recomendável a aplicação da Lei nº 7.701/1988 (que cuida da especialização das turmas dos tribunais do trabalho em processos coletivos), no que tange à competência para apreciar e julgar eventuais conflitos judiciais referentes à greve de servidores públicos que sejam suscitados até o momento de colmatação legislativa da lacuna ora declarada.

Ao desenvolver mecanismos para a apreciação dessa proposta constitucional para a omissão legislativa, creio não ser possível argumentar pela impossibilidade de se proceder a uma interpretação ampliativa do texto constitucional nesta seara, pois é certo que, antes de se cogitar de uma interpretação restritiva ou ampliativa da Constituição, é dever do intérprete verificar se, mediante fórmulas pretensamente alternativas, não se está a violar a própria decisão fundamental do constituinte. No caso em questão, estou convencido de que não se está a afrontar qualquer opção constituinte, mas, muito pelo contrário, se está a engendrar esforços em busca de uma maior efetividade da Constituição como um todo.

Vê-se, pois, que o sistema constitucional não repudia a idéia de competências implícitas complementares, desde que necessárias para colmatar lacunas constitucionais evidentes. Por isso, considero viável a possibilidade de aplicação das regras de competência insculpidas na Lei no 7.701/88 para garantir uma prestação jurisdicional efetiva na área de conflitos paredistas instaurados entre o Poder Público e os servidores públicos estatutários (CF, arts. 5º, XXXV, e 93, IX). Diante dessa conjuntura, é imprescindível que este Plenário densifique as situações provisórias de competência constitucional para a apreciação desses dissídios no contexto nacional, regional, estadual e

municipal.

Assim, nas condições acima especificadas, se a paralisação for de âmbito nacional, ou abranger mais de uma região da Justiça Federal, ou ainda, abranger mais de uma unidade da federação, entendo que a competência para o dissídio de greve será do Superior Tribunal de Justiça (por aplicação analógica do art. 2o, I, “a”, da Lei nº 7.701/1988).

Ainda no âmbito federal, se a controvérsia estiver adstrita a uma única região da Justiça Federal, a competência será dos Tribunais Regionais Federais (aplicação analógica do art. 6º da Lei nº 7.701/1988). Para o caso da jurisdição no contexto estadual ou municipal, se a controvérsia estiver adstrita a uma unidade da federação, a competência será do respectivo Tribunal de Justiça (também, por aplicação analógica, do art. 6º, da Lei no 7.701/1988).

Ou seja, nesse último caso, as greves de âmbito local ou municipal serão dirimidas pelo respectivo Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal com jurisdição sobre o local da paralisação, conforme se trate de greve de servidores municipais, estaduais ou federais. Revela-se importante, nesse particular, ressaltar que a par da competência para o dissídio de greve em si — no qual se discute a abusividade, ou não, da greve — também os referidos tribunais, nos seus respectivos âmbitos, serão competentes para decidir acerca do mérito do pagamento, ou não, dos dias de paralisação em consonância com a excepcionalidade com a qual esse juízo se reveste.

Nesse particular, nos termos do art. 7º da Lei nº 7.783/1989, a deflagração da greve, em princípio, corresponde à suspensão do contrato de trabalho. Na suspensão do contrato de trabalho não há falar propriamente em prestação de serviços, nem tampouco no pagamento de salários. Como regra geral, portanto, os salários dos dias de paralisação não deverão ser pagos, salvo no caso em que a greve tenha sido provocada justamente por atraso no pagamento ou por outras situações excepcionais que justifiquem o afastamento da premissa da suspensão do contrato de trabalho.


Os tribunais mencionados também serão competentes para apreciar e julgar medidas cautelares eventualmente incidentes relacionadas ao exercício do direito de greve dos servidores públicos civis, tais como:

i) aquelas nas quais se postule a preservação do objeto da querela judicial, qual seja, o percentual mínimo de servidores públicos que deve continuar trabalhando durante o movimento paredista, ou mesmo a proibição de qualquer tipo de paralisação;

ii) os interditos possessórios para a desocupação de dependências dos órgãos públicos eventualmente tomados por grevistas; e

iii) demais medidas cautelares que apresentem conexão direta com o dissídio coletivo de greve. Em última instância, a adequação e a necessidade da definição dessas questões de organização e de procedimento dizem respeito à fixação de competência constitucional de modo a assegurar, a um só tempo, a possibilidade de exercício do direito constitucional de greve dos servidores públicos e, sobretudo, os limites a esse exercício no contexto de continuidade na prestação dos serviços públicos.

Ao adotar essa medida, este Tribunal estaria a assegurar o direito de greve constitucionalmente garantido no art. 37, VII, da Constituição Federal, sem desconsiderar a garantia da continuidade de prestação de serviços públicos – um elemento fundamental para a preservação do interesse público em áreas que são extremamente demandadas para o benefício da sociedade brasileira.”

Fica evidente, portanto, que este Tribunal, ao determinar a aplicação da Lei n° 7.783/1989, não desconsiderou a possibilidade de que, diante do caso concreto e de acordo com suas peculiaridades, o juízo competente — que é o STJ e não o TRF, em caso de greve de âmbito nacional — possa fixar regime de greve mais severo, em razão de estarem em jogo serviços públicos de caráter essencial. E, se com a deflagração de greve ocorre, como regra geral, a suspensão do contrato de trabalho, não há que se cogitar de prestação de serviço e, portanto, de pagamento de salários.

Tal como resultou da decisão proferida no citado MI n° 708/DF, o pagamento dos dias parados se justifica somente em casos excepcionais. Não é o que se tem, à evidência, na hipótese dos autos!

Ante o exposto, defiro o pedido para suspender os efeitos da decisão proferida pelo Juízo da 4ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado do Rio Grande do Sul nos autos da Ação Ordinária 2008.71.00.006757-2.

Comunique-se, com urgência.

Publique-se.

Brasília, 08 de abril de 2008.

Ministro GILMAR MENDES

Vice-Presidente

(RISTF, art. 37, I)

SUSPENSÃO DE TUTELA ANTECIPADA 207-7 RIO GRANDE DO SUL

RELATORA: MINISTRA PRESIDENTE

REQUERENTE(S): UNIÃO

ADVOGADO(A/S): ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

REQUERIDO(A/S): RELATOR DO AGRAVO DE

INSTRUMENTO: 2008.04.00.002160-9

DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO INTERESSADO(A/S): ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MEMBROS DAS CARREIRAS DA ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO — ANAJUR E OUTRO(A/S)

ADVOGADO(A/S): ROGÉRIO VIOLA COELHO EOUTRO(A/S)

ADVOGADO(A/S) : ANTÔNIO TORREÃO BRAZ FILHO E OUTRO(A/S)

DECISÃO: A União, com fundamento nos artigos 4º da Lei 4.348/64, 25 da Lei 8.038/90, 4º da Lei 8.437/92 e 1º da Lei 9.494/97, formulou, perante a Presidência do Superior Tribunal de Justiça, o presente pedido de suspensão dos efeitos da decisão proferida pelo Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz nos autos do Agravo de Instrumento 2008.04.00.002160-9/RS (fls. 105-116), em trâmite no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, interposto pela Associação Nacional dos Membros das Carreiras da Advocacia Geral da União – ANAJUR e outros.

A decisão ora impugnada reconheceu a legitimidade da greve e deferiu, com fundamento nos julgamentos dos Mandados de Injunção 670/ES e 712/PA, o pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal para determinar que a União se abstenha de adotar qualquer medida disciplinar ou sancionatória, além de atos de retaliação ou de represália, inclusive corte de ponto com efeitos pecuniários, suspensão ou descontos de vencimentos, inscrições em assentamentos funcionais, contra os associados das entidades agravantes que aderiram ao movimento de paralisação em curso desde 17 de janeiro de 2008.

Diz a requerente que a MM. Juíza da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária de Porto Alegre (Processo 2008.71.00.001968-1/RS), em razão da STA 207 / RS existência de conexão, declinou da competência, determinando a remessa dos autos da ação ordinária coletiva ajuizada pelas entidades ora interessadas ao Juízo da 16ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal (fls. 80-83). Interposto agravo de instrumento para o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, no eventual impedimento do relator, reconheceu a competência do juízo a quo e deferiu a antecipação dos efeitos da tutela para declarar a legitimidade do direito posto em causa. Daí o presente pedido de suspensão.


Sustenta, mais, em síntese:

a) incompetência do Juízo Federal do Rio Grande do Sul, dado que as entidades representativas dos interesses da categoria em questão têm sede e foro na Capital Federal;

b) existência de conexão, nos termos do art. 103 do Código de Processo Civil, entre a ação ordinária coletiva ajuizada pelas entidades representativas perante a Seção Judiciária do Rio Grande do Sul e a ação cominatória de obrigação de fazer e não fazer cumulada com ação condenatória ajuizada pela União perante a Seção Judiciária do Distrito Federal, cuja causa de pedir é “a deflagração de movimento grevista da categoria dos Procuradores Federais, Procuradores Federais da Previdência Social, Advogados da União, Procuradores da Fazenda, Defensores Públicos e Procuradores do Banco Central” (fl. 13);

c) ocorrência de grave lesão à ordem pública, considerada em termos de ordens jurídica e administrativa, pois a decisão impugnada, além de afrontar o princípio da legalidade estrita, obsta o devido exercício das funções administrativas por parte das autoridades constituídas e a normal execução dos serviços prestados pela advocacia pública;

d) legalidade do desconto dos dias não trabalhados pelos servidores grevistas, nos termos dos arts. 40 e 44 da Lei 8.112/90, bem como em razão da inexistência de lei específica que regulamente o exercício do direito de greve pelos servidores públicos, sendo, pois, dispensável a instauração de processo administrativo para tal fim;

e) inaplicabilidade das disposições da Lei 7.783/89 ao movimento grevista das carreiras jurídicas da Advocacia-Geral da União, na medida em que as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal nos Mandados de Injunção 670/ES, 708/DF e 712/PA alcançam apenas os casos concretos neles versados. Nesse contexto, ressalta que “sem lei regulamentando o exercício do direito de greve, por parte de trabalhadores do setor público, o direito existe mas não pode ser exercido plenamente até que exista a regulamentação exigida pela Constituição” (fl. 33);

f) ilegitimidade da deflagração do movimento grevista, porquanto não houve fixação de prazo para a implementação do acordo salarial firmado com as entidades de classe em 1º de novembro de 2007, de modo que “deve ser analisado um prazo razoável para efetivação do acordo” (fl. 39). Além disso, aduz que a “mudança significativa do estado fático (perdas orçamentárias da ordem de 40 bilhões de reais por ano, que representam 7% da receita da União), provocado por fato alheio, justifica o repactuamento do acordo de concessão de reajuste salarial no momento” (fl. 41);

g) existência de grave lesão à economia pública, consubstanciada na continuidade de pagamento da remuneração dos servidores grevistas e na possibilidade de perda de prazos judiciais, o que configura manifesto e irreversível prejuízo à Fazenda Pública.

O Presidente do Superior Tribunal de Justiça, ao entender que a causa de pedir, na ação ordinária coletiva, ostenta índole constitucional, negou seguimento ao pedido e determinou a remessa dos autos ao Supremo Tribunal Federal (fls. 289-291).

Determinou-se que as entidades autoras, Associação Nacional dos Membros das Carreiras da Advocacia-Geral da União — ANAJUR e outros, encaminhassem aos presentes autos as suas razões (fl.303), as quais foram apresentadas às fls. 305-310 e 319-327, alegando, em resumo:

a) inocorrência de grave lesão à ordem pública, ante a legitimidade do movimento grevista ora em curso, por terem sido integralmente atendidas todas as exigências preconizadas pelo Supremo Tribunal Federal nos julgamentos dos Mandados de Injunção 670/ES, 708/DF e 712/PA, bem como aquelas impostas pela Lei 7.783/89, tais como, deliberação por Assembléia- Geral realizada no Distrito Federal e nos Estados, notificação prévia às autoridades competentes e preservação do percentual mínimo de 30% (trinta por cento) de advogados públicos federais em plena atividade com o objetivo de assegurar a continuidade dos serviços essenciais;

b) existência de decisão proferida em ação proposta perante juízo federal de primeiro grau de Brasília, em que os primeiros despacho e citação válida foram posteriores àqueles ocorridos no foro federal de Porto Alegre;

c) competência do Superior Tribunal de Justiça para a avaliação da legitimidade da greve em comento, nos termos do voto proferido pelo Ministro Gilmar Mendes nos julgamentos dos referidos mandados de injunção. Assim, “nem o foro federal de Porto Alegre nem o de Brasília seria, em princípio, competente para o juízo determinante da legitimidade da greve” (fl.322);

d) a decisão impugnada no presente pedido de suspensão “deu satisfação ao pedido de proteção dos grevistas contra retaliações arbitrárias do governo, sem adiantar de modo explícito um diagnóstico do movimento” (fl. 322);


e) existência do dever de o Congresso Nacional estabelecer em lei os termos e os limites da greve para os servidores públicos, certo que o direito de greve já se encontra previsto na própria Constituição da República, razão pela qual o Supremo Tribunal Federal, ante a omissão do Parlamento, estabeleceu os parâmetros a serem observados para o exercício do direito em questão;

f) legalidade e constitucionalidade da greve em apreço, além de ser “um movimento caracterizado pela mais absoluta justiça, e um movimento inadiável” (fl. 326);

g) inexistência de dúvida quanto à realidade constitucional do direito de greve dos servidores públicos, bem como em relação “aos termos e limites que o Supremo Tribunal Federal entendeu apropriados para o balizamento de uma greve desse porte” (fl. 326).

A União reiterou o presente pedido de suspensão, ante a necessidade de se resguardar o erário federal e a sociedade de eventuais prejuízos, tendo em vista que os prazos processuais não se encontram suspensos (fls. 314-315).

As Associações de Classe constitutivas do Fórum Nacional da Advocacia Pública Federal reiteraram os argumentos expendidos às fls. 319-327 e aduziram que o Ministro José Antônio Dias Toffoli, no “dia 29 de fevereiro de 2008, no programa Fórum da TV Justiça, reconheceu publicamente que os advogados públicos federais em greve atendem à manutenção dos 30% da força de trabalho das unidades jurídicas federais, bem como reconheceu que a greve em curso, por atender aos requisitos da Lei 7.783/89, não tem causado prejuízo à União” (fls. 341-343).

A Procuradoria-Geral da República opinou pelo deferimento do pedido (fls. 334-339), ao seguinte entendimento:

“20. Na hipótese, trata-se de ação coletiva, intentada pelas entidades representativas dos servidores grevistas, todas com sede em Brasília, Distrito Federal, em face da União, cujo domicílio é, também, o Distrito Federal. A escolha do foro para ajuizamento de ação contra a União, nos termos do § 2º do artigo 109 da Constituição Federal não pode ser arbitrária, há de estar apoiada em um dos elementos de atração nela previstos. Não sendo domiciliados os autores naquela seção judiciária e não havendo que se falar em ato/fato que originou a ação restrito àquela seção ou em disputa sobre coisa ali situada, deve prevalecer, por certo, a regra do domicílio da União que, no caso, é igualmente o das autoras.

21. Não se pode deixar de notar, ademais, que, conexas as ações em curso na Seção Judiciária do Rio Grande do Sul e na Seção Judiciária do Distrito Federal — em ambas se discute a legitimidade da greve dos advogados e defensores públicos —, o que primeiro despachou positivamente foi o juízo da capital federal, em 23 de janeiro do ano corrente (fls. 275/276), decisão a qual faz menção, inclusive, aquela meramente declinatória de competência proferida pelo juízo da 2ª Vara Federal de Porto Alegre (fls. 80/83). Ainda que se pudesse vislumbrar, em tese, a competência do foro escolhido pelas associações demandantes, estaria prevento, assim, em atenção ao comando do artigo 106 do Código de Processo Civil, o Juízo da Seção Judiciária do Distrito Federal.” (Fl. 338)

O Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional — Sinprofaz e outros aduziram que a União e a Procuradoria-Geral da República não demonstraram concretamente a ocorrência de grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, e que a suspensão de tutela não pode ser utilizada “como sucedâneo recursal, muito menos como instrumento de argüição de incompetência ou de instauração de conflito de competência” (fl. 691).

Inicialmente, reconheço que a controvérsia instaurada na ação principal e no agravo de instrumento referidos evidencia a existência de matéria constitucional: arts. 5º, LIV e LV, 9º e 37, VII, da Constituição da República (petição inicial da ação ordinária coletiva, fls. 44-79; petição de interposição do agravo de instrumento, fls. 84-104; e decisãoimpugnada, fls. 105-116). Dessa forma, cumpre ter presente que a Presidência do Supremo Tribunal Federal dispõe de competência para examinar questão cujo fundamento jurídico tem natureza constitucional, conforme firme jurisprudência desta Corte, destacandose os seguintes julgados: Rcl 497-AgR/RS, rel. Min.Carlos Velloso, Plenário, DJ 06.4.2001; SS 2.187-AgR/SC, rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 21.10.2003; e SS 2.465/SC, rel. Min. Nelson Jobim, DJ 20.10.2004.

Assevere-se, preliminarmente, que as leis que norteiam o instituto da suspensão (Leis 4.348/64,78.437/92 e 9.494/97) permitem, apenas e tão-somente, à Presidência do Supremo Tribunal Federal, para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, suspender a execução de decisões concessivas de segurança, de liminar ou de tutela antecipada proferidas em única ou última instância pelos tribunais locais ou federais, quando a discussão travada na origem for constitucional.


Caso se decidisse, em suspensão, que o Juízo da 16ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal (Processo 2008.34.00.002476-7) se tornou prevento para o julgamento da presente paralisação, ao determinar a citação das entidades associativas em tela, em 23.01.2008, na decisão que declarou a ilegalidade da paralisação dos serviços da Advocacia-Geral da União (fls. 275-276), como destacou a Procuradoria-Geral da República em seu parecer, estar-se-ia, indiretamente, a usurpar a competência do egrégio Superior Tribunal de Justiça (art. 105, I, d, da Constituição da República) para o julgamento de um eventual conflito de competência a ser suscitado, atribuição para a qual não se presta o excepcional instituto da suspensão.

Passo, pois, ao exame do mérito do presente pedido de suspensão dos efeitos de tutela antecipada com base, exclusivamente, no arcabouço normativo que rege as medidas de contracautela.

O artigo 4º da Lei 8.437/92, c/c o art. 1º da Lei 9.494/97, autoriza o deferimento do pedido de suspensão da execução da tutela antecipada concedida nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas.

Conforme autoriza a jurisprudência pacificada do Supremo Tribunal Federal, quando da análise do pedido de suspensão de decisão (SS 846- AgR/DF, rel. Ministro Sepúlveda Pertence, DJ 29.5.96; SS 1.272-AgR/RJ, rel. Ministro Carlos Velloso, DJ 18.5.2001, dentre outros), permite-se o proferimento de um juízo mínimo de delibação a respeito da questão jurídica deduzida na ação principal.

Entendo não ser razoável a exigência de implementação imediata do acordo firmado, em 1º 11.2007, entre os advogados públicos federais e a União, tendo em vista a ausência de previsão orçamentária em relação às despesas em questão.

Verifico, também, que se encontra devidamente demonstrada a ocorrência de grave lesão à ordem pública, em sua acepção administrativa, ante a possibilidade de perda de prazos processuais e de paralisação dos procedimentos licitatórios necessários ao bom funcionamento da máquina estatal, bem como em virtude dos transtornos causados pelo movimento paredista em comento ao normal desempenho das atribuições da advocacia pública federal, o que causará prejuízos, em última análise, ao patrimônio público, na medida em que esse movimento perdura há aproximadamente três meses.

Ressalte-se, ainda, que algumas carreiras da advocacia pública federal sequer possuem membros suficientes para o suprimento de suas necessidades de lotação, como a Procuradoria Federal, a Advocacia da União e a Defensoria Pública da União, o que impossibilita a defesa dos entes públicos e dos cidadãos de forma satisfatória.

No presente caso, poderá haver o denominado “efeito multiplicador” (SS 1.836-AgR/RJ, rel. Min. Carlos Velloso, Plenário, unânime, DJ

11.10.2001), diante da existência de outras categorias de servidores públicos federais em situação potencialmente idêntica àquela dos associados das entidades autoras, que se sentirão incentivados a deflagrar movimentos grevistas com o objetivo de reivindicar reajustes salariais.

Em voto proferido no julgamento do Mandado de Injunção 708/DF, de minha relatoria, restou asseverado o seguinte:

“No mérito, acolho a pretensão tão-somente no sentido de que se aplique a Lei no 7.783/1989 enquanto a omissão não for devidamente regulamentada por lei específica para os servidores públicos.

Nesse particular, ressalto ainda que, em razão dos imperativos da continuidade dos serviços públicos, não estou a afastar que, de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto e mediante solicitação de órgão competente, seja facultado ao juízo competente impor a observância a regime de greve mais severo em razão de tratar-se de “serviços ou atividades essenciais”, nos termos dos já mencionados arts. 9º a 11 da Lei no 7.783/1989.

Creio que essa complementação na parte dispositiva de meu voto é indispensável porque, na linha do raciocínio desenvolvido, não se pode deixar de cogitar dos riscos decorrentes das possibilidades de que a regulação dos serviços públicos que tenham características afins a esses “serviços ou atividades essenciais” seja menos severa que a disciplina dispensada aos serviços privados ditos “essenciais”.

Isto é, mesmo provisoriamente, há de se considerar, ao menos, idêntica conformação legislativa quanto ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade que, se não atendidas, coloquem “em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população” (Lei no 7.783/1989, parágrafo único, art. 11).


(…)

Assim, sob pena de injustificada e inadmissível negativa de prestação jurisdicional nos âmbitos federal, estadual e municipal, é necessário que, na decisão deste MI, fixemos os parâmetros institucionais e constitucionais de definição de competência, provisória e ampliativa, para a apreciação de dissídios de greve instaurados entre o Poder Público e os servidores com vínculo estatutário.

Nesse particular, assim como argumentei com relação à Lei Geral de Greve, creio ser necessário e adequado que fixemos balizas procedimentais mínimas para a apreciação e julgamento dessas demandas coletivas.

A esse respeito, no plano procedimental, vislumbro que é recomendável a aplicação da Lei no 7.701/1988 (que cuida da especialização das turmas dos tribunais do trabalho em processos coletivos), no que tange à competência para apreciar e julgar eventuais conflitos judiciais referentes à greve de servidores públicos que sejam suscitados até o momento de colmatação legislativa da lacuna ora declarada.

Ao desenvolver mecanismos para a apreciação dessa proposta constitucional para a omissão legislativa, creio não ser possível argumentar pela impossibilidade de se proceder a uma interpretação ampliativa do texto constitucional nesta seara, pois é certo que, antes de se cogitar de uma interpretação restritiva ou ampliativa da Constituição, é dever do intérprete verificar se, mediante fórmulas pretensamente alternativas, não se está a violar a própria decisão fundamental do constituinte.

No caso em questão, estou convencido de que não se está a afrontar qualquer opção constituinte, mas, muito pelo contrário, se está a engendrar esforços em busca de uma maior efetividade da Constituição como um todo.

Vê-se, pois, que o sistema constitucional não repudia a idéia de competências implícitas complementares, desde que necessárias para colmatar lacunas constitucionais evidentes. Por isso, considero viável a possibilidade de aplicação das regras de competência insculpidas na Lei no 7.701/88 para garantir uma prestação jurisdicional efetiva na área de conflitos paredistas instaurados entre o Poder Público e os servidores públicos estatutários (CF, arts. 5o, XXXV, e 93, IX).

Diante dessa conjuntura, é imprescindível que este Plenário densifique as situações provisórias de competência constitucional para a apreciação desses dissídios no contexto nacional, regional, estadual e municipal.

Assim, nas condições acima especificadas, se a paralisação for de âmbito nacional, ou abranger mais de uma região da Justiça Federal, ou ainda, abranger mais de uma unidade da federação, entendo que a competência para o dissídio de greve será do Superior Tribunal de Justiça (por aplicação analógica do art. 2o, I, “a”, da Lei no 7.701/1988).

Ainda no âmbito federal, se a controvérsia estiver adstrita a uma única região da Justiça Federal, a competência será dos Tribunais Regionais Federais (aplicação analógica do art. 6o da Lei no 7.701/1988).

Para o caso da jurisdição no contexto estadual ou municipal, se a controvérsia estiver adstrita a uma unidade da federação, a competência será do respectivo Tribunal de Justiça (também, por aplicação analógica, do artigo 6o, da Lei no 7.701/1988).

Ou seja, nesse último caso, as greves de âmbito local ou municipal serão dirimidas pelo respectivo Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal com jurisdição sobre o local da paralisação, conforme se trate de greve de servidores municipais, estaduais ou federais.

Revela-se importante, nesse particular, ressaltar que a par da competência para o dissídio de greve em si — no qual se discute a abusividade, ou não, da greve — também os referidos tribunais, nos seus respectivos âmbitos, serão competentes para decidir acerca do mérito do pagamento, ou não, dos dias de paralisação em consonância com a excepcionalidade com a qual esse juízo se reveste.

Nesse particular, nos termos do artigo 7º da Lei 7.783/1989, a deflagração da greve, em princípio, corresponde à suspensão do contrato de trabalho. Na suspensão do contrato de trabalho não há falar propriamente em prestação de serviços, nem tampouco no pagamento de salários. Como regra geral, portanto, os salários dos dias de paralisação não deverão ser pagos, salvo no caso em que a greve tenha sido provocada justamente por atraso no pagamento ou por outras situações excepcionais que justifiquem o afastamento da premissa da suspensão do contrato de trabalho.

Os tribunais mencionados também serão competentes para apreciar e julgar medidas cautelares eventualmente incidentes relacionadas ao exercício do direito de greve dos servidores públicos civis, tais como:

i) aquelas nas quais se postule a preservação do objeto da querela judicial, qual seja, o percentual mínimo de servidores públicos que deve continuar trabalhando durante o movimento paredista, ou mesmo a proibição de qualquer tipo de paralisação;

ii) os interditos possessórios para a desocupação de dependências dos órgãos públicos eventualmente tomados por grevistas; e

iii) demais medidas cautelares que apresentem conexão direta com o dissídio coletivo de greve.

Em última instância, a adequação e a necessidade da definição dessas questões de organização e de procedimento dizem respeito à fixação de competência constitucional de modo a assegurar, a um só tempo, a possibilidade de exercício do direito constitucional de greve dos servidores públicos e, sobretudo, os limites a esse exercício no contexto de continuidade na prestação dos serviços públicos.

Ao adotar essa medida, este Tribunal estaria a assegurar o direito de greve constitucionalmente garantido no artigo 37, VII, da Constituição Federal, sem desconsiderar a garantia da continuidade de prestação de serviços públicos — um elemento fundamental para a preservação do interesse público em áreas que são extremamente demandadas para o benefício da sociedade brasileira.”

Fica evidente, portanto, que este Tribunal, ao determinar a aplicação da Lei 7.783/1989, não desconsiderou a possibilidade de que, diante do caso concreto e de acordo com suas peculiaridades, o juízo competente — que é o STJ e não o TRF, em caso de greve de âmbito nacional — possa fixar regime de greve mais severo, em razão de estarem em jogo serviços públicos de caráter essencial. E, se com a deflagração de greve ocorre, como regra geral, a suspensão do contrato de trabalho, não há que se cogitar de prestação de serviço e, portanto, de pagamento de salários.

É patente a transgressão dos parâmetros legais pelo movimento grevista deflagrado pelos associados das entidades interessadas, que há quase três meses estão parados, com percepção de remuneração integral, em prejuízo da Fazenda Pública e de toda a sociedade.

Tal como resultou da decisão proferida nocitado MI 708/DF, o pagamento dos dias parados se justifica somente em casos excepcionais. Não é o que se tem, à evidência, na hipótese dos autos!

Ante o exposto, defiro o pedido para suspender a execução da decisão proferida pelo Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz nos autos do Agravo de Instrumento

2008.04.00.002160-9/RS, em trâmite no Tribunal Regional

Federal da 4ª Região.

Comunique-se, com urgência.

Publique-se.

Brasília, 8 de abril de 2008.

Ministro GILMAR MENDES

Vice-Presidente

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