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Mercado de precatórios atrai investidores internacionais

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1 de abril de 2008, 0h00

Os precatórios federais estão sendo pagos em dia. Em 2008 tiveram seus pagamentos antecipados de abril e maio para os meses de janeiro e fevereiro. A antecipação dos pagamentos gerou aos cofres públicos lucro de mais de R$ 300 milhões, uma vez que a União deixou de pagar juros e correção monetária correspondentes há três meses — gerando liquidez e atraindo o mercado financeiro e investidores. Com a lei que autoriza a formação de Fundos de Direitos Creditórios, via CVM (Comissão de Valores Mobiliários), este filão de precatórios está atraindo inclusive investidores internacionais e valendo até 70% do seu valor nominal.

Já os precatórios estaduais seguem políticas inversas. Nos estados de São Paulo e Rio Grande do Sul quase nada foi pago de precatórios alimentares nos últimos cinco anos, ocasionando aumento geométrico da dívida em vista da inclusão de juros e correção. Além disso, há de se computar a entrada de milhares de novos precatórios e ações contra os estados pelo descumprimento das leis que protegem os servidores públicos, principalmente em relação à falta de reajustes salariais e atrasos nos pagamentos dos salários mensais, como ocorre no Rio Grande do Sul desde julho de 2007 e promete prolongar-se por todo este ano. No Estado de São Paulo as parcelas vencidas dos precatórios não alimentares têm sido pagas em dia, visando evitar o seqüestro em contas correntes. No Rio Grande do Sul nem estes são pagos.

Em pesquisa no Rio Grande do Sul sobre novas ações de servidores públicos contra o estado, estimou-se que no ano de 2004 foram ajuizadas mil novas ações por mês. Em 2006 o número de novas ações passou para dois mil por mês, em 2007 cresceu para 2.500 mensais e a tendência é aumentar ainda mais em virtude dos atrasos nos pagamentos dos salários e da falta de aumentos legais. Imagine-se agora o número em São Paulo, estado vinte vezes maior que o primeiro. Estamos falando da maior indústria do país: “A Indústria de Precatórios”. Em 2004 se falava em dívida de R$ 3 bilhões no Rio Grande do Sul e R$ 33 bilhões em São Paulo. O valor atual em ambos os estados é uma “caixa preta”.

Os estados não pagam os precatórios alimentares e não cumprem os direitos essenciais dos seus próprios servidores, ativos e inativos, preferindo postergar por anos estas dívidas sociais que os transformam nos maiores devedores do país. Além disto, sobrecarregam o Judiciário com ações que duram uma década e que mesmo depois de ganhas na Justiça transformam o direito em precatórios que estão sem pagamento há mais uma década. Vinte anos e nada!

Nos dois estados citados acima não há previsão orçamentária alguma para pagamento dos precatórios alimentares este ano. Em 2006 foi criado no Rio Grande do Sul um Fundo de Precatórios com destinação de 3% da arrecadação para início dos pagamentos. A finalidade era eleitoreira e nunca foi cumprida, exceto para sacar 10% dos depósitos judiciais e desviá-los de sua finalidade. Em São Paulo havia uma destinação de R$ 512 milhões para os precatórios em 2008, mas o valor já foi redirecionado para outro fim. Pagamento de precatórios não rende votos, por isso continuará esquecido.

Os servidores públicos estão morrendo sem poder gozar em vida seus direitos de anos dedicados ao serviço público. Os advogados também se encontram em situação parecida, já que 30% destes precatórios são honorários, em que pese a luta diária da OAB e dos advogados, que investem vinte anos trabalhando “por êxito” nos processos.

Resta aos servidores públicos e aos advogados a única alternativa disponível: vender com deságios os seus precatórios no mercado, para que as empresas os utilizem no Judiciário para pagamento de suas dívidas fiscais. Este mercado tem crescido bastante, melhorando o preço pago aos “precatoristas” em vista das decisões judiciais favoráveis à garantia e à compensação de ICMS e de outros impostos.

Há de se atentar para as dificuldades encontradas pelos herdeiros para vender os precatórios dos credores que já morreram, pelas dificuldades, o tempo e os custos de proceder a sucessão, vez que o ITCD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doações) possui alíquota de 3 a 8%, conforme Lei Estadual 8.821/89 (RS). Existe uma decisão que reduz a alíquota para 1%, porém haveria a necessidade de discutir a matéria longamente. Tudo isto torna o precatório imprestável para utilização imediata. A melhor solução é vender em vida e gozar parte do direito ou distribuir aos seus herdeiros.

Ressalve-se que estes precatórios são ordens de pagamento emitidas pelo Judiciário e desrespeitadas pelo Executivo, que tem a chave do cofre, e, como última alternativa, voltam para o Judiciário fazer valer a Constituição, a Justiça e a igualdade de poderes, autorizando a sua utilização, como dinheiro não pago, para quitar impostos. Os Tribunais Superiores já pacificaram a matéria, mas ainda resta resistência de alguns juizes, que parecem não entender que se encontra em jogo, além de um direito constitucional, a independência e igualdade dos três poderes, ou seja, a própria democracia.

Albergar a eterna desculpa esfarrapada do estado de falta de verba enquanto a destina para obras faraônicas e eleitoreiras, esquecendo e caloteando seus próprios servidores em seus direitos essenciais, é no mínimo desprestigiar o Judiciário como um dos três poderes, estimular os estados a continuarem se beneficiando da sua própria torpeza, maltratando seus próprios servidores e afastar o Brasil do tão sonhado Estado de Direito, aumentando cada vez mais a vergonhosa “Indústria dos Precatórios”.

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