Cuidado elegante

Loja pode se precaver contra furto, mas sem constranger cliente

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14 de setembro de 2007, 0h00

A segurança de um estabelecimento comercial não pode ser confundida com desrespeito ao consumidor. Ao investir em tecnologia anti-furto, o empresário deve estar ciente de que não basta investir pesado em novos mecanismos de proteção se não houver um treinamento adequado para abordagem de seus clientes em situações de alarme. É necessário tomar precauções para não enfrentar ações judiciais e danos à imagem do seu estabelecimento.

Não é de hoje que furtos são motivos de perdas para as redes varejistas. Tanto os furtos praticados por empregados quanto os praticados por consumidores representam prejuízos, não raras vezes, de valores significativos. Por esse motivo, o varejo começou a elevar o investimento em artefatos tecnológicos, como barreiras eletrônicas, câmeras e etiquetas anti-furto, de forma a evitar ou amenizar as perdas. Porém, a adoção desses elementos trouxe para o varejo outra preocupação, relacionada à má utilização dos equipamentos.

Coincidiu com a época de utilização desses inventos o reconhecimento do dano moral em nosso ordenamento jurídico, por meio da Constituição Federal de 1988 (artigo 5º, X: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”).

Assim, pelo entendimento da Justiça, que vigorou até por volta de 2002, o mero acionamento do alarme anti-furto nas lojas, nas hipóteses de falha do operador de caixa em não ter retirada a etiqueta do produto pago, passou a ser visto por nossos tribunais como capaz de causar ao consumidor dano moral indenizável, inclusive de natureza grave, em razão da exposição indevida de sua imagem perante as pessoas que se encontram nas lojas.

O resultado disso foi o crescimento, de forma vertiginosa, do número de demandas judiciais com pedido de indenização por dano moral relacionado ao acionamento do alarme. Até 1988, essas ações representavam 14% das ações propostas contra as redes de varejo, aparecendo depois de erros de publicidade (16%) e insatisfação com produtos (19%). A partir de então passaram a representar mais de 35%, sendo, hoje, de longe, a maior incidência de pedidos indenizatórios contra o varejo. Em segundo lugar aparecem as cobranças indevidas (8%) e, empatados em terceiro lugar, aparecem os acidentes em loja e outros (6%).

Com o passar dos anos e com os abusos dos consumidores que, muitas vezes, ingressavam com ações infundadas buscando indenização por dano moral, os valores, que chegavam a R$ 10 mil, foram reduzidos. Ainda assim, foi mantido o entendimento de que o simples soar do alarme já configura o dano moral e, por conseqüência, o dever de indenizar, indiferentemente de a abordagem ter sido realizada de forma educada e discreta.

Atualmente, este cenário mudou. Prevalece a necessidade de que ocorra abordagem deselegante por parte do segurança ou outro preposto, causando constrangimento ao consumidor para que haja o dever de indenizar. Na maioria das decisões, somente o disparar do alarme na porta da loja não é mais suficiente para caracterizar dano moral. A Justiça considera dano moral o tratamento excessivo, abusivo ou constrangedor para o consumidor por parte dos funcionários do estabelecimento no momento da abordagem.

Por isso, mais do que investir em tecnologia anti-furto, as redes de varejo devem investir em treinamentos específicos dos funcionários para o trato com o consumidor. Toda a abordagem relacionada à segurança deve ser discreta. Um cliente desrespeitado pode gerar graves prejuízos jurídicos e à marca da empresa. É importante orientar todos os funcionários da loja, desde os gerentes aos seguranças, sobre o cuidado que se deve tomar nessas situações, evitando a ocorrência de constrangimento, fato que, se não impedir a propositura de ação judicial por um consumidor oportunista, provavelmente se reverterá em decisão favorável ao estabelecimento comercial.

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