Ilegalidade inútil

Proibição não impede que aborto seja feito, diz advogada

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8 de setembro de 2007, 0h00

Assim como seria impossível proibir a existência de crianças de rua através de uma lei, a criminalização do aborto não impede a sua realização. A proibição, ao invés de ser uma forma de preservar a vida, ameaça bens jurídicos como a saúde e a integridade pública das mulheres.

É com essa comparação, também, que a advogada e vice-presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros, Kátia Tavares, redigiu um parecer para defender a descriminalização do aborto. O parecer foi levado à Câmara dos deputados como subsídio para discussão do Projeto de Lei 4.384/2004 de autoria dos deputados Luciana Genro (PSol/RS) e José Aristodemo Pinotti (PMDB/SP), que autoriza a interrupção de gestação de fetos anencefálicos.

Para sustentar a tese, a advogada traz números. O Brasil é recordista em abortos clandestinos: cerca de um milhão por ano. O ministro da Saúde, o médico José Gomes Temporão, já declarou que o aborto é a terceira causa de morte materna no país. Kátia Tavares ressaltou que o Estado brasileiro assumiu o compromisso político e moral em conferências internacionais de revisar leis internas que punem as mulheres submetidas a abortos ilegais.

Em 2006, o Ministério da Saúde gastou cerca de R$ 35 milhões com a internação dessas gestantes. “Especialistas estimam que as complicações do aborto clandestino costumam ser dez vezes maiores do que seria para atender os casos de aborto legal”, escreve.

Segundo a advogada, o Brasil ratificou os principais tratados internacionais de proteção aos direitos humanos. Com destaque para a Convenção da Mulher de 1979, proposto pela Organização das Nações Unidas, e a Convenção de Belém do Pará de 1994, da Organização dos Estados Americanos.

O parecer chama atenção para a realidade do país. Proibido ou não, o aborto clandestino é feito pelas mulheres brasileiras. Melhor para aquelas que podem pagar uma clínica, com boa estrutura e equipamentos adequados. Pior para as de baixa renda, que geralmente fazem procedimentos arriscados e, na maior parte das vezes, acaba no hospital.

A advogada argumenta que à época da elaboração do Código Penal, em 1940, não se levou em conta essa hipótese de gravidez, porque não havia diagnóstico da medicina sobre o assunto. Destaca que, sob o ponto de vista da medicina, quase todos os casos de anencefalia são cientificamente inviáveis, pois o feto não consegue sobreviver fora do útero. Além do que, quando não há cérebro, não se pode atribuir qualquer expectativa de vida, explica.

Daí, sugere a descriminalização do aborto. Depois, uma política de Estado, com médicos, psicólogos e assistentes sociais, para fazer com que a mulher se sinta mais segura e possa escolher ou não pelo aborto.

O parecer foi aceito por unanimidade pelos membros que compõe o Instituto dos Advogados Brasileiros. Ele deve ser anexado ao Projeto de Lei 4.834, que corre no Congresso Nacional, para incluir esse caso entre as possibilidades legais de aborto, quando a doença for comprovada por laudos independentes de dois médicos. A idéia é incluir o inciso III ao artigo 128 do Código Penal.

Leia o parecer

PARECER:

Projeto de Lei 4.834, de 2004, de autoria dos Deputados Luciana Genro e Pinotti. Acrescenta o inciso III ao art. 128 do Decreto-Lei 2848, de 07 de dezembro de 1940 – Código Penal:

Trata a presente Indicação de Projeto de Lei que autoriza a interrupção da gravidez resultante de feto anencefálico. Acrescenta, assim, o inciso III ao atual art. 128 do Código Penal, não se punindo o aborto praticado por médico, para vigorar expressamente a seguinte hipótese: “se o feto é portador de anencefalia, comprovada por laudos independentes de dois médicos.” A matéria é reconhecidamente polêmica, e nos remete a uma sensata reflexão sobre o tema. Cabe, inicialmente, observar que além de ser jurídica a anencenfalia é uma questão da biomédica, da ética, de religiões, suscitando controvérsias.

Ressalte-se, inicialmente, que há o raciocínio enganoso, sem fundamento, invocado pela religião, segundo o qual a autorização da interrupção da gravidez no caso de anencefalia propiciaria uma espécie de carta branca, geral e irrestrita para a legalização do aborto em todos os sentidos. Aliás, o debate sobre a legalização do aborto reacendeu, tornando-se mais acalorado após a vinda do Papa Bento XVI ao Brasil, em maio deste ano, quando declarou: “As leis contrária ao matrimônio e que favorecem os anticoncepcionais e o aborto são uma ameaça ao futuro dos povos”.

Em verdade, deixando de lado as hipocrisias, não é segredo para ninguém que a gravidez indesejada é freqüentemente interrompida em clínicas clandestinas pelas classes abastadas. Mais uma vez, impõe-se no Brasil uma brutal diferença aos cidadãos de poder aquisitivo: a mulher rica tem condições de pagar pelo aborto, com segurança, higiene e cuidados, enquanto a mulher pobre e desesperada com a gravidez, em geral, se entrega na mão dos chamados “carniceiros”, ou, descobre enfermeira sem adequada qualificação na área de saúde, correndo perigo de vida.


Em regra, essas pessoas induzem a prática do aborto com um método precário um pedaço de arame ou madeira é introduzido numa sonda de borracha. O instrumento é colocado no útero da mulher, que é orientada a voltar para a casa, e retirá-lo somente depois de vinte e quatro horas. Após começar o sangramento, a gestante deverá procurar um hospital público dizendo que sofreu um aborto espontâneo. A curetagem é realizada, mas os danos são muito sérios. Muitas mulheres sofrem hemorragias graves, perdem o útero, vão parar na UTI e morrem.

No ano passado, o Ministério da Saúde gastou cerca de R$ 35 milhões com a internação dessas gestantes. Não foi ainda realizado um estudo a fim da determinação dos custos para os cofres públicos, entretanto, especialistas estimam que as complicações do aborto clandestino costumam ser dez vezes maiores do que seria para atender os casos de aborto legal.

Lamentavelmente é forçoso admitir que a interrupção voluntária da gravidez consista numa realidade cotidiana e clandestina nos paises em que o aborto não foi ainda legalizado.

Apesar de não ser objeto do Projeto de Lei examinado a legalização do aborto, tem-se o posicionamento de vários segmentos da sociedade, também, do Presidente da República e, especialmente do atual Ministro da Saúde José Gomes Temporão que, sob o ponto de vista jurídico, a criminalização do aborto afigura-se como um equívoco. A proibição expõe a mulher, que decide abortar, repita-se, a grandes riscos de vida, como expendido, já que ela recorre a expedientes não cirúrgicos, especialmente se for pobre, sem assistência médica e os cuidados higiênicos exigidos.

Da forma como é tratada a matéria, ao contrário de tutelar a vida humana, cria-se ameaças a outros bens jurídicos, como a saúde e a integridade pública das mulheres. Chega-se, assim, à seguinte conclusão: a criminalização do aborto não impede a sua realização. Proibir o aborto não acaba com ele. Assim como seria impossível proibir a existência de crianças de rua apenas baixando uma lei que determinasse isso. Por outro lado, o Brasil é recordista em abortos clandestinos (cerca de mais de hum milhão por ano), além do elevado número de mortes e do comprometimento da saúde das mulheres em decorrência das péssimas condições em que os abortos são realizados no Brasil. Como bem ressaltou o Ministro da Saúde, o médico sanitarista José Gomes Temporão: “Sou a favor da vida, mas não posso fechar os olhos para um problema de saúde pública. O aborto é a terceira causa de morte materna no país”. Nesta mesma esteira, sintetiza o Presidente LULA, comentando sobre a matéria: “Eu conheço casos de meninas que perfuraram o útero com agulhas de fazer tricô…”

Seria preciso que houvesse uma política do Estado de apoio, com médicos, psicólogos e assistentes sociais, voltada para amparar a mulher a fim de que esta se sentisse mais segura e pudesse assim escolher pela realização ou não do aborto. Esta é uma decisão que cabe somente a mulher… Além disso, caso opte pela interrupção da gravidez deve ser assegurado a sua realização de forma digna e segura.

A propósito, vale lembrar que o Estado brasileiro não só assinou compromissos político e moral em conferências internacionais de revisar leis internas que punem as mulheres submetidas a abortos ilegais, como também ratificou os principais tratados internacionais de proteção aos direitos humanos. Entre os últimos destacam-se a Convenção da Mulher, ONU, 1979 e a Convenção de Belém do Pará, OEA, 1994. Além disso, mais de sessenta por cento da população mundial vive em países onde o aborto induzido é permitido de alguma forma. Existem quatro países em que ele não é aceito em nenhuma hipótese: Chile, El Salvador, Malta e Cidade do Vaticano.

Não estamos aqui propondo a prática deliberada e irresponsável do aborto em si, mas sim propugnando sua descriminalização. Significando dizer: descriminalizar a conduta penal a que está submetida à mulher e não discriminar o ser feminino como ocorre na prática. Nesse sentido, busca-se deslocar o tratamento jurídico tradicionalmente dado ao aborto do campo do Direito Penal, repressivo, cuja responsabilidade recai principalmente sobre a mulher, impondo-lhe o constrangimento de responder a uma ação penal e submetendo-a a uma pena de detenção (que pode variar entre 1 a 3 anos), para o campo da saúde pública, a fim de transferir tal responsabilidade a cargo do Estado.

Advogamos, sim, condições de saúde e dignidade para os casos de abortamento inseguro provocado quando a mulher não se sinta em condições (sociais, econômicas, psicológicas ou médicas) de levar adiante uma gravidez indesejada, inclusive, também, nos casos de fetos sem cérebros. A opção e a decisão pelo abortamento devem ser, em última análise, recair sobre a própria mulher, seja no caso de estupro, de risco de vida, ou de anencefalia. Não cabe a ninguém ser contra ou a favor do aborto. O razoável é dizer que cabe à mulher decidir.


Sustentamos ainda: a descriminalização do aborto é uma legítima questão de Direitos Humanos, segundo a qual devem ser respeitados os princípios da dignidade da pessoa humana, igualdade, buscando-se compreender que a prática do aborto jamais deve ser imposta, bem como buscamos a compreensão de ser legítimo não exigir das mulheres que efetivamente não se sintam em condições de procriar, de forma responsável, possam optar a não exercer a maternidade.

Portanto, em boa hora, examinamos o presente Projeto de Lei instituindo legalmente a interrupção da gravidez, para o caso de feto portador de anencefalia, acrescentando tal permissão no inciso III do art. 128 do Código Penal em vigor.

O Código Penal brasileiro pune o aborto, distinguindo-se três espécies: aborto provocado pela gestante, por terceiro sem consentimento desta, ou, por terceiro com este consentimento. Entretanto, reconhece determinadas situações em que o aborto não é punido: se não há outro meio de salvar a vida da gestante (art. 128, I); se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido do consentimento da gestante ou do seu representante legal (at. 128, II). A primeira permissão configura a hipótese do estado de necessidade, em que para salvar determinado bem jurídico, a vida da mãe, se sacrifica a vida do feto. O outro caso previsto pelo Código Penal é o da gravidez proveniente de estupro, que, diferentemente do primeiro, não se pode propriamente reduzir a hipótese de um estado de necessidade. E sim que, por razões de ordem ética ou emocional, o legislador introduziu essa descriminante, sob a alegação de que sentimentos tais como: revolta e aversão podem desenvolver-se na mulher violentada, em relação ao feto, fruto da violência.

Importante destacar que, sob o ponto de vista da ciência médica, a hipótese de anencefalia implica no seguinte diagnóstico: quase todos os casos são cientificamente inviáveis, pois o feto não tem condições de sobrevivência fora do útero materno. Outro aspecto importante é que por inexistir o cérebro não se pode atribuir qualquer expectativa possível de vida no feto. Também é difícil classificá-lo como ser da espécie humana, cuja característica essencial é a possibilidade de pensar. Portanto, impõe-se uma conclusão fundamental: no feto anencefálico não se considera, sob o aspecto científico, a existência sequer de uma pessoa humana.

Com certeza, o legislador em 1940, quando elaborou o Código Penal, não se defrontou com esta hipótese de gravidez, pois se naquela época houvesse o diagnóstico da medicina, de que aproximadamente quase cem por cento dos casos de anencefalia o feto morre nos primeiros momentos após o nascimento, reconheceria a interrupção da gravidez, conforme o fez nos casos descritos acima.

Ora, se é autorizado o aborto de gravidez resultante de estupro, em que pressupõe a existência de vida em potencial, com mais razão, deve ser reconhecida a interrupção de uma gravidez sem qualquer expectativa ou condições de sobrevida do nascituro. Em última análise, dever-se-ia aplicar nesse particular a analogia in bonam partem. No estupro tem-se a permissão do legislador, o qual tutela a dignidade da mulher em detrimento da vida em potencial que ela carrega no ventre, levando em consideração o sentimento de revolta e aversão em relação ao ser, fruto da violência, tornando-se ele testemunha da vergonha e da desonra de que foi vítima. Da mesma forma, por analogia, é passível de concessão, nesses casos, da antecipação terapêutica do parto, tratando-se de uma gravidez de feto sem cérebro, preservando-se a dignidade da pessoa humana, a saúde física e mental da mulher. Porquanto, não resta dúvida que, considerando os estudos cientificamente comprovados, na maioria dos casos, a inviabilidade da vida humana da criança transforma-se numa verdadeira tortura psicológica para quem a gere.

Registre-se que a par destas considerações os Tribunais vinham firmando o entendimento, por meio de decisões proferidas em todo o país, em que reconheciam o direito das gestantes de se submeterem à antecipação terapêutica do parto nos casos da gravidez em decorrência de feto portador de anencefalia, autorizando judicialmente a realização do aborto, desde que a anomalia estivesse comprovada em laudo médico. 1 Entretanto, decisões em sentido inverso desequilibravam essa jurisprudência.

Diante da polêmica existente no debate sobre o tema, a Confederação Nacional dos Trabalhadores, em julho de 2004 ingressou com uma Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 54), requerendo liminar, a fim de que o Supremo Tribunal Federal (STF) fixasse o entendimento no qual a antecipação terapêutica de parto de feto anencefálico (ausência de cérebro) fosse legalizada, permitindo que as gestantes em tal situação tivessem o direito de interromper a gravidez, sem a necessidade de autorização judicial ou qualquer outra forma de permissão específica do Estado. Ademais, é notória a morosidade da Justiça, em qualquer procedimento. Nesse caso, tal demora da autorização judicial acarreta mais angústia para a gestante, além de que, muitas vezes, a decisão torna-se inócua, chegando somente ao final da gravidez. A liminar foi, então, deferida pelo Relator Ministro Marco Aurélio de Mello. Todavia, o mérito não foi ainda decidido, apesar de ter iniciado o julgamento, pendendo de conclusão final a referida Ação no Pretório Excelso.


Frente ao exposto, espera a signatária do presente Parecer que o IAB aprove o Projeto de Lei, adotando-se no inciso III do art. 128 do Código Penal a não punição do aborto também para a hipótese “se o feto é portador de anencefalia, comprovada por laudos independentes de dois médicos”. Caso aprovado a conclusão do Parecer pelo Plenário, requer o encaminhamento de cópia dele às autoridades competentes, ao Congresso Nacional, ao Gabinete do Ministério da Saúde e do Ministério da Justiça.

Rio de Janeiro, 30 de maio de 2007.

Kátia Tavares

Membro e 1ª Vice-Presidente do IAB

Notas

(1) Nesse sentido: JCAT 63-84/699 e RT 756/652 TJAP: “Direito Penal – Jurisdição voluntária – Alvará de autorização judicial para realização de aborto – Feto portador de anencefálico – Estado depressivo da gestante atestado por laudo psicológico circunstanciado – Consciência da gestante e de seu marido das possíveis conseqüências de um aborto – interpretação da norma jurídica em consonância com art. 5° (Lei de Introdução ao Código Civil). Compõe-se a interpretação das normas vigentes segundo os fins a que se destinam e á luz das exigências do bem comum, para o fim de reformar a sentença fustigada e deferir o alvará autorizando a interrupção da gravidez” (RDJ 22/264).

Sabe-se que o direito à vida, abrangendo a vida uterina, assegurado pelo dogma do caput do artigo 5° do Texto Constitucional, é inviolável. Todavia, esse elementar direito não se apresenta absoluto, admitindo exceções conforme prescreve o artigo 128, e seus incisos do Código Penal. Ainda, observa-se o disposto no artigo 3° do Código de Processo Penal, que diz que: “a lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito”.

Ademais, deve o magistrado decidir com imparcialidade, sem se deixar levar pelas suas mais íntimas convicções como ser humano, quer sejam de ordem ética, moral ou religiosa, pois somente assim, deixando o espírito do julgador prevalecer, estará aplicando o direito com bom senso, principalmente no presente caso, em que nos parece estarem os Requerentes bastante conscientes do caminho por ele escolhido, sob orientação médica, onde ressalto que os fatores de ordem científica também devem ser considerados.

O renomado Professor Luiz Flávio Gomes, em parte de seu artigo “STF admite ação para discutir o aborto anencefálico”, nos leva a seguinte reflexão: “Como se percebe, de um lado está o interesse público na proteção do bem jurídico (a vida do feto); de outro está o interesse geral da liberdade, que se sintetiza na dignidade da pessoa humana. Qual deve preponderar? Qual tem maior valor? Algum desses interesses seria absoluto? Portanto, há um conflito de princípios constitucionais – direito a vida e direito à liberdade, o qual, no caso, somente pode ser dirimido pelo bom senso, considerando a alta probabilidade do feto morrer durante a gestação, logo após o parto, ou até no máximo 48 (quarenta e oito) horas, de acordo com os estudos médico-científicos. Ante o exposto, DEFIRO o pedido inicial, considerando ser o mais razoável perante as circunstâncias apresentadas. Expeça-se alvará especifico para que o Dr. Argeu Clávis de Castro Rocha, CRM-GO n° 1276, juntamente com sua equipe médica, proceda à interrupção da gravidez da 1ª Requerente, realizando-a na Fêmina Maternidade localizada na Alameda Coronel Joaquim Bastos n° 120, Setor Marista, Goiânia – GO, que deve autorizar que tal procedimento seja realizado em suas dependências” (fls. 6/9).

Diante dessa r. decisão, o impetrou-se mandamus, com pedido liminar, perante o e. Tribunal a quo, no qual se pretende anular a decisão que autorizou a intervenção cirúrgica para interrupção da gravidez. A liminar restou indeferida nos seguintes termos: “Dado o eventual caráter satisfativo da decisão, sem qualquer possibilidade de retrocessão de seus efeitos, resultando em um exaurimento definitivo do mérito, teço algumas ponderações acerca do meu posicionamento.

A dignidade da pessoa humana é definida por Alexandre de Moraes como sendo “um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar”.

Entendo, no presente caso, que deve predominar a autonomia da vontade da gestante, pois não se pode impor a uma mulher e também à sua família que suporte, por longo tempo, os riscos e o peso, moral e físico, de uma gestação que é incompatível com a vida intra-uterina e fatal em cem por casos.

A opção da mulher pela evolução ou não da gestação do feto anencefálico é um direito que deve ser respeitado, pois somente ela sabe o sofrimento físico e psicológico que suportará tanto para realizar o aborto como para gerar um ser em completa inviabilidade como pessoa, com vida autônoma, fora do útero materno.

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