Caso Richarlyson

Não aceitar homossexualismo não é discriminação, diz juiz

Autor

31 de outubro de 2007, 12h59

Ter opiniões contrárias ao homossexualismo não pode ser considerado discriminação. O que se pune e deve se reprimir é a discriminação à pessoa, que se caracteriza por atitude pessoal, nominal, não genérica. Ninguém pode obrigar alguém a ser católico, evangélico, corintiano, palmeirense ou são-paulino. Podemos não gostar do catolicismo, do evangelismo, do Cotinthians ou do São Paulo, mas não podemos atacar quem tem fé nessas religiões ou torce por esses clubes. Da mesma forma, não se pode atacar o homossexual, mas ninguém pode obrigar ninguém a gostar do homossexualismo.

Esse será o fundamento apresentado nesta quarta-feira (31/10) pela defesa do juiz Manoel Maximiniano Junqueira Filho, da 9ª Vara Criminal de São Paulo, para tentar sensibilizar os 25 desembargadores do Órgão Especial do Tribunal de Justiça paulista. O juiz ganhou notoriedade depois de arquivar processo movido pelo jogador Richarlyson Barbosa Felisbino — o Richarlyson, do São Paulo — contra um dirigente do Palmeiras. O dirigente, em um programa de televisão, insinuou que o atleta era homossexual. Entre outras declarações em sua decisão, o juiz afirmou que futebol era coisa de macho.

A defesa do juiz, a cargo do advogado Francisco de Assis Pereira, vai sustentar cerceamento de defesa, nulidade do acórdão de acusação, impedimento de todos os desembargadores que subscreveram o acórdão, ausência de falta grave cometida no episódio e que não houve preconceito no texto da sentença. O juiz pediu licença do cargo, mas desde o dia 1º está de volta às funções no Fórum Criminal da Barra Funda.

Em agosto, o Órgão Especial do TJ paulista acompanhou parecer da corregedoria-geral da Justiça e recebeu o pedido de abertura de procedimento para investigar o juiz, com base no artigo 35 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman). No entendimento do colegiado, havia indícios de que, naquele episódio, o juiz agiu com conduta incompatível com os deveres do cargo de magistrado. O procedimento administrativo disciplinar foi distribuído ao desembargador Vallim Bellocchi, que atua como relator.

O advogado do juiz vai pedir também a reabertura do prazo da defesa, alegando que as provas contra seu cliente não foram entregues e que o pedido de vista de processo foi indeferido. Vai apontar, ainda, que o acórdão do colegiado fez avaliação dos fatos e juízo de razão, transformando-se numa sentença de condenação antes de qualquer defesa. “Esse acórdão teria de obedecer aos ditames da sentença de pronúncia, onde é vedado ao magistrado emitir conceitos condenatórios, reservando a condenação para o órgão julgador”, afirma o advogado para justificar seu pedido de nulidade do acórdão de agosto.

No mérito, a defesa vai sustentar que seu cliente não feriu a Constituição Federal, não invadiu a vida privada, nem a honra, nem a imagem no jogador Richarlyson. Vai refutar as acusações de que a sentença seria pérola jurídica, cômica, ofensiva e esdrúxula, como foi apontada. “O magistrado pode ter suas opiniões pessoais, mas não agiu com descompostura e imparcialidade. Apenas recusou uma queixa-crime onde não se provara a acusação e onde não havia acusação formal a quem quer que seja.”

Reincidente

Não é a primeira vez que o juiz é investigado pela Corregedoria-Geral da Justiça. Ele já teve sua conduta questionada em pelo menos uma dezena de representações. Em duas delas, chegou a ser condenado às penas de censura e advertência, mas conseguiu reverter os castigos. Nos dois casos, a penalidade foi aplicada pelo Conselho Superior da Magistratura e reformada no Órgão Especial do TJ paulista.

O juiz pediu licença do cargo, anulou a sentença da ação penal privada de Richarlyson e foi afastado do processo. Este mês voltou ao cargo. Manoel Maximiniano Junqueira Filho não era o juiz natural do caso e despachou no processo por conta da ausência da juíza auxiliar, que estava de licença-saúde. A defesa do jogador entrou com representação no Conselho Nacional de Justiça acusando o juiz de homofobia.

A polêmica

A polêmica sobre a sexualidade de Richarlyson começou quando o jornal Agora São Paulo noticiou que um jogador de futebol estava negociando com o Fantástico, programa da TV Globo, uma entrevista na qual assumiria ser gay. Em junho, durante o programa Debate Bola, da TV Record, José Cyrillo Júnior foi questionado se o tal jogador homossexual era do Palmeiras. Cyrillo se saiu com essa: “O Richarlyson quase foi do Palmeiras”.

Richarlyson alegou que se sentiu ofendido e foi à Justiça. Na sentença, o juiz ressaltou toda a masculinidade do futebol e mostrou ao jogador são-paulino que a Justiça, nesse caso, não é a melhor alternativa. “Quem é ou foi boleiro sabe muito bem que estas infelizes colocações exigem réplica imediata, instantânea, mas diretamente entre o ofensor e o ofendido, num ‘tête-à-tête’.”

O juiz sugeriu o que o jogador poderia fazer. Se não fosse homossexual, o melhor seria ir ao mesmo programa de televisão dizer que era heterossexual. “Se fosse homossexual, poderia admiti-lo, ou até omiti-lo, ou silenciar a respeito. Nesta hipótese, porém, melhor seria que abandonasse os gramados.”

Para o juiz, gramado não é lugar de homossexual. “Futebol é jogo viril, varonil, não homossexual.” Não há ídolos de futebol que são gays, disse ele. E mais. Demonstrou a virilidade do esporte com o hino do Internacional de Porto Alegre: “Olhos onde surge o amanhã, radioso de luz, varonil, segue sua senda de vitórias”.

O juiz ainda ironizou a manifestação de um grupo gay da Bahia de que o futebol deveria ser aberto aos homossexuais. “Ora bolas, se a moda pega, logo teremos o sistema de cotas.” E completou: “Não que um jogador não possa jogar bola. Pois que jogue, querendo. Mas forme o seu time e inicie uma federação. Agende jogos com quem prefira pelejar conta si”.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!