Governo consumidor

Compras públicas têm de ser mais ágeis e transparentes

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27 de outubro de 2007, 23h00

O uso do pregão fez surgir enormes dúvidas e causou grandes divergências doutrinarias. Primeiramente quando a obrigatoriedade era restrita apenas ao âmbito da União, através do Decreto 3.555/00 e respectiva portaria.

Depois disso, achou-se por melhor editar uma Medida Provisória para regulamentar o certame, dando obrigatoriedade apenas à União para sua execução. E desde o advento desta primeira versão da Medida Provisória, já se questionava sobre a obrigatoriedade ou não dos estados e municípios utilizarem o pregão em suas contratações, quando possível.

A maioria dos estados e municípios acabou adotando o pregão apenas depois que essa Medida Provisória foi convertida na Lei 10.520/02, já sem a limitação de seu uso exclusivo à União.

Com a edição da Lei 10.520/02, foi sanado enfim o grande equívoco formulado pela Medida Provisória 2.108-9/00 e suas sucessivas reedições instituindo a referida modalidade de licitação apenas no âmbito da União. A polêmica desta MP girava em torno do fato de que a mesma esbarrava frontalmente com as disposições contidas no parágrafo 8º do artigo 22 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei 8.666/93).

Pode ser observado que os termos desta lei são de caráter geral aplicáveis a todos os entes da Federação, em clara obediência expressa no artigo 22, XXVII, de nossa Carta Magna.

Assim, cabe aos demais entes a estrita observância dos exatos termos previstos na legislação que instituiu essas normas gerais do procedimento licitatório, posto que a MP instituidora desta nova modalidade de licitação regulamentou o instituto apenas para o âmbito da União, e não operava como norma geral, mas de um modo expressivamente específico, e, com efeito, foi exatamente isto o que se desejou ao evitar o supracitado § 8º, do artigo 22 da Lei 8.666/93 em seu sentido teleológico: que os demais entes da Federação criassem novas modalidades de licitação no âmbito de suas respectivas administrações.

Sabe-se, entretanto que uma lei pode ser revogada por outra lei, também no caso de uma MP, porque esta detém força legal e pode revogar uma lei quando preenchidos os pressupostos legais contidos no artigo 62 de nossa Carta Magna de 1988:

“Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional”.

De fato, eis que a nova lei — a MP — era incompatível com a anterior (Lei 8.666/93), tornando possível, desta forma, a concepção do princípio de que a norma posterior revogou a anterior, uma grave incompatibilidade legal.

Indo de encontro a esta tese, intérpretes menos diligentes foram levados à exegese de que as disposições contidas na MP prevaleceriam sobre as da Lei 8.666/93, já que de acordo com outro princípio da hermenêutica jurídica: a norma especial prevalece sobre a norma geral. Não obstante a esta tese, a postura do exegeta não pode ser outra, a não ser a de que, antes de aplicar o critério cronológico, ou ainda, o critério da especialidade, ele deve de pronto observar o critério de hierarquia.

A questão de hierarquia é vislumbrada por nossa atual Constituição Federal, ao dar competência privativa para a União estabelecer normas gerais de licitação para todos os entes da Federação. Implicitamente define que estas normas gerais são de caráter nacional. E, notadamente, as disposições da lei anterior, Lei 8.666/93, obedecem ao caráter geral dado por nossa Constituição Federal, e deste modo são hierarquicamente superiores a qualquer legislação específica ou especial elaborada pelos demais entes da Federação que se aplicariam tão somente a si próprios.

Enfim, a MP instituidora do pregão somente o criou sob a égide da União e de pronto desrespeitou as disposições elencadas na lei geral de observância obrigatória porque é hierarquicamente superior como norma constitucional. Diante deste aspecto de hierarquia legal, concretiza-se o fato de que a celeuma da referida MP, estava absolutamente maculada de inconstitucionalidade material, o que tornou sua utilização absolutamente inválida.

Em tempo, pode-se declarar que, não só o intuito de discussão exegética ora fundamentado, mas como dos demais mestres adminstritivistas, findou-se quando houve a promulgação da Lei 10.520/02, onde toda discussão a despeito da inconstitucionalidade do pregão gerido pela respectiva MP de 2000 perdeu-se diante desta eventualidade. O legislador, percebendo o equívoco, sanou a existência desta inconstitucionalidade ao estabelecer a aplicação desta nova modalidade de licitação no âmbito de todos os estados, municípios e Distrito Federal. A nova legislação passou a ter caráter geral, em obediência à regra constitucional, podendo revogar a legislação anterior — ab-rogação da lei, ou seja, a lei nova provoca, total ou parcialmente, a cessação da autoridade de uma lei anterior. E assim, ficou revogada a previsão contida no citado § 8º do artigo 22 da Lei 8.666/93, bem como nos termos do artigo 2º, parágrafo 2º, da Lei de Introdução ao Código Civil. Neste sentido, uma nova lei tornou-se compatível com a anterior, revogando-a, portanto, tacitamente.

Pregão Presencial

Não se poderia acreditar que depois de uma problemática como esta, de inconstitucionalidade e embates jurídicos e doutrinários, se chegaria a acreditar que o pregão alcançaria tão crescente aceitação pelas entidades públicas em geral.

Primeiro, as normas que surgiram acerca do instituto, o restringiam apenas ao âmbito federal, depois o mesmo teve sua utilização generalizada para todos os entes públicos da Federação, consagrando-se desta forma a sua importância crucial nas compras e contratações pela via pública administrativa. Inserindo-se assim, num contexto muito maior do que simplesmente o seu de âmbito de atuação, pois o uso do pregão vem trazendo, desde sua origem, a desburocratização de atos públicos envolvendo uma esfera tão passível de erros e corrupção. No momento em que veio para reger todos os procedimentos conferidos à competência dos gestores administrativos nas compras públicas de bens e serviços comuns.

O pregão presencial é um instituto jurídico que se constitui em uma outra modalidade licitatória dentre as já existentes e enumeradas pela Lei 8.666/93. Ele veio para nutrir a necessidade de tornar muito mais eficiente e econômica a atuação do Poder Administrativo no âmbito das compras públicas, possuindo, como nas demais modalidades, diferenças relevantes de cunho procedimental.

As etapas que envolvem a sua execução se diferenciam das demais inicialmente pela inversão das fases, isto é, primeiro ocorre a disputa das propostas de preços para posteriormente avaliar-se a documentação de habilitação somente da empresa vencedora. Se por algum motivo legal esta não for considerada habilitada, a comissão desclassifica-a e analisa a próxima proposta de preço. O que não ocorre nas outras modalidades, que possuem regras muito mais complexas e que dão muito mais lentidão ao certame. Só em se saber de imediato qual empresa poderá ser contratada pelo melhor preço caso a vencedora não esteja habilitada, já proporciona a agilidade necessária para todo e qualquer procedimento de cunho público-administrativo.

A desburocratização da máquina pública veio desde a Emenda Constitucional 19/98, e o instituto do pregão presencial, num primeiro momento, surge a partir deste impulso legal. Percorrendo então o curso deste progresso na Administração Pública Moderna, não se pode negar que com o advento de determinações legais, a exemplo do Decreto Federal 5.540/2005, o futuro do pregão presencial será o desuso. A perspectiva atual é a de prevalência do pregão eletrônico sobre o presencial.

Justen Filho (2005) tece um relevante comentário em sua obra e opina acertadamente quando diz que não é exagero estimar que a difusão do pregão eletrônico produzirá a redução da relevância do pregão comum. À medida que as diferentes unidades administrativas instituam o pregão eletrônico, essa passará a ser alternativa dominante. Portanto, a utilização do pregão comum é uma etapa passageira. Não será surpresa se, dentro de alguns anos, a figura do pregão comum se configurar como uma raridade.

Pregão Eletrônico

Na órbita do direito administrativo, numa definição muito sintética, o Pregão é o modo pelo qual se realiza o leilão. Sendo este, de fato, o ponto gerencial que faz verter a expectativa de compra, leiloar para acolher a melhor proposta, e, por fim, efetivar celebração do contrato. Para que se tenha concretizado o certame que liga a expectativa de compra à efetivação desta, temos o meio, que será então o procedimento administrativo. A compra pública que utiliza como meio de aferir esta necessidade, os recursos da Tecnologia da Informação, é chamada de Pregão Eletrônico.

O pregão eletrônico é apenas um dos reflexos materiais da forte tendência pela tecnologia da informação nos meios jurídicos de atuação junto aos tribunais e demais esferas do Direito Público e Privado. Pois eis que esta onda tecnológica também se entranhou especificamente nesta modalidade de licitação, que tem se alargado com o passar dos anos numa grande maioria de Estados e Municípios brasileiros. A tecnologia avançou e trouxe à tona o pregão eletrônico, que é a licitação realizada, com a utilização dos recursos de tecnologia da informação.

A nova legislação, acompanhando as mais recentes conquistas científicas e tecnológicas das últimas décadas, propicia, à Administração dos três níveis de governo e do Distrito Federal, a utilização dos recursos eletrônicos ou de tecnologia da informação, e de ferramentas mais modernas e céleres, em consonância com os princípios maiores da presteza, desburocratização e eficiência, na forma de regulamentação específica.

Esta novíssima modalidade foi regulamentada pelo Decreto 3.697/00, o qual foi alterado e revogado pelo Decreto 5.450, de 31 de maio de 2005, que começou a vigorar em 1º de julho de 2005, e o posterior Decreto 5.504 de 05 de agosto de 2005, determinando sua regulamentação em âmbito federal para obrigatoriedade na contratação de bens e serviços comuns pela União.

O que se nota, é a devida atenção para um instituto que tem corroborado com o preenchimento das lacunas deixadas pelas demais modalidades de licitação, atendendo às necessidades de agilidade, economia e transparência nas contratações e compras públicas. Assim, não é por outra razão, que sua utilização gradualmente vem deixando de ser facultativa para se tornar obrigatória.

A compulsoriedade do uso do Pregão Eletrônico nos casos de uso de verba federal decorre também de outros fatores externos, tais como os escândalos envolvendo fraudes voluptuosas dentro do próprio governo federal.

Se a força motriz que rege todos os atos da administração pública é justamente a lei, este Decreto veio para encravar mais profundamente o que todos os cidadãos que compõem um Estado Democrático de Direito desejam: a justeza nos atos dos governantes. Legislar para tornar mais hábil e transparente os atos administrativos que envolvem as compras públicas é um grande passo para se conquistar políticas voltadas ao bom senso e a responsabilidade com o dinheiro público.

Trazendo avanços tecnológicos para empreender este tipo de política, nossos legisladores, e todas as demais esferas de poder que compreendem nossa Federação, estão propugnando junto ao Direito Administrativo, a modernidade e a idéia de que o direito caminha também com os avanços tecnológicos e globais rumo à sociedade moderna, assim como é forte o desejo de se tornar cada vez mais transparente e eficiente evolução das compras públicas.

Referências Bibliográficas:

FILHO, Marçal Justen. Pregão (Comentários à legislação do pregão comum e eletrônico). 4ª ed, rev e atual, São Paulo, Dialética, 2005.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 13ª ed. São Paulo, Atlas, 2001.

FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de Direito Administrativo. 7ª ed. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2001.

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