O ministro da Saúde José Gomes Temporão disse, na quinta-feira (18/10), que o Judiciário está tomando o lugar do médico no país, em uma crítica ao alto número de ordens judiciais para fornecimento, pelo poder público, de remédios caros e procedimentos médicos complexos.
“Na verdade, agora o Judiciário está prescrevendo, tirando o lugar do médico, e isso está criando um peso enorme de financiamento do sistema [público de saúde]", afirmou.
Temporão criticou a chamada "judicialização" do SUS (Sistema Único de Saúde) durante reunião dos governadores do Sul do país e do Mato Grosso do Sul, promovida em Curitiba. A reportagem é do jornal Folha de S. Paulo.
O secretário de Ciência e Tecnologia do Ministério da Saúde, Reinaldo Guimarães, afirmou que há uma "epidemia de ações judiciais" do setor de saúde. Ele disse que decisões judiciais obrigaram, neste ano, o Ministério da Saúde a bancar medicamentos no valor de R$ 26 milhões. Os Estados, segundo ele, desembolsam, em média, R$ 500 milhões por ano por causa do que ele chamou de "judicialização da saúde".
Segundo a assessoria do Ministério, a pasta já estudava propor uma lei para regular esse fornecimento mediante ordem judicial, mas foi "atropelada" pelos governadores, que pressionaram por medidas para conter o expediente.
“Não são só os governadores do Sul que se queixam. O governador José Serra [PSDB-SP] me disse que o Estado gasta por ano R$ 300 milhões com mandados judiciais. Virou uma farra, uma festa sem controle, que traz grave ameaça ao equilíbrio financeiro do sistema", disse.
Temporão conseguiu dos governadores reunidos, na quinta-feira (18/10), moção de apoio urgente à tramitação do projeto de lei do presidente do Senado, Tião Viana (PT-AC), que define regras para liberação das verbas. O projeto estabelece que apenas procedimentos e remédios protocolados no ministério sejam financiados pelo SUS.
"Dentro desse processo [judicialização] existe de tudo. Há prescrições justificáveis, mas existe muita picaretagem, fraude, medicamentos não registrados no Brasil, procedimentos experimentais", afirmou.
O presidente da AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), Rodrigo Collaço, afirmou que a crítica do ministro "tenta ocultar uma deficiência notória da política pública de saúde do Brasil".
Para ele, "as pessoas que recorrem ao Judiciário só o fazem porque não obtiveram o tratamento que a Constituição assegura para todo cidadão". De acordo com Collaço, o Judiciário tem suprido as "falhas" das políticas públicas, especialmente as de saúde e as desenvolvidas pelo SUS, que são "muito ruins".
No Supremo
Recentemente, a ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal, entendeu que não se deve confundir direito à saúde com direito a remédio. Ela adotou esse entendimento ao julgar um recurso do estado de Alagoas contra o fornecimento de medicamentos para um paciente individual.
De acordo com ela, o artigo 196 da Constituição Federal, ao assegurar o direito à saúde, se refere, em princípio, à efetivação de políticas públicas que alcancem a população como um todo, assegurando o acesso universal e igualitário. A ministra destacou que ele não garante situações individualizadas, como o fornecimento de remédios excepcionais e de alto custo que estão fora da lista do Sistema Único de Saúde.
Comentários de leitores
13 comentários
Arley (Funcionário público)
Não devemos nos esquecer que a CPMF foi criada para socorrer a saúde pública que ofegava pelo descaso de nossos governantes. Agora eles nos vêm com o discurso que iram aplicar apenas um percentual da grandiosa cifra arrecadada pelo Governo Federal! Até quando seremos tratados como imbecis?
Arley (Funcionário público)
O Senhor Ministro da Saúde tenta desviar o verdadeiro foco dos problemas apontando um culpado pela incompetência do Poder Executivo em cumprir os mandamentos da Constituição Federal. A final de contas, a quem iremos recorrer se, quem tem o dever de nos fornecer saúde não o faz? Ou será que os fundamentos da República Brasileira e os direitos sociais, contidos nos Arts. 1º e 6º da sobredita carta constitucional são apenas partes de um poema que trazem versos utópicos? O real problema não é a interferência do poder Judiciário nos outros dois Poderes, mas total descaso com a Saúde Pública. O caos na saúde são efeitos de sucessivas políticas públicas desastrosas. Falta de um planejamento consciente e de medidas que beneficiam a muitos, menos a nós povo. Felizmente, ainda podemos contar com o braço amigo de alguns setores do Poder Judiciário para nos socorrer quando nossos direitos fundamentias são jogados na lama do jogo político de nosso país!
Freire (Advogado Autônomo)
O ministro da Saúde José Gomes Temporão está fora de seu "tempo". Não é que o Judiciário "está tomando o lugar do médico no país". Essa leitura deve ser feita por quem ignora o princípio de pesos e contrapesos na administração pública. Dizer que "agora o Judiciário está prescrevendo... tirando o lugar do médico", é uma grande heresia jurídica. O que o Judiciário está fazendo é garantir a entrega dos direitos fundamentais e sociais do cidadão pela administração pública. Causa-nos perplexidade a Ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal, entender "que não se deve confundir direito à saúde com direito a remédio". Data maxima venia, se para se ter saúde (individualmente) é preciso ter acesso a remédios, então, por óbvio, "direito à saúde" é "direito à remédio". São mais de R$ 10.000.000.000,00 (dez bilhões de reais) por ano de CPMF. Onde está esse dinheiro? Era para a saúde quando editada a sua cobrança pelo Des-Governo Collor de Mello. "legis habemus", falta aplicar, e, quando não aplicada, Judiciário neles. Eduardo Freire.
Comentários encerrados em 27/10/2007.
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