Preço do benefício

Aumento de licença maternidade ajuda mas pode atrapalhar

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18 de outubro de 2007, 18h28

O projeto de lei (PLS) 281/2005, de autoria da senadora Patrícia Saboya (PDT-CE), que aumenta para seis meses a licença maternidade, pode restringir a inclusão da mulher no mercado de trabalho, segundo especialistas. O projeto aprovado, em caráter terminativo, nesta quinta-feira (18/10), pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado, segue agora para a Câmara dos Deputados.

Para o ministro Ives Gandra Martins Filho, do Tribunal Superior do Trabalho, o projeto torna mais realista essa proteção à maternidade. Ressaltou que com a prorrogação, o país fica mais próximo do que é vivenciado na Europa. Segundo ele, há países que a licença é de até dois anos. “Sabemos que a criança precisa efetivamente dos cuidados da mãe até, no mínimo, um ano. A prorrogação é um ônus social que vale a pena a ser assumido”, afirmou.

Ives Filho explicou que, como a medida é facultativa, vai depender da sensibilidade do empregador. Para ele, o projeto é positivo do ponto de vista social. Destacou, no entanto, que na prática o beneficio pode ter efeito negativo que é o de colocar certa restrição na contratação de mulheres.

A advogada trabalhista, Patricia Esteves Jordão, do Rayes, Fagundes e Oliveira Ramos Advogados, concorda com o ministro. Para ela, ao mesmo tempo em que a prorrogação pode ajudar, ela pode atrapalhar. Ela também entende que o prazo de seis meses pode dificultar a inclusão da mulher no mercado de trabalho.

Na opinião da advogada trabalhista Nadia Demoliner Lacerda, do escritório Mesquita Barros Advogados, o projeto tem um objetivo louvável, que é deixar a criança mais tempo perto da mãe. Mas a medida poderá causar impactos negativos em relação à vida profissional da mulher. “Em muitas profissões e cargos não há como largar tudo e se isolar por seis meses. A mulher corre o risco de perder espaço e ficar de fora do mercado de trabalho”, afirmou

A empresa que quiser conceder a licença de seis meses deve aderir ao programa Empresa Cidadã, criado pelo próprio projeto, que dará ao empregador isenção total no Imposto de Renda do valor pago às trabalhadoras nos dois meses a mais de licença.

No caso das servidoras públicas, a emenda prevê que “fica a Administração Pública, direta, indireta e fundacional, autorizada a instituir programa que garanta prorrogação da licença-maternidade para suas servidoras, nos termos do artigo 1º do projeto”. O artigo citado institui o Programa Empresa Cidadã, destinado a prorrogar por 60 dias a duração da licença-maternidade prevista no artigo 7º, XVIII, da Constituição.

O tributarista Roberto Pasqualin explica que o Governo, ao permitir a dedução do gasto durante os meses da prorrogação, está fazendo uma renúncia fiscal. Segundo ele, essa renúncia vai ser compensada por outras fontes de recursos como aumento de alíquotas ou criação de impostos novos.

“É importante destacar, no entanto, que não é porque o Governo fez uma renúncia fiscal que ele aumentará automaticamente outro imposto. Ele pode custear esse beneficio com sobras de arrecadação”, disse. Pasqualin acredita que se o benefício é facultativo quase nenhuma empresa vai aderir.

O projeto

A iniciativa legislativa destaca a importância do vinculo entre a mãe e o bebê, garantindo a amamentação nesses 6 meses. Nos primeiros meses de vida do bebê, o leite materno funciona também como uma espécie de vacina para vários tipos de doença comuns no período.

Como o projeto foi aprovado em caráter terminativo, segue direto para a Câmara, a menos que senadores apresentem recurso para que seja votado em Plenário. Se aprovado na Câmara sem alterações, irá a sanção presidencial e começará a vigorar.

“Esse projeto não representa nenhum gasto, mas um investimento nas crianças, no futuro do país. Nós precisamos garantir que a criança tenha desenvolvimento físico e intelectual total”, afirmou a senadora Patrícia Saboya após a aprovação da proposta.

Leia a íntegra

PROJETO DE LEI DO SENADO DE 2005

Cria o Programa Empresa Cidadã, destinado à prorrogação da licença-maternidade mediante concessão de incentivo fiscal.

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1º Fica instituído o Programa Empresa Cidadã, destinado a prorrogar por sessenta dias a duração da licença-maternidade prevista no art. 7º, XVIII, da Constituição Federal.

Parágrafo único. A prorrogação será garantida à empregada da pessoa jurídica que aderir ao Programa, desde que a empregada a requeira até o final do primeiro mês após o parto, e concedida imediatamente após a fruição da licença-maternidade de que trata o art. 7º, XVIII, da Constituição Federal.

Artigo 2º Durante o período de prorrogação da licença-maternidade, a empregada terá direito à sua remuneração integral, nos mesmos moldes devidos no período de percepção do salário-maternidade pago pelo regime geral de previdência social.

Artigo 3º No período de prorrogação da licença-maternidade de que trata esta Lei, a empregada não poderá exercer qualquer atividade remunerada e a criança não poderá ser mantida em creche ou organização similar.

Parágrafo único. Em caso de descumprimento do disposto no caput deste artigo, a empregada perderá o direito à prorrogação.

Art. 4º A pessoa jurídica que voluntariamente aderir ao Programa Empresa Cidadã terá direito, enquanto perdurar a adesão, à dedução integral, no cálculo do imposto de renda da pessoa jurídica, do valor correspondente à remuneração integral da empregada nos sessenta dias de prorrogação de sua licença-maternidade;

Art. 5º O Poder Executivo, com vistas ao cumprimento do disposto nos arts. 5º, II, 12 e 14 da Lei Complementar 101, de 4 de maio de 2000, estimará o montante da renúncia fiscal decorrente do disposto nesta Lei e o incluirá no demonstrativo a que se refere o § 6º do art. 165 da Constituição, que acompanhará o projeto da lei orçamentária cuja apresentação se der após decorridos sessenta dias da publicação desta Lei.

Art. 6º Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos a partir do primeiro dia do exercício subseqüente àquele em que for implementado o disposto no artigo anterior.

JUSTIFICAÇÃO

Um dos avanços sociais de maior significado para a evolução da sociedade humana no século XX é a formulação dos direitos básicos da criança e do adolescente, que exsurge como reconhecimento da complexa especificidade do ser humano no período de vida marcado pelos fenômenos de crescimento e desenvolvimento. Essa nova visão, fundada na evidência científica acumulada em todos os ramos de conhecimento pertinentes, permitiu a elaboração da doutrina jurídica que confere à criança o estatuto de cidadão.

Na esteira dessa grandiosa conquista, o Estado brasileiro tornou-se signatário das decisões oriundas da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos Humanos da Criança e do Adolescente (ECA), acolhendo, como conseqüência, no art. 1º do ECA, o princípio da Proteção Integral, do qual decorre a elevação de crianças e adolescentes brasileiros à condição de sujeitos de direitos. Vale dizer que as políticas públicas, medidas legais e atos legislativos que tenham a ver com o estrato populacional infanto-juvenil terão como marco referencial os interesses primordiais advindos da sua condição especial de pessoas em desenvolvimento.

O êxito do crescimento e desenvolvimento da criança, desde a vida intra-uterina, depende de numerosos fatores do meio ambiente em que se passa sua existência, mas, fundamentalmente, da criação de vínculo afetivo adequado com a mãe, o pai e demais membros do grupo social da família que a acolhe. Por outro lado, os laços fortes desse apego mãe-filho, filho-mãe, mãe-filho-pai-família construído no primeiro ano de vida, e particularmente nos seis primeiros meses, são indispensáveis ao surgimento da criança sadia, do adolescente saudável e do adulto solidário – emocionalmente equilibrados -, alicerces seguros de uma sociedade pacífica, justa e produtiva.

A licença-maternidade de 120 dias assegurada à trabalhadora brasileira no artigo 7º, inciso XVIII, da Constituição Federal, foi um passo vigoroso na garantia do direito da criança às condições mínimas para o estabelecimento do vínculo afetivo que a normalidade de seu crescimento e desenvolvimento requer.

Ora, o processo biológico natural, ideal, embora não único, para a construção dessa ligação afetiva intensa que se faz no primeiro ano de vida é o aleitamento materno. A amamentação não se presta apenas a prover nutrição ao lactente. Permite o contato físico com a mãe, a identificação recíproca entre mãe e filho, bem como o despertar de respostas a estímulos sensoriais e emocionais, compartilhadas num continuum bio-psicológico, que se configura como unidade afetiva incomparável. Por isso, e por proposta brasileira, a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda o aleitamento materno exclusivo durante os seis primeiros meses de vida. É a forma natural de propiciar a plenitude do vínculo afetivo original que, na espécie humana, se faz, de maneira insubstituível, nesse período. O princípio vale, inclusive, para mães trabalhadoras que não conseguem, por qualquer razão, amamentar seus filhos. Mesmo não lhes podendo alimentar com leite humano, podem garantir-lhes, com igual plenitude, todos os demais estímulos essenciais ao estabelecimento do vínculo afetivo, desde que estejam disponíveis para cuidarem dos filhos. Por isso, a Constituição, sabiamente, não restringe a licença maternidade às mulheres que estejam amamentando.

Ao defender o aleitamento materno exclusivo durante os seis primeiros meses de vida, o Brasil revelou sensibilidade diante de uma exigência crucial para a alimentação saudável no primeiro ano de vida. Contribuiu, também, para reforçar a definição da duração mínima desejável da licença-maternidade capaz de assegurar a excelência dos fenômenos decisivos que se passam no primeiro ano, dos quais depende a saúde do cidadão e, como conseqüência, o bem-estar de toda a sociedade.

É, pois, inadiável, a formulação de mecanismo jurídico que torne possível a prorrogação, por dois meses, da licença-maternidade de quatro meses determinada constitucionalmente, sem prejuízo de direitos adquiridos e sem custos adicionais para as empresas. Só assim será possível corrigir, em consonância com o que outros países já fizeram, o desencontro entre o que a Constituição Federal preceitua, o que a evidência científica recomenda e o Poder Público tem procurado implementar com a adoção de estratégias que visam estimular o aleitamento materno exclusivo por seis meses.

O Poder Público tem se valido do caminho do incentivo fiscal para atrair empresas a um nível elevado de compromissos sociais. Trata-se de solução justa e defensável numa economia de mercado e numa sociedade democrática, cuja lógica deve ser a do convencimento e não a da imposição.

Em vista dessas considerações, o intuito do presente projeto de lei é a criação do Programa Empresa Cidadã, destinado a estimular a prorrogação da licença-maternidade estabelecida na Constituição Federal, por período de sessenta dias, mediante a concessão de incentivo fiscal que demonstre o verdadeiro compromisso do Estado com a evolução social da nação.

A adesão ao programa é voluntária e, desde que realizada, confere à empresa o direito de deduzir, do imposto de renda devido, o valor correspondente à remuneração da empregada referente aos sessenta dias que perdurar a prorrogação da licença-maternidade.

Projeções indicam que a renúncia fiscal decorrente da proposição é palatável. Corresponde a cerca de R$ 500 milhões, referente à dedução, do imposto de renda devido, da remuneração da empregada afastada.

Constata-se, pois, que, em vista dos imensos ganhos sociais da iniciativa, a relação custo-benefício da proposta é claramente positiva, razão pela qual solicito o apoio dos nobres parlamentares.

Sala das Sessões,

Senadora PATRÍCIA SABOYA GOMES

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