Limites da negociação

Acordo coletivo não pode isentar empregado de marcação de ponto

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2 de outubro de 2007, 10h23

Cláusula de acordo coletivo que isenta o trabalhador da marcação de ponto é inválida, pois afronta a CLT e impossibilita o recebimento de horas extras feitas pelo funcionário. Em processo julgado na 6ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, o relator, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, julgou que esse tipo de flexibilização extrapola os limites da negociação. “Os próprios princípios do Direito do Trabalho estariam sendo colocados em xeque.”

Os ministros integrantes da Turma entenderam, por unanimidade, que prevalece o artigo 74 da CLT, que obriga os estabelecimentos com mais de dez empregados a manter controle de horário. O colegiado não conheceu do recurso apresentado pela Companhia de Bebidas das Américas (Ambev) e manteve entendimento de primeira e segunda instâncias.

Durante o julgamento, o ministro Corrêa da Veiga disse que não há como prevalecer a cláusula do acordo coletivo, na medida em que a marcação de ponto é a forma que têm as partes, na relação jurídica de trabalho, de garantia, de prova, da duração do contrato.

O ministro Horácio de Senna Pires destacou que o Direito do Trabalho surgiu da jornada de trabalho. “Todo nosso ordenamento jurídico trabalhista surge dessa matéria que é fundamental: a luta pelas oito horas de serviço”. Para a ministra Rosa Maria Weber, “há que se observar qual a norma que há de ser flexibilizada, porque qualquer dia, por norma coletiva, também não se terá que observar o salário mínimo”.

A ação foi apresentada por um empregado da área administrativa da Ambev no Rio Grande do Sul, que reivindicava as horas extras, entre outros pedidos. A empresa argumentou que nada devia, com base em cláusula de acordo coletivo ajustada com o sindicato dos trabalhadores. A cláusula 14 do acordo estabelecia que os “empregados que atuam em funções administrativas, pelas próprias características dessas atividades, ficarão isentos da marcação do cartão de ponto”.

A sentença considerou inválida a cláusula por afrontar diretamente os princípios norteadores da relação de emprego e não respeitar a norma constitucional de proteção ao trabalhador, dando motivo ao exercício deliberado de uma jornada excessiva. Com amparo em prova produzida nos autos, o juiz condenou a Ambev a pagar horas extras e arbitrou a seguinte jornada: de segunda a sexta-feira, das 7h às 22h; no sábado, das 8h às 17h30; e, em um domingo por mês, das 8h às 16h30.

A empresa recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul para pedir a suspensão dos efeitos da sentença. Alegou que, além da existência do acordo coletivo, havia adotado o regime de compensação de jornada e que o empregado em poucas oportunidades desenvolveu atividade extraordinária. O TRT manteve o entendimento e ressaltou que a Ambev não esclareceu quais seriam as características da atividade que impossibilitariam o registro da jornada.

Além disso, o tribunal considerou que a jornada compensatória é incompatível com a própria norma coletiva de isenção de registro, pois não há como verificar a regularidade de seu exercício.

No TST, a Ambev não conseguiu reverter a situação, apesar da sustentação oral da sua advogada, que pediu a prevalência do acordado sobre o legislado.

Na argumentação da advogada, além da Constituição Federal preservar a validade dos acordos coletivos, há precedentes no TST, da 4ª Turma, no sentido de observar o disposto na norma coletiva. No entanto, a 6ª Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso de revista da empresa. O ministro Horácio de Senna Pires ressaltou o problema da compensação: “Como se verificar o exercício regular dessa compensação sem a marcação de ponto?”.

RR-1591/2004-291-04-00.0

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