Execução penal

Juízes devem se empenhar em concretizar objetivos da LEP

Autores

  • Rosimeire Ventura Leite

    é juíza na Paraíba doutoranda em Direito Processual Penal pela USP mestre em Direito Constitucional pela UFC especialista em Ciências Criminais pela UFPE especialista em História da Filosofia pela Favip e professora de Direito Processual Penal (UEPB).

  • Kelly Cristina Canela

    é advogada doutoranda na área de Direito Privado pela Faculdade de Direito da USP e mestre em Direito pela Università di Roma “Tor Vergata”.

28 de novembro de 2007, 18h11

O objetivo do presente trabalho é fazer um estudo sobre a jurisdicionalização e os órgãos da execução penal. Trata-se de tema de grande relevância, uma vez que a fase de execução enseja vários problemas que dizem respeito à relação entre a intenção punitiva do Estado e o direito de liberdade do indivíduo, questões que ganham ainda mais relevo diante da crise por que passa o sistema penitenciário no Brasil.

De fato, a Lei de Execução Penal (Lei 7.210, de 1 de Julho de 1984) consagra um pensamento reconhecidamente avançado em termos de tratamento ao membro da comunidade que se submete à sanção penal, contudo remanescem as mais diversas dificuldades em sua plena concretização, o que nos impõe a necessidade de continuarmos buscando um sistema mais justo e que atenda melhor aos anseios da sociedade.

O trabalho analisa, na primeira parte, a jurisdicionalização da execução penal, idéia positivada já no artigo 2º da lei referida, o que representou um dos mais notáveis progressos introduzidos na legislação pátria pertinente à matéria. Em seguida, abordamos os órgãos da execução penal, suas atribuições e as expectativas em relação a eles, diante da realidade desafiadora que vivemos.

O estudo, portanto, é um convite para que possamos analisar o tema de acordo com o regramento constitucional e legal do processo penal executivo, observando os institutos à luz dos direitos e garantias individuais do devido processo.

Jurisdicionalização da Execução Penal

Concluído o processo penal de conhecimento, com o trânsito em julgado da sentença condenatória [1], o exercício da tutela jurisdicional ainda permanece, sendo que, a partir deste momento, para a concretização do título executivo emergente.

A fase de execução penal, aos poucos, demonstrou uma complexidade incompatível com a sua classificação como mero desdobramento do processo de conhecimento. Por outro lado, os problemas que foram surgindo no sistema penitenciário também fizeram perceber a necessidade de mais atenção por parte dos três Poderes estatais e da sociedade.

Importa notar que a autonomia da execução penal – científica, jurídica e legislativa[2] – desvelou igualmente os dramas próprios da relação entre o interesse punitivo do Estado e a liberdade daquele a quem é imposta uma pena, quando chega o momento decisivo de fazer cumprir o que ficou estabelecido na sentença.

Analisamos, neste contexto, a idéia da jurisdicionalização da execução penal e seus reflexos, passando pelos conceitos de jurisdição penal, processo e ação penal executiva.

Considerações Gerais

O problema da natureza jurídica da execução penal já foi objeto de acirrados debates, divergindo as opiniões quanto ao caráter administrativo ou jurisdicional da execução da sanção penal.

Pela primeira corrente, a execução penal limita-se a uma atividade meramente administrativa, em que a atuação do juiz se restringe a fiscalizar as ações dos agentes que ocupam o sistema carcerário. Por outro lado, o reconhecimento da jurisdicionalidade implica a atribuição de um papel mais ativo à autoridade judicial, indicando que a execução penal também deve ser cercada de direitos e garantias, aplicando-se a esta fase o devido processo penal.

A jurisdicionalidade é a noção predominante na doutrina pátria, sendo igualmente a posição adotada pela Lei de Execução Penal, ao fazer referência no artigo 2º, caput, à “jurisdição penal dos juízes ou tribunais da justiça ordinária” [3] e ao “processo de execução”. Deste modo, o exercício da jurisdição não se encerra com o decreto condenatório, prolongando-se ainda durante a fase de satisfação do título executivo. Cumprido este, conclui-se enfim a atividade estatal no exercício de seu interesse punitivo.

Conforme observa Rogério Lauria Tucci, a jurisdição penal insere-se no contexto genérico da jurisdição, entendida esta como “poder-dever de realização de justiça estatal, por órgãos especializados do Estado”. Apresenta, porém, características próprias, na medida em que é através desta forma mais específica de jurisdição que se aplicam “as normas jurídicas penais materiais positivas a um caso concreto”, inserindo-se neste conceito também a idéia de “poder-dever de julgar as causas criminais”. [4]


Importa ressaltar, no entanto, que o poder-dever de prestar a tutela jurisdicional deve realizar-se através do processo, com a observância do regramento determinado na legislação. O processo, neste sentido, revela-se como instrumento pelo qual a jurisdição se efetiva, sendo, pois, inevitável, para que haja a aplicação de uma pena ou medida de segurança [5]. Neste mesmo contexto, vê-se a necessidade do processo igualmente na fase executória. Nas palavras de Ada Pellegrini Grinover, “o processo de execução penal nada mais é do que o instrumento através do qual opera a jurisdição, para a tutela judiciária dos direitos subjetivos do sentenciado e para a efetiva realização do comando concreto emergente da sentença”. [6]

Este processo penal de execução tem por objetivo “realizar concretamente a sanção neste especificada, mediante a realização de atos executórios, consistentes em operações jurídicas e práticas, que a tornem efetiva; vale dizer, devida e realisticamente atuada”. [7]

Trata-se, pois, de processo autônomo e não de uma simples fase do processo de conhecimento, consoante ressalta Sérgio Marques de Moraes Pitombo, ao mencionar que “o processo penal de conhecimento volta-se para o passado, que tende a reconstruir. O processo penal de execução mira o futuro e visa a prevenir infrações penais, de modo prevalente”. [8]

Assim, trazer a idéia de jurisdição para a execução penal implica o reconhecimento de que esta atividade deve ser necessariamente exercida através de um processo, desenvolvendo-se perante órgãos estatais especializados, a fim de que a prestação jurisdicional seja completa.

Por outro lado, cabe ainda ressaltar a particularidade da ação penal executiva, que dá ensejo ao processo de execução, uma vez que esta se consubstancia na ação judiciária, independendo, portanto, de ação da parte. De fato, formado o título executivo com o trânsito em julgado da sentença que impôs a sanção penal, o juiz procede de ofício nos atos executórios, prescindindo de atuação de uma parte em sentido processual. [9] Trata-se, pois, da regra da oficialidade, aplicada, plenamente, neste contexto. [10]

Legalidade e Jurisdicionalidade

O primeiro aspecto a ser destacado é o caráter fundamental da legalidade da execução das penas e medidas de segurança. Com efeito, a garantia da legalidade deve reger toda a atividade do Estado de direito, impondo limites e afastando a arbitrariedade, o que não poderia ser diferente em se tratando de execução penal.

É esta legalidade que desempenha função essencial no combate às práticas abusivas que inevitavelmente ocorrem quando determinada atividade se restringe ao âmbito da discricionariedade, sem que haja formas de fiscalização. A legalidade traz racionalidade e controle dos atos praticados, assegurando que estes não sejam frutos de mera discricionariedade ou subjetivismo, mas que tenham parâmetros nas normas tipificadas pelo ordenamento jurídico e realizem os valores nestas contidos.

O cânone da legalidade impõe-se não só no que se refere ao título executivo, como também aos direitos e deveres do condenado, faltas disciplinares e sanções. [11]

Conforme ressalta Ela Wiecko V. de Castilho, “o princípio da legalidade da execução penal importa na reserva legal das regras sobre as modalidades de execução das penas e medidas de segurança, de modo que o poder discricionário seja restrito e se exerça dentro de limites definidos”. [12]

O reconhecimento da legalidade também está relacionado com a jurisdicionalização, na medida em que caberia a um órgão jurisdicional a fiscalização e o controle sobre o cumprimento das normas que disciplinam a execução das penas e medidas de segurança. [13]


A concepção de uma execução penal meramente administrativa já não se harmoniza com as exigências do Estado democrático de direito, principalmente no que diz respeito à proteção dos direitos e garantias fundamentais. No entanto, o reconhecimento da jurisdicionalidade só se deu em época recente. Na legislação pátria, este pensamento só prevaleceu com a atual Lei de Execução Penal, em que igualmente se firmaram as idéias de autonomia e legalidade da execução.

A progressiva admissão dos direitos da pessoa que cumpre pena e o seu reconhecimento como sujeito de direito, e não objeto da execução, levaram à necessidade de uma intervenção jurisdicional sobre a execução das sanções penais impostas. De fato, é através de um órgão jurisdicional que se possibilita a ação necessária para a efetivação destes direitos. Nesta linha, afirma Anabela Miranda Rodrigues que “o que está em causa é ter-se reconhecido que a tutela efectiva dos direitos dos reclusos supõe que estes possam dirigir-se a órgãos jurisdicionais”. [14]

A jurisdicionalização da execução penal atribui a juízes e tribunais uma função central no processo executivo, de caráter prevalentemente jurisdicional, o que retira poderes da esfera administrativa, mas não a exclui. De fato, remanescem procedimentos internos, ações para a manutenção dos estabelecimentos penais, atos fiscalizatórios e aspectos burocráticos que dizem respeito à própria rotina do sistema carcerário.

Por outro lado, em se tratando de verificar o fiel cumprimento do título executivo, a correção da atividade administrativa e o respeito aos direitos e garantias do membro da comunidade que se submete à sanção penal, a intervenção dos membros do Poder Judiciário é imprescindível.

Neste sentido, é através da atuação jurisdicional que são apreciadas e resolvidas as questões relacionadas aos interesses da pessoa que cumpre a pena ou medida de segurança e o interesse punitivo do Estado, ao longo do processo executivo e até que se concretize o que ficou estabelecido na sentença transitada em julgado.

Acrescente-se ainda que estas questões não dizem respeito apenas aos incidentes da execução, consoante ressalta Mirabete, mas também a “qualquer situação do processo executório em que se contraponham, de um lado, os direitos e os deveres componentes do status do condenado, delineado concretamente na sentença condenatória e, de outro, o direito de punir do Estado, ou seja, de fazer com que se execute a sanção aplicada na sentença”. [15]

Conseqüências da Execução Penal Jurisdicionalizada

Um dos principais reflexos do reconhecimento da natureza jurisdicional da execução penal está relacionado à aplicação do devido processo penal e das garantias que lhe são inerentes.

Com efeito, considerando que a jurisdição – presente na fase executória, como visto – só se concretiza através do processo, e que este, por sua vez, exige a observância das regras positivadas no sistema, a fim de proteger as partes em sentido processual e a própria tutela jurisdicional, impõe-se afirmar ser imprescindível a aplicação do devido processo penal aos procedimentos executivos.

Por conseguinte, o indivíduo que se submete à sanção penal tem sua posição jurídica alterada, deixando de ser apenas um objeto da execução para ser um sujeito de direitos. Nesta linha de pensamento, a doutrina de Anabela Miranda Rodrigues, ressaltando que “ficou para trás o tempo em que o condenado à pena de prisão era despojado de todos os direitos, transformando-se em objecto de uma relação especial de poder criada e mantida num espaço de não-direito”. [16]

O primeiro aspecto a ser considerado é a garantia da ampla defesa e do contraditório no âmbito da execução penal. De fato, os procedimentos da fase executória não podem ser tomados à revelia da defesa, sob pena de o processo se transformar em uma mera formalidade. A defesa técnica, por sua vez, deve ser efetiva, presente, atuando no sentido de preservar os direitos daquele que cumpre a sanção penal. Neste sentido, acrescenta Dyrceu Aguiar Dias Cintra Júnior que a defesa técnica “é necessária para que valham em sua plenitude as garantias do contraditório e ampla defesa. Só assim se poderá dizer que de fato se trata de devido processo legal, jurisdicionalizado”. [17]


Assim, importa pôr em relevo igualmente a importância da atuação da defensoria pública, sem a qual as garantias da ampla defesa e do tratamento paritário ficam completamente prejudicadas para aqueles menos favorecidos, os quais formam a grande parte da população carcerária brasileira.

Para Antônio Magalhães Gomes Filho, “é evidente não ser possível a dispensa de participação do defensor técnico no processo de execução penal, pois tal exigência decorre diretamente dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, nos quais está implícita a ‘paridade de armas’ características do devido processo legal”. [18]

Por outro lado, não se exclui a autodefesa, sendo exigível a oitiva do condenado em determinadas situações, a exemplo da regressão de regime, na forma prevista no artigo 118, parágrafo 2º, LEP. No entanto, é a defesa técnica que, de uma maneira mais eficiente, preserva os interesses do indivíduo que cumpre a sanção penal, equilibrando sua posição frente ao poder do Estado e seus mecanismos de repressão.

Como manifestação da plenitude de defesa e do contraditório, pode-se elencar o direito à prova. Tal providência por vezes é necessária para fazer valer a proteção dos demais direitos e garantias, a fim de que as decisões se aproximem mais da justiça, da realidade dos fatos, o que é essencial para os objetivos de ressocialização e reintegração social contidos na LEP.

De fato, na execução penal as questões referentes à prova e à busca da verdade também são relevantes, haja vista que nos incidentes o juiz precisa de elementos para formar sua convicção, o que se realiza através da produção probatória.

Deste modo, nas palavras de Rogério Lauria Tucci, “toda a atividade instrutória da causa penal, de natureza cognitiva ou executiva (ins-truere), tem endereço certo, qual seja a construção de um ato decisório, mediante o qual o órgão jurisdicional a aprecia (construere), formando sua convicção pela livre apreciação da prova produzida acerca da perquirida verdade dos fatos examinados”. [19]

Cumpre ainda colocar em relevo que, nesta atividade instrutória, o juiz também atua por iniciativa própria, determinando a produção das provas que entenda cabíveis para a elucidação dos fatos, submetendo, naturalmente, o resultado disso ao conhecimento da defesa e do Ministério Público. E nesta linha de raciocínio, Marcos Alexandre Coelho Zilli aponta o artigo196, parágrafo 2º, da LEP, como o dispositivo que autoriza genericamente esta iniciativa judicial, havendo ainda outros artigos específicos sobre a matéria, tanto na LEP quanto no Código de Processo Penal, a exemplo do artigo 175, V, LEP, e arts. 708, parágrafo único, e 730, CPP. [20]

Necessária também a garantia do juiz natural, estabelecida no artigo 5º, LIII e XXXVIII, da Constituição Federal de 1988, e que se estende ao processo executivo, diante do disposto no artigo 65, LEP. Assim, a regra é que o juiz competente para a execução penal seja o indicado na lei de organização judiciária local. Não havendo este, a competência permanece com o juiz que prolatou a sentença.

Com a garantia do juiz natural, tem-se a imparcialidade do órgão julgador, que se coloca acima dos interesses em questão no processo, o que evita favorecimentos injustificáveis ou a pretensão de acarretar algum prejuízo. Enfim, é mais um mecanismo de coibir decisões viciadas.

Destaca-se ainda, dentre estas garantias, a da motivação. O dever de motivar os atos decisórios encontra-se previsto na Constituição Federal de 1988, artigo 93, IX, impondo a necessidade de justificação sob pena de nulidade. Com isso, tem-se uma importante garantia contra o arbítrio e o subjetivismo na decisão judicial, contribuindo para o controle dos atos decisórios.

Tal dever persiste na fase executória, de modo que o juiz deve justificar as razões de seu convencimento ao proferir as decisões nos incidentes da execução, demonstrando com clareza o raciocínio adotado e os dispositivos de lei em que se funda, possibilitando, assim, a impugnação do ato pelos meios recursais cabíveis.

Adotando este posicionamento e ressaltando a dificuldade de motivação no processo executório, comenta Antônio Magalhães Gomes Filho que a tarefa não é simples, “até porque as previsões legais fazem referência a vários conceitos indeterminados como mérito (artigo 112, caput, da LEP), comportamento adequado (artigo 123, I, da LEP), comportamento satisfatório (artigo 83, III, do CP c.c. artigo 131 da LEP) etc., que supõe difíceis escolhas valorativas para sua concretização e reclama, é óbvio, um correspondente empenho justificativo, sem o qual haveria o risco de transformarem-se os propósitos de recuperação e reintegração social do condenado em licença para o arbítrio”. [21]


Acrescente-se que esta motivação deve ser efetiva, e não apenas implícita, concordando com os termos do pronunciamento do Ministério Público, ou aparente, utilizando frases genéricas que poderiam se adaptar a qualquer processo.

Cumpre, por fim, mencionar a garantia do prazo razoável para a solução dos incidentes e questões levadas ao conhecimento do juiz da execução penal. A Constituição Federal de 1988, com a Emenda Constitucional n. 45/2004, estabeleceu no artigo 5º, LXXVIII, que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

Na execução, a morosidade da justiça acaba sendo um dos fatores que contribuem para as dificuldades do sistema carcerário, fazendo com que o julgamento dos pedidos seja muitas vezes retardado, o que fere o princípio da individualização da pena e impede que o condenado tenha sua situação melhorada dentro do sistema. É possível também que o indivíduo permaneça mais tempo do que o devido na prisão, por falta de mais celeridade na apreciação de seu processo executivo.

Vê-se, deste modo, que a jurisdicionalidade da execução penal é o pensamento predominante e também acolhido pela Lei de Execução Penal brasileira. No entanto, muito ainda há o que ser feito para que as conseqüências advindas disso sejam efetivamente concretizadas, mudando as condições reais em que se encontra o cumprimento das sanções no sistema carcerário pátrio.

Assim, analisada a natureza jurisdicional da execução penal, cumpre abordar os seus órgãos, que são essenciais para que os objetivos da LEP sejam alcançados, sobretudo a ressocialização do condenado e sua reinserção no ambiente social.

Órgão da Execução Penal

Conforme visto, os objetivos da execução penal, ou seja, a efetivação das disposições da sentença ou decisão criminal e oferecimento de condições para a harmônica integração social do condenado e do internado, são alcançados através de uma atividade complexa (jurisdicional e administrativa), exercida pelo Poder Judiciário, pelo Poder Executivo, pelo Ministério Público e pela comunidade.

Ora, como todos atuam com vistas ao mesmo fim, conclui-se que a atuação de cada órgão da execução penal deve ocorrer em harmonia com os demais, de forma a constituir uma unidade.

Dada a complexidade desta atividade e a necessária atuação conjunta e harmônica dos mencionados órgãos, passamos, então, a analisar cada um destes.

Considerações Gerais

Até a década de 60, os tribunais brasileiros e europeus ignoravam as reivindicações dos presos no tocante ao modo em que se dava a execução da pena. Consoante o pensamento corrente, o juiz concluía o seu papel após a pronúncia da sentença condenatória. Competia ao sistema penitenciário (poder discricionário da administração penitenciária) o controle da execução da pena privativa de liberdade, limitando-se a intervenção do Juízo das Execuções à solução dos incidentes da execução. [22]

No sentido de combater este posicionamento, pugnava-se, desde a década de 50, por uma lei federal de execução penal. Essa idéia finalmente concretizou-se com a Lei 7.210/84, por meio da qual obteve-se o controle jurisdicional dos atos da execução. [23]

Os órgãos da execução penal, os quais foram estabelecidos sem um rigor hierárquico, estão elencados no artigo 61 da LEP:

1. o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária;

2. o Juízo da Execução;

3. o Ministério Público;

4. o Conselho Penitenciário;

5. os Departamentos Penitenciários;

6. o Patronato;

7. o Conselho da Comunidade.

Esta enumeração não é taxativa, podendo intervir, na execução penal, outros órgãos, como a Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana.

Ressalte-se que, dos órgãos mencionados no artigo 61 da LEP, apenas o Patronato não possui qualquer competência no controle da legalidade da execução. [24]

Estes órgãos devem atuar de forma conjunta e harmônica, embora isto seja difícil em razão da diversa natureza jurídica dos mesmos. [25]


De qualquer forma, como é afirmado na própria Exposição de Motivos da LEP, as atribuições pertinentes a cada um dos órgãos enumerados no artigo 61 foram estabelecidas de forma a evitar conflitos, realçando-se, por outro lado, a possibilidade de atuação em conjunto, destinada a superar os gravosos inconvenientes derivados do antigo conceito de que a execução das penas e das medidas de segurança era assunto de natureza meramente administrativa. [26]

Diante de objetivos mais políticos que jurídicos, objetivou-se uma maior elasticidade no modo de tratar o condenado, de executar a pena e permitir uma dinamização de todo o processo executório. Destaca-se ainda, na atribuição das competências dos presentes órgãos, um sentido de jurisdicionalização da execução penal, juntamente com um caráter político criminal da participação da comunidade nesse processo, mediante a atuação dos patronatos particulares e do conselho da comunidade. [27]

Destaca-se que o sucesso na persecução criminal depende de uma visão em conjunto do “Sistema Criminal”, pois de nada adianta “o exame isolado da criminalidade sem conhecer o conjunto dos poderes e órgãos do Estado que atuam, ou devem atuar, empenhando-se contra a violência e a criminalidade, dentro de suas competências legais”. [28]

Realmente, se o juízo competente, as autoridades administrativas responsáveis pela observância das regras carcerárias e a comunidade – fundamental na reintegração social do sentenciado – não atuarem com a unidade e o entrosamento necessários, será praticamente impossível a realização dos objetivos da execução penal e, como conseqüência, aumentarão os índices de criminalidade. [29]

O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária

Trata-se de órgão subordinado ao Ministério da Justiça, tendo sua sede na Capital da República. O Departamento Penitenciário Federal atua como seu órgão de apoio administrativo. [30]

O Conselho Nacional, bem como o Departamento Penitenciário Federal, existem desde 1975, quando foram criados pelo Decreto 76.387, de 2 de outubro de 1975, o qual reestruturou o Ministério da Justiça.

Quanto à sua composição, este órgão é integrado por treze membros, designados por ato do Ministério da Justiça, dentre professores e profissionais da área do Direito Penal, Processual Penal, Penitenciário e ciências correlatas, bem como por representantes da comunidade e dos Ministérios da área social. O mandato dos seus membros tem a duração de dois anos. [31]

O Conselho, no tocante à atividade, atua nos âmbitos federal e estadual, das seguintes formas: [32]

I – propondo diretrizes da política criminal e execução de penas e das medidas de segurança;

II – contribuindo na elaboração de planos nacionais de desenvolvimento, sugerindo as metas e prioridades da política criminal e penitenciária;

III – promovendo a avaliação periódica do sistema criminal para a sua adequação às necessidades do País;

IV – estimulando e promovendo a pesquisa criminológica;

V – elaborando o programa nacional penitenciário de formação e aperfeiçoamento do servidor;

VI – estabelecendo regras sobre a arquitetura e construção de estabelecimentos penais e casas de albergados;

VII – estabelecendo os critérios para a elaboração da estatística criminal;

VIII – inspecionando e fiscalizando os estabelecimentos penais, bem assim informando-se, mediante relatórios do Conselho Penitenciário, requisições, visitas ou outros meios, acerca do desenvolvimento da execução penal nos Estados, Territórios e Distrito Federal, propondo às autoridades dela incumbidas as medidas necessárias ao seu aprimoramento;

IX – representando ao juiz da execução ou à autoridade administrativa para a instauração de sindicância ou procedimento administrativo, em caso de violação das normas referentes à execução penal;


X – representando à autoridade competente para a interdição, no todo ou em parte, de estabelecimento penal.

Destacamos as seguintes regras editadas pelo presente Conselho Nacional:

1) Resolução 1, de 30 de março de1999 (Recomenda aos Departamentos Penitenciários Estaduais ou órgãos congêneres seja assegurado o direito à “visita íntima” aos presos de ambos os sexos, recolhidos aos estabelecimentos prisionais); [33]

2) Resolução 2, de 30 de março de 1999 (Define e reforma regras para a organização dos Conselhos Penitenciários dos Estados e do Distrito Federal, e dá outras providências);

3) Resolução 5, de 19 de Julho de 1999 (Diretrizes Básicas de Política Criminal e Penitenciária); [34]

4) Resolução 16, de 17 de dezembro de 2003 (Diretrizes Básicas de Política Criminal quanto à Prevenção do Delito, Administração da Justiça Criminal e Execução das Penas e das Medidas de Segurança); [35]

O Conselho pode encaminhar um caso de não-execução de lei federal ao Procurador-Geral da República, o qual poderá, por sua vez, representar perante o STF, requerendo intervenção federal no Estado. Ademais, o Conselho ainda tem o poder de representar autoridades administrativas federais para a suspensão de qualquer ajuda financeira federal destinada aos Estados com o objetivo de atender às despesas de execução das penas e medidas de segurança (artigo 203, parágrafo 4° da LEP). São, contudo, medidas que dificilmente seriam aplicadas. [36]

Este órgão tem recebido um elevado número de denúncias de sentenciados sobre fatos ocorridos nos estabelecimentos penais. Quanto ao procedimento, há o ofício ao Juízo da Execução do denunciante, ao Procurador-Geral da Justiça do Estado em que esteja cumprindo a pena e, quando entendido necessário ou conveniente, ao órgão estadual da Defensoria Pública. O ofício pode voltar-se para a solicitação de instauração de sindicância ou procedimento administrativo. [37]

O Juízo da Execução Penal

O juiz competente para a execução penal será aquele indicado na lei local de organização judiciária e, na sua falta, o da sentença. [38] Ademais, como determina a Súmula 192 do STJ, compete ao juízo das execuções penais do Estado a execução das penas impostas aos sentenciados pela Justiça Federal, Militar ou Eleitoral, quando recolhidos a estabelecimentos sujeitos à administração estadual. [39]

Vejamos, pois, o que compete ao juiz da execução: [40]

I – aplicar aos casos julgados lei posterior que de qualquer modo favoreça o condenado[41]. Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao Juízo da Execução a aplicação de lei mais benigna. [42]

Ademais, cabe ressaltar que não existe dispositivo constitucional ou ordinário que preveja a ultratividade ou a retroatividade de lei mais benigna quando se trata de norma extrapenal, como no caso das regras jurídicas processuais e administrativas; [43]

II – declarar extinta a punibilidade.

III – decidir sobre:

a) a soma ou unificação de penas. Quando houver várias condenações contra uma mesma pessoa, o juiz da execução receberá várias guias, registradas em livro especial, consoante a ordem cronológica do recebimento e anexadas ao prontuário do condenado. [44]As penas, então, devem ser somadas para que se retifiquem as guias de execução, observando-se a ordem determinada pelas datas de trânsito em julgado. Por outro lado, havendo várias sentenças condenatórias contra um indivíduo em casos de continência, sem que tenha ocorrido a unificação dos processos em uma única ação penal pela avocação do juízo prevalente, serão expedidas várias guias de recolhimento, cabendo ao juiz encarregado da execução a unificação das penas aplicadas; [45]


b) progressão ou regressão nos regimes;

c) decretação[46] e remição da pena;

d) suspensão condicional da pena. Caso o juiz ou o tribunal de condenação sejam omissos quanto às condições do sursis, nada impede que o juízo da execução as fixe, declarando como devem ser cumpridas: [47]

e) livramento condicional;

f) incidentes da execução;

IV – autorizar saídas temporárias;

V – determinar:

a) a forma de cumprimento da pena restritiva de direitos e fiscalizar sua execução;

b) a conversão da pena restritiva de direitos e de multa em privativa de liberdade;

c) a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos;

d) a aplicação da medida de segurança, bem como a substituição[48] da pena por medida de segurança;

e) a revogação da medida de segurança;

f) a desinternação e o restabelecimento da situação anterior;

g) o cumprimento de pena ou medida de segurança em outra comarca;

h) a remoção do condenado na hipótese prevista no parágrafo 1° do artigo 86 da LEP. É importante observar que o juiz, ao determinar a remoção para outra unidade da Federação, está declinando da sua competência para a execução penal: [49]

VI – zelar pelo correto cumprimento da pena e da medida de segurança;

VII – inspecionar, mensalmente, os estabelecimentos penais, tomando providências para o adequado funcionamento e promovendo, quando for o caso, a apuração de responsabilidade: [50]

VIII – interditar, no todo ou em parte, estabelecimento penal que estiver funcionando em condições inadequadas ou com infringência aos dispositivos da LEP;

IX – compor e instalar o Conselho da Comunidade;

X – emitir anualmente atestado de pena a cumprir.

Na execução penal, o juiz possui competência jurisdicional estrita[51] e ainda exerce atribuições de caráter administrativo[52] quando tem por objetivo normalizar a execução penal, a qual está sujeita a normas legais e prescrições regulamentares. Neste último caso, o juiz, como órgão da administração, atua para tornar efetivo o interesse do Estado, decidindo como titular de um interesse particular e tendo como limite apenas a lei. [53]

Uma interessante questão sobre a atuação judicial diz respeito à aplicação e ao controle da pena restritiva de direitos. A dificuldade prática de adequar o conhecimento da ação penal e o seu julgamento com a previsão do específico serviço à comunidade, a qual deveria ser estabelecida e verificada pelos magistrados da fase de conhecimento, tem levado a alguns deles a não fixá-la precisamente na sentença. Assim, por exemplo, são utilizados os seguintes termos: “sessenta dias de serviço à comunidade a serem fixados na execução” ou in casu, fixando “pena restritiva de direitos, a critério da Vara das Execuções Criminais”. [54]O exercício desta atribuição pela Vara das Execuções Criminais, ainda que tão-somente para o controle, parece atender ao espírito da legislação e não ofende nenhum direito público subjetivo.

Uma discussão polêmica diz respeito à exigência do comparecimento de um juiz corregedor ou de um juiz das execuções criminais na rebelião em presídios. A atuação necessária do magistrado no gerenciamento da crise, neste caso de rebelião, parece imprópria, pois ele não tem comando sobre órgãos do Poder Executivo, os quais a ele não se subordinam, hierárquica e disciplinarmente. Os responsáveis pela garantia dos presos nesta circunstância são a Administração Penitenciária e a Polícia. Porém, se elas não forem capazes de dar tais garantias, apenas então caberá a intervenção judicial competente. [55]


Por fim, cabe mencionar uma pesquisa de Lucia Maria Casali de Oliveira[56] sobre a situação das Varas de Execuções no Estado de São Paulo. Apesar do incessante trabalho dos magistrados, as Varas de Execuções ainda não têm qualquer controle quanto ao número de processos de sentenciados que se encontram foragidos, bem como sobre a destinação e a movimentação dos sentenciados no sistema penitenciário. Constata-se que, no regime fechado, a Coespe tem removido sentenciados sem qualquer consulta ao juízo, o que gera a alteração da jurisdição e a morosidade na apreciação dos pedidos. Ademais, “pedidos iniciais mal instruídos, dificuldade na juntada em cartório, atraso na juntada dos pedidos e das informações requeridas e demora na tramitação dos recursos interpostos. Estas são algumas das imensas dificuldades que colaboram para o estrangulamento da Vara de Execuções e retardam a prestação jurisdicional tão ansiosamente esperada por aqueles que se encontram recolhidos na rede Coespe e, especialmente, nos Distritos Policiais”.

Ministério Público

Pela configuração institucional do Ministério Público (artigo 1° da LC n°40/81), exige-se que este órgão seja responsável, perante o Judiciário, pela defesa da ordem jurídica e dos interesses indisponíveis da sociedade, pela fiel observância da Constituição e das leis. Trata-se de uma das instâncias formais mais importantes do controle da aplicação do princípio de legalidade. [57]

No âmbito da execução penal, o Ministério Público fiscaliza[58] a execução da pena e da medida de segurança, oficiando no processo executivo e nos incidentes da execução. Ademais, ele visitará mensalmente os estabelecimentos penais, registrando a sua presença em livro próprio[59]. Desta forma, o Parquet exerce o seu papel de custos legis, fiscalizando os casos que envolvem norma de ordem pública ou um direito indisponível, irrenunciável.

Deve-se considerar, ademais, que este órgão, como parte, “pode requerer e intervir, produzindo provas, requisitando diligências, sendo intimado de todos os atos processuais, ser intimado de todas as decisões tomadas no curso do processo, tanto jurisdicionais como administrativas, opinando previamente antes que sejam tomadas, das mesmas podendo recorrer, enfim, praticar todos os atos inerentes à típica função de parte”. [60]

Por outro lado, pode-se dizer que o Ministério Público tem duas tarefas essenciais na execução da pena. A primeira resume-se no aspecto individual do processo executivo (artigo 68 da LEP). A outra diz respeito à defesa dos direitos transindividuais dos presos. Na defesa destes últimos direitos, o Parquet não possui a mesma tendência de atuação de outras legitimidades de proteção de interesses transindividuais (v. g., meio ambiente e consumidor). De fato, raras são as ações coletivas em defesa do direito do preso[61].

Segundo o artigo 68 da LEP, o Ministério Público atua na execução penal das seguintes formas:

I – fiscaliza a regularidade formal das guias de recolhimento e de internamento;

II – requer:

a) todas as providências necessárias ao desenvolvimento do processo executivo:

b) a instauração dos incidentes de excesso ou desvio de execução;

c) a aplicação de medida de segurança, bem como a substituição da pena por medida de segurança;

d) a revogação da medida de segurança;

e) a conversão de penas, a progressão ou regressão nos regimes e a revogação da suspensão condicional da pena e do livramento condicional;

f) a internação, a desinternação e o restabelecimento da situação anterior;

III – interpõe recursos de decisões proferidas pela autoridade judiciária, durante a execução.

Esta enumeração evidentemente não é taxativa, pois ela é complementada por outros dispositivos da LEP. Ademais, isso fica claro pelo princípio geral que pode ser extraído dos arts. 194 e 195, pelo qual, em qualquer situação decorrente da lei, o Ministério Público poderá iniciar procedimento judicial[62].


Vejamos ainda alguns entendimentos jurisprudenciais sobre a atividade fiscalizadora do Ministério Público[63]:

1) Obrigatoriedade de oitiva do Ministério Público no processo de execução: TJST (JTJ 215/366; TARJ (RT 731/638); TACRSP (RJDTACRIM 27/20);

2) Obrigatoriedade de oitiva do Ministério Público na declaração de extinção da punibilidade: STJ (RT 657/346), TJSP (RT 608/315). Contra: TACRSP (RJDTACRIM 38/61);

3) Obrigatoriedade de oitiva do Ministério Público na concessão do indulto: TACRSP (RJTACRIM 47/54), STJ, Resp. n. 123992/DF, 6ª Turma, DJU de 13.10.1997;

4) Obrigatoriedade de oitiva do Ministério Público na progressão de regime: STJ (RSTJ 168/469);

5) Obrigatoriedade de oitiva do Ministério Público e ausência de prejuízo: STJ, Resp n. 65.080-1/RS, DJU de 20.10.1997, p. 53140, TJRS (RJTJERGS 207/119).

O Ministério Público é o mais importante órgão de fiscalização da execução, pois ele não apenas é obrigatoriamente ouvido nos procedimentos correspondentes a todas as situações previstas na lei (artigo 196), mas ainda porque tem o direito de oficializar amplamente no processo mediante requerimentos e recursos. [64]

Depois do Juízo, ele é o órgão que possui maior soma de deveres para controlar a legalidade da execução. [65]

Um aspecto em certa medida contraditório encontra-se no tema de inspeção e visita dos estabelecimentos penais: enquanto o juiz, o CNPCP, o DPN e DPL inspecionam os estabelecimentos penais, o órgão do Ministério Público apenas deve visitá-lo mensalmente. A diferença entre inspecionar e visitar é grande. Desta forma, restringe-se o contato do Ministério Público com a realidade, o que propicia um efetivo controle. Trata-se de um sistema de controle ilógico, pois haveria a inspeção por órgãos que, para obterem qualquer resultado prático, necessitam recorrer ao Ministério Público, como é o caso do CNPCP. [66]

Deve ser ressalvado, contudo, que esse acesso mais limitado do Ministério Público aos estabelecimentos penais não impede que o Ministério Público possa agir para promover a apuração de responsabilidades quando contatar irregularidade ou ilegalidade, independentemente de inquérito policial, justificação ou representação da vítima, por força da Lei 4.898/65. [67]

Contudo, há entendimento doutrinário no sentido de que o sistema de visitas deve “possibilitar ao Ministério Público a fiscalização das atividades administrativas ligadas à execução penal, ou seja, de verificar se a lei de ordem pública está sendo cumprida em toda a sua extensão, possibilitando-se-lhe as medidas judiciais e administrativas para sanar as ilegalidades constatadas durante as visitas. (…) Obriga a lei que a visita seja mensal, mas nada impede que o órgão do Ministério Público desempenhe mais amiúde tal atividade fiscalizadora”. [68]

O maior problema enfrentado pelo Parquet nas execuções penais em São Paulo, superadas as dificuldades da Vara e seus cartórios, consiste, diante do grande volume de serviços, na quase impossibilidade atual de fiscalização direta dos estabelecimentos e dos sentenciados através das visitas correcionais. [69]

Conselho Penitenciário

O Conselho Penitenciário exerce funções consultivas e fiscalizadoras na execução penal, sendo o seu funcionamento regulado por legislação federal e estadual.

Quanto à sua composição, ele é integrado por membros nomeados pelo governador do Estado, do Distrito Federal e dos Territórios, dentre professores e profissionais da área de Direito Penal, Processual Penal, Penitenciário e ciências correlatas, bem como por representantes da comunidade. O mandato dos seus membros tem uma duração de quatro anos. [70]


É um órgão de longa tradição na execução penal brasileira, tendo sido criado pelo decreto Federal 16.665, de 6 de novembro de 1924, o qual criou, pela primeira vez, o livramento condicional no país.

As suas incumbências são: [71]

I – emitir parecer sobre indulto e comutação de pena, excetuada a hipótese de pedido de indulto com base no estado de saúde do preso;

II – inspecionar os estabelecimentos e serviços penais;

III – apresentar, no primeiro trimestre de cada ano, ao Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, relatório dos trabalhos efetuados no exercício anterior;

IV – supervisionar os patronatos, bem como a assistência aos egressos.

Tais incumbências são explicitadas em outros artigos da LEP[72]. Desta forma, v. g., por meio da sua função de fiscalização, o Conselho Penitenciário pode intervir em qualquer incidente ou fase do procedimento de execução. E o rol de suas intervenções não é taxativo, já que o artigo 185 da LEP legitima o Conselho a suscitar o incidente de excesso ou desvio de execução e o artigo 195, a propor o procedimento judicial correspondente às situações previstas na lei. [73]

Faz-se necessário observar que o Conselho Penitenciário, ao propor o procedimento judicial (artigo 195 da LEP), não atua como sujeito ativo da ação penal, como titular da ação penal, mas tão-somente como integrante do Estado-Administração, o qual se tornou inerte por meio dos seus órgãos encarregados de pleitear em juízo a tutela jurisdicional executiva, o Ministério Público. Este, pois, permanece como titular exclusivo da ação penal pública. [74]

Interessa mencionar alguns entendimentos jurisprudenciais: [75]

1) Obrigatoriedade de parecer do Conselho em concessão do livramento condicional: STF (RT 584/450), TJRS (RT 604/425), TJSP (RT 640/289, RT 628/310 e RT 614/267);

2) Obrigatoriedade do parecer do Conselho em concessão de indulto: TJSP (JTJ 186/320), TACRSP (RJTACRIM 47/54);

3) Audiência facultativa do Conselho a critério do juiz da execução no pedido de indulto: TJSP (RT 773/570), TJRS (RJTJERGS 207/115);

4) Obrigatoriedade de parecer do Conselho em concessão de indulto a condenado sob sursis: TACRSP (RT 694/328);

5) Demora inadmissível do Parecer do Conselho Penitenciário: TACRSP (RJDTACRIM 1/186).

O Conselho é um órgão peculiar, independente do Poder Judiciário e não integrado na estrutura da administração penitenciária. Desta forma, a sua participação no processo decisório tende a diluir a carga de responsabilidade na tomada da decisão, principalmente quando o parecer pelo indeferimento da pretensão. [76]

Deve-se observar que a estrutura dos Conselhos Penitenciários não tem condições de supervisionar ou de inspecionar outros órgãos. Muitos Estados não possuem nem mesmo um serviço social penitenciário, restringindo-se o controle do liberado condicional à vigilância policial. [77]

Por fim, afirma-se ser imprescindível a reorganização do Conselho para que o seu amplo poder de fiscalização deixe de ser puramente formal. Esta reorganização deve privilegiar, sobretudo, a questão dos limites da sua atribuição e o modo de sua atuação.[78]

Departamentos Penitenciários

O Departamento Penitenciário Nacional é subordinado ao Ministério da Justiça e é o principal órgão executivo da Política Penitenciária Nacional e de apoio administrativo e financeiro do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. [79]

A sua origem pode ser encontrada na Inspetoria-Geral Penitenciária, criada pelo Decreto 24.797, de 14 de Julho de 1934.


Suas atribuições são, além da coordenação e supervisão dos estabelecimentos penais e de internamento federais, as apresentadas a seguir: [80]

I – acompanhar a fiel aplicação das normas de execução penal em todo o território nacional;

II – inspecionar e fiscalizar periodicamente os estabelecimentos e serviços penais;

III – assistir tecnicamente as unidades federativas na implementação dos princípios e regras estabelecidos nesta lei;

IV – colaborar com as unidades federativas, mediante convênios, na implementação de estabelecimentos e serviços penais: [81]

V – colaborar com as unidades federativas para a realização de cursos de formação pessoal penitenciário e de ensino profissionalizante do condenado e do internado;

VI – estabelecer, mediante convênios com as unidades federativas, o cadastro nacional de dados existentes em estabelecimentos locais destinados ao cumprimento de penas privativas de liberdade aplicadas pela justiça de outra unidade federativa, em especial para presos sujeitos a regime disciplinar.

Em razão das suas atribuições, pode-se afirmar que o Departamento Penitenciário Nacional é o principal órgão executivo da política penitenciária nacional. [82]

A legislação local também poderá criar Departamento Penitenciário ou órgão similar para supervisionar e coordenar os estabelecimentos penais da unidade da Federação a que pertencer. Tais Departamentos, de modo geral, já existem como órgão da Secretaria da Justiça, como, por exemplo, nos seguintes casos: Coordenadoria dos Estabelecimentos Penitenciários do Estado de São Paulo (Coespe), a Coordenadoria do Sistema Penitenciário do Estado do Paraná (Coosipe), a Coordenadoria das Organizações Penais do Estado de Santa Catarina (Cope), e o Departamento do Sistema Penitenciário do Estado do Rio de Janeiro (Cope). Ficam, estes, na linha de frente da execução, pois eles efetivam as disposições da sentença ou decisão criminal e proporcionam as condições de assistência e trabalho para a integração social do condenado ou internado. [83]

Uma interessante questão é saber o que significa acompanhar a fiel aplicação das normas de execução penal em todo território nacional. Segundo Ela Wiecko V. de Castilho[84], “tudo e nada ao mesmo tempo. Tudo, porque a fórmula é tão genérica que abrange a execução individual de cada condenado. Nada, porque ter acompanhamento é impossível a um órgão de estrutura administrativa sediada em Brasília, sem ramificações estaduais”.

Patronato

Um dos maiores problemas da pena privativa de liberdade é a marginalização social do preso, não apenas durante o cumprimento da condenação, mas também após a saída do estabelecimento penal. Quanto maior a dificuldade de reajustamento do egresso, maior é a probabilidade de que ele venha a cometer novamente um delito. Daí a importância da completa reinserção social do egresso. [85]

É exatamente neste meio que se insere o Patronato como parte do tratamento penitenciário, isto é, do processo de reinserção social do condenado. O seu maior objetivo é auxiliar o egresso em sua nova vida, após o cumprimento da sua pena. [86]

Segundo a LEP, cabe ao Patronato, público ou privado, prestar assistência aos albergados e aos egressos. Ademais, também compete a este órgão as seguintes funções:[87]

I – a orientação dos condenados à pena restritiva de direitos;

II – a fiscalização do cumprimento das penas de prestação de serviço à comunidade e de limitação de fim de semana; e

III – a colaboração na fiscalização do cumprimento do cumprimento das condições da suspensão e do livramento condicional.


Conselho da Comunidade

Pode-se afirmar que uma das causas da reincidência é o descaso no tratamento oferecido pela sociedade ao preso e ao egresso. A comunidade deve ser conscientizada sobre a sua missão de acompanhar aquele que, após a transgressão, resgatará o seu débito muitas vezes em condições materiais bem abaixo de suas necessidades, comuns a todas as pessoas[88]. É justamente neste sentido que deve atuar o Conselho da Comunidade. Este colabora com o Juízo e a Administração para neutralizar os efeitos danosos da marginalização. [89]

Em cada comarca deve haver um Conselho da Comunidade, composto, no mínimo, por um representante de associação comercial ou industrial, um advogado indicado pela seção da Ordem dos Advogados do Brasil e um assistente social escolhido pela Delegacia Seccional do Conselho Nacional de Assistentes Sociais. Em caso de falta de representação, fica a critério do juiz da execução a escolha dos integrantes do Conselho.[90]

As funções deste Conselho são:

I – visitar, pelo menos mensalmente, os estabelecimentos penais existentes na comarca;

II- entrevistar presos;

III – apresentar relatórios mensais ao juiz da execução e ao Conselho Penitenciário;

IV – diligenciar a obtenção de recursos materiais e humanos para melhor assistência ao preso ou internado, em harmonia com a direção do estabelecimento.

Os itens I a III demonstram um caráter de fiscalização dos presídios, o que pode gerar dificuldades com a direção do estabelecimento, com quem o Conselho deve manter harmonia (item IV) ao diligenciar a obtenção de recursos materiais e humanos.[91]

Para Ela Wiecko V. Castilho[92], essa colaboração certamente enfrenta dificuldades, pois “o juízo da execução e a administração prisional são órgãos que tradicionalmente convivem em desarmonia, espelhando a contradição existente no sistema penal entre os objetivos da segurança e da recuperação. O juiz da execução tende a fazer valer o objetivo da recuperação do delinqüente, expresso na lei, enquanto o administrador, encurralado pelos problemas inerentes à vida na prisão, opta pelo objetivo segurança”.

Do exposto, percebe-se a importância de uma atuação harmônica e em conjunto dos órgãos da execução penal para o correto funcionamento do sistema de execução penal. Apenas desta forma é possível concretizar os ditames de um Estado Democrático de Direito. E, neste meio, insere-se a necessidade da participação da comunidade para alcançar a finalidade da LEP: a integração social do condenado e do internado.

O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária exerce grande influência política e elabora relevantes resoluções que, embora não sejam em grande parte concretizas, servem de orientação para a atividade legislativa e dos órgãos da execução penal.

Os dois principais órgãos de controle de legalidade na execução são o Juízo e o Ministério Público, sendo, este último, custos legis, o que acaba por conferir-lhe uma ampla esfera de atuação. Ocorre, porém, que tais órgãos têm encontrado dificuldades no exercício de suas funções em decorrência de uma série de fatores, dentre os quais o grande volume de processos e a falta de infra-estrutura.

Outro órgão fundamental é o Conselho Penitenciário. Sem dúvida, os seus pareceres oferecem essencial apoio à execução, dada a qualificação dos seus membros. Contudo, há necessidade de uma concreta e efetiva fiscalização por sua parte.

Os Departamentos Penitenciários, por outro lado, devem lidar com a grave realidade do sistema carcerário brasileiro: lotação, falta de presídios, constantes rebeliões, falta de infra-estrutura para o oferecimento de condições dignas de cumprimento de pena ao condenado etc.

Por fim, destaca-se a participação da comunidade através do Patronato e do Conselho da Comunidade, os quais se dedicam ao acompanhamento dos presos com a finalidade de propiciar-lhes a harmônica integração social.

Considerações finais

Vê-se, assim, que não há mais o que discutir em relação à natureza jurisdicional da execução penal, pelo mesmo no ordenamento jurídico brasileiro.


Se por um lado o reconhecimento da jurisdicionalidade importou um significativo avanço, o desafio neste momento é fazer com que isso tenha conseqüências concretas e práticas na execução penal, contribuindo para a construção de um sistema penitenciário que funcione melhor e atenda aos objetivos de ressocialização e reinserção do condenado.

Com efeito, a jurisdicionalidade não pode ser algo meramente formal, uma atuação simbólica do juiz que sequer tem conhecimento do histórico da pessoa sobre a qual está se manifestando. È imperativo que defesa e contraditório tornem-se efetivos, reais, servindo de instrumentos para que a verdade surja no processo e que a melhor decisão seja encontrada. Não menos relevante é a motivação dos atos decisórios, cujo caráter de garantia é incompatível com frases prontas, aplicáveis aos mais diversos processos executivos.

O anseio de ressocialização exige que se coíbam as práticas nocivas do sistema penitenciário e que haja uma conscientização da necessidade de cumprir o mandamento constitucional de individualização da pena.

A análise dos órgãos da execução penal também demonstra que as atribuições deles não podem ficar apenas previstas na lei, mas contribuir para a mudança da realidade.

Constata-se, com tudo isso, que para o cumprimento do princípio e das regras do sistema, tão imprescindível quanto a previsão legal é que os indivíduos igualmente mudem suas concepções e assumam novas posturas.

Concretizar os objetivos da Lei de Execução Penal deve ser um desafio constante de todos que participam desta grande tarefa de reabilitar o indivíduo que feriu a norma penal, reconhecendo o seu erro, punindo-o na justa medida, mas sem olvidar o seu lado humano.

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[1] Muito embora o Código de Processo Penal tenha a sentença que impõe medida de segurança como absolutória (art. 386, V), entendemos, em consonância com a doutrina de Rogério Lauria Tucci, que se trata de sentença que assume o caráter de condenatória, tendo a medida de segurança natureza de sanção penal.

[2] Conforme destaca Mirabete, Execução penal. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 19-20 e 26-27.

[3] Ressalte-se a impropriedade do termo “justiça ordinária”, que corresponde, na realidade, à justiça comum.

[4] Teoria do direito processual penal: jurisdição, ação e processo penal (estudo sistemático). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 46, 43 e 44 (grifos do autor). Dentre as peculiaridades da jurisdição penal, o mencionado autor destaca a irrelevância do conceito de lide, a substituição da contenciosidade pela contraditoriedade, e a coisa julgada, que pode ter autoridade relativa ou absoluta (“Princípio e regras da execução de sentença penal”, Revista CEJ, Brasília, n. 7, jan./abr. 1999, p. 59-60).

[5] Regra da inevitabilidade do processo penal como parte da jurisdicionalização da pena (TUCCI, Rogério Lauria. Teoria do direito processual penal: jurisdição, ação e processo penal: estudo sistemático. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 42).

[6] A natureza jurídica da execução penal. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; BUSANA, Dante (Coord.). Execução penal. São Paulo: Max Limonad, 1987, p. 7.


[7] TUCCI, Rogério Lauria. Princípio e regras da execução de sentença penal, Revista CEJ, Brasília, n. 7, jan./abr. 1999, p. 61.

[8] Breves notas sobre a novíssima execução penal. In: Reforma penal. São Paulo: Saraiva, 1985, p. 131.

[9] A ação judiciária consiste na “atuação dos órgãos jurisdicionais, juízes e tribunais, em sua obra diuturna de realização do direito”. Ao lado desta noção, tem-se ainda a de ação da parte, que a integra, e que consiste na ação “conferida aos sujeitos parciais da relação jurídica” (TUCCI, Rogério Lauria. Teoria do direito processo penal: jurisdição, ação e processo penal: estudo sistemático, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2002, p. 76).

[10] TUCCI, Rogério Lauria. Princípio e regras da execução de sentença penal, Revista CEJ, Brasília, n. 7, jan./abr. 1999, p. 64.

[11] TUCCI, Rogério Lauria. Direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 274.

[12] Controle da legalidade na execução penal: reflexões em torno da jurisdicionalização. Porto Alegre: S. A. Fabris, 1988, p. 25.

[13] Embora para Ela Wiecko V. de Castilho a relação não seja necessária, posicionando-se no sentido de que “a questão da natureza jurídica da execução penal não é fundamental para a aplicação do principio da legalidade. Reconhecer-lhe natureza administrativa não implica necessariamente em negar-lhe legalidade ou subtraí-la de controle, porquanto no Estado Social de Direito todos os atos administrativos são passiveis de controle jurisdicional” (op. cit., p. 42).

[14] Da ‘afirmação de direitos’ à ‘proteção de direitos’ dos reclusos: a jurisdicionalização da execução da pena de prisão, Revista Direito e Justiça, v. especial, 2004, p.189.

[15] Execução penal. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 30.

[16] Novo olhar sobre a questão penitenciária. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 64 (fac-símile da edição portuguesa de Coimbra Editora, junho/2000).

[17] A jurisdicionalização do processo de execução penal: o contraditório e a ampla defesa, Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, ano 3, n. 9, jan./mar. 1995, p. 129.

[18] A defesa do condenado na execução penal. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; BUSANA, Dante (Coord.). Execução penal. São Paulo: Max Limonad, 1987, p.42.


[19] Princípio e regras da execução de sentença penal, Revista CEJ, Brasília, n. 7, jan./abr. 1999, p. 66.

[20] A iniciativa instrutória do juiz no processo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 253.

[21] A motivação das decisões penais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 238.

[22] CASTILHO, Ela Wiecko V. de, Controle da legalidade na execução penal: reflexões em torno da jurisdicionalização. Porto Alegre: S. A. Fabris, 1988, p. 68.

[23] CASTILHO, Ela Wiecko V. de, op. cit., p. 68-69.

[24] Ibid., p. 70.

[25] Ibid., p. 69.

[26] GRINOVER, Ada Pellegrini, Anotações sobre os aspectos processuais da lei de execução penal. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; BUSANA, Dante (Coord.). Execução penal. São Paulo: Max Limonad, 1987, p. 16.

[27] MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução Penal, 11. ed., São Paulo: Atlas, 2004, p. 170.

[28] LAZZARINI, Alvaro-GALBETTI, Luis Mário. Dos juízes das execuções criminais e corregedoria dos presídios no enfoque multidisciplinar, Revista A Força Policial, São Paulo, n. 36, out./nov./dez. 2002, p. 9.

[29] OLIVEIRA, Lucia Maria Casali, Órgãos de execução criminal em São Paulo, Revista Brasileira de Ciências Criminais, ano 5, n. 20, 1997, p. 507.

[30] O Departamento Penitenciário Federal, a partir de uma decisão do Conselho no processo MJ n. 30204/83 (D.O.de 26.02.1987), realiza as inspeções do Conselho.

[31] Art. 63, da LEP.

[32] Art. 64, da LEP. Mencionamos, ainda, a exposição do Prof. Francisco de Assis Toledo, no recinto da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, em 06.10.1983, durante a tramitação do projeto que se transformaria na atual LEP: “Previu-se a criação do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Esse órgão, que deverá ser integrado, segundo se espera, por especialistas de notável saber e experiência, nomeados pelo Ministério de Estado da Justiça, terá a incumbência de elaborar as diretrizes de uma política criminal e penitenciária a ser observada em todo o país, guardadas as peculiaridades regionais. Será um órgão normativo e de fiscalização, cabendo-lhe ainda, contribuir, de modo direto e efetivo, para a implementação das determinações e recomendações que fizer, com vistas na realização dos fins da reforma penal e penitenciária. Pretende-se, com a criação desse Conselho, retirar do empirismo em que se encontra, no Brasil, a formulação de critérios diretivos no âmbito da prevenção e repressão do crime e na esfera da organização penitenciária, evitando-se soluções de continuidade, contradições e os conhecidos altos e baixos. Preservou-se, contudo, a autonomia das unidades federativas, atuando o Conselho precipuamente na faixa reservada à esfera de atribuições dos órgão da União. Em suma, o referido Conselho irá contribuir, como tarefa fundamental, para a elaboração, por parte do Governo, de um plano amplo e bem coordenado de controle do fenômeno de criminalidade”. Cf. MIRABETE, Julio Fabbrini, op. cit., p. 171.


[33] É interessante citar as algumas recomendações sobre a “visita íntima”: a) é um direito também assegurado aos presos casados entre si ou em união estável (art. 2°); b) a direção do estabelecimento prisional deve assegurar ao preso pelo menos uma “visita íntima” por mês (art. 3°); c) a “visita íntima” não deve ser proibida ou suspensa a título de sanção disciplinar, excetuados os casos em que a infração disciplinar estiver relacionada com o seu exercício (art. 4°).

[34] A Resolução n° 5 de 1999 traz uma série de precisões sobre a política criminal e a política penitenciária. Assim, por exemplo, mencionamos alguns dos seus objetivos: priorizar a construção de miniprisões para abrigar no máximo 330 reclusos, se possível adaptando as cadeias públicas de pequeno porte, especialmente localizadas nas comarcas do interior para integrá-las na estrutura do sistema prisional de cumprimento da pena (art. 17); construir estabelecimentos federais, de segurança máxima, nomeadamente em regiões de fronteiras ou em zonas de grande concentração de criminalidade violenta (art. 18); e recomendar o exato cumprimento do que dispõem os arts. 66, VII, e 68, parágrafo único, da LEP, a saber: visitas obrigatórias de Juízes e Promotores de Justiça aos estabelecimentos prisionais.

[35] Segundo o art. 1° da Resolução 16 de 2003, estas diretrizes constituem o conjunto de orientações do Conselho Nacional destinadas aos responsáveis pela concepção e execução de ações relacionadas à prevenção da violência e da criminalidade, à administração da justiça criminal e à execução das penas e das medidas de segurança. Destaquem-se as diretivas referentes à elaboração legislativa (art.3°): a) descriminalização e despenalização de condutas à luz da concepção de intervenção mínima do Direito Penal; b) defesa do instituto das penas alternativas, como forma de evitar a privação de liberdade, que deve ser imposta excepcionalmente, qual ultima ratio; III – manutenção do regime progressivo de cumprimento de penas, independentemente na natureza do crime praticado; d) oposição ao alargamento das hipóteses de incidência da prisão sem condenação, medida sempre excepcional; e) adoção de medidas que objetivem o desarmamento; f) proteção e amparo às vítimas e testemunhas de crimes.

[36] CASTILHO, Ela Wiecko V. de, op. cit., p. 72.

[37] Idem.

[38] Art. 65, da LEP.

[39] Segundo FRANCO, Alberto da Silva, Crimes hediondos, São Paulo: RT, 1991, p. 115, a competência do juiz para dirimir os incidentes da execução de pena é determinada pela natureza e pela sede do estabelecimento penitenciário em que o sentenciado cumpre a reprimenda, pois assim se evita a inadmissível dualidade jurisdicional em um mesmo presídio.

[40] Art. 66, da LEP.

[41] Trata-se de decorrência do princípio constitucional dos direitos e garantias individuais, segundo o qual a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu (art. 5°, inc. XL da CF). Deste princípio decorrem os arts. 1° e 2° do CP.


[42] Súmula 612 do STF.

[43] MIRABETE, Julio Fabbrini, op. cit., p. 186.

[44] Art. 107, § 2° da LEP.

[45] MIRABETE, Julio Fabbrini, op. cit., p. 194-195.

[46] Sobre o cômputo de tempo de prisão em outro processo com absolvição, evidencia-se os seguintes entendimentos jurisprudenciais: STF: “Pena. Detração. A detração do período de prisão a que se seguiu a absolvição do réu pode ser concedida se se trata de pena por outro crime anteriormente cometido. Não, porém, em relação à pena por crime posterior à absolvição” (RTJ 70/324) e STJ: “A Constituição da República, em razão da magnitude conferida ao status libertatis (art. 5°, XV), inscreveu no rol dos direitos e garantias individuais regra expressa que obriga o Estado a indenizar o condenado por erro judiciário ou quem permanecer preso por tempo superior ao fixado na sentença (art. 5°, LXXV), situações essas equivalentes a quem foi submetido à prisão processual e posteriormente absolvido. Em face desse preceito constitucional, o art. 42 do CP, e o art. 111 da Lei das Execuções Penais devem ser interpretados de modo a abrigar a tese de que o tempo de prisão provisória, imposta em processo no qual o réu foi absolvido, seja computado para a detração de pena imposta em processo relativo a crime anteriormente cometido” (RT 763/536-537).

[47] STJ, 5ª. Turma, REsp n. 24.391-2/SP, Rel. Min. Costa Lima, DJU de 16.11.1992.

[48] Art. 183 da LEP: “Quando, no curso da execução da pena privativa de liberdade, sobrevier doença mental ou perturbação da saúde mental, o juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou da autoridade administrativa, poderá determinar a substituição da pena por medida de segurança”.

[49] MIRABETE, Julio Fabbrini, op. cit., p. 221.

[50] Destaca-se, sobre o tema, a Súmula 10 do Painel de Debates sobre a Execução Penal, realizado nos dias 25 e 26 de julho de 1998, pela Escola Paulista da Magistratura em conjunto com a Associação de Juízes para a Democracia: “O Juiz a Execução e o jurisdicionado. A inspeção mensal aos estabelecimentos penais é imprescindível, sendo salutar o contato com o preso, seu jurisdicionado, pressuposto para a efetividade da execução penal” apud MIRABETE, Julio Fabbrini, op. cit., p. 225.

[51] Art. 66, I a V, LEP.

[52] Art. 66, VI a X, LEP.


[53] MIRABETE, Julio Fabbrini, op. cit., p. 177.

[54] LAZZARINI, Alvaro-GALBETTI, Luis Mário, op. cit., p. 15-16.

[55] Ibid., p. 17-18.

[56] Órgãos de execução criminal em São Paulo, op. cit., p. 510.

[57] CASTILHO, Ela Wiecko V. de, op. cit., p. 83.

[58] Quanto ao debate sobre se o Ministério Público funciona na atividade de execução como fiscal da lei ou como parte, não se pode deixar de atender à opinião de CUNHA, Renan Severo Teixeira, O Ministério Público na execução penal, in JESUS, Damásio E. de. Curso sobre a reforma penal, São Paulo: Saraiva, 1985, p. 182: “Substancialmente, o Ministério Público tem uma atividade só, tanto quando oficia no processo penal, como ainda quando oficia na própria atividade administrativa da execução da pena – em todos esses momentos o Ministério Público exerce sempre uma atividade fiscalizadora. Não existe a antinomia: parte-fiscal da lei. Projeta-se no processo uma certa antinomia entre interveniente e requerente. Mas a função fiscalizadora da lei é da essência da instituição”.

[59] Art. 68, parágrafo único da LEP.

[60] OLIVEIRA, Victor Corrêa de, Execução penal e Ministério Público, in JUS (Revista Jurídica do Ministério Público), Belo Horizonte, n. XXIII, v. 14, 1992, p. 96.

[61] CAVALCANTE, Eduardo M., O Ministério Público na Execução Penal, in CARVALHO, Salo de (Org.). Crítica à Execução Penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 436-437.

[62] CASTILHO, Ela Wiecko V. de, op. cit., p. 86.

[63] Cf. MIRABETE, Julio Fabbrini, op. cit., p. 228-230.

[64] CASTILHO, Ela Wiecko V. de, op. cit., p. 84.

[65] Ibid., p. 86.

[66] Ibid., p. 87.


[67] Ibid.

[68] MIRABETE, Julio Fabbrini, op. cit., p. 232.

[69] OLIVEIRA, Lucia Maria Casali, op. cit., p. 510.

[70] Art. 69, LEP.

[71] Art. 79, LEP.

[72] Vide arts. 131, 143, 145, 146, 158, 185, 187, 188, 189, 190 e 193, LEP.

[73] CASTILHO, Ela Wiecko V. de, op. cit., p. 81.

[74] OLIVEIRA, Victor Corrêa de, op. cit., p. 95.

[75] Cf. MIRABETE, Julio Fabbrini, op. cit., p. 235-236.

[76] CASTILHO, Ela Wiecko V. de, op. cit., p. 79.

[77] Ibid., p. 80. Esta autora ainda cita um relatório de 1986, do Conselho Penitenciário de Santa Catarina: “A dotação orçamentária, destinada ao Conselho Penitenciário, tem sido a cada ano mais insuficiente, sem contar com as reduções sofridas durante o exercício. O funcionamento do Órgão tem dependido invariavelmente de favores de outros órgãos, principalmente no que se refere a aquisição de selos para o envio de processos apreciados e correspondências expedidas às comarcas do Estado e de fora dele. A atribuição do Colegiado, no que diz respeito à fiscalização do funcionamento dos presídios do interior do Estado e ao acompanhamento da execução penal, ficou prejudicada em função de que a verba era insuficiente para a aquisição de passagens de ônibus e hospedagem”.

[78] Ibid., p. 81. Destaca-se a opinião de OLIVEIRA, Lucia Maria Casali, op. cit., p. 510, sobre os atuais problemas do Conselho Penitenciário do Estado de São Paulo: “É fundamental que ele seja devidamente aparelhado e estruturado pelo Estado, para que possa exercer suas funções. Hoje, conta com poucos funcionários para atender à população carcerária do Estado. Seus Conselheiros também não efetuam qualquer visita aos estabelecimentos penais e aos distritos policiais, limitando-se apenas aos pareceres nos pedidos de indulto e livramento condicional, bem como sugestões quanto ao texto dos novos decretos de indulto”.

[79] Art. 71, da LEP.


[80] Art. 72, da LEP.

[81] Em uma pesquisa realizada em 1997, OLIVEIRA, Lucia Maria Casali, op. cit., p. 508-509, denunciou o caos dos estabelecimentos penais no Estado de São Paulo, os quais transformaram-se em um verdadeiro depósito humano, em completo desrespeito à CF e a LEP. Segundo o Censo Penitenciário de 1995, o Brasil possuía um déficit de 72.514 vagas. Para suprir estas vagas, seriam necessários 150 novos estabelecimentos para 500 presos cada um. Isso, naquele tempo, exigiria um investimento de US$ 2.250.000 (dois bilhões e duzentos e cinqüenta mil dólares).

[82] CASTILHO, Ela Wiecko V. de, op. cit., p. 73.

[83] CASTILHO, Ela Wiecko V. de, op. cit., p. 77.

[84] Controle da legalidade, op. cit., p. 76.

[85] MIRABETE, Julio Fabbrini, op. cit., p. 244.

[86] Idem. Segundo este mesmo autor (p. 245), o Estado de São Paulo possui inúmeras manifestações laudatórias sobre o relevante trabalho realizado pela Apac (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados) de São José dos Campos, que provocou uma redução drástica do índice de reincidência, de fugas e de faltas disciplinares.

[87] Art. 79, LEP.

[88] MIRABETE, Julio Fabbrini, op. cit., p. 247. Muito interessante é a Súmula 4 do já mencionado Painel de Debates sobre Execução Penal: “O juiz e a comunidade. A atuação da comunidade é essencial para que seja alcançada a finalidade da integração social do condenado e internado, razão pela qual o juiz deve participar de movimentos de sua mobilização e buscar as condições para o cumprimento da pena, com os recursos nela disponíveis. O Conselho da Comunidade, cuja regulamentação e instalação compete ao juiz da execução, tem papel relevante na mobilização social”.

[89] DOTTI, René Ariel, A lei de execução penal: perspectivas fundamentais, Revista dos Tribunais, v. 598, ago. 1985, p. 283.

[90] Art. 80, LEP.

[91] CASTILHO, Ela Wiecko V. de, op. cit., p. 90.

[92] Controle da legalidade, op. cit., p. 90.

Autores

  • Brave

    é juíza na Paraíba, doutoranda em Direito Processual Penal pela USP, mestre em Direito Constitucional pela UFC, especialista em Ciências Criminais pela UFPE, especialista em História da Filosofia pela Favip e professora de Direito Processual Penal (UEPB).

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    é advogada, doutoranda na área de Direito Privado pela Faculdade de Direito da USP e mestre em Direito pela Università di Roma “Tor Vergata”.

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