Condomínio obrigatório

Todos devem pagar contribuições de associação de moradores

Autor

  • Hamilton Quirino

    é advogado especializado em Direito Imobiliário diretor da Associação Brasileira dos Advogados do Mercado Imobiliário e vice-presidente da Câmara Imobiliária de Mediação e Arbitragem.

9 de novembro de 2007, 12h13

Consideramos um grande retrocesso o acórdão do Superior Tribunal de Justiça, constante do REsp 623.274/RJ, relator o ministro Carlos Alberto Menezes Direito, publicado em 09 de maio de 2007, contrário ao pagamento das contribuições cobradas pelas associações de moradores não constituídas em condomínio. Decidiu o STJ reformar julgado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, segundo o qual “cada um deve contribuir para a vigilância, limpeza, custeio, conservação e embelezamento das áreas comuns (…), como fator de aglutinação da comunidade e vedação do enriquecimento sem causa”.

Para os ministros da 3ª Turma do STJ, “nada impede que os moradores de determinado loteamento constituam condomínio, mas deve ser obedecido o que dispõe o artigo 8º. da Lei n. 4.591/64. No caso isso não ocorreu, sendo a autora sociedade civil e os estatutos sociais obrigando apenas aqueles que o subscreverem ou forem posteriormente admitidos”.

No caso concreto um casal era associado e pagava as cotas mensais há vários anos. Com a separação o imóvel ficou pertencendo à ex-esposa, que se declarou não mais associada, vindo, ao final, a ser beneficiada com a improcedência da cobrança.

Não podemos concordar com tal decisão, que vem favorecer aqueles que, contrariando os princípios da solidariedade, resolvem sair das associações de moradores (ou delas não participar), embora continuem a usufruir dos serviços prestados no interesse comum. A instalação e a manutenção de guaritas sequer dão a opção de a pessoa não usar dos serviços.

Portanto, passa a usufruir de um serviço sem nada pagar. Seria o caso de não se abrir o portão para essa pessoa, deixando que ela mesma o faça? Não recolher o seu lixo? Ignorar os problemas de segurança em sua casa? Criar duas espécies de moradores – os que pagam e os que não pagam?

Consideramos perigoso esse precedente, embora o acórdão tenha se baseado na interpretação das normas do próprio estatuto da associação integrante do julgamento. De toda forma, a decisão em pauta contém um formalismo há muito superado pela jurisprudência carioca, que fez prevalecer o entendimento contrário ao enriquecimento ilícito, mais forte do que o da livre associação.

A pacificação da matéria se deu pela Súmula 79 do Tribunal de Justiça: “Associação de moradores. Condomínio de fato. Cobrança de despesas comuns. Principio do não enriquecimento sem causa. Em respeito ao princípio que veda o enriquecimento sem causa, as associações de moradores podem exigir dos não associados, em igualdade de condições com os associados, que concorram para o custeio dos serviços por elas efetivamente prestados e que sejam do interesse comum dos moradores da localidade.”

O princípio de pagamento pelos serviços prestados insere-se na essência da convivência, com a predominância do princípio da boa fé objetiva, um dos pilares do Código Civil. O principal dispositivo legal que sustenta essa cobrança solidária vem a ser o artigo 1.315 do Código Civil, que regula o condomínio geral voluntário ( pro-indiviso), “o condômino é obrigado, na proporção de sua parte, a concorrer para as despesas de conservação ou divisão da coisa, e a suportar os ônus a que estiver sujeita”.

E o que é a associação de moradores com serviços comuns senão um condomínio de fato, como consta expressamente da Súmula 79 do TJ-RJ? De outro lado, a diferença básica entre condomínio e loteamento é que neste último as áreas internas são públicas, enquanto naqueles são particulares.

Sem dúvida que o loteamento pode ser transformado em condomínio edilício, para rateio das despesas, com votação e registro de uma convenção, conforme o Decreto-Lei 271/67, não revogado pela Lei 6.766/79. O que se discute no acórdão aqui comentado, é justamente o loteamento que não constitui condomínio, mas possui serviços administrados por uma associação.

Discordamos da decisão do STJ, pois, ainda que não se constitua o condomínio, e para melhorar a segurança, poderá ser criada uma associação, destinada a administrar as áreas comuns e cuidar da segurança, mediante rateio das despesas. E a principal diferença entre os dois (ruas internas públicas ou particulares) deixa de existir quando é aprovado o fechamento da rua, como ocorre no Rio de Janeiro, por força de Decreto Municipal 23.084, de 01 de julho de 2003.

O Conselho Federal de Justiça, por sinal, aprovou o Enunciado 98, nos seguintes termos: “O disposto nos arts. 1.331 a 1.358 do novo Código Civil aplica-se, no que couber, aos condomínios assemelhados, tais como loteamentos fechados, multipropriedade imobiliária e clubes de campo”.

Portanto, a despeito do acórdão do STJ aqui contestado, não é justo nem razoável que algumas pessoas possam se beneficiar dos serviços prestados, principalmente a segurança, indispensável nos grandes centros urbanos, sem nada contribuir, apenas pelo formalismo jurídico, o que, muitas vezes, vem favorecendo e estimulando a impunidade neste país.

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    é advogado, especializado em Direito Imobiliário, diretor da Associação Brasileira dos Advogados do Mercado Imobiliário e vice-presidente da Câmara Imobiliária de Mediação e Arbitragem.

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