Violação mundial

Invasão de escritórios não é um problema só do Brasil

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1 de novembro de 2007, 23h00

Em 2007, a União Internacional dos Advogados (UIA), que atua em defesa do exercício da profissão de advogado de uma forma plena e democrática em todo o mundo, testemunhou e defendeu um tipo de crime cada vez mais comum contra esses profissionais: a invasão de escritórios de advocacia e Ordens de Advogados por autoridades policiais. Com autorização do Poder Judiciário, algumas passaram a ser um problema mundial.

Nos últimos meses, a UIA foi convocada para atuar em diversos casos desse tipo de crime contra a democracia. Os mais gritantes foram cometidos em países como Portugal, Polônia, Itália e Estados Unidos, onde ocorreram escutas ilegais para gravação de diálogos de advogados com seus clientes, com o objetivo de facilitar a autoridade investigatória a obter as provas que normalmente são obtidas com a lei processual penal. O segredo profissional, garantido por lei entre o advogado e o cliente, está ameaçado, obrigando em alguns países, que as consultas sejam feitas em locais neutros, como em hotéis ou noutro ponto público, para evitar a gravação ou o registro dos naturais segredos envolvidos na relação profissional.

Em todas as legislações mundo afora, profissionais do Direito concordam que o local de trabalho dos advogados deve ser inviolável, valendo também para seus arquivos e todo o material usado para as suas atividades como livros, pesquisas, depoimentos gravados, documentos, entre outras provas. Isso sem contar os segredos pessoais dos clientes, muitas vezes íntimos e que precisam ser preservados. Em qualquer lugar do mundo, os documentos e dados entregues aos advogados devem estar protegidos, justamente para que seja garantida a defesa do cliente. A privacidade do cliente de um escritório de advocacia deve ser respeitada como na relação entre paciente e médico.

Por outro lado, todos sabemos que a lei prevê a busca e apreensão de documentos, desde que através de autorização judicial. É claro que, tanto no Brasil quanto na Europa ou nos Estados Unidos, quando o advogado se envolve em práticas criminosas, excedendo seus limites profissionais, deve ser alvo de investigações e varreduras. Para isso, existem as entidades de classe, que exemplarmente no Brasil, Portugal e nos Estados Unidos, não são corporativistas diante do mau profissional.

Mas, na prática, lamentavelmente, o que estamos assistindo são informações profissionais violadas à manu militari, algumas vezes sem autorização, sob argumentação de que a apuração criminal supera a privacidade. Muitas vezes a missão dos advogados é confundida com práticas ilegais de seus clientes. Com isso, no momento em que percebemos o esforço de entidades jurídicas internacionais na defesa da democracia e da liberdade plena entre os países, notamos também que as prerrogativas da advocacia eram muito mais asseguradas e respeitadas no passado.

Embora o combate à criminalidade, sobretudo à corrupção que impera em países como o Brasil, deva ser exaltada, é preciso saber respeitar os limites da legalidade. É preciso ser observado também os critérios respectivos da busca e investigação amparados no Código de Processo Penal em detrimento do método ilegal e violento, como uma forma de se economizar tempo nas pesquisas necessárias em alguns casos.

Fechar os olhos para a violação de segredos profissionais, valendo-se do argumento da importância da investigação criminal, é o mesmo que negar defesa assegurada por lei para simples acusados. A apreensão de documentos retidos com os advogados para incriminação de seus clientes pode ser considerada uma prova ilegal de acusação. Com base nesses princípios, é frustrante que essas invasões de escritórios de advocacia, que ocorriam em governos ditatoriais, passem também a se tornar hábito em regimes democráticos como o brasileiro, consolidados com a ajuda dos próprios advogados. O due process of law está sob risco.

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