Punição aos infiéis

Supremo já mostrou que é a favor da fidelidade partidária

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31 de março de 2007, 0h00

Se vier a enfrentar a questão, o Supremo Tribunal Federal deve manter a decisão do Tribunal Superior Eleitoral de que o voto pertence ao partido e não ao candidato. A inclinação de privilegiar a fidelidade partidária foi demonstrada pela Corte em dezembro do ano passado, no julgamento em que foi derrubada a cláusula de barreira.

Ao declarar inconstitucional a regra que restringia a atuação parlamentar de deputados de partidos com baixo desempenho eleitoral, pelo menos seis ministros do Supremo apontaram a alternativa mais legítima e eficaz para garantir a seriedade das legendas: a fidelidade partidária.

O julgamento no TSE foi provocado por uma consulta do Democratas (ex-PFL), que queria saber se poderia reaver os cargos que perdeu com a mudança de deputados eleitos sob a sua legenda. Depois das eleições de 2006, ao menos 36 deputados trocaram de legenda. O Partido da República, por exemplo, recebeu 15 novos filiados eleitos por outras agremiações.

O Democratas ainda está analisando a possibilidade de recorrer à Justiça Eleitoral para pedir as sete cadeiras que perdeu com o troca-troca dos deputados. Primeiro, o pedido deve ser apresentado ao Tribunal Regional Eleitoral. Depois, o recurso vai para o Tribunal Superior Eleitoral. Depois disso, deve bater às portas do Supremo.

Em dezembro, quando por unanimidade o STF derrubou a cláusula de barreira, o ministro Gilmar Mendes chamou atenção para a “imperiosa” necessidade de mudança na jurisprudência sobre a fidelidade partidária. Para ele, a troca de partido representa uma evidente violação à vontade do eleitor e “um falseamento grotesco do modelo de representação popular pela via da democracia de partidos!”.

Ele relembra o teor do parágrafo 1º, artigo 17, da Constituição Federal, que diz que o estatuto das agremiações partidárias deve estabelecer normas de fidelidade e disciplina. Na ocasião, criticou o atual entendimento do STF, de que a infidelidade partidária não repercute sobre o mandato exercido. Para Gilmar Mendes, o abandono da legenda deve ser punido com a perda do mandato.

“Embora haja participação especial do candidato na obtenção de votos com o objetivo de posicionar-se na lista dos eleitos, tem-se que a eleição proporcional se realiza em razão de votação atribuída à legenda”, explicou o ministro.

Para o ministro Marco Aurélio, ministro do STF e presidente do Tribunal Superior Eleitoral, a Corte Suprema só está aguardando o primeiro processo sobre a matéria chegar ao plenário para que essa tendência seja confirmada.

Em seu voto contra a cláusula de barreira, Marco Aurélio sinalizou a favor da fidelidade. “Surge incongruente assentar a necessidade de o candidato ter, em um primeiro passo, o aval de certo partido e, a seguir eleito, olvidar a agremiação na vida parlamentar. O casamento não é passível desse divórcio”.

Não bastasse o entendimento dos ministros, o artigo 26 da Lei 9.096/95 (Lei dos Partidos Políticos) prevê que “perde automaticamente a função ou cargo que exerça, na respectiva Casa Legislativa, em virtude da proporção partidária, o parlamentar que deixar o partido sob cuja legenda tenha sido eleito”.

O coeficiente eleitoral é o maior eleitor de deputados, já que as sobras de votos dos partidos são transferidas para eles. Segundo dados do TSE, dos 513 deputados eleitos, apenas 31 conseguiram se eleger com seus próprios votos. Os outros foram puxados para o Congresso pelos votos da legenda.

Reforma pela Justiça

Por seis votos a um, o Tribunal Superior Eleitoral julgou, na terça-feira (27/3), que o voto pertence ao partido e não ao candidato individualmente. A decisão também vale para Assembléias Legislativas e Câmaras dos Vereadores, o que significa que outras dezenas de parlamentares também podem ficar sem mandato.

O presidente do TSE, Marco Aurélio, ao acompanhar voto do relator Cesar Asfor Rocha, lembrou dispositivos da Lei dos Partidos Políticos, que autorizam a legenda a estabelecer medidas disciplinares e penalidades caso o parlamentar não acompanhe, em atitudes ou no voto, as diretrizes da legenda. Também determinam que o parlamentar subordine a ação parlamentar aos princípios doutrinários e programáticos da legenda.

Para o ministro Cezar Peluso, o mandato eletivo pertence ao partido político e não ao candidato eleito. O ministro, lembrando o artigo 14 da Constituição Federal, salientou que a filiação partidária é requisito essencial à elegibilidade do candidato. Nesse sentido, o cancelamento dessa filiação ou a transferência para outra legenda “tem por efeito a preservação da vaga ao partido”, ressaltou.

O ministro Caputo Bastos lembrou que para registrar candidatura o candidato precisa comprovar um ano de filiação partidária, mas que depois de eleito não deve fidelidade à legenda por nenhum dia mais. Acompanharam o voto do relator também os ministros Carlos Ayres Britto e José Delgado. Marcelo Ribeiro votou contra.

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