Infidelidade partidária

Partidos querem de volta mandatos de deputados infiéis

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28 de março de 2007, 21h23

Dos 38 deputados que trocaram de partido depois da eleição de outubro, 17 deles dormem hoje sobre o risco de perda de mandato. É que os partidos em que foram eleitos, DEM (ex-PFL), PPS, PDT e PSDB afirmam terem tomado todas as providências para que as vagas sejam devolvidas o mais rápido possível às siglas.

O imbróglio se baseia no entendimento do TSE, em resposta a Consulta analisada na terça-feira (27/3) de que os mandatos eletivos pertencem aos partidos ou coligações e não ao candidato eleito.

Voz dissonante no TSE na votação que discutiu a fidelidade partidária, o ministro Marcelo Ribeiro está tendo seu entendimento acompanhado por reconhecidos especialistas em direito eleitoral no país.

Mais que o fato da penalidade não estar prevista nem na Constituição Federal nem em normas infraconstitucionais, a advogada Stella Bruna Santo, especialista em Direito Eleitoral, sustenta que não cabe ao TSE decidir matéria relativa a exercício de mandato.

“A atuação do TSE cessou com a diplomação dos eleitos, resolver sobre titularidade de mandato é pauta da Justiça Comum. Embora seja favorável à fidelidade partidária, entendo que o que está havendo é uma inversão de competências para uso político”, avalia.

Assim como ela, o especialista Ricardo Penteado entende que o TSE não tem jurisdição a respeito da matéria para responder à consulta que foi formulada pelo PFL. Há circunstâncias já previstas na Constituição Federal que tratam de perda de mandato, tais como quebra de decoro e a assunção simultânea de outro mandato. “O que me preocupa são os atalhos para se chegar à fidelidade partidária. Isso não é matéria eleitoral”.

Sobre o voto, o presidente do TSE, ministro Marco Aurélio explica que a decisão do tribunal foi baseada na interpretação da Constituição Federal. "Declaramos o direito posto na Constituição. E a fidelidade partidária está lá na Constituição desde 1988. Não houve alteração de lei e sim uma interpretação. A perda do mandato já está prevista no artigo 26 da Lei 9.096/95 dos partidos políticos" O artigo 26 da Lei dos Partidos literalmente afirma que “perde automaticamente a função ou cargo que exerça, na respectiva Casa Legislativa, em virtude da proporção partidária, o parlamentar que deixar o partido sob cuja legenda tenha sido eleito”.

Embora a decisão do TSE tenha recebido mais elogios do que críticas do ponto de vista político, seus aspectos técnicos suscitaram outros questionamentos. O PSL, o partido que se especializou em fazer consultas ao tribunal eleitoral, fez a consulta da vez.

Em consulta assinada pelo secretário geral Ronaldo Medeiros, o partido quer saber se a fidelidade partidária implica a assunção do cargo pelo suplente no caso de transferência de legenda do titular; e se aplica o princípio da anualidade à decisão do TSE. Neste caso pelo menos o ministro Marco Aurélio já deu a resposta ao dizer que o tribunal não tomou uma decisão, mas apenas deu a conhecer a interpretação sobre legislação já existente. Ou seja, não se tem de falar de anualidade.

Judiciário rápido, Legislativo lento

Para o advogado eleitoral Renato Ventura, no caso em questão, a Justiça está sendo usada para fazer política. “E nesse ponto, sem entrar no mérito, o TSE demonstrou que está muito mais rápido que o Legislativo, uma vez que essa discussão sobre fidelidade partidária está há tempos no Congresso e não foi priorizada até o momento”, assevera.

Independente de qualquer contestação, o procurador eleitoral de São Paulo, Mário Bonsaglia, entende que, provavelmente, o debate é quem vai ganhar. “A discussão com certeza terá de ser apreciada pelo STF e instâncias competentes, onde processos judiciais irão surgir, o que torna o entendimento do TSE bastante saudável e salutar para o sistema político partidário brasileiro”.

Mais que a questão das competências, o procurador se preocupa com a aplicação prática dessa resolução da Justiça Eleitoral. “Resta saber quais instrumentos processuais e tribunais competentes irão atuar na aplicação dessa resolução”.

O que não pode ser desconsiderado, de acordo com a avaliação de Renato Ventura, é o fato de os afetados pela interpretação do TSE recorrerem ao STF, onde três dos 11ministros que são do TSE já têm o voto conhecido. “A única conseqüência automática dessa decisão é que a troca partidária será inibida”, diz acreditar o especialista.

Movimentação partidária

A resolução do TSE sobre perda de mandato foi motivada por consulta do PFL, partido que mais perdeu deputados desde a eleição de outubro. Ao todo oito. Com esse encaminhamento, DEM, PDT, PPS e PSDB ameaçam exigir na Justiça a “devolução dos mandatos”, uma vez que ela impede o troca-troca partidário para eleitos na proporcional, ou seja vereadores e deputados estaduais e federais.

Confira no quadro a movimentação partidária dos deputados eleitos em outubro passado:

Parlamentar De onde saiu Para onde foi
AL Cristiano Matheus PFL PMDB
AL Maurício Quintella Lessa PDT PR
AM Sabino Castelo Branco PFL PTB
AM Silas Câmara PTB PAN
AP Lucenira Pimentel PPS PR
BA Colbert Martins PPS PMDB
BA José Rocha PFL PR
BA Marcelo Guimarães Filho PFL PMDB
BA Tonha Magalhães PFL PR
BA Veloso PPS PMDB
CE Léo Alcântara PSDB PR
CE Marcelo Teixeira PSDB PR
CE Vicente Arruda PSDB PR
DF Jofran Frejat PTB PR
ES Jurandy Loureiro PSC PAN
MA Waldir Maranhão PSB PP
MG Juvenil Alves PT S/ partido
MG Paulo Piau PPS PMDB
MT Homero Pereira PPS PR
PA Lúcio Vale PMDB PR
PA Zequinha Marinho PSC PMDB
PB Armando Abílio PSDB PTB
PB Damião Feliciano PR S/ partido
PE Marcos Antonio PSC PAN
PR Átila Lira PSDB PSB
PR Airton Roveda PPS PR
PR Ratinho Junior PPS PSC
PR Takayama PMDB PAN
RJ Neilton Mulim PPS PR
RJ Sandro Matos PTB S/ partido
RJ Sandro Matos S/ partido PR
RO Lindomar Garçon PV PR
RR Angela Portela PTC PT
SC Djalma Berger PSDB S/ partido
SC Djalma Berger S/ partido PSB
SC Nelson Goetten PFL PR
TO Laurez Moreira PFL PSB
TO Vicentinho Alves PSDB PR

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