Dos 38 deputados que trocaram de partido depois da eleição de outubro, 17 deles dormem hoje sobre o risco de perda de mandato. É que os partidos em que foram eleitos, DEM (ex-PFL), PPS, PDT e PSDB afirmam terem tomado todas as providências para que as vagas sejam devolvidas o mais rápido possível às siglas.
O imbróglio se baseia no entendimento do TSE, em resposta a Consulta analisada na terça-feira (27/3) de que os mandatos eletivos pertencem aos partidos ou coligações e não ao candidato eleito.
Voz dissonante no TSE na votação que discutiu a fidelidade partidária, o ministro Marcelo Ribeiro está tendo seu entendimento acompanhado por reconhecidos especialistas em direito eleitoral no país.
Mais que o fato da penalidade não estar prevista nem na Constituição Federal nem em normas infraconstitucionais, a advogada Stella Bruna Santo, especialista em Direito Eleitoral, sustenta que não cabe ao TSE decidir matéria relativa a exercício de mandato.
“A atuação do TSE cessou com a diplomação dos eleitos, resolver sobre titularidade de mandato é pauta da Justiça Comum. Embora seja favorável à fidelidade partidária, entendo que o que está havendo é uma inversão de competências para uso político”, avalia.
Assim como ela, o especialista Ricardo Penteado entende que o TSE não tem jurisdição a respeito da matéria para responder à consulta que foi formulada pelo PFL. Há circunstâncias já previstas na Constituição Federal que tratam de perda de mandato, tais como quebra de decoro e a assunção simultânea de outro mandato. “O que me preocupa são os atalhos para se chegar à fidelidade partidária. Isso não é matéria eleitoral”.
Sobre o voto, o presidente do TSE, ministro Marco Aurélio explica que a decisão do tribunal foi baseada na interpretação da Constituição Federal. "Declaramos o direito posto na Constituição. E a fidelidade partidária está lá na Constituição desde 1988. Não houve alteração de lei e sim uma interpretação. A perda do mandato já está prevista no artigo 26 da Lei 9.096/95 dos partidos políticos" O artigo 26 da Lei dos Partidos literalmente afirma que “perde automaticamente a função ou cargo que exerça, na respectiva Casa Legislativa, em virtude da proporção partidária, o parlamentar que deixar o partido sob cuja legenda tenha sido eleito”.
Embora a decisão do TSE tenha recebido mais elogios do que críticas do ponto de vista político, seus aspectos técnicos suscitaram outros questionamentos. O PSL, o partido que se especializou em fazer consultas ao tribunal eleitoral, fez a consulta da vez.
Em consulta assinada pelo secretário geral Ronaldo Medeiros, o partido quer saber se a fidelidade partidária implica a assunção do cargo pelo suplente no caso de transferência de legenda do titular; e se aplica o princípio da anualidade à decisão do TSE. Neste caso pelo menos o ministro Marco Aurélio já deu a resposta ao dizer que o tribunal não tomou uma decisão, mas apenas deu a conhecer a interpretação sobre legislação já existente. Ou seja, não se tem de falar de anualidade.
Judiciário rápido, Legislativo lento
Para o advogado eleitoral Renato Ventura, no caso em questão, a Justiça está sendo usada para fazer política. “E nesse ponto, sem entrar no mérito, o TSE demonstrou que está muito mais rápido que o Legislativo, uma vez que essa discussão sobre fidelidade partidária está há tempos no Congresso e não foi priorizada até o momento”, assevera.
Independente de qualquer contestação, o procurador eleitoral de São Paulo, Mário Bonsaglia, entende que, provavelmente, o debate é quem vai ganhar. “A discussão com certeza terá de ser apreciada pelo STF e instâncias competentes, onde processos judiciais irão surgir, o que torna o entendimento do TSE bastante saudável e salutar para o sistema político partidário brasileiro”.
Mais que a questão das competências, o procurador se preocupa com a aplicação prática dessa resolução da Justiça Eleitoral. “Resta saber quais instrumentos processuais e tribunais competentes irão atuar na aplicação dessa resolução”.
O que não pode ser desconsiderado, de acordo com a avaliação de Renato Ventura, é o fato de os afetados pela interpretação do TSE recorrerem ao STF, onde três dos 11ministros que são do TSE já têm o voto conhecido. “A única conseqüência automática dessa decisão é que a troca partidária será inibida”, diz acreditar o especialista.
Movimentação partidária
A resolução do TSE sobre perda de mandato foi motivada por consulta do PFL, partido que mais perdeu deputados desde a eleição de outubro. Ao todo oito. Com esse encaminhamento, DEM, PDT, PPS e PSDB ameaçam exigir na Justiça a “devolução dos mandatos”, uma vez que ela impede o troca-troca partidário para eleitos na proporcional, ou seja vereadores e deputados estaduais e federais.
Confira no quadro a movimentação partidária dos deputados eleitos em outubro passado:
Parlamentar | De onde saiu | Para onde foi | |
AL | Cristiano Matheus | PFL | PMDB |
AL | Maurício Quintella Lessa | PDT | PR |
AM | Sabino Castelo Branco | PFL | PTB |
AM | Silas Câmara | PTB | PAN |
AP | Lucenira Pimentel | PPS | PR |
BA | Colbert Martins | PPS | PMDB |
BA | José Rocha | PFL | PR |
BA | Marcelo Guimarães Filho | PFL | PMDB |
BA | Tonha Magalhães | PFL | PR |
BA | Veloso | PPS | PMDB |
CE | Léo Alcântara | PSDB | PR |
CE | Marcelo Teixeira | PSDB | PR |
CE | Vicente Arruda | PSDB | PR |
DF | Jofran Frejat | PTB | PR |
ES | Jurandy Loureiro | PSC | PAN |
MA | Waldir Maranhão | PSB | PP |
MG | Juvenil Alves | PT | S/ partido |
MG | Paulo Piau | PPS | PMDB |
MT | Homero Pereira | PPS | PR |
PA | Lúcio Vale | PMDB | PR |
PA | Zequinha Marinho | PSC | PMDB |
PB | Armando Abílio | PSDB | PTB |
PB | Damião Feliciano | PR | S/ partido |
PE | Marcos Antonio | PSC | PAN |
PR | Átila Lira | PSDB | PSB |
PR | Airton Roveda | PPS | PR |
PR | Ratinho Junior | PPS | PSC |
PR | Takayama | PMDB | PAN |
RJ | Neilton Mulim | PPS | PR |
RJ | Sandro Matos | PTB | S/ partido |
RJ | Sandro Matos | S/ partido | PR |
RO | Lindomar Garçon | PV | PR |
RR | Angela Portela | PTC | PT |
SC | Djalma Berger | PSDB | S/ partido |
SC | Djalma Berger | S/ partido | PSB |
SC | Nelson Goetten | PFL | PR |
TO | Laurez Moreira | PFL | PSB |
TO | Vicentinho Alves | PSDB | PR |