Gases em foco

Comunidade jurídica começa a se preocupar com efeito estufa

Autor

  • Ludovino Lopes

    é advogado sócio do escritório Menezes e Lopes Advogados especialista em Direito Ambiental e esteve presente na COP 12 representando a OAB/SP.

23 de março de 2007, 0h01

A preocupação com os efeitos das mudanças climáticas — cujo principal responsável é o aumento da concentração dos gases de efeito estufa (GEE) — já ultrapassou as barreiras da comunidade científica e já se reflete em diversos setores da economia, exigindo também a atuação de juristas especializados.

Apesar das ações ambientais já movimentarem valores expressivos, ainda é muito pouco se comparado aos potenciais prejuízos causados pela ausência de medidas de precaução. Para se ter uma idéia, segundo estudo elaborado por Nicholas Stern, economista chefe do governo britânico, se nada for feito, os prejuízos poderão representar 5% a 20% do PIB mundial, algo equivalente a US$ 7 trilhões.

Um dos principais instrumentos internacionais para a mitigação dos GEE é a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (CQNUMC), criada como resultado das pesquisas apresentadas, em 1990, pelo Intergovernamental Panel on Climate Change (IPCC).

O objetivo da CQNUMC encontra-se previsto no artigo 2º, que foca “a estabilização das concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera num nível que impeça uma interferência antrópica perigosa no sistema climático”. E ressalta que “esse nível deverá ser alcançado num prazo suficiente que permita aos ecossistemas adaptarem-se naturalmente à mudança do clima, que assegure que a produção de alimentos não seja ameaçada e que permita ao desenvolvimento econômico prosseguir de maneira sustentável”.

É importante destacar que, na criação da CQNUMC, o Comitê Intergovernamental da ONU considerou a insuficiência de informações sobre as mudanças do clima e decidiu por adotar uma convenção geral com princípios e instituições e, à medida que as negociações evoluíssem, as partes da convenção regulamentariam os procedimentos por meio de protocolos e ajustes.

Desde então, as partes signatárias da CQNUMC vêm se reunindo periodicamente, com o objetivo de definir as medidas de consenso sobre os esforços a serem envidados para combater as alterações climáticas, sendo que a 3ª Conferência das Partes, promovida em dezembro de 1997 no Japão, resultou no Protocolo de Kyoto, o qual define as regras para a redução das emissões de gases que causam o efeito estufa.

Como muitos já sabem, de acordo com o Protocolo de Kyoto, os países industrializados comprometem-se a reduzir, no período de 2008 a 2012, a emissão dos GEE para atingir uma média global de 5,2% em relação aos níveis de 1990. Ao contrário, os países em desenvolvimento, além de não assumirem metas de redução, poderão se beneficiar de projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) que, no âmbito do Protocolo de Kyoto, resultarão na transferência de tecnologias, investimentos externos e créditos de carbono negociáveis.

No Brasil, o Protocolo de Kyoto foi ratificado pelo Decreto Legislativo 14.402, sancionado pelo Decreto 5.445/05. Mas, assim como na maioria dos demais países, a definição da natureza jurídica dos créditos de carbono aguarda regulamentação.

Nesse sentido, de acordo com o Projeto de Lei do deputado Eduardo Paes (PL 3.552/04), os créditos de carbono obtidos em projetos de MDL são definidos como valores mobiliários e passariam a ser comercializados na Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F), situada na Bolsa de Valores do Estado do Rio de Janeiro (BVRJ). Além da BVRJ, outras bolsas já manifestaram o interesse em negociar os créditos de carbono.

Ressalte-se que a ausência de regulamentação não impede a negociação desses créditos, sendo que, atualmente, o Brasil já ocupa o segundo lugar em quantidade de projetos de MDL e o terceiro lugar em reduções de emissões de GEE projetadas para o primeiro período de obtenção de créditos.

Recentemente, o assunto ganhou destaque pela realização, nos dias 6 a 17 de novembro de 2006, da 12ª Conferência das Partes (COP 12) da CQNUMC, em Nairóbi, no Quênia. O encontro teve a participação de quase 200 países, dentre eles, o Brasil.

A OAB-SP também participou da COP 12 e nela, representada pelos advogados Flávio Menezes e Ludovino Lopes, sócios do escritório Menezes e Lopes Advogados, teve a oportunidade de apresentar a Proposta do Projeto de Lei de Mudanças Climáticas do Estado de São Paulo, elaborada pela própria OAB paulista em conjunto com outros escritórios de advocacia, em evento do Banco Mundial e a International Emissions Trading Association (Ieta).

Dentre os assuntos tratados na pauta da COP 12, destacaram-se:

(i) A prorrogação dos compromissos assumidos pelos países para um segundo período — de 2012 a 2016 — foi aberta para discussões nesta COP em cumprimento ao artigo 3.9 do Protocolo de Kyoto, que determina que as negociações para os compromissos para os períodos subseqüentes deveriam ocorrer pelo menos sete anos antes do término do primeiro período de compromisso. Apesar das partes não terem chegado a um acordo, os países participantes concordaram que, diante do atual cenário, essa decisão deverá ocorrer nas próximas COPs;

(ii) A revisão do texto do Protocolo de Kyoto para que os países em desenvolvimento também assumam compromissos concretos de redução de emissões de GEE, de acordo com o artigo 9º do Protocolo;

(iii) A implantação do Fundo de Adaptação previsto no artigo 12.8 do Protocolo, que é constituído pelo valor correspondente a 2% dos créditos advindos de atividades no âmbito de MDL e destinam-se à prestação de assistência aos países em desenvolvimento vulneráveis aos efeitos adversos da mudança do clima.

O governo brasileiro aproveitou o encontro para apresentar uma proposta para a criação de um fundo voluntário destinado para compensar os países que reduzam o desflorestamento. Na ocasião, a proposta passou quase despercebida, mas vem despertando o interesse de alguns países e deve ser tema principal de uma próxima reunião a ser feitas até julho de 2007.

Apesar da COP 12 não ter resultado posições definitivas, o que desagradou ambientalistas e aqueles que defendem ações imediatistas, pode-se dizer que o resultado final foi bastante positivo, uma vez que os seus participantes concluíram a necessidade de identificar os custos e os impactos das mudanças climáticas nas suas economias e no mundo, além de criar um modelo de “governança climática” para que o planeta seja capaz de efetivamente evitar os impactos negativos das mudanças climáticas.

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    é advogado, sócio do escritório Menezes e Lopes Advogados, especialista em Direito Ambiental e esteve presente na COP 12 representando a OAB/SP.

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