O Supremo e a Constituição

Jurisprudência do STF deve ser respeitada sem críticas levianas

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22 de março de 2007, 17h19

Já se disse que a melhor contribuição do Estado ao bem-estar da população consiste na elaboração de boas leis. Mas de nada adiantam se não forem bem aplicadas, criando um verdadeiro sistema coerente e garantindo a segurança jurídica, que é tão importante quanto a segurança material do cidadão. O controle da constitucionalidade das leis e o respeito dos princípios constitucionais pelo legislador e pelos magistrados constituem a missão que tem sido exercida continuadamente, com independência e coragem cívica, pelo Supremo Tribunal Federal.

Se sempre se reconheceu a importância da nossa Corte Suprema na subsistência do Estado Democrático de Direito, em cuja defesa se manteve corajosamente até durante o regime militar, também deve ser enfatizada a sua atuação no sentido de dar maior eficiência ao nosso sistema judiciário e garantir os direitos individuais.

Efetivamente, já faz longo tempo que o congestionamento da nossa mais alta Corte está prejudicando a velocidade dos julgamentos. Mas, nos últimos anos, um esforço concentrado e fecundo foi realizado pelos ministro do STF para encontrar soluções eqüitativas e adequadas no sentido de apressar os julgamentos.

Recentemente, surgiram algumas críticas à Corte e ao ministro Gilmar Mendes, partindo de pessoas que não conheciam o funcionamento do Tribunal ou que pretendiam politizar a justiça. Ora, o ministro se limitou a manter e acompanhar a jurisprudência mansa e pacífica da Corte. Trata-se, aliás, de um dos nossos maiores constitucionalistas, autor de numerosas obras, professor que tem a mais alta reputação no país e no exterior, e que, nos últimos vinte anos, tem lutado, constantemente, pelo aperfeiçoamento e pela dinamização da Justiça.

A primeira discussão que surgiu foi em relação às ações de improbidade nas quais se analisou a política do governo. É evidente que se trata de matéria que deve ser apreciada sob o prisma da constitucionalidade, não podendo depender de ideologias políticas. Já, há longos anos, Hely Lopes Meirelles condenava a hipertrofia da legitimação em matéria de Ações Civis Públicas e de Ações de Improbidade, cuja excessiva ampliação da área de utilização tem sido condenada pela maioria dos nossos juristas.

O estado de direito, baseado no princípio da separação dos poderes, limita o controle do Poder Judiciário em relação aos atos políticos do Executivo, ressalvando sempre o exame da constitucionalidade das disposições legais pelo Supremo Tribunal Federal. Está havendo, assim, uma distorção tanto da Ação de Improbidade quanto da Ação Civil Pública, que o ministro Gilmar Mendes e os demais integrantes do Supremo Tribunal Federal repeliram, no interesse da Justiça e da democracia, e de acordo com a tradição da corte.

Outra questão suscitada se refere ao Habeas Corpus, garantia básica da liberdade individual. É preciso que o STF possa concedê-lo sempre que tenha havido violação do devido processo legal que abrange tanto as normas referentes ao procedimento quanto a obediência aos princípios constitucionais. Não se podem desrespeitar as garantias individuais pois, como já ensinava o Padre Vieira, “dispensam-se às leis por utilidade e abre-se a porta à ruína universal que só se pode evitar com a observância inviolável das leis”. E acrescentava que as leis são os muros da República e que, “se hoje se abriu uma brecha, por onde possa entrar um só homem, amanhã será tão larga que entra um exército inteiro”.

O Supremo Tribunal Federal é o garantidor da liberdade individual e do estado de direito, e a sua jurisprudência deve ser compreendida, divulgada e respeitada, sem críticas levianas e sem julgamentos político-partidários.

As posições de cada um dos ministros e do Tribunal devem, pois, ser entendidas dentro do seu contexto, pois não há liberdade individual, nem democracia, sem um Poder Judiciário forte e independente, como o que, felizmente, temos no Brasil.

Artigo publicado originalmente em O Globo de 22/03/2007.

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