Sistema de videoconferência

A Justiça brasileira precisa se adequar aos novos tempos

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19 de março de 2007, 13h02

O plenário da Câmara dos Deputados aprovou por unanimidade no último dia 7 de março o Projeto de Lei 7227/06, de autoria do Senador Tasso Jereissati, que torna regra geral o uso da videoconferência nos interrogatórios e nas audiências judiciais das quais participe o juiz, o acusado preso e seu advogado.

Atualmente, a prática para ouvir o acusado é transportá-lo até o fórum, devido à falta de segurança para o comparecimento do juiz ao presídio. Ainda sobre a aprovação da referida lei, se o advogado do réu não estiver com ele na sala especial da prisão onde a videoconferência ocorrerá, o defensor terá acesso a uma linha telefônica reservada para a comunicação com o acusado. Nos presídios, as salas reservadas para os interrogatórios e audiências serão fiscalizadas por representantes do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Ordem dos Advogados do Brasil.

A questão é muito controversa e ainda mesmo com a essa aprovação o debate está longe de cessar. É um grande passo, mas o legislador foi tímido ao deixar uma brecha para que a videoconferência não seja realizada. Reza o novo texto legal que na ausência de condições de realização e de o magistrado não puder se deslocar até o presídio, o traslado do preso está autorizado.

Estamos muito atrasados, e só agora é iniciada a regulamentação de um mecanismo largamente utilizado em outros países. Já fora empregado com sucesso na Itália no combate ao crime organizado. O objetivo do Collegamento Audivisivo a Distanza, assim denominado naquele país, era proteger as testemunhas da indústria mafiosa que ali se instalara.

Também nos Estados Unidos em 1983, o sistema da videoconferência entrou em operação nos processos de crimes de abuso de menores, permitindo-se a audiência à distância para que a vítima não sofresse intimidação e traumas psicológicos diante de um reencontro com o autor do crime, o denominado face to face.

Aqui no Brasil o corajoso e entusiasta juiz Edison Aparecido Brandão realizou o primeiro interrogatório por videoconferência do Brasil, no ano de 1986, na cidade de Campinas, interior de São Paulo. Já o Tribunal de Justiça da Paraíba foi o primeiro Estado do Brasil a regulamentar o interrogatório à distância. Naquele Estado está em pleno funcionamento, desde outubro de 2002, um complexo de equipamentos que reúne duas câmeras profissionais, telão, programa de computador, que, através de um canal exclusivo fazem a interligação entre o estúdio montado no fórum da Capital e outro no maior presídio estadual.

Em São Paulo e no Rio de Janeiro duas leis formam editadas no âmbito de seus respectivos estados, e autorizam a efetiva implantação da chamada tele-audiência. São elas, a Lei Estadual paulista 11.819/05, que também prevê a oitiva de testemunhas por esse método, e a Lei Estadual fluminense 4.554/05. Em São Paulo foi firmada parceria entre o governo paulista e o Tribunal de Justiça para a implementação do sistema de videoconferência em audiências criminais em cinco centros de detenção provisória e na penitenciária de segurança máxima de Presidente Bernardes. Esta implementação é fruto de uma fase experimental realizada no Fórum Criminal Mário Guimarães na oitiva de réus presos, onde foram ouvidos quatorze criminosos da organização criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital).

Dentre as justificativas para implementação deste sistema está, além da segurança, a economia aos cofres públicos com o transporte dos presos. Segundo novos dados trazidos pelo Senador Jereissati, em São Paulo a escolta de um preso ao tribunal custa R$ 2,5 mil, e com o sistema de videoconferência a economia ficaria em torno de R$ 17,5 milhões por semana.

Um exemplo concreto destes gastos desnecessários são os recentes deslocamentos realizados com o traficante Fernandinho Beira Mar. Desde que foi preso, em 2001, Beira-Mar fez 14 viagens, que geraram gastos, só com a parte aérea, de R$ 195 mil.

Uma questão apontada pelos críticos do sistema é a violação do direito do preso de ser levado à presença de um juiz. O promotor de Justiça Ronaldo Batista Pinto em recente artigo publicado, comenta que esta crítica de que o réu deva se dirigir ao juiz, para que este possa sentir-lhe as reações, interpretar sua postura e detectar o rubor da face, deve ser analisada com mais cuidado. Lembra o promotor que nosso ordenamento jurídico, pelo menos em matéria processual penal, não adotou o princípio da identidade física do juiz, razão pela qual inexiste qualquer vinculação entre o julgamento da causa e o ato de presidência do interrogatório.

Assim, não é raro que um juiz interrogue e outro profira a sentença, sem que jamais se tenha proclamado a nulidade do decisum decorrente de tal fato. Lembra ainda da hipótese do interrogatório ser realizado por meio de carta precatória, cuja validade foi inúmeras vezes reafirmada pelo STF, e neste caso também não há qualquer contato entre o juiz sentenciante e o acusado. Salienta também que inúmeras vezes o tribunal, em grau de recurso, altera a sentença valendo-se, como elemento de prova, do interrogatório judicial, do qual apenas conheceu através da letra fria impressa no papel, sem que nenhum contato visual com o réu tenha ocorrido.

É natural que a primeira decorrência da inovação seja a resistência. Lembramos aqui do magistrado José Raul Gavião de Almeida, que relata ter o Judiciário enfrentado, em 1926, contestações sobre sentenças datilografadas. Até então, os documentos eram manuscritos. Aquele que recusava a modernidade entendia que não havia segurança nas sentenças, colocando em dúvida se realmente eram proferidas por um juiz.

Os paradigmas impostos pela cultura ou pelos costumes tendem a resistir, mas acabam cedendo ao melhor meio de solução das dificuldades. A videoconferência hoje é largamente vários outros setores organizados da sociedade, como meio facilitador na rapidez das decisões e pela redução nos gastos.

Temos que parar de agir de acordo com nossas conveniências quando o tema envolve os interesses de toda coletividade. A Justiça brasileira precisa se adequar aos novos tempos e não podemos permanecer à margem de colaborar neste processo.

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