Cada um por si

Falta um sistema nacional de defesa do consumidor

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17 de março de 2007, 0h01

Quem defende o consumidor brasileiro? Esta, talvez, seja uma das perguntas mais difíceis de se responder quando o assunto é defesa do consumidor no Brasil. Não por falta de defensores. Estão aí, por todos os lados, os Procons, Idecs, ONGs, secretarias municipais e estaduais e até um Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor federal para amparar a classe de cidadãos que consomem.

O que dificulta falar dos defensores do consumidor é a falta de articulação e coordenação entre eles que impede a aplicação de uma política nacional de proteção ao consumo. Falta globalização no setor, enfim. Os órgãos de defesa do consumidor estaduais e municipais são autônomos e independentes entre si e não há lei que os obrigue a serem interligados. No mundo globalizado, isso gera complicação das boas.

Veja-se, por exemplo, o sistema de sanção às empresas, previsto no Código de Defesa do Consumidor e regulamentado por leis e portarias dos órgãos de defesa do consumidor. Cada Procon tem a sua fórmula para punir a empresa que desrespeitou o seu cliente.Com isso, uma mesma empresa, por uma mesma falta em cidades ou estados diferentes será punida de forma diferente. Com 27 estados, um Distrito Federal e mais de 5 mil municípios, pode-se imaginar o tamanho da encrenca que representa esta multiplicidade de competências.

É importante alertar que o Código de Defesa do Consumidor existe e afeta interesses tanto dos consumidores quanto dos fornecedores. Por isso, a implantação de procedimentos e normas em âmbito nacional interessa tanto a uma categoria quanto à outra.

De acordo com o especialista em Direito do Consumidor, Rodrigo Mesquita Pereira, do Mesquita Pereira, Marcelino, Almeida e Esteves Advogados, o código existe para gerar uma harmonia na relação de consumo. “Ele não deve ser usado só pra defender o consumidor. Nem só o consumidor pode ser defendido e nem só a empresa pode ser atacada”, finalizou.

Com Mesquita, concorda outro especialista em Direito do Consumidor, Francisco Antonio Fragata Junior. Para o advogado, o Código, num primeiro momento, foi entendido como um instrumento de enriquecimento fácil dos consumidores. Com o amadurecimento das relações propostas pelo CDC, esta situação está mudando. Hoje se pode notar melhor disposição para a negociação, com a empresa pagando pelos danos causados e com o consumidor buscando apenas reparar seus prejuízos.

É neste ponto que se nota a falta de uma política nacional de multas. Não há quem seja contra a punição das empresas nos casos em que causam prejuízo ou dano ao consumidor. No entanto, a sanção deve ser previsível e limitada, o que também pode servir como forma de inibir as contravenções. “Não faz sentido uma política fragmentada”, diz Fragata

Fragata diz que o Código de Defesa do Consumidor, que completa 17 anos no dia 11 de setembro, deixou essa questão aberta a interpretações e práticas diversas. O artigo 57 do CDC prevê: a pena de multa, graduada de acordo com a gravidade da infração, a vantagem auferida e a condição econômica do fornecedor, será aplicada mediante procedimento administrativo. Em seu parágrafo único, diz que a multa será em montante não inferior a duzentas e não superior a três milhões de vezes o valor da Ufir.(R$ 1, 06) “Falta uma legislação que dê maior orientação sobre o sistema de aplicação de multas”, reclama.

Mesquita Pereira conta que “em determinados casos o órgão fixa a multa pelo que a empresa fatura, sem ao menos verificar qual o faturamento real da empresa”.

O problema de dosimetria das multas, estados e municípios é amplificado pela multiplicidade de competência para multar. O Procon do estado de São Paulo pode aplicar sanções. O Procon de Campinas, que fica a uma hora de São Paulo, também pode punir. E o de Santos, no litoral, também. “Precisamos de uma regulamentação que amarre todo mundo”, sugere Fragata.

A ex-diretora do Procon de São Paulo, Maria Stella Gregori, que também é consultora e professora de Direito do Consumidor, acredita ser importante preservar a autonomia dos órgãos municipais ou estaduais. “Basta que cada um deles trate as questões a nível nacional”. Para ele, um sistema de política nacional que defina diretrizes evitaria que cada Procon aplique multas com valores diferentes por uma mesma reclamação. Havendo divergências, as empresas podem recorrer ao Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), órgão vinculado a Secretária de Direito Econômico do Ministério da Justiça.

O Sistema Nacional de Organização dos Órgãos de Defesa do Consumidor é a primeira tentativa de integração do sistema de Procons. Modesta. Primeiro, porque se limita a centralizar informações sobre reclamações de consumidores. Em segundo lugar, porque a adesão não é obrigatória. São Paulo, o estado que mais consome, não participa.

Uma vez concluída a integração, o sistema terá sua utilidade. O número de reclamação a que responde uma empresa é um bom parâmetro para o consumidor na hora de contratar os seus serviços ou comprar os seus produtos. É a vingança do consumidor contra cadastros tipos Serasa e SPC.

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