É pré-requisito

Preso em São Paulo pode ser avaliado para ter progressão

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10 de março de 2007, 0h02

Os presos de São Paulo passarão por exame criminológico para progredir de pena se o juiz assim determinar. O entendimento é do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, que julgou inconstitucional os artigos 6º, 112 e parágrafos da Lei 10.792/03, que alterou a lei de Execução Penal.

Com a decisão do tribunal, que seguiu voto do desembargador Ivan Sartori, a progressão penal só pode acontecer depois de parecer da Comissão Técnica de Classificação.

O entendimento dos desembargadores é o de que a lei de 2003 contraria os incisos XLVI (individualização da pena) e LV (contraditório) do artigo 5º da Constituição Federal, segundo parecer do procurador Hermann Herschander, da Procuradoria-Geral de Justiça.

“Não fica impedido o magistrado de examinar promoção prisional ou os outros benefícios previstos no parágrafo 2º do art. 112 à luz de parecer da comissão [CTC] e/ou do exame aludido, haja vista, inclusive, o art. 33, parágrafo 2º, do Código Penal. Nem poderia ser diferente, porquanto ao legislador não é dado cercear o juiz na atividade jurisdicional, em detrimento de princípio constitucional básico, como o é o contraditório (art. 5º, inciso LV)”, afirmou Sartori.

A decisão se baseia em dois votos do Supremo Tribunal Federal, do ano passado. Um do ministro Celso de Mello e outro do ministro Ricardo Lewandowski. Em ambos, o Supremo entendeu pelo direito dos juízes de solicitar o exame do preso para conceder a progressão.

“Torna-se inviável interpretação dos dispositivos em questão que leve ao entendimento de que banido do processo de execução de pena o exame criminológico ou parecer da CTC – como defendido por alguns respeitáveis operadores do direito -, uma vez que essa posição, além de não se afinar com o espírito da lei, importa maltrato aos princípios insculpidos nos arts. 2º e 5º, incisos XLVI e LV, da Carta da República”, disse Sartori.

Leia o voto

Incidente de Inconstitucionalidade de Lei nº 142.535.0/8-00

Comarca: São Paulo

Órgão Julgador: Órgão Especial do Tribunal de Justiça

Sucte: 3ª Câmara do 2º Grupo da Seção Criminal do TJ de SP

Sucdo: Daniel Michellin de Oliveira

VOTO DO RELATOR

Ementa: Constitucional – Incidente de Inconstitucionalidade de Lei – Execução de pena – Arts. 6º e 112 da LEP – Alterações introduzidas pela Lei 10.792/03 – Possível ofensa aos incisos XLVI e LV do art. 5º da CF – Exame criminológico e participação da CTC que, embora não sendo obrigatórios na progressão de regime e em outros benefícios, não foram banidos da execução penal – Interpretação sistemática nesse sentido – Precedentes do STF – Inconstitucionalidade não ocorrente – Exclusão, todavia, de interpretação legal que implique a eliminação completa do exame e da participação cuidados – Procedência parcial.

Trata-se incidente de inconstitucionalidade suscitado pela Eg. 3ª Câmara da Seção de Direito Criminal desta Corte, em autos de agravo ministerial em execução de pena privativa de liberdade, diante de argumento da Promotoria de Justiça de que as alterações nos arts. 6º, 112 e parágrafos da Lei de Execução Penal, nos termos da Lei 10.792/03, dispensando exame criminológico e parecer multidisciplinar da Comissão Técnica de Classificação à obtenção de progressão de regime prisional e demais benefícios, estariam a contrariar os incisos XLVI (individualização da pena) e LV (contraditório) do art. 5º da Constituição Federal.

A Procuradoria Geral de Justiça, em parecer da lavra do ilustre Procurador de Justiça Hermann Herschander, é pela procedência parcial, com vistas à exclusão de interpretações das disposições enfocadas que vedem a intervenção da Comissão Técnica de Classificação e o exame criminológico.

É o relatório.

Inicialmente, importante salientar que as partes tiveram ampla oportunidade de manifestação acerca do objeto deste incidente, porque inerente ao próprio agravo.

No cerne, tem-se que a Lei 10.792/03, ao proceder a alterações na redação dos arts. 6º, 112 e parágrafos da Lei de Execução Penal, não excluiu a possibilidade de realização do exame criminológico ou mesmo da participação da Comissão Técnica de Classificação no processo de execução da pena.

Realmente, não há vedação expressa a respeito e permaneceram incólumes o art. 7º e seu parágrafo e 8º “caput” da LEP, os primeiros a disporem sobre a composição da CTC e seu funcionamento junto ao Juízo de Execução e o último dispositivo a prever o exame já referido à individualização da execução.

Mesmo o art. 6º, que sofreu modificação, continua a cuidar de atribuição da mesma comissão, consistente na realização do programa individualizador do escarmento físico.

Assim, não fica impedido o magistrado de examinar promoção prisional ou os outros benefícios previstos no parágrafo 2º do art. 112 à luz de parecer da comissão e/ou do exame aludido, haja vista, inclusive, o art. 33, parágrafo 2º, do Código Penal.

Nem poderia ser diferente, porquanto ao legislador não é dado cercear o juiz na atividade jurisdicional, em detrimento de princípio constitucional básico, como o é o contraditório (art. 5º, inciso LV).

No pertinente, além do aresto do Superior Tribunal de Justiça citado no bem lançado parecer ministerial (fls. 78/9), colacionem-se os seguintes julgados do Supremo Tribunal Federal:

“Reconhecimento, ainda, da possibilidade de o juiz da execução ordenar, mediante decisão fundamentada, a realização de exame criminológico – Importância do mencionado exame na aferição da personalidade e do grau de periculosidade do sentenciado (RT 613/278) – Edição da Lei nº 10.792/2003, que deu nova redação ao art. 112 da LEP – Diploma legislativo que, embora omitindo qualquer referência ao exame criminológico, não lhe veda a realização, sempre que julgada necessária pelo magistrado competente – Conseqüente legitimidade jurídica da adoção, pelo Poder Judiciário, do exame criminológico (RT 832/676 – RT 836/535 – RT 837/568) – Precedentes (…)” (HC-ED 85963-SP, Segunda Turma, Min. Celso de Mello, DJ 27.10.2006, p. 00062; Ement. Vol-02253-02, p. 00296).

E:

“EMENTA: PENAL. EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 112 DA LEI Nº 7.210/84, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 10.792/03. PROGRESSÃO DE REGIME. REQUISITOS. EXAME CRIMINOLÓGICO. ARTIGO 33, § 2º DO CP. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA. I – A obrigatoriedade do exame criminológico e do parecer multidisciplinar da Comissão Técnica de Classificação, para fins de progressão de regime de cumprimento de pena, foi abolido pela Lei 10.972/03. II – Nada impede, no entanto, que, facultativamente, seja requisitado o exame pelo Juízo das Execuções, de modo fundamentado, dadas as características de cada caso concreto. III – Ordem denegada.” (HC 86631/PR, Primeira Turma, Min. Ricardo Lewandowski, DJ 20.10.2006, p. 00062, Ement. Vol. 02252-02, p. 00326).

Daí por que também não se pode falar em violação ao principio da individualização da pena, quando a lei não retira do juiz toda possibilidade de diligência à aferição da periculosidade do réu e capacidade de adaptação a novo regime ou à vida social.

Por isso que, em face do suso exposto, torna-se inviável interpretação dos dispositivos em questão que leve ao entendimento de que banido do processo de execução de pena o exame criminológico ou parecer da CTC – como defendido por alguns respeitáveis operadores do direito -, uma vez que essa posição, além de não se afinar com o espírito da lei, importa maltrato aos princípios insculpidos nos arts. 2º e 5º, incisos XLVI e LV, da Carta da República.

Destarte, julga-se procedente em parte o incidente, somente para o fim de excluir-se interpretação dos art. 6º, 112 e parágrafos da Lei de Execução Penal, redação da Lei 10.792/03, que implique a inadmissão, no processo de execução de pena, do exame criminológico e da participação da Comissão Técnica de Classificação.

IVAN SARTORI

Desembargador Relator

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