Certeza da dívida

Débito deve ser descrito com clareza em caso de execução

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7 de março de 2007, 10h12

Para executar mutuário, as parcelas que compõem a execução devem ser discriminadas de forma precisa. O entendimento é da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que determinou a anulação do processo que a Caixa Econômica Federal move contra um mutuário. Ele alegou que recebeu a cobrança sem especificação das parcelas da dívida.

Para o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o documento elaborado pela Caixa é impreciso e insuficiente porque não dá ao devedor a certeza do valor da condenação. No STJ, a instituição financeira alegou que apresentou o demonstrativo da dívida e nele constava a evolução do débito com clareza.

O relator, ministro Aldir Passarinho Júnior concluiu que a execução deve vir acompanhada do demonstrativo do débito atualizado, conforme o artigo 614 do Código de Processo Civil. Além disso, observou que o argumento da Caixa esbarra na Súmula 7 do STJ, que proíbe a análise de provas.

No entanto, entendimento da 2ª Seção do tribunal diz que, na hipótese de faltarem documentos para comprovação exata da dívida, cabe às instâncias ordinárias dar a oportunidade àquele que promoveu o processo de acrescentar os registros que faltam. Diante disso, o ministro conheceu em parte do recurso para anular o processo a partir do acórdão, determinando ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região que conceda à Caixa a oportunidade de adicionar os demonstrativos ao processo.

Leia a decisão

RECURSO ESPECIAL Nº 802.743 – SC (2005⁄0203749-0)

RELATOR : MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR

RECORRENTE : CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CEF

ADVOGADO : CÉSAR EUGÊNIO ZUCCHINALI E OUTROS

RECORRIDO : ROGÉRIO FIGUEIREDO

ADVOGADO : CELSO EUGÊNIO DO NASCIMENTO E OUTRO

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA. LEI N. 5.741⁄71. DEMONSTRATIVOS TIDOS POR INCOMPLETOS. IMPRECISÃO DETECTADA. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7⁄STJ. FACULDADE DO EXEQÜENTE COMPLEMENTAR OS CÁLCULOS. APLICAÇÃO DO ART. 616 DO CPC.

I. Reconhecido pelo Tribunal de origem a existência de imprecisão do demonstrativo do débito, em prejuízo da liquidez e certeza do título sob execução, impossível ao STJ a reforma do juízo valorativo, em razão da via estreita do recurso especial (Súmula n. 7).

II. Precedentemente à extinção do processo, todavia, deve ser oportunizada ao credor a correção dos cálculos, nos termos do art. 616 do CPC.

III. Recurso especial conhecido em parte e provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nessa parte, dar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Jorge Scartezzini, Hélio Quaglia Barbosa, Massami Uyeda e Cesar Asfor Rocha.

Brasília (DF), 06 de fevereiro de 2007.(Data do Julgamento)

MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR

Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 802.743 – SC (2005⁄0203749-0)

RELATÓRIO

EXMO. SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR: Caixa Econômica Federal interpõe, pelas letras “a” e “c” do art. 105, III, da Carta da República, recurso especial contra acórdão do colendo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assim ementado (fl. 56):

“ADMINISTRATIVO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. MÚTUO HABITACIONAL. AVISOS DE COBRANÇA. TÍTULO. LIQUIDEZ.

1. Nos termos do que dispõe o art. 2º da Lei 5741⁄71, não existe a exigência de que os avisos de cobrança sejam entregues pessoalmente ao devedor.

2. Em atenção aos atributos de certeza e liquidez que acompanham o título executivo, o demonstrativo de débito deve discriminar com precisão as parcelas que compõem a execução.

3. Apelo parcialmente provido.”

Alega o recorrente que a decisão ofendeu o art. 2º, II e III, da Lei n. 5.741⁄71, posto que apresentou, devidamente, o demonstrativo da dívida, dele constando a evolução do débito com clareza.

Invoca dissídio jurisprudencial.

Sem contra-razões (cf. certidão fl. 77).

Recurso admitido na instância de origem (fl. 78).

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 802.743 – SC (2005⁄0203749-0)

VOTO

EXMO. SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR (Relator): Discute-se no presente recurso especial, aviado pelas letras “a” e “c” do autorizador constitucional, sobre a higidez da cobrança executiva efetuada pela empresa publica, de dívida resultante de mútuo hipotecário.

O recurso merece prosperar em parte.

De efeito, é entendimento assente de que a execução deve vir acompanhada do demonstrativo do débito atualizado, conforme dicção do art. 614 do CPC. In casu, o aresto federal considerou impreciso o demonstrativo juntado com a inicial pela exeqüente, insuficiente, portanto, para atribuir certeza e liquidez à cobrança judicial. Demover tais argumentos no âmbito do recurso especial importaria no revolvimento do conjunto probatório, de impossível trâmite no STJ, em virtude da Súmula n. 7.

Mas, por outro lado, também constitui entendimento tranqüilo no âmbito da 2ª Seção, a compreensão de que na hipótese de faltarem documentos para a demonstração exata do débito, cabe às instâncias ordinárias oportunizarem ao exeqüente a complementação da instrução do feito, pelo princípio do aproveitamento do processo, evitando-se o ajuizamento de outro igual, e isso ainda que tal matéria tenha sido suscitada em embargos do devedor. É a aplicação do art. 616 do CPC.

À guisa de exemplo, cito os seguintes precedentes:

“PROCESSUAL CIVIL. ACÓRDÃO. NULIDADE NÃO CONFIGURADA. EXECUÇÃO. DEMONSTRATIVOS DE CÁLCULO. EVOLUÇÃO DA DÍVIDA NÃO DEVIDAMENTE ESCLARECIDA. MATÉRIA DE FATO. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. INÉPCIA DECLARADA EM 2º GRAU, DE OFÍCIO. EXTINÇÃO DO PROCESSO. CPC, ART. 616. APLICAÇÃO. OPORTUNIZAÇÃO PARA ADEQUADA INSTRUÇÃO.

I. Não padece de nulidade o acórdão que enfrenta de modo suficiente a matéria controvertida, apenas com conclusão desfavorável à pretensão do banco exeqüente.

II. Conquanto admissível ao Tribunal de 2ª instância conhecer de ofício sobre as condições da ação, impedindo continuidade de execução incompletamente aparelhada, eis que sem planilha de evolução da dívida suficientemente esclarecedora, deve a Corte, nesse caso, oportunizar à parte a complementação da instrução, nos termos do art. 616 do CPC, pela emenda à inicial, sem extinguir o feito.

III. Recurso especial conhecido e provido.”

(4ª Turma, REsp n. 302.260⁄MG, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, unânime, DJU de 26.08.02)

“EXECUÇÃO. AÇÃO DE EMBARGOS DO DEVEDOR. DISTINÇÃO.

DISTINTAS SÃO AS AÇÕES DE EXECUÇÃO E DE EMBARGOS DO DEVEDOR AINDA QUE ESTA SEJA INCIDENTAL DO PROCESSO ORIGINADO NA PRIMEIRA. POR ESSA RAZÃO, IMPOSSÍVEL É A DECLARAÇÃO DE INÉPCIA DA INICIAL DA EXECUÇÃO, DE OFÍCIO, NO JULGAMENTO DA APELAÇÃO INTERPOSTA DA DECISÃO SINGULAR QUE JULGOU IMPROCEDENTES OS EMBARGOS, VISTO NÃO TER A QUESTÃO SIDO SUSCITADA NA AÇÃO DE OPOSIÇÃO.”

(3ª Turma, REsp n. 1.194⁄GO, Rel. Min. Cláudio Santos, por maioria, DJU de 23.09.91)

“Execução. Art. 616 do Código de Processo Civil. Precedentes da Corte.

1. É pacífica a jurisprudência da Corte no sentido de que é possível suprir a deficiência da inicial quanto aos documentos e cálculos, cumprindo o Juiz o comando do art. 616 do Código de Processo Civil.

2. Recurso especial não conhecido.”

(3ª Turma, REsp n. 311.358⁄PR, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, unânime, DJU de 18.02.02)

“EMBARGOS DE DEVEDOR. Carência da ação executiva. Emenda da inicial.

– O Tribunal podia examinar a questão da carência da ação executiva, por falta de liquidez e certeza do título, matérias constantes da defesa do devedor.

– Sendo insuficientes os documentos e os cálculos apresentados pelo credor com a petição inicial do processo de execução, não é o caso de extingui-lo, mas de oportunizar a emenda da inicial, na forma do art. 616 do CPC.

– Recurso conhecido em parte e parcialmente provido. Votos vencidos.”

(4ª Turma, REsp n. 117.122⁄MG, Rel. p⁄ Acórdão Min. Ruy Rosado de Aguiar, por maioria, DJU de 09.11.98)

Ante o exposto, conheço em parte do recurso especial e dou-lhe provimento, para anular o processo a partir do acórdão, determinando ao TRF da 4ª Região que faculte à exeqüente a juntada da documentação faltante.

É como voto.

Documento: 2169478 RELATÓRIO E VOTO

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