Estado x União

Governo gaúcho consegue liminar para não recolher Pasep

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4 de março de 2007, 0h02

O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, deferiu liminar ao governo do Rio Grande de Sul contra o pagamento da contribuição federal Pasep (Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público).

Segundo a ação, ao recolher a contribuição no período de abril de 1993 a julho de 1994, o governo gaúcho teria efetuado pagamento de valores maiores do que realmente devia. Constatado o pagamento a maior, o estado protocolou o pedido de restituição, na via administrativa, em abril de 2003.

O estado informa que o pedido não foi aceito pelo Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda. O governo federal disse que o prazo estava prescrito.

Na ação, os gaúchos pedem “(a) a anulação, por ilegalidade, de decisões administrativas que indeferiram o pleito de devolução; (b) a condenação da União a homologar a compensação já efetuada pelo estado no valor de R$ 21.787.969,57; (c) a condenação da União Federal a restituir os valores relativos ao Pasep pleiteados na esfera administrativa e ainda não aproveitados, monetariamente atualizados e com juros de mora, e acatar que aludidos valores sejam aproveitados pelo ente público estadual, seja no pagamento do Pasep devido mês a mês, seja no abatimento das prestações devidas em parcelamento firmado ou, na pior das hipóteses, mediante recebimento por precatório judicial”.

Celso de Mello reconheceu a competência originária do STF para julgar a causa, “por nela vislumbrar a potencial ocorrência de conflito federativo, o que autoriza esta Suprema Corte a examinar o pedido de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional deduzido pelo estado do Rio Grande do Sul”.

O ministro ressalta que as considerações iniciais “permitem reconhecer a existência do profundo dissenso que se instaurou, na doutrina e na jurisprudência, a propósito do termo inicial da contagem do prazo a que alude o art. 168, I, do Código Tributário Nacional (CTN), para efeito de repetição de indébito concernente a tributos sujeitos à modalidade de lançamento por homologação”.

O Rio Grande do Sul justificou de maneira adequada, ressalta o ministro. As razões que “caracterizam a concreta ocorrência, na espécie, da situação de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação”. Segundo a ação, “se não for suspensa a exigibilidade do valor exigido haverá a inscrição no CADIN e a negativa de certidão de regularidade fiscal, inviabilizando a assinatura de convênios, nos termos da Lei 10522/2002”.

Em sua decisão, Celso de Mello deferiu o pedido para “suspender a exigibilidade quanto aos débitos exigidos pela União em razão das compensações já procedidas pelo estado”. O ministro também determinou “que a União emita certidão positiva com efeito de negativa relativamente a tais débitos” e que, “além de não proceder à inscrição no CADIN”, não imponha “obstáculos à retenção no Fundo de Participação dos Estados”.

O ministro não aceitou o pedido de “compensação dos débitos do Estado com o Pasep com tributos da mesma natureza”. Observou ainda, a proibição legal, presente no art. 170-A do CTN, que veda a compensação de valores que estão sendo discutidos na justiça, antes do trânsito em julgado. Citou também entendimento do tribunal na ACO 657 que, não cabe aceita liminar para autorizar imediata compensação de valores.

Leia Voto

AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA N.981-5

PROCED. RIO GRANDE DO SUL

RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO

AUTOR(A/S)(ES) : ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

ADV. (A/S) : PGE-RS – KARINA DA SILVA BRUM E OUTRO (A/S)

RÉU (É) (S) : UNIÃO

ADV. (A/S) : PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL


DECISÃO: O Estado do Rio Grande do Sul ajuíza, perante o Supremo Tribunal Federal, contra a União Federal, “ação de anulação de decisão administrativa cumulada com ação de repetição de indébito”, versando controvérsia relativa à contribuição, devida por essa unidade federada, ao Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público – PASEP, objetivando-se, na presente causa, “(a) a anulação, por ilegalidade, das decisões administrativas que indeferiram o pleito de devolução; (b) a condenação da União a homologar a compensação já efetuada pelo Estado no valor de R$ 21.787.969,57; (c) a condenação da União Federal a restituir os valores relativos ao PASEP pleiteados na esfera administrativa e ainda não aproveitados, monetariamente atualizados e com juros de mora, e acatar que aludidos valores sejam aproveitados pelo ente público estadual, seja no pagamento do PASEP devido mês a mês, seja no abatimento das prestações devidas em parcelamento firmado ou, na pior das hipóteses, mediante recebimento por precatório judicial

(fls. 03grifei).

O Estado autor – que também formula pedido de antecipação de tutela (fls. 545/557 e fls. 773/777) – explicita que, relativamente ao indeferimento de seu pleito junto ao Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda, “o fundamento – comum aos três acórdãos – foi o decurso do prazo para o exercício do direito de postular a repetição” (fls. 05 – grifei), assim justificando, no ponto, as razões de seu pleito (fls. 20/22):

Decorre de elementar leitura que, na contribuição ao PASEP, por se enquadrar na modalidade de lançamento por homologação, a contagem do prazo de 5 (cinco) anos que o Estado tem para pleitear a restituição do que foi pago, indevidamente, a maior ou de forma mais onerosa, inicia-se, não a partir da data do pagamento, mas, sim, a contar da data da homologação do lançamento, que, caso não ocorra expressamente, se dará pelo decurso do prazo de 5 (cinco) anos contados da ocorrência do fato gerador, conforme bem dispõe o § 4º do artigo 150 do CTN.

No caso, os pagamentos a maior ocorreram de 04/93 a 07/94, foram homologados de forma tácita cinco anos a contar dos fatos geradores respectivos e, só a partir desta homologação teve início o prazo do artigo 168 do CTN. Assim, o prazo de dez anos ainda não havia escoado quando formulado o primeiro pleito de repetição administrativa em abril de 2003. A posição aqui defendida quanto ao prazo, aliás, foi adotada pelos votos vencidos em dois julgamentos proferidos pelo Conselho de Contribuintes cuja cópia segue em anexo (processos nºs 110800038139/2003-86 e 11080003229/2003).

Os votos vencedores adotados nos dois processos logo acima mencionados sustentaram, em síntese, que o prazo para repetição do indébito é de cinco anos a contar da declaração de inconstitucionalidade. Nada mais equivocado, diante do atual entendimento do E. STJ, acima reproduzido. E veja-se que o E. STJ não mais considera a declaração de inconstitucionalidade como relevante para fins de contagem do prazo para pleitear a restituição de tributos, como mesmo destacado na decisão que deferiu a medida liminar, a qual faz referência ao julgamento exarado no Recurso Especial nº 435.835-SC.


Já o voto vencedor prolatado no processo nº 11080006227/2003-93, no sentido de que o prazo do artigo 168 do CTN só tem aplicação na esfera administrativa, não encontra amparo na doutrina e na jurisprudência pátria. E veja-se que, na espécie, era viável o pleito baseado na inconstitucionalidade, pois reconhecida esta pela própria autoridade administrativa.

Não se desconhecem, por evidente, os arts. 3º e 4º da LC 118/2005. No entanto, é de ser ponderado que a norma contida no artigo 3º somente pode ter eficácia para fatos geradores ocorridos a contar de 09.06.2005, sendo sua aplicação retroativa inconstitucional, como já decidiu o STJ no Recurso Especial nº 719.101.

Por derradeiro é bem de ver-se que, durante a discussão administrativa da repetição de indébito, não corre o prazo para pleitear-se o indébito:

Repetição de Indébito. Pendência de Processo Administrativo. 1. A decadência do direito à repetição do indébito tributário inicia-se após cinco anos, contados a partir de

quando se tornou definitiva a decisão administrativa que apreciou o pedido do contribuinte. À falta de decisão, não se opera decadência’. (STJ, lª Turma, Recurso Especial 151.520/PE, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJU de 20.04.98, pág. 37).

O eminente Procurador-Geral da República, ao pronunciar-se nestes autos (fls. 612/616), manifestou-se pelo reconhecimento da competência originária do Supremo Tribunal Federal para apreciar a presente causa, opinando, ainda, pelo deferimento do pedido de antecipação de tutela, em parecer assim ementado (fls. 612):

AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA. PLEITO DE ANULAÇÃO DE DECISÕES DO CONSELHO DE CONTRIBUINTES QUE DECLARARAM EXTINTO O PRAZO PARA O AJUIZAMENTO DE AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PEDIDO DE NATUREZA CAUTELAR DE SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DE CRÉDITO ANTERIORMENTE COMPENSADO PELO ESTADO. ‘FUMUS BONI IURISEPERICULUM IN MORACONFIGURADOS. AMPLA DISCUSSÃO DOUTRINÁRIA E JURISPRUDENCIAL A RESPEITO DA QUESTÃO DE QUE TRATA A ESPÉCIE. RISCO DE INSCRIÇÃO DO ESTADO AUTOR EM CADASTRO DE INADIMPLENTES E DE DANOS QUE LHE SÃO CONSEQÜENTES .PARECER PELO DEFERIMENTO DO PLEITO CAUTELAR.” (grifei)

Passo a examinar, preliminarmente, se se acha configurada, ou não, na espécie, a competência originária desta Suprema Corte para processar e julgar a presente causa, considerado o que dispõe a regra inscrita no art. 102, I, “f”, da Constituição da República.

E, ao fazê-lo, entendo caracterizada, no caso, a hipótese a que se refere a norma constitucional em questão.


Cabe assinalar, neste ponto, em face de sua relevância, os fundamentos em que se apóia o parecer da douta Procuradoria-Geral da República, quando também reconhece configurada, na espécie, a competência originária desta Suprema Corte para apreciar a presente causa (fls. 612/615):

1. O Estado do Rio Grande do Sul ajuizou ação cautelar e, posteriormente, ação anulatória cumulada com repetição de indébito (a primeira apensada a esta última), objetivando a desconstituição de decisões do Conselho de Contribuintes que declararam extinto o prazo para o exercício do direito de postular a repetição de valores referentes à contribuição ao PASEP, após a declaração de inconstitucionalidade dos Decretos-lei nº 2.445 e 2.449, ambos de 1988.

2. No caso discutido nos autos, o pagamento a maior foi realizado no período de abril de 1993 a julho de 1994, tendo sido protocolados os pleitos de restituição na via administrativa em abril de 2003. Foram três os pedidos de repetição – mediante a autorização para a compensação com créditos posteriores -, referentes a períodos diversos em que recolhida a contribuição ao PASEP. O Estado já havia procedido à compensação de parcela (R$ 29.856.735,93) do valor discutido em um dos pedidos referidos (processo nº 11080-003229/2003), sendo que, indeferido o pleito na via administrativa, exigiu a União o pagamento daquele montante compensado, sob pena de inscrição no CADIN e conseqüente retenção de repasse de verbas federais

3. Consideraram os julgados referidos que a decadência do direito de pleitear a restituição de indébito tributário, na hipótese de declaração de inconstitucionalidade dos diplomas normativos que fundamentavam a sua exigência, tem como prazo inicial a data da publicação da Resolução do Senado que retira a eficácia da lei declarada inconstitucional (na espécie, a Resolução nº 49/95). Contam-se, a partir dela, segundo entendimento ali externado, cinco anos.

4. O Estado autor entende que o prazo para o pleito de restituição do indébito, na espécie, é de dez anos, a contar da ocorrência do fato gerador, já que, em se tratando de tributo sujeito a lançamento por homologação, o Fisco tem cinco anos para proceder à homologação (momento da extinção do crédito), sendo a partir daí contados os cinco anos do prazo decadencial do art. 168 do CTN.

5. Na cautelar proposta, foi deferido, pela Justiça Federal de 1ª instância, o pedido de liminar formulado, para suspender-se a exigibilidade docrédito referido, com a determinação, em conseqüência, de que ‘a existência de tal montante não seja óbice para a expedição de certidão positiva com efeito de negativa’ e de que não seja o ente inscrito no cadastro de inadimplentes (fls. 29/630).

6. Da decisão deferitória da liminar interpôs a União agravo de instrumento, ao qual negou seguimento o TRF/4ª Região ante o reconhecimento, pelo juiz prolator daquela decisão, da competência do Supremo Tribunal Federal para a apreciação da causa.

7. A questão da competência é ainda objeto de discussão, nos autos do Agravo de Instrumento nº 630.920, de relatoria do Ministro Celso de Mello, interposto para destrancar o recurso extraordinário da União onde questionada a decisão do TRF/4ª Região referida.


8. Às fls. 545/557, informa o Estado do Rio Grande do Sul que foi intimado para proceder à devolução de novo valor – R$ 12.724.902,00 (doze milhões, setecentos e vinte e quatro mil, novecentos e dois reais) -, compensado em 15.01.2004 e que é parte daquele cuja devolução se pretende na espécie. Afirma, ainda, que a certidão obtida por ocasião da liminar tem como prazo de vencimento a data de 03.03.2007.

9. Pleiteia, assim, aduzindo que nasceu novamente, com a exigência, perigo de dano irreparável e de difícil reparação (não abrangido pela liminar obtida), a antecipação parcial da tutela para o fim de suspender a exigibilidade desse novo montante e, em conseqüência, para que seja determinado à União que emita certidão positiva com efeito de negativa relativamente a tal débito e que não proceda à inscrição no CADIN e à retenção de verbas para o Fundo de Participação dos Estados.

10. Pelo que dos autos consta, não foi ainda a União citada para apresentar contestação.

11. Em seguida, vieram os autos à Procuradoria Geral da República para manifestação, ‘inclusive sobre a competência [da] Corte para processar e julgar, originariamente, o presente feito’.

12. De início, entendo estar caracterizada, ante o teor do art. 102, I, ‘f‘, da Constituição da República, a competência desse Supremo Tribunal Federal para a apreciação da causa. Contendem, na espécie, a União e Estado-membro da Federação, hipótese descrita no preceito aludido, pelo que desnecessária, a meu ver, a análise da existência ou não de eventual conflito capaz de colocar em risco o pacto federativo.

13. De todo modo, essa Corte reconheceu a sua competência para julgar ação de repetição de indébito proposta por Estado em face da União, como a presente, nos autos da ACO nº 251/SP, assim ementado:

COMPETÊNCIAREPETIÇÃO DE INDÉBITOESTADO VERSUS INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL. Na dicção da ilustrada maioria, vencido o relator, a competência prevista na alínea ‘f’ do inciso I do artigo 102 da Constituição Federal alcança conflito a envolver repetição de indébito pretendida por Estado ante o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS. SALÁRIO- – EDUCAÇÃO – PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO – REGÊNCIA – OBRIGATORIEDADE DE RECOLHIMENTO. Somente com a Lei nº 9.766, de 18 de dezembro de 1998, ocorreu, relativamente ao salárioeducação, isenção, considerados os Estados’. (STF/Pleno, Relator Min. Marco Aurélio, DJ de 09.06.2006, pg. 01).” (grifei)

Entendo correto esse douto pronunciamento emanado do eminente Procurador-Geral da República.

Como se sabe, a regra de competência inscrita no art. 102, I, “f”, da Constituição, confere, ao Supremo Tribunal Federal, a posição eminente de Tribunal da Federação, atribuindo, a esta Corte, em tal condição institucional, o poder de dirimir as controvérsias, que, ao irromperem no seio do Estado Federal, culminam, perigosamente, por antagonizar as unidades que compõem a Federação.


Essa magna função jurídico-institucional da Suprema Corte impõe-lhe o gravíssimo dever de velar pela intangibilidade do vínculo federativo e de zelar pelo equilíbrio harmonioso das relações políticas entre as pessoas estatais que integram a Federação brasileira.

Daí a observação constante do magistério doutrinário (MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, “Comentários à Constituição Brasileira de 1988”, vol. 2/219-220, 1992, Saraiva), cuja lição, ao ressaltar essa qualificada competência constitucional do Supremo Tribunal Federal, acentua:

Reponta aqui o papel do Supremo Tribunal Federal como órgão de equilíbrio do sistema federativo. Pertencente embora à estrutura da União, o Supremo tem um caráter nacional que o habilita a decidir, com independência e imparcialidade, as causas e conflitos de que sejam partes, em campos opostos, a União e qualquer dos Estados federados.

É por essa razão que o Supremo Tribunal Federal, ao interpretar a norma de competência inscrita no art. 102, I, “f”, da Carta Política, veio a proclamar que “o dispositivo constitucional invocado visa a resguardar o equilíbrio federativo” (RTJ 81/330-331, Rel. Min. XAVIER DE ALBUQUERQUE), cabendo, a esta Corte Suprema, dirimir aquelas controvérsias – como a ora em exame – de que possam derivar situações caracterizadoras de conflito federativo (RTJ 132/109 – RTJ 132/120).

Esse entendimento jurisprudencial evidencia que a aplicabilidade da norma inscrita no art. 102, I, “f”, da Carta Política estende-se, portanto, àqueles litígios cuja potencialidade ofensiva revela-se apta a vulnerar os valores que informam o princípio fundamental que rege, em nosso ordenamento jurídico, o pacto da Federação, como esta Corte tem reiteradamente proclamado (RTJ 137/177-178, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RTJ 180/3, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA – RTJ 182/420, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA – RTJ 195/24, Rel. Min. CARLOS BRITTO – ACO 417-QO/DF, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – ACO 597-AgR/SC, Rel. Min. CELSO DE MELLO – ACO 684-QO/MG, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – ACO 730-QO/RJ, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA – Rcl 1.061/SP, Rel. Min. ELLEN GRACIE – Rcl 3.074/MG, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – Rcl 3.331/RR, Rel. Min. CARLOS BRITTO – Rcl 3.813/RR, Rel. Min. CARLOS BRITTO):

Supremo Tribunal Federal: competência originária (CF, art. 102, I, ‘f‘): ação proposta por uma unidade federada, o Distrito Federal, contra a União, caso em que, à fixação da competência originária do Tribunal, sempre bastou a qualidade das pessoas estatais envolvidas, entidades políticas componentes da Federação, não obstante a estatura menor da questão: precedentes.” (ACO 555-QO/DF, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – grifei)

– O art. 102, I, ‘f‘, da Constituição confere, ao Supremo Tribunal Federal, a posição eminente de Tribunal da Federação, atribuindo-lhe, nessa condição de órgão de cúpula do Poder Judiciário, competência para dirimir as controvérsias que irrompam no seio do Estado Federal, opondo as unidades federadas umas às outras, e de que resultem litígios cuja potencialidade ofensiva revele-se apta a vulnerar os valores que informam o princípio fundamental que rege, em nosso ordenamento jurídico, o pacto da Federação. (…).” (RTJ 194/743, Rel. Min. CELSO DE MELLO)


Reconheço, pois, na espécie, na linha dos precedentes mencionados, a competência originária do Supremo Tribunal Federal para processar e julgar a presente causa, por nela vislumbrar a potencial ocorrência de conflito federativo, o que autoriza esta Suprema Corte a examinar o pedido de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional deduzido pelo Estado do Rio Grande do Sul (fls. 545/557 e fls. 773/777).

O eminente Procurador-Geral da República, em seu douto parecer, propõe o deferimento da pretendida antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional, por entender presentes, quanto ao pleito de provimento antecipatório, os requisitos da verossimilhança e do “periculum in mora”, a que alude o art. 273 do CPC (fls. 615/616):

14. Quanto ao pedido de antecipação de tutela deduzido às fls. 545/557, entendo deva ser o mesmo recebido como se de providência de natureza cautelar se tratasse – complementação daquela deferida pela Justiça Federal de 1ª instância -, nos termos autorizados pelo art. 273, § 7º, do Código de Processo Civil, e assim deferido, uma vez verificada, na hipótese, a presença dos pressupostos que permitem o seu deferimento.

15. O autor procedeu à compensação de valores que posteriormente foram declarados prescritos e agora vem a União exigir a sua devolução, sob pena de inclusão do Estado em cadastro de inadimplente e conseqüente retenção de repasse de verbas federais.

16. O debate envolve, essencialmente, a questão do prazo para o pleito de restituição/compensação de tributo cuja legislação de criação fora declarada inconstitucional.

17. Doutrina e jurisprudência pátrias discutem sobre qual seria o diploma normativo aplicável para a aferição do prazo prescricional da repetição do indébito tributário quando a lei em que se fundamentou a exigência do tributo é posteriormente declarada inconstitucional – se o Código Tributário Nacional ou o Decreto nº 20.910/32, ambos fixadores do prazo de cinco anos – e, ainda, sobre a forma de contagem desse prazo.

18. Há quem entenda que, em se tratando de tributo sujeito à lançamento por homologação, como é o caso da contribuição ao PASEP, o prazo tem início na data da homologação do recolhimento pelo Fisco, quando é considerado extinto o crédito – o que significaria conferir prazo de dez anos a contar do recolhimento para o pleito de restituição, já que a homologação tácita se dá em cinco anos -, e há aqueles que defendem a tese de que se inicia o prazo a partir da suspensão da lei pelo Senado Federal, no caso de declaração de inconstitucionalidade por meio do controle difuso – a partir daí seriam contados os cinco anos.

19. A meu ver, é suficiente para a configuração do ‘fumus boni iuris’ a existência de controvérsia séria sobre o tema e orientação favorável à tese sustentada pelo autor, como verificado no caso dos autos.


20. Opericulum in morapode ser vislumbrado nas negativas repercussões financeiras provocadas pelo registro do Estado demandante em cadastro de inadimplentes – como, dentre outros, a obstaculização do repasse de verbas federais e a impossibilidade de celebração de convênios -, com prejuízos sensíveis à execução de ações do Governo e, diretamente, à população estadual.

21. Presentes os requisitos autorizadores da concessão do pleito liminar, é de ser o mesmo deferido, com a determinação de suspensão da exigibilidade do crédito referente à compensação efetuada pelo Estado e, via de conseqüência, de emissão de certidão positiva com efeito de negativa (referente ao débito ora analisado e também, pelos mesmos fundamentos, aquele de que tratou a decisão da Justiça Federal deferitória da liminar, em vista do vencimento da primeira certidão em data próxima), declarando-se, ainda, a impossibilidade de inscrição do Estado em cadastro de inadimplentes.

Ante o exposto, manifesto-me, esperando ter nova vista dos autos oportunamente, pelo reconhecimento da competência dessa Corte para a apreciação da causa e pelo deferimento da providência cautelar requerida.” (grifei)

Tais considerações – ora reproduzidas “in extenso” – permitem reconhecer a existência do profundo dissenso que se instaurou, na doutrina e na jurisprudência, a propósito do termo inicial da contagem do prazo a que alude o art. 168, I, do CTN, para efeito de repetição de indébito concernente a tributos sujeitos à modalidade de lançamento por homologação.

Há doutrinadores eminentes – como ALDEMÁRIO ARAÚJO CASTRO (“Do Termo Inicial de Contagem da Prescrição Qüinqüenal na Repetição de Indébito Tributário”, “in” Doutrina ADCOAS, ano VI, nº 01, jan/2003, p. 44/47), MARCELO MARQUES RONCAGLIA/EDUARDO CARVALHO CAIUBY (“Ainda a Prescrição e a Decadência: a Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e a Segurança Jurídica”, “in” Revista Dialética de Direito Tributário nº 132/2006, p. 81/96) e LUCIANO AMARO (“Direito Tributário Brasileiro”, p. 427/428, item n. 6, 2005, Saraiva) – que definem, como termo inicial para esse específico efeito (repetição de indébito tributário), a data em que ocorrido o pagamento antecipado por parte do sujeito passivo da obrigação tributária (CTN, art. 150, § 1º, c/c o art. 168, I), valendo referir, por sua inteira pertinência, as considerações expostas por EURICO MARCOS DINIZ DE SANTI (“Decadência e Prescrição no Direito Tributário”, p. 270, item n. 10.6.3, 2000, Max Limonad):

Portanto, a ‘data da extinção do crédito tributário‘, no caso dos tributos sujeitos ao Art. 150 do CTN, deve ser a data efetiva em que o contribuinte recolhe o valor a título de tributo aos cofres públicos e haverá de funcionar, ‘a priori’, como ‘dies a quo‘ dos prazos de decadência e de prescrição do direito do contribuinte. Em suma, o contribuinte goza de cinco anos para pleitear o débito do Fisco, e não dez.” (grifei)

Outros ilustres autores, porém – como JOSÉ AUGUSTO DELGADO (“Reflexões Contemporâneas sobre a Prescrição e Decadência em Matéria Tributária. Doutrina. Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça”, “in” Revista Fórum de Direito Tributário, ano 2, nº 10, jul/ago 2004, p. 76/81, item n. 11) e KIYOSHI HARADA (“Prescrição Tributária. Alterações Introduzidas pela LC nº 118/05”, “in” Circulus – Revista da Justiça Federal do Amazonas, v. 03, nº 05, jan/jun 2005, p. 57/62, item n. 3.2) -, perfilham orientação diversa, sustentando que o prazo qüinqüenal, na situação referida, somente terá início após a homologação, pela autoridade administrativa competente, do lançamento, salientando que, na hipótese de homologação tácita, o lapso de 05 (cinco) anos apenas fluirá quando decorrido um qüinqüênio contado da ocorrência do fato gerador, observando-se, em tal caso, o que dispõe o art. 150, § 4º, do CTN, cumprindo ressaltar, a esse respeito, as considerações expostas por PAULO DE BARROS CARVALHO (“Extinção da Obrigação Tributária, nos Casos de Lançamento por Homologação”, “in” Direito Tributário – Estudos em Homenagem a Geraldo Ataliba, p. 232/233, item n. 7, 1997, Malheiros):


O prazo decadencial de cinco anos, relativamente aos tributos sujeitos ao regime de ‘lançamento por homologação’, começa a fluir para o contribuinte a partir da homologação expressa ou tácita por parte do fisco. Este é o sentido que se pode construir a contar do texto do direito positivo brasileiro, sem qualquer esforço retórico. Segue-se que o termo inicial de contagem do prazo de caducidade está fixado na data da extinção do crédito tributário, vale dizer, no preciso instante em que se dá a homologação expressa ou tácita do pagamento antecipado, promovido pelo contribuinte. E saliente-se que tal orientação é obtida, de modo pronto e imediato, da integração do art. 150 com o art. 174, ambos do Código Tributário Nacional (Lei n. 5.172/66). Não se trata, portanto, de mera proposta exegética que a doutrina produz na linha de afirmar suas tendências ideológicas. É prescrição jurídico-positiva, estabelecida pelo legislador de maneira explícita.” (grifei)

Há a registrar, ainda, a posição daqueles que, problematizando a questão ora em análise, introduzem, no debate, um dado adicional, apto a provocar o exame da controvérsia sob perspectiva diversa, que considera a existência de declaração, pelo Supremo Tribunal Federal, de inconstitucionalidade da lei tributária, distinguindo, para esse efeito, as decisões que esta Suprema Corte venha a proferir em sede de fiscalização abstrata daquelas emanadas em controle incidental.

Cabe referir, sob essa outra perspectiva de abordagem do tema, a orientação exposta por HUGO DE BRITO MACHADO (“Extinção do Direito a Repetição do Indébito Tributário” “in” Temas de Direito Tributário nº II, p. 189/190, item n. 11.4, 1994, RT), MARCO AURÉLIO GRECO/HELENILSON CUNHA PONTES (“Inconstitucionalidade da Lei Tributária – Repetição do Indébito”, p. 62/73, itens ns. 1.4 e 2, 2002, Dialética), ALBERTO XAVIER (“A Contagem dos Prazos no Lançamento por Homologação” “in” Revista Dialética de Direito Tributário nº 27/97, p. 10/13, item “b”), GONÇALO BONNET ALLANGE (“O Prazo Prescricional nas Ações de Restituição de Indébito Tributário Fundadas em Declaração de Inconstitucionalidade pelo STF”, “in” Revista de Estudos Tributários, ano VI, nº 31, mai/jun 2003, p. 07/13), PAULO ROBERTO LYRIO PIMENTA (“Efeitos da Decisão de Inconstitucionalidade em Direito Tributário”, p. 167/169, item n. 2.3.3, 2002, Dialética) e MARCELO FORTES DE CERQUEIRA (“Repetição do Indébito Tributário”, p. 330/334, item n. 5.1, 2000, Max Limonad), valendo mencionar, quanto a tal posição, o magistério de RICARDO LOBO TORRES (“Restituição de Tributos”, p. 169, cap. V, item n. 2, 1983, Forense):

Na declaração de inconstitucionalidade da lei, a decadência ocorre depois de cinco anos da data do trânsito em julgado da decisão do STF proferida em ação direta ou da publicação da Resolução do Senado que suspendeu a lei com base em decisão proferida ‘incidenter tantum’ pelo STF.” (grifei)

Essa ampla controvérsia doutrinária – que também se reflete no plano da jurisprudência dos Tribunais, notadamente na do E. Superior Tribunal de Justiça – foi magnificamente bem exposta pelo eminente Desembargador LUIZ FELIPE SILVEIRA DIFINI (“Manual de Direito Tributário”, p. 289/293, item n. 4.1.1, 2ª ed., 2005, Saraiva), que assim a resumiu:

O prazo decadencial para pleitear a repetição de indébito é de cinco anos. Segundo o art. 168 do CTN, o direito de pleitear a restituição extinguese com o decurso do prazo de cinco anos, contados da data da extinção do crédito tributário ou, no caso de alteração de decisão condenatória, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou transitar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória.


A hipótese mais comum é do inciso I e tem peculiaridades dignas de nota, especialmente no caso dos tributos sujeitos a lançamento por homologação. A decadência do direito de pleitear a restituição se consuma cinco anos após a extinção do crédito tributário. No lançamento por homologação, a extinção do crédito tributário se dá com a homologação (CTN, art. 156, VII). Se não há homologação expressa, tem-se que há homologação tácita em cinco anos, a contar do fato gerador (art. 150, § 4º). Portanto, não havendo homologação expressa, a extinção do crédito tributário se dá com a homologação tácita, cinco anos após o fato gerador e a partir daí corre o prazo de (mais) cinco anos para pleitear a devolução, em caso de pagamento indevido. Na prática, o prazo decadencial de cinco anos começa a correr depois de completado o prazo de cinco anos a partir do fato gerador para a homologação, o que acaba resultando em dez anos (5 + 5) a partir do fato gerador (imponível): ‘não tendo ocorrido a homologação expressa, o direito de pleitear restituição só ocorrerá após o transcurso do prazo de cinco anos, contados da ocorrência do fato gerador, acrescido de mais cinco anos, contados daquela data em que se deu a homologação tácita, isto é, em 1996, quanto aos fatos impositivos mais remotos…’ (STJ, 2ª Turma, REsp 44221/PR, rel. Min. Pádua Ribeiro, RSTJ, 59, p. 405). Nesse sentido, firmara-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

Posteriormente, ‘a 1ª Seção do STJ, no julgamento do EREsp 423.994/MG, Min. Peçanha Martins, sessão de 08.10.2003, consagrou o seguinte entendimento, quanto ao prazo para pleitear a restituição de tributos sujeitos a lançamento por homologação cuja cobrança foi declarada inconstitucional pelo STF: a) se a declaração de inconstitucionalidade ocorreu em sede de ação de controle concentrado, o prazo de cinco anos inicia na data da publicação do respectivo acórdão; e b) se a inconstitucionalidade foi declarada na via do controle difuso, o prazo qüinqüenal tem início na data da resolução do Senado Federal suspendendo a execução da norma – CF, art. 52, X’ (EREsp 437.513/MG).

A seguir, no citado EREsp 437.513/MG, examinando hipótese em que o Senado não havia editado a resolução em questão, decidiu a 1ª Seção do STJ que, ‘nos casos em que o Senado não edita resolução suspendendo a execução dos dispositivos declarados inconstitucionais, tendo em vista não haver no sistema prazo prescricional cujo termo ‘a quo’ seja indeterminado, nem obrigação tributária imprescritível, é de ser adotada a regra geral consagrada para a repetição de tributos sujeitos a lançamento por homologação, qual seja, a de considerar como termo inicial do prazo de cinco anos da prescrição a data da homologação, tácita ou expressa, do lançamento’.

Em síntese: como regra geral, nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, a decadência do direito de pleitear restituição ocorre, não tendo havido homologação expressa, após o transcurso do prazo de cinco anos, contados de cinco anos após a ocorrência do fato gerador, que é quando se dá a homologação tácita (cinco mais cinco anos, logo, ao fim do prazo de dez anos). No caso de tributos cuja exigência foi declarada inconstitucional pelo STF, o prazo é de cinco anos a partir da publicação do acórdão se a declaração de inconstitucionalidade ocorreu em sede de controle concentrado e de cinco anos a partir da resolução do Senado suspendendo a execução da norma se a declaração de inconstitucionalidade ocorreu em sede de controle difuso. Contudo, se o Senado não editar a resolução, aplicar-se-á a regra geral: prazo de cinco anos a partir da homologação tácita, que ocorre cinco anos após a ocorrência do fato gerador (prazo de 5 + 5 anos).


Assim estava posta a situação, quando veio a Lei Complementar n. 118, de 9 de fevereiro de 2005, que dispôs no seu art. 3º: ‘Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1° do art. 150 da referida Lei’.

Portanto, a lei pretendeu conferir interpretação autêntica ao art. 168, I, do CTN, fixando o marco inicial do prazo decadencial do direito de pleitear restituição de tributos sujeitos a lançamento por homologação e indevidamente pagos na data do pagamento dito ‘antecipado’, contrariando a interpretação jurisprudencial vigente que situava este marco inicial na data da homologação (que normalmente é tácita e ocorre 5 anos após o fato gerador). Em suma, reduziu o prazo (por pretendida interpretação autêntica) de dez anos a partir do fato gerador (5 + 5) para cinco anos a partir do pagamento.

Ainda, o art. 4º da mesma lei tem a seguinte redação: ‘Esta Lei entra em vigor 120 (cento e vinte) dias após sua publicação, observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei n. 5.172, de 25 outubro de 1966 – Código Tributário Nacional’.

(…) Como já visto (…), a lei dita interpretativa contraria a interpretação jurisprudencial antes vigente e agrava a situação do contribuinte. Desse modo, só pode dispor para o futuro. Desimporta que a lei tenha feito menção ao art. 106, I, do CTN. Já antes dela a interpretação deste artigo era no sentido de não haver retroação quando a nova lei contrariasse interpretação jurisprudencial vigente e agravasse a situação do contribuinte. Assim, o disposto no art. 3° da Lei Complementar n. 118/2005 só se aplica aos pagamentos antecipados realizados após sua vigência, que se dará 120 dias após sua publicação (em 9-6-2005, portanto). Nos pagamentos anteriores a esta data, o prazo decadencial para ajuizar repetição de indébito só fluirá a partir da homologação (normalmente tácita, que ocorre cinco anos após o pagamento antecipado). Também nos casos em que a exigência tributária foi ou será declarada inconstitucional pelo STF, prevalecerá a atual jurisprudência do STJ, com as necessárias

adaptações.

Assim, nesta matéria (…), a nosso ver, foram postas as questões referentes à decadência do direito de pleitear restituição dos tributos sujeitos a lançamento por homologação. A decadência ocorrerá:

a) se não foi declarada a inconstitucionalidade da exigência pelo STF:

a. 1) se o pagamento antecipado foi efetuado antes da vigência da Lei Complementar n. 118/2005 (9-6-2005), não tendo havido homologação expressa, após o transcurso do prazo de cinco anos (contados de 5 anos após a ocorrência do fato gerador), que é quando se dá a homologação tácita (5 + 5 anos, logo, ao fim do prazo de 10 anos, segundo a interpretação jurisprudencial então vigente);


a. 2) se o pagamento antecipado foi efetuado na vigência da Lei Complementar n. 118/2005 (9-6-2005), após o transcurso de cinco anos da data do pagamento dito antecipado;

b) se for declarada a inconstitucionalidade da exigência pelo STF:

b. 1) se a declaração for em sede de controle concentrado (em ação declaratória de inconstitucionalidade ou constitucionalidade), no prazo de cinco anos após a publicação do acórdão;

b. 2) se a declaração for em sede de controle difuso:

b. 2.1) no prazo de cinco anos a partir da resolução do Senado suspendendo a execução da norma;

b. 2.2) se o Senado não editar a resolução, e o pagamento dito antecipado tiver sido efetuado anteriormente à vigência da Lei Complementar n. 118/2005, aplica-se a interpretação jurisprudencial então vigente (EREsp 437.513/MG) no prazo de cinco anos a partir da homologação tácita, que ocorre cinco anos após a ocorrência do fato gerador;

b. 2.3) se o Senado não editar a resolução, e o pagamento dito antecipado tiver sido efetuado posteriormente à vigência da Lei Complementar n. 118/2005, é a hipótese mais complexa, na qual cremos se deva contar o prazo de cinco anos a partir da publicação do acórdão do STF, pois não acreditamos se possa adotar interpretação (como seria contar o prazo a partir do pagamento dito antecipado) que coloque o contribuinte em situação mais desfavorável que no caso de a inconstitucionalidade ter sido declarada em sede de controle concentrado.” (grifei)

Todas essas considerações – como anteriormente assinalado – revelam o profundo dissenso existente sobre a matéria em discussão, o que basta para evidenciar a verossimilhança das alegações deduzidas pelo Estado autor (CPC, art. 273), como foi bem ressaltado, em sua douta manifestação, pela Procuradoria-Geral da República (fls. 615/616, itens ns. 14 a 21).

Há que se destacar, ainda, por oportuno e relevante, decisão proferida pelo eminente Ministro EROS GRAU, como Relator, nos autos da Pet 3.221/RN, em cujo âmbito se discutiu idêntica questão.

Cabe registrar, também, a existência, nesta Corte, de outras causas, igualmente ajuizadas por Estados-membros em face da União Federal (ACO 655/BA, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE e ACO 657/PE, Rel. Min. MARCO AURÉLIO), nas quais se instaurou controvérsia idêntica à ora suscitada neste processo.


Acentue-se, finalmente, que o Estado do Rio Grande Sul justificou, de maneira inteiramente adequada, as razões que caracterizam a concreta ocorrência, na espécie, da situação de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação (fls. 552/557):

O tema de fundo, alusivo ao cálculo do PASEP, está pacificado e sequer foi objeto de controvérsia na esfera administrativa, que negou os pleitos do ente público porque, equivocadamente, decorrido o prazo para pleitear a restituição. Tudo está documentalmente demonstrado, tanto que já havia sido deferida medida liminar para suspender a exigibilidade do valor de R$ 29.856.735,93. Trata-se da mesma situação de fato e do mesmo direito. Presente a verossimilhança das alegações e a prova inequívoca.

E, diante da intimação recebida pelo Estado, em 10/2006, para que fizesse o recolhimento de R$ 12.794.902,00, novamente nasce o perigo de dano irreparável e de difícil reparação. Com efeito. Como noticiado pela Secretaria de Estado da Fazenda, se não for suspensa a exigibilidade desse débito, poderá ser obstaculizada a execução dos Convênios firmados com a União (repasse de verbas) e, ainda, retidos os repasses de recursos federais. E veja-se que, conforme documento em anexo, a certidão positiva com efeito de negativa em nome do Estado vencerá em 03.03.2007. Se não deferida a suspensão da exigibilidade do crédito, a partir de tal data todos os repasses serão obstaculizados.

Excelência: a situação das finanças estaduais é grave, para dizer-se o mínimo. Todos os dias o déficit estadual é matéria dos jornais desse Estado (cópias em anexo), dado o seu vulto: R$ 2,3 bilhões. O governo tentou, inclusive, aprovar medidas que pudessem reduzi-lo, sem êxito. O fato é que o rombo financeiro existe e é grave!!!!

O ente público estadual não pode prescindir desse valor (que pode ser retido se não for deferida a tutela) e, muito menos, pode abrir mão dos repasses federais. Todos os recursos são necessários para honrar os serviços públicos de saúde, segurança pública, educação, a folha de pagamento, etc.

A suspensão dos repasses ou mesmo a paralisação dos recursos de Convênios representaria o verdadeiro caos e um prejuízo irreparável à sociedade.

Se não for suspensa a exigibilidade do valor exigido haverá a inscrição no CADIN e a negativa de certidão de regularidade fiscal, inviabilizando a assinatura de Convênios, nos termos da Lei n.° 10.522/2002.” (grifei)

Sendo assim, em face das razões expostas, defiro o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, em ordem a suspender a exigibilidade quanto aos débitos exigidos pela União em razão das compensações já procedidas pelo Estado, no valor de R$ 29.856.735,93 e R$ 12.724.902,00 (processo administrativo 11080003229/2003-21)”, determinando, ainda, “via de conseqüência, como medida acautelatória (…), que a União emita certidão positiva com efeito de negativa relativamente a tais débitos” e que, “além de não proceder à inscrição no CADIN”, não imponhaobstáculos à retenção no Fundo de Participação dos Estados” (fls. 776/777, itens ns.2e3” – grifei).


Deixo de acolher, no entanto, o pleito formulado a fls. 776, item n. 1 (“Permitir a compensação dos débitos do Estado com o PASEP com tributos da mesma natureza, até a importância integral postulada no pedido de restituição na ACO 981, isto é, até a importância de R$ 179.084.390,63”), eis que tal pretensão contraria, de modo expresso, o que dispõe o art. 170-A do Código Tributário Nacional (na redação dada pela LC nº 104/2001):

Art. 170-A – É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial.” (grifei)

Tal indeferimento, além de se apoiar em expressa vedação legal, também encontra suporte em decisão plenária do Supremo Tribunal Federal consubstanciada em acórdão assim ementado:

TUTELA ANTECIPADA PASEPRECOLHIMENTO A MAIOR. No bojo de ação em que se busca ver reconhecido recolhimento a maior de parcelas devidas a título de PASEP, descabe implementar tutela antecipada com o fito de imediata compensação de valores.” (ACO 657-AgR/PE, Rel. Min. MARCO AURÉLIO – grifei)

Comunique-se, com urgência, encaminhando-se cópia da presente decisão à eminente Senhora Presidente do E. TRF/4ª Região (AG 2006.04.00.002927-2/RS), ao MM. Juiz da 2ª Vara Federal Tributária de Porto Alegre/RS (Processo nº 2005.71.00.040883-0), à Senhora Procuradora-Geral do Estado do Rio Grande do Sul e ao Senhor Procurador-Geral da Fazenda Nacional.

Feitas tais comunicações, voltem-me conclusos os presentes autos.

Publique-se.

Brasília, 02 de março de 2007.

Ministro CELSO DE MELLO

Relator

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