Negligência pública

Município deve indenizar pais de criança que bebeu soda cáustica

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24 de maio de 2007, 0h01

Empresas públicas ou privadas, que prestem serviço público, respondem por danos causados por seus funcionários. Com esse entendimento, o município de Camboriú (SC) foi condenado a pagar R$ 800 mil de indenização aos pais de uma criança que morreu depois de beber soda cáustica em uma creche da rede municipal. A decisão é da Vara da Fazenda Pública de Camboriú. Cabe recurso.

De acordo com a juíza Adriana Lisboa, ficou comprovado que houve o descuido das servidoras. “A funcionária da creche aplicou o produto sem as cautelas devidas, usando para medir o produto uma caneca idêntica àquelas usadas pelas crianças da creche nas refeições, deixando-a no banheiro das crianças que fica na própria salinha de aula”, afirmou.

Para responsabilizar o município, a juíza baseou sua decisão no parágrafo 6º, do artigo 37, da Constituição e nos artigos 932 e 933 do Código Civil.

A prefeitura foi condenada, ainda, ao pagamento de R$ 1,9 mil, por danos materiais, além de R$ 85,3 mil equivalente à pensão mensal a que os pais teriam direito entre os 14 e os 65 anos da filha.

Leia a determinação

Vistos etc.

Fernando Ramos Noronha e Lindamara Santos da Cruz, devidamente qualificados, através de advogado habilitado, ajuizaram ação de indenização por danos materiais e morais contra o Município de Balneário Camboriú, aduzindo, em síntese, que são pais da menor Fernanda da Cruz Noronha, que foi vítima de negligência da creche municipal “Sementes do Amanhã” , pertencente ao requerido, a qual faleceu por ingestão de soda cáustica naquele estabelecimento, que não cumpriu com seu dever de cuidado sobre a menor.

Sublinhando a responsabilidade civil do Município pelos atos de seus prepostos, elencando os danos materiais suportados com o tratamento e funeral da criança, inclusive pelo afastamento dos pais de suas atividades profissionais, reclamaram a condenação do demandado ao pagamento do respectivo ressarcimento das despesas havidas e lucros perdidos.

Externando a dor sofrida, pediram a condenação do Município de Balneário Camboriú ao pagamento de indenização por danos morais e demais consectários sucumbenciais.

Juntaram documentos e reclamaram provas.

Posteriormente, aditaram a inicial pedindo a condenação do requerido ao pagamento de pensão, correspondente a 2/3 do salário mínimo, equivalente ao futuro auxílio que a filha lhes prestaria, entre os 14 e 25 anos e, posteriormente, a pensão no patamar de 1/3 do salário mínimo, a compensar a ajuda que a mesma lhes forneceria na idade adulta, entre seus 25 e 65 anos de idade, o que, no total, representaria R$ 86.796,36.

Indeferida a tutela antecipada, foi concedido o benefício da assistência judiciária gratuita aos autores.

Reiterado o pedido com a anexação de documentos, foi deferida a antecipação da tutela parcialmente (fls. 86).

Citado, o requerido veio aos autos e ofereceu resposta.

Preliminarmente denunciou a lide às servidoras municipais envolvidas no ocorrido, contra as quais, aduziu, já instaurou, inclusive, o competente processo administrativo disciplinar.

No mérito, argumentou que os fatos estão pendentes de esclarecimentos no âmbito interno da municipalidade e que os valores reclamados a título de danos morais são exorbitantes e desconformes às decisões pátrias, constituindo-se verdadeiro enriquecimento

sem causa.

No que concerne à pensão reclamada, sustenta que, em caso de procedência, seria devida até a data em que a vítima completasse 25 anos de idade, quando então se presumiria que constituiria família e não mais contribuiria para o sustento dos pais.

Requereu, então, a improcedência do pleito inicial.

Juntou documentos e pediu provas.

A parte adversa impugnou a peça de resistência.

Indeferida a denunciação a lide, as partes foram instadas a dizer se pretendiam dilação probatória, pedindo, ambas, o julgamento antecipado da lide.

O Ministério Público entendeu desnecessária sua intervenção no feito.

Vieram-me os autos.

É a sinopse necessária.

Decido.

Como já observado quando da prolação da decisão de fls. 160, o Município requerido limitou-se a vergastar a tese argüida na inicial de forma perfunctória e genérica, talvez até pela clareza dos fatos e quiçá pela evidência de sua responsabilidade, eis que nemo

potest ad impossibile obligari (ninguém pode ser obrigado ao impossível ) !

Considerando a inaplicabilidade dos efeitos da revelia às pessoas jurídicas de direito público interno, mister a análise das provas existentes nos autos.

Ora, da simples leitura do processo administrativo instaurado pela Municipalidade para apurar o ocorrido, juntado às fls. 122 e seguintes pelo Município de Balneário Camboriú, verifica-se em contundente conclusão, que a pequena filha do casal autor foi vítima de uma série de irresponsabilidades das servidoras da creche que freqüentava.


Primeiro pela compra de produto diretamente pela coordenadora do Núcleo Infantil, ainda que se vislumbre sua boa intenção. Contudo, se agisse dentro dos limites de sua função e respeitando a legislação atinente, não teria se conduzido dessa forma.

Segundo porque, além de ter que aguardar a remessa dos produtos ou de equipe técnica apta a realizar o serviço, adquiriu produto de alto poder lesivo, para ser usado em estabelecimento freqüentado por crianças em fase pré-escolar, e, portanto, sem capacidade de discernimento.

Terceiro porque a funcionária da creche aplicou o mesmo sem as cautelas devidas, usando para medir o produto uma caneca idêntica àquelas usadas pelas crianças da creche nas refeições, deixando-a no banheiro das crianças que fica na própria salinha de aula. Não se desfez da mesma, sequer lavou-a eficientemente (se é que tal procedimento seria aceitável) e ainda deixou ao alcance dos pequenos.

Ou seja, ainda que se reconheça, por óbvio, a ausência de intenção das funcionárias no resultado havido, claro restou que o acidente foi ilação de um desenrolar de erros concatenados, somente imputados às servidoras, eis que tinham o dever legal de tomar todas as cautelas para proteger a integridade física das crianças entregues pelos pais à sua guarda.

Se tomassem os cuidados mínimos esperados e perfeitamente exigíveis na situação, o infortúnio poderia ter sido evitado, porque plenamente previsível.

Por certo não se olvida que não pretendessem, aquelas, ferir ou matar a criança, ou que, antevendo o resultado (embora plenamente previsível) a ele se mantivessem indiferentes.

Não obstante, por ter em suas mãos vidas de crianças, era exigível que obrassem com intensificada cautela, respondendo pela omissão de cuidados que, como professoras, coordenadora e servente de um núcleo infantil, lhes era dever observar.

Lidar com segurança infantil exige precaução maior e prudência redobrada.

Desrespeitando regras comezinhas e normas de bom senso gerais, agiram, aquelas, com culpa, sendo cabível a indenização à família da vítima.

Resta mais que evidente, destarte, que a conduta das funcionárias públicas foi, no mínimo, negligente, e acarretou a ingestão pela menor do produto químico e, conseqüentemente, sua morte.

Portanto, tendo as servidoras agido com culpa no evento danoso, e não tendo, o requerido, argüido culpa da vítima, caso fortuito, força maior ou qualquer outra medida tendente a afastar sua responsabilidade, o dever de indenizar é evidente, não exigindo maior discussão.

Estabelece o art. 37, § 6º da Constituição Federal :

“Art. 37 – (…)

“§ 6º – As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nesta qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.

Segundo Hely Lopes Meirelles:

“O exame desse dispositivo revela que o constituinte estabeleceu para todas as entidades estatais e seus desmembramentos administrativos a obrigação de indenizar o dano causado a terceiros por seus servidores, independentemente da prova de culpa no cometimento da lesão.” (in : Direito administrativo brasileiro, 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 622).

E continua, o tratadista :

“Para obter a indenização, basta que o lesado acione a Fazenda Pública e demonstre o nexo causal entre o fato lesivo (comissivo ou omissivo) e o dano, bem como o seu montante. Comprovados esses dois elementos, surge naturalmente a obrigação de indenizar. Para eximir-se dessa obrigação incumbirá à Fazenda Pública comprovar que a vítima concorreu com culpa ou dolo para o evento danoso. Enquanto não evidenciar a culpabilidade da vítima, subsiste a responsabilidade objetiva da Administração. Se total a culpa da vítima, fica excluída a responsabilidade da Fazenda Pública; se parcial, reparte-se o quantum da indenização” (op. cit. p. 627)

No mesmo diapasão, colhe-se da jurisprudência do insigne Areópago Estadual :

“Por força do acolhimento pela Constituição Federal da teoria objetiva no tocante à responsabilidade civil do Estado, o dever de reparar nasce, para a Administração, com a demonstração do nexo causal entre o fato e o dano” (Rel. Des. Sérgio Paladino, Apelação cível 98.016902-0, de Xanxerê, julg. em 09/05/2000).

Ainda :

“Pela teoria do risco administrativo, integrante da responsabilidade objetiva, o Estado deverá indenizar sempre que a atividade administrativa provocar um dano, salvo se a vítima concorreu para o evento danoso ou originou-o através de seu comportamento. O Estado, neste caso, deverá provar a culpa do lesado ou a ocorrência de caso fortuito ou força maior para obter a exclusão ou atenuação da responsabilidade estatal. Inteligência do art. 37, § 6º, da Constituição Federal” (Rel. Des. Pedro Manoel Abreu, Apelação cível nº 51.986, da Capital, julg. em 21.11.96).


Também :

“O Estado tem o dever de ressarcir os danos a que deu causa ou deveria evitar. A responsabilidade é objetiva (CF, art. 37, § 6°) e dela somente se exonera o ente público se provar que o evento lesivo foi provocado por culpa exclusiva da própria vítima ou de terceiro, caso fortuito ou força maior.” (Rel. Des. Luiz Cezar Medeiros, Apelação Cível n. 2004.012041-9, de Ponte Serrada, julg. em 05/09/2006).

A norma é reafirmada pela legislação infraconstitucional, perfilhando, o Código Civil :

“Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil :

(omissis)

III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;”

“Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.”

Inquestionável, assim, que ao Estado se atribui a responsabilidade objetiva, ou seja, presente o dano praticado por seus agentes e o nexo de causalidade deste com o prejuízo suportado pela vítima, a indenização há que ser deferida, independente da existência de culpa ou dolo daquele que, de qualquer forma, caso exigível, restou sobejamente demonstrada nos presentes autos.

A responsabilidade do requerido à indenização reclamada, desta feita, é inafastável.

Determina o Código Civil Brasileiro em vigor :

“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”

E especifica como ato ilícito :

“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão, voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”

Como já exaustivamente explanado, as servidoras omitiram-se no dever de cautela plenamente exigível, violaram o direito à integridade física e à vida da infeliz vítima, causando dano aos autores.

Adentro, assim, ao exame da verbas pretendidas.

Quanto aos danos materiais, além da ausência de impugnação especificada, entendo que foram comprovados documentalmente nos autos, merecendo acolhimento.

Determina o Código Civil :

“Art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar.”

Os autores informaram que, para acompanhar o tratamento médico de sua filha, considerando que a mesma ficou internada em hospital por 15 dias, deixando, ambos, de exercer suas atividades profissionais. Em assim sendo, não teriam recebido as verbas para seu sustento.

Efetivamente, a declaração – não impugnada, ressalte-se – de fls. 87, comprova que deixaram de receber a quantia de R$ 1.988,24 (um mil, novecentos e oitenta e oito reais e vinte e quatro centavos), referente a “salário e comissões”.

Por lógica, tal afirmação é perfeitamente dedutível, considerando-se os fatos. Não se pode imaginar que um pai ou uma mãe possam trabalhar em tais circunstâncias, desenvolvendo normalmente suas atividades, sabendo do estado trágico da filha.

Portanto, deverão, os requerentes, serem ressarcidos dessa verba.

No que concerne à pensão alimentícia reclamada, também não há qualquer dúvida quanto à sua incidência.

Reclamam, os autores, a condenação do requerido a pagar-lhes, em uma única parcela, a importância de R$ 86.796,36, sendo R$ 30.799,56 correspondente a 11 anos de pensão mensal no valor de 2/3 do salário mínimo atual, equivalente ao período em que sua filha teria entre 14 e 25 anos; e R$ 55.996,80 do mesmo benefício, reduzido para 1/3 da mencionada verba salarial base, no interregno em que aquela teria de 25 a 65 anos de idade.

O pedido, neste aspecto, merece maior aprofundamento.

“Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações :

“I – no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, o funeral e o luto da família.

“II – na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima.”

A pensão, por certo, é devida, pois há presunção – acolhida por sedimentada e remansosa jurisprudência – de que aquela auxiliaria o sustento dos pais, inicialmente como dependente deles e, posteriormente, por liberalidade, como sói ocorrer em famílias de baixa renda.

Ademais, dita a Súmula 491 do STF :

“Súmula 491 – É indenizável o acidente que cause a morte de filho menor, ainda que não exerça trabalho remunerado.”

E diferente, creio, não poderia ser. Dos documentos juntados e antes analisados (relativos à verba salarial), tem-se que o casal possui módico padrão de vida, fato que, certamente, acarretaria o futuro auxílio financeiro da filha.


O próprio fato da criança freqüentar creche pública corrobora a situação, quer por não poderem, os requerentes, manterem a mesma em uma escola particular – cujos gastos para a realidade nacional são altíssimos – quer porque precisavam trabalhar, pois, do contrário, tendo vista sua tenra idade, a manteriam em casa.

Como costuma ocorrer nessas situações (art. 5º da LICC e art. 335, CPC), os filhos adentram cedo no mercado de trabalho, às vezes antes mesmo da idade constitucionalmente permitida (art. 7º, XXXIII, CF), contribuindo significativamente para o orçamento familiar.

Posteriormente, já na idade adulta, quando constituem família própria ou deixam o lar paterno para uma vida independente, permanecem ajudando seus progenitores, ainda que de forma mais precária, considerando as necessidades inerentes dessa nova fase da vida.

Do egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina, colaciono adequado precedente do Superior Tribunal de Justiça, constante no corpo da Apelação Cível n. 2006.008072-1, de Santo Amaro da Imperatriz :

“CIVIL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – MORTE DE FILHO MENOR QUE NÃO EXERCIA TRABALHO REMUNERADO – FAMÍLIA DE BAIXA RENDA – LIMITE DO PENSIONAMENTO – TERMO FINAL.

I – Em lares de famílias de condição econômica precária, os filhos menores constituem fonte de renda, motivo pelo qual admite-se a indenização de dano material.

II – A contribuição financeira dos filhos, em casos tais, não cessa por atingirem eles uma determinada idade ou contraírem matrimônio. A experiência demonstra que o auxílio permanece, ainda que diminuído, pois a manutenção do núcleo familiar depende do trabalho de todos.

III – Pensionamento estabelecido em 2/3 do salário mínimo, a contar da data em que seria admitido o início do trabalho do menor (14 anos), até quando atingiria 25 anos de idade. Daí para frente e até os prováveis 65 anos da vítima, a pensão é reduzida a 1/3 daquele mesmo salário.

IV – Recurso conhecido pelo dissídio, mas desprovido”. (REsp 113989/SP , rel. Min. Eduardo Ribeiro, Terceira Turma, j. 15-2-01). (Rel. Des. Mazoni Ferreira, Apelação Cível n. 2006.008072-1, de Santo Amaro da Imperatriz, julg. em 23/11/2006).

Não há como, pois, no presente feito, negar que a menor prestaria tal auxílio a seus pais.

A jurisprudência dominante é de que o valor da pensão deve ter por base o salário mínimo, quando não se sabe qual o valor que a vítima efetivamente viria a receber, tendo em vista ser a menor quantia possível de pagamento ao trabalhador (CF, art. 7º, IV).

Ademais, o art. 475 – Q, § 4º, do CPC permite a fixação tendo tal parâmetro :

Art. 475-Q. (omissis)

“§ 4 Os alimentos podem ser fixados tomando por base o salário-mínimo.”

Quanto à idade da vítima de início do pensionamento, da mesma forma, a previsão constitucional deve ser observada, tendo-se como 14 anos de idade, quando poderia iniciar as atividades laborais como aprendiz.

Tem-se, então, que retiraria 1/3 do valor para si própria, auxiliando com o restante os pais. Aos 25 anos, como já verificado, erigiram, os Tribunais Pátrios, como a data em que a extinta adentraria às suas próprias obrigações da fase adulta sozinha, contraindo núpcias, terminando os estudos ou, de qualquer forma, se presumiria a assunção de seu sustento.

Nesse caso, a partir de seus 26 anos, haveria inversão do valor do pensionamento, quando então a vítima contribuiria com 1/3 de seus rendimentos para os pais, permanecendo com o restante em seu favor.

No caso, esse é o costume nacional, é o que se verifica entre as famílias e é assegurado nas decisões judiciais. Na idade adulta espera-se que os filhos reconheçam as dificuldades enfrentadas por seus pais e permaneçam em seu auxílio.

Da mesma forma, seguindo a orientação predominante das Cortes Nacionais, a expectativa de vida da vítima seria de 65 anos de idade, termo, então, final da pensão a ser por ela prestada a seus progenitores.

Nesse particular, a insurgência do requerido de que a pensão se limitaria aos 25 anos da vítima, não comporta albergamento.

Além das mencionadas fontes do direito aplicáveis ao caso, a norma positiva é objetiva, determinando o Código Civil, como já visto :

Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações :

(omissis)

“II – na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima.”

No caso, entendo, em que pese pudessem, os autores, reclamar pensionamento vitalício, verifico que a limitação da idade teve por interesse o recebimento antecipado da verba, o que adiante se analisará, autorizando o deferimento que a ele fica cingido.


A título de fundamentação, colaciono as decisões do egrégio Sodalício Catarinense :

“PENSÃO MENSAL – VERBA ALIMENTAR DESTINADA AOS GENITORES DA VÍTIMA MENOR IMPÚBERE – QUANTUM FIXADO NO VALOR EQUIVALENTE A 2/3 DO SALÁRIO MÍNIMO – MARCO INICIAL – DATA EM QUE A VÍTIMA COMPLETARIA 14 ANOS DE IDADE – EXEGESE DO ART. 7º, XXXIII, DA CF/88 – TERMO FINAL – PAGAMENTO DE 2/3 DO SALÁRIO MÍNIMO DOS 14 ANOS ATÉ QUE A VÍTIMA COMPLETASSE 25 ANOS, PASSANDO ENTÃO A 1/3 ATÉ A DATA EM QUE A FALECIDA COMPLETARIA 65 ANOS – PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.”

Consoante entendimento sedimentado do Superior Tribunal de Justiça, a pensão destinada aos pais em decorrência do falecimento de filha de tenra idade deve ser fixada no valor equivalente a 2/3 do salário mínimo, tendo como marco inicial a data em que a vítima completaria 14 anos, quando poderia ingressar no mercado de trabalho – art. 7º, XXXII, da Constituição Federal – até a data em que viesse a completar 25 (vinte e cinco) anos e, a partir daí, a pensão será reduzida para 1/3 (um terço) do seu valor, até a idade provável da vítima, 65 (sessenta e cinco) anos.” (Rel. Des. Mazoni Ferreira, Apelação Cível n. 2006.008072-1, de Santo Amaro da Imperatriz, julg. em 23/11/2006).

No mesmo norte :

“PENSÃO ALIMENTÍCIA. VÍTIMA CONTANDO COM APENAS 12 (DOZE) ANOS DE IDADE NA DATA DO ACIDENTE. DEVER DE PAGAMENTO DE PENSÃO AOS PAIS. APLICAÇÃO DA SÚMULA 491 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. TERMO INICIAL. DATA EM QUE A VÍTIMA COMPLETARIA 14 (QUATORZE) ANOS, TENDO EM VISTA QUE SOMENTE A PARTIR DESTA DATA O MENOR PODERIA COMEÇAR A EXERCER PROFISSÃO REMUNERADA. INTELIGÊNCIA DO ART. 7º, INCISO XXXIII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. SENTENÇA MODIFICADA NESTE PONTO. TERMO FINAL. PAGAMENTO DE 2/3 (DOIS TERÇOS) DO SALÁRIO MÍNIMO DOS 14 (QUATORZE) ANOS ATÉ QUE A VÍTIMA COMPLETASSE 25 (VINTE E CINCO) ANOS, PASSANDO ENTÃO A 1/3 (UM TERÇO) ATÉ QUE A VÍTIMA COMPLETASSE 65 (SESSENTA E CINCO) ANOS. CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. PEDIDO VISANDO A INCLUSÃO DO BENEFICIÁRIO EM FOLHA DE PAGAMENTO. INADMISSIBILIDADE. NECESSIDADE DA CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL PARA ASSEGURAR O CABAL CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR.” (Rel. Des. Jorge Schaefer Martins, Apelação cível n. 2005.036829-9, de Concórdia, julg. em 27/07/2006).

No caso, porém, há de ser feita uma retificação no cálculo apresentado pelos autores às fls. 74.

Àqueles serão devidos R$ 85.396,44 (oitenta e cinco mil, trezentos e noventa e seis reais e quarenta e quatro centavos), sendo 132 meses (11 anos – dos 14 aos 25 anos) de pensão no valor mensal de R$ 233,33 (2/3 do salário mínimo, hoje R$ 350,00), resultando em R$ 30.799,56. Não obstante, serão 468 prestações (39 anos – dos 26 aos 65), de pensão no valor de R$ 116,66 (1/3 do s.m.), equivalente a R$ 54.596,88.

Pedem, os autores, o recebimento do pensionamento em uma única parcela.

A princípio, ter-se-ia que a pensão – cuja própria designação terminológica indica prestação – haveria de ser prestada com periodicidade, e não em uma única parcela.

Leciona, a propósito, Yussef Said Cahali, no seu festejado livro “Dos Alimentos”

:

“A obrigação alimentar, quando não cumprida sob a forma de acolhimento na casa, hospedagem e sustento do alimentando, se cumpre sob a forma de uma quantia em dinheiro, em gêneros ou por meio de rendimentos de bens, conforme as circunstâncias. “Se o primeiro modo de serem supridos os alimentos caracteriza-se pela continuidade, o segundo modo – aliás, o mais freqüente – efetua-se em parcelas, representadas pela pensão alimentar; a própria palavra pensão supõe prestações periódicas.” (in : Dos alimentos. 3ª ed.,, São Paulo : Revista dos Tribunais, 1999, p. 143).+

Os autores, entretanto, formulam o requerimento a fim de que seja saldado em uma única parcela, perfazendo-se imediatamente o cálculo pelo valor do salário mínimo hoje vigente.

Tenho, a princípio, que a verba alimentar reclamada é de cunho indenizatório e não necessariamente afeta ao direito de família. Tanto que o mesmo tratadista acima mencionado, observa em sua outra obra “Dano Moral”:

“Na sua literalidade, dispõe o art. 1537, II, do CC, que a indenização, no caso de homicídio, consiste ‘a prestação de alimentos às pessoas a quem os defunto os devia’. “Na aplicação do citado dispositivo, a jurisprudência jamais teve dúvida em conceder indenização, sob a forma de pensão alimentar, aos familiares do falecido (marido, companheiro, genitor, filho maior), a quem este sustentava ou tinha o dever de sustentar (esposa, companheira, filhos menores, genitores).

“Sob esse aspecto, coloca-se como pressuposto, em linha de princípio, a existência de uma relação de dependência econômica, efetiva, presumida ou até mesmo eventual, entre os pretensos beneficiários e a falecida vítima.


“É uniforme a lição dos doutos e a manifestação dos tribunais no sentido de que a remissão feita pelo dispositivo, referindo-se a prestação de alimentos a quem o defunto os devia não está acoplada à obrigação alimentar do direito de família (arts. 233, IV, 399 e 400 do CC), representando mera forma ou expediente técnico de que se utiliza o legislador para determinar a maneira como se fará a liquidação do dano resultante de homicídio, o que, aliás, vai refletir-se em matéria de ônus probatório do dano…” (Yussef Said Cahali. in : Dano moral, 2.ed., São Paulo: RT, 2000, p.105).

De outra monta, o Código de Processo Civil permite a condenação da parte à constituição de capital para garantia futura da obrigação e autoriza ao magistrado que tome as providências necessárias a tal desiderato (art. 475, e art. 461) :

“Art. 475-Q. Quando a indenização por ato ilícito incluir prestação de alimentos, o juiz, quanto a esta parte, poderá ordenar ao devedor constituição de capital, cuja renda assegure o pagamento do valor mensal da pensão.

“§ 1º Este capital, representado por imóveis, títulos da dívida pública ou aplicações financeiras em banco oficial, será inalienável e impenhorável enquanto durar a obrigação do devedor.

“§ 2º O juiz poderá substituir a constituição do capital pela inclusão do beneficiário da prestação em folha de pagamento de entidade de direito público ou de empresa de direito privado de notória capacidade econômica, ou, a requerimento do devedor, por fiança bancária ou garantia real, em valor a ser arbitrado de imediato pelo juiz.

(omissis)”

E :

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

“§ 1o A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente. “

(omissis)

Assim, s.m.j., haveria perfeitamente a possibilidade de acolhimento do pedido dos autores para pagamento da pensão reclamada em uma única parcela.

De qualquer forma, observo que a Lei Substantiva Civil também prevê a questão, dispondo no parágrafo único do art. 950 :

Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até o fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.

Parágrafo único. O prejudicado, se preferir, poderá exigir que a indenização seja arbitrada e paga de uma só vez.”

Por certo, não se olvida que a obrigação legal imposta refere-se à lesão corporal e não ao caso de morte.

Entretanto, ainda usando a analogia, determina o art. 951 do mesmo diploma legal :

Art. 951. O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.”

Tenho, pois, da simples leitura do artigo, em que pese referir-se a “paciente”, que sua aplicação, considerando todos os princípios norteadores traduzidos nas normas acima reproduzidas, permitem o pagamento na forma exigida pelos requerentes, eis que a morta da infante decorreu exatamente por negligência e imprudência das servidoras, no exercício de suas funções.

Assim, entendo perfeitamente acolhível o requerimento nos termos em que foi proposto.

Resta, destarte, a análise dos danos morais reclamados.

Os danos morais são resguardados pela Constituição Federal (art. 5º, V e X, da CF), e pelo artigo 186 do Código Civil, anteriormente transcrito.

De outra monta, o art. 948, I, do CC determina que caberá ao ofensor indenizar, além dos danos materiais, consistentes nas despesas do funeral, também o luto da família.

Sobre o conceito de “luto”, Azevedo Marques leciona :

“Este é mais amplo; é também, no dizer dos léxicos : ‘o profundo sentimento de tristeza causado pela perda de pessoa cara’ ou, genericamente, ‘a tristeza profunda causada por desgostos e sofrimentos” Pode haver luto, sem haver morte; pode alguém estar de luto, sem vestir roupas especiais. O luto não é somente o sinal de dor, é a própria dor; é o sofrimento moral íntimo; donde surge para logo, necessariamente, logicamente, a idéia de dano, ou melhor, de dor moral, esteja ou não escrito nas leis.” ( in: Revista Forense 78/548).


Portanto, entendo que o luto integra o dano moral a ser indenizado.

No conceito de Wilson Melo da Silva :

” Danos morais são lesões sofridas pelo sujeito físico ou pessoa natural de direito em seu patrimônio ideal, entendendo-se por patrimônio ideal, em contraposição a patrimônio material, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico.

“Jamais afetam o patrimônio material, como salienta Demongue. E para que facilmente os reconheçamos, basta que se atente, não para o bem sobre que incidiram, mas, sobretudo, para a natureza do prejuízo final.

Seu elemento característico é a dor, tomado o termo em seu sentido amplo, abrangendo tanto os sofrimentos meramente físicos, como os morais propriamente ditos.

“Danos morais, pois, seriam, exemplificativamente, os decorrentes das ofensas à honra, ao decoro, à paz interior de cada qual, às crenças íntimas, aos sentimentos afetivos de qualquer espécie, à liberdade, à vida, à integridade corporal. (in : O Dano moral e sua reparação, Rio de Janeiro : Revista Forense, 1955, p. 11). (Grifei)

O não menos renomado tratadista José de Aguiar Dias consigna sobre danos morais:

“Não decorre da natureza do direito, mas do efeito da lesão, do caráter da sua repercussão sobre o lesado. O dano moral deve ser compreendido em relação ao seu conteúdo, que não é o dinheiro nem coisa comercialmente reduzida a dinheiro, mas a dor, o espanto, a emoção, a vergonha, a injúria física ou moral, em geral uma dolorosa sensação experimentada pela pessoa, atribuído à palavra dor o mais largo significado.

(in : Da Responsabilidade civil, v. II, p. 226). (Grifos meus).

Em casos tais, nada há de ser provado, eis que a dor, a tristeza, o desespero, o melindre, a mágoa, cuidam-se de sentimentos, de elementos internos do agente, impossíveis de serem externados materialmente.

Comprovado o ato e o resultado, e verificada a relação emocional ligando os reclamantes à vítima, os danos morais são presumidos, e, demonstrada a culpa do agente no evento – no caso por suas servidoras – o dever de indenizar o abalo moral sofrido é decretável.

A propósito :

“DANO MORAL PURO. PRESUNÇÃO. PREJUÍZO MATERIAL. COMPROVAÇÃO. DESNECESSIDADE. INDENIZAÇÃO DEVIDA.

“É presumido o dano puramente moral, sem condicioná-lo a qualquer prejuízo de ordem material, isto é, ele existe, tão-somente, pela ofensa, sendo o bastante para justificar a indenização.” (Rel. Des. Carlos Prudêncio, Apelação cível n. 02.022220-3, de Santo Amaro da Imperatriz, julg. em 15/04/03).

E :

“O constrangimento ou a dor que justificam a indenização dos danos morais não precisam ser provados. O que precisa ser demonstrado cabalmente é a ocorrência do fato e a eficácia deste para causar abalo de ordem moral” (Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, Apelação Cível n. 2005.028458-4, de São José, julg. em 11/10/2005).

Portanto, o abalo moral, emocional e psíquico dos requerentes é corolário lógico do resultado obtido da ação culposa das prepostas do requerido, no exercício de suas funções, devendo ser indenizado.

Resta, assim, o arbitramento do quantum reparatório.

Embora nenhuma quantia monetária possa cobrir com justeza o dano moral experimentado pelos requerentes, deve, o requerido, ser condenado à reparação pecuniária a fim de minorar as conseqüências suportadas por aqueles, sanção que apresenta, igualmente, intuito punitivo, exteriorizando a toda sociedade o resultado de uma conduta como a do demandado, para que não volte a comportar-se da forma realizada.

A mestra Maria Helena Diniz acerca do tema, sublinha :

“Fácil é denotar que o dinheiro não terá na reparação do dano moral uma função de equivalência própria do ressarcimento do dano patrimonial, mas um caráter concomitantemente satisfatório para a vítima e lesados e punitivo para o lesante, sob uma perspectiva funcional. (Curso de direito civil, Rio de Janeiro : Saraiva, 1994, v. VII, p. 70).

A propósito, já se pronunciou o colendo Sodalício Catarinense, verbis :

1. “Sobrevindo, em razão de ato ilícito, perturbação nas relações psíquicas, na tranqüilidade, nos sentimentos e nos afetos de uma pessoa, configura-se o dano moral, passível de indenização” (REsp n.º 8.768, Min. Barros Monteiro).

2. “Na avaliação do dano moral se deve levar em conta a posição social e cultural do ofensor e do ofendido; a maior ou menor culpa para a produção do evento. A reparação do dano moral para a vítima não passa de compensação, satisfação simbólica; para o ofensor uma pena para que sinta o mal praticado” (AC n.º 35.339, Des. Amaral e Silva). (Relator: Des. Newton Trisotto, Apelação cível n. 99.016656-2, de Criciúma, julg. Em 23 de maio de 2000).


E :

“‘A eficácia da contraprestação a ser fornecida residirá, com exatidão, na sua aptidão para proporcionar tal satisfação, de modo que, sem que configure um enriquecimento sem causa para o ofendido, imponha ao causador do dano um impacto suficiente, desestimulando-o a cometer novos atentados similares com outras pessoas.’ (ACV n. 49.415, da Capital, rel. Des. Trindade dos Santos).” (Rel. Des. Sérgio Paladino, apelação cível n. 99.002727-9, da Capital, julg. em 31/03/99).

Necessário, por conseguinte, examinar os elementos que possibilitem auferir o valor que possa atender a essas duas exigências : A mitigação do sofrimento moral sentido pelos autores e a punição dos requeridos, sem, entretanto, que se transforme, a presente, em meio de locupletamento indevido.

O demandado cuida-se de pessoas jurídicas de direito público, possuindo infra estrutura suficiente para garantir, no caso, às crianças sob sua custódia, a segurança e qualidade esperadas nas suas atividades.

O ocorrido não possui a mínima justificativa acolhível, nada havendo que minore a conduta negligente das servidoras.

O erro foi crasso.

Os autores, por seu turno, em nada contribuíram para o resultado.

Muito pelo contrário, depositaram nas mãos do demandado o bem mais precioso que possuíam, esperando, por certo, que lhes fosse garantida a segurança da menor.

Ora, a dor da perda da filha, rebento único do casal – saliente-se, em idade em que certamente era a alegria da casa, não pode sequer ser imaginada.

Impossível, entendo, a qualquer pai ou mãe descrever .

Aliás, mesmo não guardando qualquer parentesco, não conhecendo a família ou a menor, tenho que qualquer pessoa que abra o presente processo e veja as fotografias da menina e, a seguir, leia os relatos de seu padecimento após a ingestão do produto químico e a agonia a que foi submetida antes de falecer, com certeza sentirá uma dor inexplicável, será tomado por sentimento de penalização incapaz de ser traduzido.

A forma trágica da morte não pode ser relevada.

Imagina-se, então, a aflição por que passaram os pais da menor, vendo-a em tal situação de penúria e agonia, acompanhando por dias a fio o desenrolar trágico da situação, sempre com a esperança de que reagiria e haveria a melhora.

A ceifa da vida daquela por irresponsabilidade tão evidente, decorrente de situação que poderia ser facilmente evitada se tomadas as cautelas mínimas exigíveis, não pode ser respondida com qualquer quantia monetária, certamente.

Não obstante, deverá servir para minorar a dor dos pais, quase como uma resposta judicial ao ato praticado pelo requerido, por suas prepostas.

Em contra partida, tem-se que o Município, em que pese sugerir que o valor reclamado é significativo, o que não se discute, não sopesa que inúmeros contratos firmados pela municipalidade que diuturnamente aportam neste Juízo (art. 155, caput, CPC) apontam sifras vultosas, corroborando o poder financeiro do ente público, cuja arrecadação de impostos é considerável, fato, ademais, de conhecimento público e notório, alardeado por toda a mídia (art. 334, I, CPC).

O custo de vida em Balneário Camboriú, o mercado imobiliário, as conseqüências da exploração turística, e diversas outras questões financeiras também devem ser consideradas na presente decisão, sendo certo que a realidade local diverge significativamente da grande maioria dos municípios do interior.

Tendo em vista tais circunstâncias, fixo o dano moral a ser indenizado em R$ 800.000,00 (oitocentos mil reais).

Isto posto, com base nos artigos de lei anteriormente mencionados, com fulcro no art. 269, I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado na inicial e CONDENO O MUNICÍPIO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ ao pagamento aos autores FERNANDO RAMOS NORONHA e LINDAMARA SANTOS DA CRUZ, do valor de R$ 1.988,24 (um mil, novecentos e oitenta e oito reais e vinte e quatro centavos), correspondente aos danos materiais, devidamente corrigido da data do infortúnio e acrescido de juros legais a partir da citação, confirmando a antecipação da tutela concedida.

CONDENO o MUNICÍPIO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ ao pagamento de R$ 85.396,44 (oitenta e cinco mil, trezentos e noventa e seis reais e quarenta e quatro centavos), correspondente à pensão mensal a ser paga aos progenitores da menor, sendo 2/3 (dois terços) do salário mínimo vigente à data da sentença por onze anos (data compreendida entre seus 14 e 25 anos de idade) acrescido de pensão equivalente a 1/3 (um terço) do salário mínimo em vigor no período entre seus 26 e 65 anos de idade (39 anos). O valor deverá ser corrigido monetariamente a contar da presente decisão e ser acrescido de juros legais a partir da citação. O pagamento em uma parcela única tem por escopo o art. 951, do CC.

CONDENO O MUNICÍPIO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ ao pagamento de danos morais aos autores, no valor total de R$ 800.000,00 (oitocentos mil reais), sendo metade para cada um dos autores. O valor deverá ser corrigido monetariamente a partir da presente decisão e acrescido de juros legais a partir da citação.

CONDENO O MUNICÍPIO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ, considerando que os autores decaíram de parte mínima do pedido (apenas quanto ao valor – art. 21, par. ún., CPC) ao pagamento de honorários advocatícios à parte adversa, os quais, com base no art. 20, §§ 3º e 4º (contra a Fazenda Pública) e 5º (indenização por ato ilícito), do CPC, fixo em 10% sobre o valor total da condenação, considerando a simplicidade da discussão jurídica e a ausência de dilação probatória.

O Município está isento de custas, por força de lei (LC 156/97).

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

Não havendo recurso voluntário, recorro ex officio da presente decisão.

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