A volta

Cassada liminar que afastou Berenice Giannella da antiga Febem

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24 de maio de 2007, 15h41

Tudo voltou ao que era antes na Febem. O presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Celso Limongi, suspendeu liminar do Departamento das Execuções da Infância e Juventude da Capital (Deij) – braço do Judiciário paulista e manteve Berenice Maria Giannella na presidência da Fundação Casa (antiga Febem). Cabe recurso.

Na segunda-feira (21/5), a juíza Mônica Ribeiro de Souza Paukoski, do Deij determinou o afastamento da presidente da Fundação Casa por descumprimento de decisão judicial. Berenice é acusada de não respeitar sentença que impede a superpopulação na UAI (Unidade de Atendimento Inicial) do Brás, na região central da capital. O afastamento foi dado em caráter liminar até o julgamento do mérito.

Insatisfeita com o despacho, Berenice recorreu ao presidente do TJ e pediu a suspensão da liminar. Alegou que a superlotação da unidade do Brás era decorrente da oscilação provocada pela atuação policial e demora na autorização da Justiça para remoção dos adolescentes.

O afastamento de Berenice foi pedido do Ministério Público Estadual. Limongi entendeu que o afastamento da presidente da Fundação Casa poderia gerar grave risco na solução de programas de alcance estadual. Segundo ele, a medida traria instabilidade nas relações contratuais, que são necessárias para reformas e construções de novas unidades. O presidente determinou que a entidade informe o número de adolescentes na UAI do Brás à Presidência do TJ todo o primeiro dia útil da semana.

Em outro trecho da decisão, Limongi ressalta que a suspensão da liminar é recomendável “para que haja conjugação de esforços por todos os envolvidos na reeducação dos adolescentes, incluindo a identificação de causas e busca de soluções a minimizar a superlotação existente na Unidade de Acolhimento Inicial (UAI) da Capital”.

A unidade abriga 161 internos, quando a capacidade máxima permitida é de 65 adolescentes. Além disso, alguns desses jovens já deveriam estar em outras unidades, pois o prazo máximo de internação na UAI do Brás é de três meses. A Promotoria acusa a presidente da Fundação Casa de ter conduta incompatível com o exercício do cargo.

A decisão judicial, transitada em julgado, foi proferida em abril de 2002 e determinou que a antiga Febem transferisse para locais adequados todos os adolescentes que excedessem a capacidade máxima da unidade. Em junho de 2005, Berenice foi intimada a tomar providências para cumprir o acórdão, sob pena de fechamento da UAI do Brás. Outras intimações se seguiram sem que o problema fosse solucionado.

No último dia 24 de abril, a Justiça fez a inspeção na unidade onde constatou o agravamento da superpopulação. De acordo com o relatório, foram encontrados 162 jovens, dos quais 35 já estavam sentenciados e ali permaneciam ociosos e alijados das medidas previstas no Estatuto da Criança do Adolescente (ECA).

“Sete anos já se passaram desde que este processo foi instaurado. Em que pese as alegadas dificuldades do Governo do Estado para implementar o processo de descentralização das unidades pelo Interior, tal argumento não pode ser utilizado para eternizar o descumprimento das decisões do Poder Judiciário, ainda mais que se cuida de sentença passada em julgado”, afirmou a juíza Mônica Ribeiro de Souza Paukoski para afastar a presidente da Fundação Casa.

Segundo a juíza, todo agente público tem o dever jurídico de seguir os princípios constitucionais da legalidade e da moralidade. Ainda de acordo com a juíza, quando o servidor do Estado persiste em descumprir uma decisão judicial, atenta contra a dignidade, o prestígio e o respeito devidos ao Poder Judiciário.

Para ela, competia a presidente da Fundação Casa, há quase um ano no cargo, dar um basta naquela situação. “Permitir que a UAI continue funcionando do jeito que está, além de ferir os mais basilares direitos e garantias preconizados no ECA, afronta acórdão do Tribunal de Justiça que autorizou o funcionamento da UAI apenas se todas as duas anomalias, dentre as quais a gritante superlotação, fossem removidas”, completou a juíza.

Leia íntegra da liminar

Processo 149.232-01

Natureza: Suspensão de medida liminar

Requerente: Fundação Centro de Atendimento Sócio-Educativo de

São Paulo – Fundação Casa/SP

Trata-se de pedido formulado pela Fundação CASA/SP, de suspensão de decisão liminar prolatada nos autos do Processo Administrativo 07/07, do Departamento de Execuções da Infância e da Juventude da Capital, que determinou, com fundamento no art. 191, parágrafo único, do Estatuto da Criança e do Adolescente, o afastamento provisório da atual Presidente, Dra. Berenice Maria Giannella. Sustenta, em síntese, grave risco à ordem , segurança e economia públicas.

Para a suspensão dos efeitos de liminares ou sentenças — cabível em atividade político-administrativo do Presidente do Tribunal ao qual será interposto recurso contra decisão hostilizada —, desde que plausível a tese sustentada pela pessoa jurídica de direito público requerente, não se verifica a correção ou adequação judicial da decisão, mas, tão-somente, a possibilidade de grave risco à ordem, à economia, à saúde, à segurança públicas.

Embora a viabilidade da suspensão não decorra da literalidade do disposto no par. 1º, do artigo 4º, da Lei 8.437/92, não se pode perder de vista que o escopo da lei foi o de conferir ao Poder Público um instrumento apto a embargar decisões provisórias potencialmente perturbadoras aos valores ordem, economia, saúde ou segurança públicas. Adotado como elemento teleológico (artigo 5º, da Lei de Introdução ao Código Civil), conclui-se pela admissibilidade da instauração deste incidente no procedimento previsto no artigo 191, do ECA.

As alegações expendidas no pedido de suspensão, acerca do mérito do procedimento administrativo em trâmite perante o Departamento de Execuções da Infância e da Juventude da Capital, serão conhecidas naqueles autos principais, quando a Fundação Casa terá oportunidade para demonstrar que a superpopulação na UAI decorre da oscilação provocada pela atuação policial e demora na autorização judicial para remoção e não de proposital descumprimento de ordem judicial.

Entretanto, o afastamento provisório liminar, “inaudita altera parte”, da Presidente da Fundação é preocupante e poderá trazer grave risco à ordem, à segurança e à economia públicas, pela solução de continuidade de programas de alcance estadual, com instabilidade nas relações contratuais necessárias para reformas e construções de novas unidades, todas com envolvimento de autoridades dos órgãos dos Poderes do Estado.

O grave risco a esses valores que autorizam a suspensão decorre da excepcional gravidade do afastamento liminar da autoridade responsável pelas atividades de comando e gerenciamento da Fundação, com mecessário provimento da função de Presidência e inesperado reinício de negociações com o quadro de funcionários e empresas contratadas para serviços de adequação das unidades em funcionamento, além de possível rompimento de programas de interesse dos adolescentes, alguns tendentes a prevenir rebeliões.

Como tenho afirmado, os direitos fundamentais dos adolescentes recolhidos na Unidade de Acolhimento Inicial não são olvidados por este Presidente. Entretanto, neste instante inicial, recomendável a suspensão da decisão liminar de afastamento provisório, para que não ocorram os riscos antes apontados e para que haja conjugação de esforços por todos os envolvidos na (re)educação dos adolescentes, incluindo a identificação de causas e busca de soluções a minimizar a superpopulação existente na Unidade de Acolhimento Inicial da Capital, agora também sob acompanhamento desta Presidência.

Relembre-se, na lição de Hely Lopes Meirelles, calcada em explicitação do então Ministro do STF José Néri Silveira, que no conceito de ordem pública “se compreende a ordem administrativa em geral, ou seja, a norma execução do serviço público, o regular andamento das obras públicas, o devido exercício das funções da Administração pelas autoridades constituídas, Realmente, assim, há que ser entendido o conceito de ordem pública para que o Presidente do Tribunal competente possa resguardar os altos interesses administrativos, cassando liminar ou suspendendo os efeitos da sentença concessiva de segurança, quando tal providência se lhe afigurar conveniente e oportuna” (Mandado de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado de Injunção, “Habeas Data” RT 26ª edição, p. 87).

Ante o exposto, defiro a suspensão da liminar, até que esta Corte conheça o mérito do procedimento administrativo.

Deverá a Fundação CASA/SP, todo primeiro dia útil da semana, informar a esta Presidência do Tribunal de Justiça o número de adolescentes na UAI.

Comunique-se.

São Paulo, 23 de maio de 2007.

Celso Limongi

Presidente do Tribunal de Justiça

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