Luta por poder

Ministério da Justiça disputa o controle do Coaf

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10 de maio de 2007, 16h06

O secretário nacional de Justiça, Antonio Carlos Biscaia, tem em mãos a minuta de Medida Provisória que transfere o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Ministério da Fazenda para o da Justiça, informa o Painel da Folha.

O órgão recebe informações cadastrais bancárias para identificar transações suspeitas de lavagem de dinheiro. No primeiro mandato do presidente Lula, o então ministro Márcio Thomaz Bastos tentou a mudança, mas o ex-ministro da Fazenda, Antonio Palocci, não autorizou.

A tentativa acontece em um momento em que o órgão pode ganhar mais poder. No Senado, um projeto de reforma da Lei de Lavagem de Dinheiro está tramitando. No dia 18 de abril, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania aprovou o Projeto de Lei 209, de autoria do senador Antônio Carlos Valadares (PSB-SE). A proposta do PL é substituir a Lei 9.613/98, o que tornaria mais eficiente a pena dos crimes de lavagem de dinheiro.

A reforma surgiu de uma necessidade para adaptar o sistema brasileiro às recomendações do Gafi (Grupo de Ação Financeira), que teve origem no G-7 (grupo dos sete países mais ricos). O organismo estabeleceu 40 recomendações de medidas para o combate à lavagem de dinheiro e outras nove recomendações especiais sobre o financiamento ao terrorismo.

Se for aprovado, as “pessoas físicas ou jurídicas que prestem, mesmo que eventualmente, serviços de assessoria, consultoria, contadoria, auditoria, aconselhamento ou assistência, de qualquer natureza” serão obrigadas a informar ao Coaf as operações suspeitas. A pena para quem ocultar as operações será de 3 a 18 anos de prisão mais multa.

A lista é dos que serão obrigados a informa ao Coaf também inclui bolsas de valores e de mercadorias, empresas do ramo imobiliários, comerciantes de bens de luxos ou de alto valor, juntas comerciais, empresários de atletas e artistas e pessoas jurídicas do setor agropecuário.

O parecer favorável ao projeto já foi aprovado pela Comissão de Assuntos Econômicos. Agora, precisa passar pelo Plenário antes de ser enviado à Câmara dos Deputados. Como é apoiada pelo governo, a proposta deve seguir sem grandes alterações no Parlamento.

Sigilo profissional

O projeto ainda cria divergências sobre a possibilidade de os advogados serem obrigados a informar operações suspeitas de seus clientes ao Coaf. Caso seja aprovada a nova forma da lei, a possível brecha interpretativa deixará nas mãos do Supremo Tribunal Federal a decisão sobre as conseqüências que ela terá sobre o sigilo profissional do advogado.

A questão sobre a quebra o sigilo neste projeto não é recente. Em 2005, quando a minuta da proposta era preparada pelo governo, o inciso XVI do artigo 9º dizia claramente que “os advogados e as sociedades de advogados, quando prestem os serviços previstos nos incisos anteriores (consultoria e assessoria),” deveriam notificar as possíveis suspeitas ao Coaf.

Diante da forte reação da classe, encabeçada pela OAB, o Ministério da Justiça recuou e suprimiu o inciso. Com a exclusão nominal dos advogados, o inciso XIV foi retocado.

No entanto, para o advogado Jorge Nemr, do escritório Leite, Tosto e Barros Advogados Associados, o projeto continua sendo uma grande ameaça para o sigilo profissional do advogado. “Como o projeto não específica a natureza da consultoria, o trabalho do advogado pode ser incluído nesta obrigação”, entende Nemr.

O advogado lembra que na França, Japão e Canadá uma lei de igual teor também foi aprovada. As entidades de classe destes países estão mobilizadas para derrubar a propositura. Lá, o erro só foi percebido quando a lei entrou em vigor.

Já a procuradora Neydja Maria Dias de Morais, chefe da Procuradoria da Fazenda Nacional no DF e professora de Direito, defende uma maior flexibilização no sigilo profissional. “Diante de indícios de crime, nenhum tipo de informação merece proteção, ademais já há nesse caso, previsão de quebra de sigilo bancário, fiscal e telefônico”, afirma.

Há quem discorde da interpretação do projeto feita por Jorge Nemr. “O inciso fala em consultoria em geral, mas que não estão ligadas ao sigilo profissional. Quando se tem a atividade da consultoria jurídica, você tem o sigilo profissional. Não deve ser interpretada para o advogado. Tecnicamente não dá para sustentar esta visão”, afirma o presidente da OAB-SP, Luiz Flávio Borges D’Urso.

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