Excesso de coliformes

Justiça determina que Sabesp forneça água limpa ao Guarujá

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10 de maio de 2007, 21h11

A Sabesp tem até esta sexta-feira (11/5) para reduzir a contaminação de coliformes fecais (bactérias presentes nas fezes) e termotolerantes da água fornecida ao município do Guarujá (Baixada Santista).

Uma liminar do juiz Daniel Carnio Costa, da 5ª Vara de Guarujá, determinou, na terça-feira (8/5), que a companhia de saneamento forneça a água para consumo humano nos mesmos níveis de pureza indicados pelo Ministério da Saúde. A multa pelo descumprimento é de R$ 100 mil por dia.

Segundo a legislação, só é permitido que haja coliformes fecais em no máximo 5% das amostras analisadas e nenhuma presença de coliformes termotolerantes (que apontam contato com o esgoto). No Guarujá, os níveis de poluições estavam acima do permitido em dez das 14 análises feitas.

A empresa terá que entregar diariamente laudos medindo a qualidade da água. Também será obrigada a fazer uma campanha publicitária esclarecendo a população sobre doenças que podem ser contraídas pelo consumo de água suja. Será aplicada multa de R$ 100 mil para cada um dos dois itens em caso de descumprimento.

A prefeitura foi obrigada, ainda, a entregar para a Justiça o contrato de concessão de serviço da Sabesp e a planilha da arrecadação da empresa na cidade. O juiz também pediu para a Secretaria de Saúde do Guarujá o número de atendimentos relativos a doenças causadas por contaminação de água no período de janeiro a abril de 2006, de outubro a dezembro de 2006 e de janeiro a março de 2007.

“É a saúde do consumidor de água que está em risco. A presença de coliformes fecais e termotolerantes na água servida ao consumo humano é, inequivocamente, causa de diversas doenças. Se assim é, não se pode admitir que as pessoas continuem ingerindo água contaminada e adoecendo até que se defina a existência do direito na ação principal”, anotou o juiz.

A ação foi ajuizada pela associação Princípios. “Vamos entrar com a ação em outros municípios da Baixada Santista, onde é fornecida a pior água no estado de São Paulo”, afirma o advogado da associação, Clayton Pessoa de Melo Lourenço.

Segundo testes de potabilidade realizados pela Sabesp, a água é imprópria para consumo humano durante a maior parte do ano na Baixada Santista e em parte do litoral sul paulista. Os dados mostram que, principalmente durante o verão, a água chega às torneiras com coliformes fecais em índices acima do estabelecido pelo Ministério da Saúde em uma portaria publicada em 2000.

“A forma de relação da Sabesp com os municípios da Baixada Santista é diferente das demais. Na região, a Sabesp tem uma escritura pública com as Prefeituras e não haveria, a exemplo do que está acontecendo no interior, uma Assembléia de Municípios Concedentes. Para o período 2007-2011, temos investimentos previstos que superam a casa dos R$ 2.1 bilhões, sem contar outros R$ 200 mil, pelo menos, que podem vir de recursos do PAC via Prefeituras”, explicou Gesner Oliveira, presidente da Sabesp, em reunião com os prefeitos da Baixada, na segunda-feira (7/4).

Leia a liminar

Processo 422/2007

Trata-se de ação cautelar preparatória de ação civil pública ajuizada pela associação civil denominada Princípios — Agência Saneamento Básico do Estado de São Paulo — Sabesp e da Prefeitura Municipal alegando, em suma, que foi amplamente divulgado na mídia regional que a Sabesp tem distribuído água imprópria para o consumo em Guarujá, sem que haja uma interferência efetiva da Prefeitura Municipal para correção da qualidade do serviço público transferido à Sabesp através de concessão.

Requereu, assim, medida liminar para determinar à Sabesp que:

a) reduza aos níveis indicados pelo Ministério da Saúde a presença de coliformes fecais e de coliformes termotolerantes imediatamente, sob pena de pagamento de multa diária no valor de R$ 100.000,00;

b) apresente diariamente laudos de medição da qualidade da água;

c) inicie campanha publicitária para esclarecimento e prevenção de doenças, sempre que constatar durante as medições a presença de substâncias nocivas à saúde humana, sob pena de pagamento de multa diária no valor de R$ 100.000,00;

d) apresente relatório das análises de qualidade da água realizadas nos últimos 24 meses na cidade de Guarujá.

Requereu, ainda, que:

a) seja oficiado à Secretaria de Saúde de Guarujá, a fim de que informe o número de atendimentos relativos às doenças ou sintomas de doenças causadas por contaminação de água no período de janeiro a abril de 2006, de outubro a dezembro de 2006 e de janeiro a março de 2007;

b) seja oficiado à Prefeitura Municipal a fim de que junte aos autos o contrato de concessão do serviço à Sabesp, bem como a planilha de valores arrecadados pela Sabesp a título de cobrança de tarifa nos mesmos períodos acima mencionados;

c) seja oficiado à Prefeitura a fim de que junte aos autos os relatórios de fiscalização dos serviços prestados pela Sabesp no referido período.

O Ministério Público manifestou-se nos autos opinando pelo deferimento da medida liminar, bem como pela expedição dos ofícios à Prefeitura Municipal e Secretaria Municipal da Saúde (fls. 68/70).

É o breve relatório.

Fundamento e decido acerca do pedido liminar.

A medida liminar consiste na obtenção prévia e antecipada daquilo que só se obteria ao final, quando da prolação da sentença.

É, pois, a antecipação dos efeitos da sentença.

Tratando-se de medida cautelar, a liminar antecipa os efeitos da sentença cautelar, ou seja, antecipa a proteção ao bem jurídico discutido no processo principal e a garantia da efetividade e da utilidade do futuro provimento jurisdicional de mérito.

Não antecipa, por óbvio, o direito discutido na ação principal, mas apenas a sua proteção.

A concessão da medida liminar, ou seja, a antecipação da cautela pretendida exige como pressupostos necessários a presença da fumus bni iures e do periculum in mora.

Passemos, pois à análise da existência dos requisitos imprescindíveis ao deferimento da liminar cautelar.

Está presente nos autos a fumaça do direito alegado pela associação autora.

Não obstante existam tão somente matérias jornalísticas sobre o tema, verifica-se que as notícias são fundadas em dados estatísticos e informações fornecidas pela própria Sabesp.

Tais notícias foram veiculadas por jornais e órgãos de mídia tradicionais e, em princípio, confiáveis.

Daí que a documentação acostada aos autos, embora não seja prova inequívoca da existência da irregularidade na prestação do serviço, serve ao menos para preencher o requisito cautelar de fumus boni iures.

Vale lembrar que no processo cautelar o Juiz não analisa de maneira exauriente o direito à cautela. Contenta-se com a existência da fumaça do bom direito ou fumus boni iures.

O Juiz analisa se o direito alegado pela parte é plausível, verossímil, provável, sem analisar profundamente sua existência, o que será feito na ação principal.

Havendo a mínima possibilidade de existência do direito alegado, justifica-se a sua preservação até que se defina se o mesmo realmente existe ou pertence à parte.

Basta, portanto, a mera possibilidade de existência do direito alegado pela parte que se reconheça a presença do requisito cautelar do fumus boni iures.

Registre-se que a associação civil, embora legitimada pela lei para ajuizar ação civil pública, não tem à sua disposição o inquérito civil como instrumento de investigação prévia dos fatos supostamente lesivos aos direitos transindividuais.

Mais um motivo, portanto, para se contentar inicialmente com a veiculação jornalística do problema que, ao que foi levado ao conhecimento comum, vem causando potencial lesão à saúde dos consumidores da água fornecida pela ré.

Não se pode negar, ainda, que não tendo havido a atuação do Ministério Público na investigação preliminar de tais fatos, através do inquérito civil, não restou alternativa à associação civil serão propor a presente ação cautelar com base nas notícias verossímeis e confiáveis de que o serviço público estaria mesmo sendo prestado de maneira lesiva aos consumidores.

A gravidade da situação justifica a atuação da associação.

Por tudo isso, reconheço presente o fumus boni iures para o deferimento da cautelar liminarmente.

O periculum in mora também está presente nos autos.

A razão de existir do processo cautelar é a urgência, que se revela através do periculum in mora, ou seja, o perigo de que a demora na definição do processo principal possa gerar a parte um dano irreparável ou de difícil reparação.

O receio da ocorrência da lesão deve ser sério, plausível e fundado.

O fundado receio de ser objetivo, fundado em motivos sérios e que possam ser demonstrados, ainda que de maneira indiciária.

Não serve o simples receio subjetivo.

No caso, diante dos fatos noticiados amplamente na mídia regional, o periculum in mora é latente.

É a saúde do consumidor de água que está em risco.

A presença de coliformes fecais e termotolerantes na água servida ao consumo humano é, inequivocamente, causa de diversas doenças.

Se assim é, não se pode admitir que as pessoas continuem ingerindo água contaminada e adoecendo até que se defina a existência do direito na ação principal.

O receio de que a saúde pública sofra danos de difícil reparação funda-se em motivos sérios (a contaminação admitida pela própria Sabesp) e demonstrados, ainda que de forma indiciária (conforme matérias jornalísticas que instruem a inicial).

Não se pode aguardar o final do processo cautelar para se conceder a proteção ao direito. A saúde do consumidor sofreria danos de difícil reparação caso a cautela fosse dada somente ao final, em sentença.

O deferimento da liminar é, pois, imperioso.

I – Nesse sentido, determino à Sabesp que:

a) reduza no prazo de 03 dias a contaminação da água fornecida ao consumo humano por coliformes fecais e coliformes termotolerantes aos níveis indicados pelo Ministério da Saúde, sob pena de pagamento de multa diária no valor de R$ 100.000,00.

b) apresente diariamente nos autos, a partir de sua intimação dessa decisão, laudos de medição da qualidade da água fornecida na cidade de Guarujá, sob pena de pagamento de multa diária no valor de R$ 100.000,00.

c) realize campanha publicitária (jornal, rádio e televisão) para esclarecimento e prevenção de doenças, sempre que constatar durante as medições a presença de substâncias nocivas à saúde humana, sob pena de pagamento de multa diária no valor de R$ 100.000,00.

d) apresente, no prazo de 03 dias, relatório das análises de qualidade da água realizadas nos últimos 24 meses na cidade de Guarujá.

II – Determino, ainda, à Prefeitura Municipal que:

a) junte aos autos, no prazo da resposta, o contrato de concessão do serviço à Sabesp, bem como a planilha de valores arrecadados pela Sabesp a título de cobrança de tarifa nos mesmos períodos acima mencionados.

b) junte aos autos, no prazo da resposta, os relatórios de fiscalização dos serviços prestados pela Sabesp no referido período.

III – Oficie-se para cumprimento da medida liminar.

IV – No mais, e sem prejuízo do cumprimento da liminar, citem-se as rés para que apresentem resposta no prazo legal.

V – Por fim, com vistas à instrução do feito, oficie-se à Secretaria de Saúde de Guarujá, a fim de que informe o número de atendimentos relativos a doenças ou sintomas de doenças causadas por contaminação de água no período de janeiro a abril de 2006, de outubro a dezembro de 2006 e de janeiro a março de 2007.

Ação principal em 30 dias, contados da efetivação da medida liminar, sob as penas da lei.

Ciência ao MP.

Int.

Guarujá, 8 de maio de 2007.

Daniel Carnio Costa

Juiz de Direito

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