Concorrência desleal

Empresa Estrela não consegue indenização da Mattel por ato ilícito

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6 de maio de 2007, 14h46

A Fábrica de Brinquedos Estrela perdeu a queda de braço que travava na justiça paulista contra a norte-americana Mattel Inc. e sua subsidiária no país a Mattel do Brasil, fabricantes da Barbie a mais famosa boneca do mundo, líder de mercado há quase 50 anos. A 9ª Câmara de Direito Privado negou pedido de indenização por suposto ato ilícito e concorrência desleal apontado pela empresa brasileira. A Estrela acusa o grupo Mattel de agir de má-fé e de forma afrontosa. Sustenta que, por causa de contrato que aponta como desfavorável, sofreu prejuízo da ordem de R$ 1.039.344,40.

A Estrela afirma que pelo contrato assinado com o grupo Mattel, ganhou autorização para licenciar, com exclusividade, produtos da multinacional no Brasil. Em troca, assumiu o compromisso de retirar do mercado alguns de seus brinquedos para eliminar a concorrência com a maior fabricante mundial de brinquedos. Um desses produtos foi a boneca Susi, que ficou longe das prateleiras das lojas por 12 anos, entre 1985 e 1997. Só retornou ao mercado quando Mattel e Estrela romperam acordo de produção da Barbie.

A Estrela acusa os antigos sócios de obrigá-la a repassar a Mattel do Brasil seu estoque de brinquedos, embora continuasse a arcar com os custos de armazenagem. Sustenta que, além de se apropriar do estoque, a Mattel revendeu os produtos para a empresa brasileira e a obrigou a assinar documento como se a operação não houvesse acontecido. Apontou, ainda, que o grupo americano aliciou seus empregados, suspendeu o contrato assinado, se negou a enviar produtos importados e impediu que a Estrela mantivesse a produção nacional.

A turma julgadora do Tribunal de Justiça de São Paulo entendeu que não havia indícios de que a Estrela assinou contrato desfavorável, nem que houve coação, má-fé, aliciamento ou concorrência desleal por parte das duas empresas acusadas. Na opinião dos três desembargadores que julgaram o caso a empresa brasileira não comprovou os fatos alegados na ação.

“A apelante Estrela estava livre para contratar com as apeladas do Grupo Mattel e seus interesses poderiam ser atendidos por outros meios, como a licença para comercialização e produção de outros produtos. Não havia monopólio de fato ou de direito, não restando eliminada a concorrência, como o exige o contrato de adesão”,sustentou o desembargador Gavião de Almeida, relator do recurso.

“Aceitar que toda atuação das requeridas foi preconcebida para prejudicar a autora é conclusão que os elementos vindos aos autos não conseguem sustentar. Verifica-se que segundo a autora a associação que manteve com a Mattel não foi ligeira, mas duradoura, pois mantida por 30 anos. Não é crível que alguém se disponha a construir ardil por período tão dilatado”, completou o relator.

O Tribunal de Justiça usou como parâmetro às provas apresentadas pela perícia. De acordo com a documentação, a Estrela gastou cerca de R$ 3, 668 milhões com a recolocação da boneca Barbi no mercado nacional e investiu R$ 1,273 milhão com equipamentos e moldes para produzir outros brinquedos da marca norte-americana, além de desembolsar R$ 36,357 milhões com publicidade dos produtos da Mattel.

A perícia aponta, no entanto, que no período do contrato de licenciamento, a Estrela teve faturamento de R$ 927,164 milhões só com a venda de produtos da Mattel. O documento conclui que o acerto feito entre as partes, na confissão da dívida, estava correta e que a incorreção na forma de pagamento beneficiou a Estrela, porque a Mattel teria recebido US$ 10 mil a menos do que era devido.

Para a turma julgadora, que se baseou no laudo pericial, não seria possível responsabilizar o grupo Mattel pelas perdas da Estrela. Na opinião dos desembargadores, o endividamento da Estrela não foi conseqüência dos produtos licenciados pelo grupo norte-americano, porque a situação da empresa nacional já era grave, desde o plano Collor, em 1990, que permitiu a abertura do mercado brasileiro a produtos estrangeiros. “Tudo indica, portanto, que a crise se deveu à política econômica adotada no país e que prejudicou o interesse das indústrias nacionais, privilegiando as empresas estrangeiras”, afirmou o relator, Gavião de Almeida.

Recordações de Infância

Os problemas da Estrela começaram na década de 90, quando o processo de abertura de mercado atingiu a indústria nacional de brinquedos. Outra paulada veio com a valorização do real de 1994 a 1999. A seguir, o mercado teve de enfrentar os efeitos da concorrência chinesa, a enxurrada de mercadoria asiática, a falsificação de produtos e o contrabando. O auge da crise da Estrela coincide com o fundo do poço de todo o setor de brinquedos. Em 1996 foram fechadas 536 fábricas acarretando a demissão de 18 mil pessoas.

Entre 1986 e 1997, a Estrela viu despencar o número de funcionários de 11 mil para apenas 600. Desde então, a empresa tenta recuperar espaço no mercado. Em 2006, teve resultados positivos: as vendas cresceram 40% em relação ao ano anterior. Hoje suas linhas de produção já contam com 800 empregados e a empresa mantém três fábricas – em Manaus (AM), Três Pontas (MG) e Itapira (SP).

Mas os motivos da crise da Estrela não são apenas macroeconômicos. O outro ingrediente veio de dentro de casa. De acordo com analistas do setor de brinquedos, a empresa não conseguiu se adaptar aos novos tempos. A linha de produtos não se renovou em velocidade suficiente para acompanhar as mudanças. Ainda hoje, o carro chefe da Estrela continua sendo as bonecas, sobretudo a Suzi, lançada há mais de 30 anos. E produtos como Banco Imobiliário e Autorama se mantêm há décadas como destaques.

Agora, em 2007, a empresa completa 70 anos e promete inovar e ganhar novos mercados. Da modesta fábrica de bonecas de pano e carrinho de madeira surgida em 1937 até a moderna indústria de hoje a Estrela tem uma história que faz parte da recordação de infância de muitos brasileiros.

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